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Planet of the Humans

Eis que despretensiosamente fui assistir o último documentário produzido pelo Michael Moore. Pra quem já viu algum dos filmes dele esse Planet of the Humans segue o mesmo estilo, porém o narrador não é ele. Mas o estilo é MUITO igual.

Fui ver o filme meio as cegas sem saber do que se tratava e fiquei contente em saber que era sobre meio ambiente, energia verde, sustentabilidade e afins.

Como todo documentário, ele conta um ponto de vista, uma visão de mundo, entrevista pessoas que interessam para a narrativa e muitas vezes não aprofunda no assunto que pode de alguma forma contradizer a tese. 

O problema do filme é você assisti-lo querendo ver o mundo de forma simplista. E é isso que me incomoda nele, num mundo complexo cheio de problemas cruéis a serem resolvidos não é polarizando a questão ambiental e tratando de forma superficial que vamos chegar num lugar melhor do que estamos hoje. (O detalhe é que essa abordagem hoje em dia parece que tem sido regra para qualquer conflito, seja na política, na economia, na saúde).

Dois pontos que abusam da superficialidade e simplismo

1) carros elétricos. Em 2009 escrevi um post sobre o documentário Quem matou o carro elétrico? E qual foi a minha principal questão naquele post? Qual é a origem da energia produzida para abastecer os carros elétricos? 11 anos depois essa pergunta já foi respondida e superada. O desempenho e o custo por km rodado do carro elétrico é muito melhor que o carro a combustão, ou seja, ele faz mais com menos. Então mesmo emitindo mais CO2 o carro elétrico faz mais. Acho preguiçoso o argumento: “ah se a energia do carro elétrico não tiver origem sustentável, então o carro elétrico não serve”. Você acha inteligente o pensamento de que se toda a produção de comida no Brasil não for orgânica, então nem quero saber de produção orgânica e ela nem deve ser incentivada?

Lembrando aqui que o carro elétrico não é a bala de prata pra problemas de transporte no mundo e tem várias problemas também, mas como a vida já deve ter te ensinado, não há solução única e perfeita no mundo.

2) combustíveis fósseis são a pior opção sempre. Longe de mim querer defender os combustíveis fósseis, eles são um problema sim mas é importante ter claro que o uso deles não vai parar na terra da noite para o dia. É ingenuidade achar que isso é possível e a menos que você seja um indígena isolado na floresta amazônica ou integrante de alguma tribo isolada africana é impossível não depender de combustível fóssil de alguma forma. E o fato de aceitar que ele é parte da vida não significa que você não pode defender que outras formas de energia e matéria-prima sejam usadas e desenvolvidas.

A falsa dicotomia

Ter conhecimento dos problemas da energia dita verde renovável, do consumo de carne, da produção da soja, das viagens de avião, dos bilionários no mundo, do plástico de origem vegetal, da reciclagem como solução para o problema de resíduos no mundo não me fazem uma pessoa que incentiva e apoia tudo isso. Nem me fizeram defensora da energia fóssil, vegana, deixei de separar meu lixo, vão me impedir de viajar de avião ou deixar de acreditar que uma outra solução além da reciclagem é possível. Felizmente o mundo não é feito só de sim ou não, certo e errado, preto ou branco.

Talvez o filme ajude os desavisados a simplesmente passarem a odiar as soluções alternativas de energia, provavelmente ambientalistas e defensores da energia verde se sintam ofendidos e/ou traídos e talvez o filme seja usado pela indústria do petróleo como endosso aos seus produtos. Tudo isso é possível e nem posso dizer que está errado. Talvez se o filme tentasse ao menos seguir no meio do caminho, não só criticando as energias alternativas, mas mostrando que ela tem vantagens e outros aspectos da origem dos problemas ambientais, seria uma maneira de ampliarmos nossas conversas e ajudaria a diminuir a polarização.

É meio estranho o que vou dizer aqui, mas o ponto alto de Planet of the Humans para mim foi a frase da Rachel Carson nos créditos finais

Mais opiniões sobre The Planet of Humans

Achei que esse texto reforça a ideia de dicotomia do filme (em inglês), provavelmente faz parte do grupo ambientalista que se sentiu traído/ofendido com a abordagem.

esse outro texto (em português) sugere que o filme deveria ter focado mais na base do problema: consumo, ideia de crescimento infinito possível e modelos econômicos alternativos. Válido, mas ai acho que seria um outro filme.

EXTRA: No site do filme planetofthehumans.com tem um guia de discussão para professores (em inglês). Gente, queria tanto que no meu tempo de escola tivesse tido esse tipo de discussão sobre os filmes que assisti… Um dos exercícios que mais me empolgaram foi: se esse filme fosse o primeiro de uma mini-série o que você gostaria que fossem os próximos episódios?

Brasil querendo ficar bem na fita, te convence?

Hoje quando abri o portal Globo.com apareceu um pop-up do Governo Brasileiro que levava para um site falando da participação do Brasil na COP-15.

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Numa das páginas do site chamada Panorama que fala de matriz energética limpa eles afirmam (no texto) que 45,9% da produção de energia brasileira vem de fontes renováveis. Ai mostram 2 gráficos, um mostrando a matriz energética brasileira separada em renovável (46,4%, afinal qual o número correto?) e não renovável (53,6%) e outro gráfico as fontes de geração de eletricidade. Mais de 75% é de origem em hidrelétricas.

Ai o Brasil resolve falar em investimentos, é essa parte que mais me irrita. “A estimativa do Ministério de Minas e Energia para o período 2008-2017 indica aportes públicos e privados da ordem de R$ 352 bilhões para a ampliação do parque energético nacional.” “Para a área hidrelétrica estão previstos cerca de R$ 83 bilhões.” “Outros R$ 23 bilhões devem ser aplicados na expansão da produção e oferta de biocombustíveis como etanol e biodiesel.”

Ótimo, são R$106 bilhões que serão investidos hidrelétricas e biocombustíveis, ou seja, 30,12% do total dos investimentos. Tá e os outros R$ 246 bilhões? Vão investir em que? Vento? Nuclear? Gás Natural? Petróleo e derivados? Vejam bem são praticamente 70% de todo o dinheiro e eles não falam onde vão investi-lo, por que será? Não pega bem num site que fala de desenvolvimento sustentável e matriz energética limpa dizer que 70% dos investimentos em matriz energética não terão nada a ver com fontes alternativas de energia. Espero realmente estar errada e que o texto foi feito as pressas e esqueceram de mencionar o quanto vão investir em outras fontes renováveis.

A ideia do site de mostrar o que o Brasil tem feito pelo seu “desenvolvimento sustentável” é louvável, mas não precisava entrar na maquiagem verde, né? Tá querendo enganar quem, Brasil, ainda mais depois do pré-sal?