Eis que despretensiosamente fui assistir o último documentário produzido pelo Michael Moore. Pra quem já viu algum dos filmes dele esse Planet of the Humans segue o mesmo estilo, porém o narrador não é ele. Mas o estilo é MUITO igual.
Fui ver o filme meio as cegas sem saber do que se tratava e fiquei contente em saber que era sobre meio ambiente, energia verde, sustentabilidade e afins.
Como todo documentário, ele conta um ponto de vista, uma visão de mundo, entrevista pessoas que interessam para a narrativa e muitas vezes não aprofunda no assunto que pode de alguma forma contradizer a tese.
O problema do filme é você assisti-lo querendo ver o mundo de forma simplista. E é isso que me incomoda nele, num mundo complexo cheio de problemas cruéis a serem resolvidos não é polarizando a questão ambiental e tratando de forma superficial que vamos chegar num lugar melhor do que estamos hoje. (O detalhe é que essa abordagem hoje em dia parece que tem sido regra para qualquer conflito, seja na política, na economia, na saúde).
Dois pontos que abusam da superficialidade e simplismo
1) carros elétricos. Em 2009 escrevi um post sobre o documentário Quem matou o carro elétrico? E qual foi a minha principal questão naquele post? Qual é a origem da energia produzida para abastecer os carros elétricos? 11 anos depois essa pergunta já foi respondida e superada. O desempenho e o custo por km rodado do carro elétrico é muito melhor que o carro a combustão, ou seja, ele faz mais com menos. Então mesmo emitindo mais CO2 o carro elétrico faz mais. Acho preguiçoso o argumento: “ah se a energia do carro elétrico não tiver origem sustentável, então o carro elétrico não serve”. Você acha inteligente o pensamento de que se toda a produção de comida no Brasil não for orgânica, então nem quero saber de produção orgânica e ela nem deve ser incentivada?
Lembrando aqui que o carro elétrico não é a bala de prata pra problemas de transporte no mundo e tem várias problemas também, mas como a vida já deve ter te ensinado, não há solução única e perfeita no mundo.
2) combustíveis fósseis são a pior opção sempre. Longe de mim querer defender os combustíveis fósseis, eles são um problema sim mas é importante ter claro que o uso deles não vai parar na terra da noite para o dia. É ingenuidade achar que isso é possível e a menos que você seja um indígena isolado na floresta amazônica ou integrante de alguma tribo isolada africana é impossível não depender de combustível fóssil de alguma forma. E o fato de aceitar que ele é parte da vida não significa que você não pode defender que outras formas de energia e matéria-prima sejam usadas e desenvolvidas.
A falsa dicotomia
Ter conhecimento dos problemas da energia dita verde renovável, do consumo de carne, da produção da soja, das viagens de avião, dos bilionários no mundo, do plástico de origem vegetal, da reciclagem como solução para o problema de resíduos no mundo não me fazem uma pessoa que incentiva e apoia tudo isso. Nem me fizeram defensora da energia fóssil, vegana, deixei de separar meu lixo, vão me impedir de viajar de avião ou deixar de acreditar que uma outra solução além da reciclagem é possível. Felizmente o mundo não é feito só de sim ou não, certo e errado, preto ou branco.
Talvez o filme ajude os desavisados a simplesmente passarem a odiar as soluções alternativas de energia, provavelmente ambientalistas e defensores da energia verde se sintam ofendidos e/ou traídos e talvez o filme seja usado pela indústria do petróleo como endosso aos seus produtos. Tudo isso é possível e nem posso dizer que está errado. Talvez se o filme tentasse ao menos seguir no meio do caminho, não só criticando as energias alternativas, mas mostrando que ela tem vantagens e outros aspectos da origem dos problemas ambientais, seria uma maneira de ampliarmos nossas conversas e ajudaria a diminuir a polarização.
É meio estranho o que vou dizer aqui, mas o ponto alto de Planet of the Humans para mim foi a frase da Rachel Carson nos créditos finais
Já esse outro texto (em português) sugere que o filme deveria ter focado mais na base do problema: consumo, ideia de crescimento infinito possível e modelos econômicos alternativos. Válido, mas ai acho que seria um outro filme.
EXTRA: No site do filme planetofthehumans.com tem um guia de discussão para professores (em inglês). Gente, queria tanto que no meu tempo de escola tivesse tido esse tipo de discussão sobre os filmes que assisti… Um dos exercícios que mais me empolgaram foi: se esse filme fosse o primeiro de uma mini-série o que você gostaria que fossem os próximos episódios?
Iniciativa empresarial em clima (#iec) defende metas de 50% de fontes renováveis na matriz energética até 2030. — Claudia Chow (@clauchow) November 12, 2015
“Debate sobre clima não é debate ambiental é debate sobre desenvolvimento” Francisco Gaetano – diz muito sobre nossa política ambiental. — Claudia Chow (@clauchow) November 12, 2015
Mas esse Francisco Gaetano vive no mundo da fantasia. Dizer q não existe disputa entre ambientalista x ruralistas é muita ingenuidade.
Pra ele todos estão em busca da produção com desenvolvimento sustentável! #sqn — Claudia Chow (@clauchow) November 12, 2015
A coisa foi toda meio esquizofrênica, comecei ouvindo que somos uma potência ambiental e somos respeitados por isso no mundo todo. Mas pra isso ser verdade acho que a gente não deveria ter sujado a nossa matriz energética, né não? Ouvi lá que a Alemanha aproveita mais a energia solar do que nós e o melhor potencial de incidencia solar deles não chega nem perto do nosso pior índice de incidência solar. E mesmo assim somos considerados uma potência ambiental mundial? Mas o mundo vai mal mesmo, hein?
Mas os aprendizados do dia foram:
Para as empresas mudanças climáticas resumem-se a energia e pelo visto essa é a única e maior contribuição que eles podem fazer por que o evento SÓ falou disso. Pra você ter uma noção de como o assunto do evento foi energia só o Ministro de Minas e Energia estava presente apesar da Ministra de Meio Ambiente e o Ministro da Fazenda também terem sido convidados.
E para o governo mudanças climáticas não é um problema ambiental e sim de desenvolvimento. Isso explica muita coisa do que temos vistos diante dos nossos problemas ambientais, né não?
Fui conhecer uma casa com vários conceitos sustentáveis em sua construção. Na verdade acho que todos esses conceitos poderiam ser pensados para todas as casas hoje em dia. Coisas como aquecimento solar, reaproveitamento de água de chuva, telhado verde, aproveitamento de energia solar, ventilação cruzada e iluminação natural não são coisas impossíveis de ser parte de uma rotina na hora de pensar uma nova construção, assim como banheiro, cozinha e a churrasqueira. Por que coisas como closets, ofurôs e cozinha gourmet que até bem pouco tempo não existia nas casas, hoje em dia é super comum? Por que conceitos estéticos viram “moda” e ecoeficiência não? Quando eu percebo esse tipo de coisa eu vejo que eu devo mesmo ser a minoria da minoria das pessoas preocupadas em ter um apoveitamento mais inteligente dos recursos naturais do planeta.
O próprio engenheiro e dono da casa diz que não tem nada de difícil e muito novo no que ele fez, são tecnologias perfeitamente acessíveis, basta querer implementar. Ah, mas é caro por isso que as pessoas não fazem. Bom, fazer um ofurô, uma piscina, um closet também não é barato, então, como sempre, tudo é uma questão de escolha e prioridade.
Sim, essa é uma casa num condomínio de luxo e precisamos fazer esses conceitos de eficiência nas moradias e nas construções chegarem também em casas mais simples e populares, mas enquanto o povão acreditar que copiar os ricos que é legal e os ricos não resolverem mudar o conceito, vai ficar dificil…
Como geóloga, tenho verdadeira admiração pelo Aquífero Guarani. Essa esponja rochosa subterrânea garante não apenas que várias cidades sejam abastecidas da melhor água do Brasil, como também — e, talvez, principalmente — assegura a qualidade do chope fabricado em Ribeirão Preto e provavelmente a famosa cerveja Brahma de Agudos (mas os mestres cervejeiros dizem que isso não é verdade). Mas pelo menos os geólogos meus amigos que frequentam o famoso bar Pinguim em busca daquela maravilha gelada, cremosa e bem tirada deveriam sempre fazer seu primeiro brinde ao arenito Botucatu, que estoca toda aquela água para eles. Se bem que os hidrogeólogos do interior de São Paulo devem fazer isso já que esse aquífero garante o emprego da maioria deles!
As pessoas que vivem em boa parte do interior de São Paulo, e outras no Centro-Sul do Brasil, talvez marchassem furiosas com tulipas quebradas na mão sobre a Agência Nacional do Petróleo se soubessem o que o futuro próximo pode reservar às rochas do Aquífero Guarani. Sem muito debate público e sem muita cobertura da imprensa, a ANP quer permitir a exploração de gás natural em depósitos não convencionais na bacia sedimentar do Paraná no oeste do Estado homônimo, que abriga parte do aquífero. A técnica a ser usada é o fraturamento hidráulico, ou “fracking”. Isso pode significar contaminação das águas do Guarani.
Uma audiência pública foi realizada sobre o tema na semana passada, já às portas da 12a Rodada de Licitações, que acontece nos dias 28 e 29 deste mês e que concederá 240 blocos de gás em 12 Estados. A audiência discutiu uma minuta de resolução da ANP estabelecendo regras para o uso do fracking para salvaguardar os recursos hídricos na exploração desses reservatórios não convencionais. ONGs como o Instituto Socioambiental manifestaram sua oposição ao movimento, pedindo moratória ao fracking no Brasil.
Como tudo mais que envolve energia neste país, a 12a Rodada acontece sem que as decisões importantes tenham sido amadurecidas ou debatidas com a sociedade pela energocracia estatal, e sem que ninguém além de meia-dúzia de engenheiros do governo e o pessoal da indústria tenha muita informação sobre riscos e benefícios. Como resultado, a discussão vira um fla-flu no qual os ambientalistas são acusados de ignorância, luddismo ou sectarismo só por quererem um aprofundamento nas informações que é incompatível com os calendários de licenciamento fixados por esses mesmos engenheiros do governo. Os ambientalistas e o Ministério Público, por sua vez, podem de fato exagerar na reação. Todos perdem.
Para entender o que está em jogo, é preciso entender primeiro what the frack são esses depósitos não convencionais. Vamos lá:
O gás natural (CH4) normalmente ocorre em bolsões em carbonatos, um tipo de rocha sedimentar. Como o petróleo, ele é formado por coisas mortas cozidas durante milhões de anos em condições ideiais de pressão e temperatura no fundo da terra. Ai, o gás migra para os carbonatos que são rochas bastante porosas, até que alguém dê a sorte de furá-los. Algumas dessas rochas são tão grandes e porosas que produzem gás por décadas. É assim no Qatar, na Rússia, no Mar do Norte e na nossa vizinha Bolívia.
Acontece que existem outros tipos de rocha sedimentar nos quais a decomposição de coisas mortas produziu gás e petróleo. Um deles é o folhelho, que os anglo-saxões chamam de “shale” ou “mudstone”, exatamente pelo fato de ser formado por lama rica em matéria orgânica depositada continuamente em fundos de rios ou lagos. Desde o século 19 os geólogos sabem que muitos folhelhos contêm hidrocarbonetos. Como o folhelho também é um dos tipos mais comuns de rocha sedimentar, vários países do mundo estão montados em várias Arábias Sauditas em óleo e gás de folhelho (assim como a bacia sedimentar do Paraná). Isso se alguém pelo menos conseguisse extraí-los: em vez de acumular-se em bolsões gigantes, os preciosos hidrocarbonetos do folhelho, o “shale oil” e o “shale gas”, ficam presos em fendinhas minúsculas na rocha. Sempre foram, por isso, economicamente inviáveis. Alguns deles até tem cheiro de óleo, folhelhos são na verdade petróleo que passou do ponto.
Em 1999, um persistente geólogo americano chamado George Mitchell descobriu o segredo do folhelho e fez os depósitos dessa rocha falarem. Ele uniu duas técnicas, o fraturamento hidráulico de alto volume (o tal “fracking”) e a perfuração de longos poços horizontais, para arrancar o gás na porrada. A receita é mais ou menos simples: primeiro, perfura-se o poço vertical até atingir a camada de folhelho com gás. Depois, perfura-se horizontalmente, ao longo da rocha, túneis que chegam a quilômetros de comprimento. Aí vem a mágica: injeta-se no poço, a altíssima pressão, uma mistura de 1 milhão de litros d’água, areia e um coquetel de químicos surfactantes. Essa sopa quebra toda a rocha ao longo do poço, permitindo que o gás aprisionado nas fendas vaze no sentido da menor pressão – para dentro do poço e para fora.
O “fracking” começou a ser usado em larga escala nos folhelhos da formação Marcellus, no nordeste dos Estados Unidos, em 2004. A técnica fez tanto sucesso que o preço do gás caiu nos EUA de US$ 14 o milhão de BTUs em 2005 para US$ 1,90 em 2011. A Pensilvânia tornou-se um dos maiores produtores de gás do planeta. Hoje os americanos preparam-se para exportar gás natural. E não é só isso: o fracking vem sendo aplicado com sucesso a folhelhos que contêm óleo também. No ano passado, a Agência Internacional de Energia afirmou que o shale oil transformará os EUA no maior produtor de petróleo do mundo em 2035. De quebra, os EUA reduziram sua dependência de carvão e suas emissões de CO2 caíram em 2011 pela primeira vez desde os anos 1990. O panorama energético global foi transformado pela teimosia de George Mitchell.
Mas é claro que não existe almoço grátis. A maior porção do folhelho Marcellus fica no interior do Estado de Nova York, contíguo à Pensilvânia. Também ali ficam as montanhas Catskills, que abrigam os mananciais que abastecem a cidade de Nova York. O governo de Nova York impôs, em nome da sua água, uma moratória à exploração de shale gas no Estado.
Mas as coisas não param por aí: no fim da década passada, um caso de contaminação grave aconteceu no distrito de Dimock, na Pensilvânia, onde poços artesianos explodiram, torneiras abertas pegaram fogo e alguns residentes perderam suas casas, já que sua água ficou imprestável. Isso porque, no meio do caminho entre o folhelho e a cabeça dos poços, havia um lençol freático. Um trabalho nas coxas de perfuração fez com que o mix de químicos, água e gás metano vazasse para dentro do aquífero. A história é contada no belo livro Under the Surface, do jornalista americano Tom Wilber, e no documentário Gasland.
Um conhecido esteve em Dimock no ano passado e conversou com alguns moradores. A maioria não foi afetada pelo vazamento, ganha royalties pelos poços em sua propriedade e o impacto visual é francamente pequeno. O pessoal está bastante satisfeito. Claro, há vários estudos mostrando que o impacto do shale gas sobre o clima no curto prazo pode ser mais grave que o do carvão, mas hoje em dia ninguém está nem aí para esses detalhes, certo? O que o Brasil está esperando, então? Provavelmente foi esse o raciocínio da ANP.
A figura abaixo mostra qual é o problema. Ela é meio arcana, mas acho que dá para entender: trata-se de uma estratigrafia da bacia sedimentar do Paraná.
Há quase 300 milhões de anos, grande parte da região que hoje vai da Argentina e Uruguai ao Mato Grosso e Goiás estava tomada por mares rasos cheios de lama. O fundo desses mares viraram o folhelho Irati, a camadinha fininha de rocha que você vê na segunda coluna de “litoestratigrafia”. Segundo Alexandre Szklo, da Coppe-URFJ, os folhelhos da bacia do Paraná podem conter 60 vezes mais gás do que todas as reservas brasileiras conhecidas hoje. Aliás, meus primeiros reconhecimentos geológicos aconteceram nessa formação, a primeira vez que eu vi um folhelho na vida foi o Irati!
Formação Irati. As partes escuras são o famoso folhelho. Foto: Alexandre Perinotto.
No Jurássico, há 160 milhões de anos, toda aquela região virou um grande deserto. Isso explica por que não temos quase nenhum fóssil de dinossauro daquela época no Brasil. E explica também o aquífero Guarani, formado pelas rochas porosas do arenito Botucatu, remanescentes daquele deserto. Na maioria dos locais, para chegar aos 70 metros do Irati é preciso furar através dos 450 metros do Botucatu. É fácil imaginar problemas no caminho.
Um amigo geólogo especialista na bacia do Paraná me diz que não há problemas ambientais, necessariamente. Ele lembra, por exemplo, que a Petrobras explora há anos no sul do Paraná o petróleo do folhelho Irati, o tal “oil shale” (não confundir com “shale oil”), no qual a rocha é moída e cozida até separar o hidrocarboneto. Naquela região, porém, o folhelho está mais próximo da superfície e o que acontece lá nada tem a ver com o fracking e sim uma mineração desses folhelhos. É assim nos blocos concedidos no oeste paranaense? Provavelmente não.
É um caso complexo de decisão, que faz invocar o princípio da precaução, sempre desprezado pela indústria e algumas vezes abusado pelo ambientalismo e pelos ministérios públicos da vida. A probabilidade de dano pode ser mínima, mas o impacto seria tão grave que é caso de parar para discutir. Para o Brasil, o pior cenário seria ter Dimock em proporções continentais sem gozar da bonança econômica do gás. No Brasil, o pior cenário é o que costuma acontecer. Não acho que o país possa ou deva dizer não ao fracking, mas um pouco mais de estudos, precaução e canja de galinha não faz mal a ninguém. E de verdade, entre gás e água eu sempre vou ficar com a água por uma questão de sobrevivência. Pra mim não faz sentido vender gás para comprar água limpa importada.
Acabei de ler um livro chamado Como mudar o mundo, e vou precisar muito da ajuda dele para não me sentir a pessoa mais impotente do universo depois de ler a última série de reportagens da Agência Pública sobre a Amazônia.
A única região da Amazônia que eu conheci é o oeste do Pará, às margens do Rio Tapajós, numa visita patrocinada pela Vivo e a Ericsson para acompanhar a inauguração da primeira torre de dados da região. E pensar que toda a beleza daquele local pode estar comprometida me deixa bem triste. Nada mais, nada menos que um complexo hidrelétrico com 7 represas estão programadas para o local, esse é um dos aspectos levantados nessa terceira semana de reportagens, essa semana sobre o Rio Tapajós.
Rio Tapajós. Foto: Fernanda Ligabue.
Tudo que essas reportagens contaram só mostra o jeito capitalista de desenvolvimento, o jeito capitalista de crescer e o jeito capitalista de ser dos governos. É errado? Bom, não tenho achado que seja o melhor caminho, mas parece que é o melhor que a humanidade tem conseguido. E como faz para mudar isso? Como faz para fazer realmente diferente em que todos saiam perdendo o menos possível? E rápido por que não adianta nada pensar que poderia ter sido diferente depois do estrago feito.
Eu sei que lendo essas reportagens me senti muito impotente… Chega a ser desanimador, o que será que se pode fazer e não deixar a Amazônia virar um canteiro de obras?
Semana passada a Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo iniciou uma série sobre a Amazônia, Carajás e a exploração do ferro foi o primeiro tema. Essa semana o tema são as usinas hidrelétrica que estão em construção ao longo do rio Madeira, Jirau e Santo Antônio.
Ano passado conheci um colega geólogo que esteve a trabalho nas 2 obras e as histórias contadas por ele eram verdadeiros shows de horrores, praticamente tudo que as reportagens dessa semana contam de alguma forma esse meu colega também citou. E assim como em Carajás o problema social causado é, na minha opinião, o pior e o mais difícil de resolver.
Usina hidrelétrica de Jirau. Foto Marcelo Min.
Segundo esse meu colega não eram todas as empresas que tratavam mal seus funcionários ou não davam condições adequadas de trabalho, algumas empreiteiras da obra tinham lista de espera de funcionários pois nelas as pessoas sabiam que seria bem tratadas. Mas provavelmente essas empresas devem ser excessões.
Só eu fico assustada quando ouço ou leio as histórias dessas obras? E não falo apenas dos maus tratos dos trabalhadores, da destruição de vilarejos e vidas de pessoas, mas será que as se tem ideia do impacto que é uma espécie de peixe sumir de um ecossistema? Como podemos deixar isso acontecer em pleno 2012? Bom, se o mundo acabar tá tudo resolvido, mas e se não acabar?
As perguntas que ficam (afinal, eu nunca tenho respostas só mais perguntas) hidrelétricas geram mesmo energia limpa? A gente ignora todo o impacto causado na construção e tudo bem? Ok, ok, precisamos de energia, mas será que não dá pra fazer de um jeito melhor? Quero acreditar que essas obras também teve gente da região impactada positivamente e não apenas financeiramente…
Eu não quero discutir Belo Monte, aliás já disse uma vez o que eu realmente defendo em relação a essa obra, principalmente depois de ler essa entrevista. Pra mim Belo Monte nada mais é do que o bode na sala, fica todo mundo falando disso e esquece de discutir o que realmente é importante para o futuro, o país, as pessoas. Brigar contra ou a favor de Belo Monte é apagar incêndio, é pensar em curto prazo, bem típico de brasileiro que não faz planejamento direito. E isso eu deixo para os ecochatos, os políticos que querem viabilizar essa obra e quem mais quiser, eu me abstenho, vou ficar em cima do muro mesmo, pois eu acho que pra essa questão nunca vamos encontrar o certo ou o errado, sempre vão existir ótimos argumentos para fazer e não fazer essa obra.
O que eu quero debater é: qual o nosso modelo de desenvolvimento? O dia que tivermos isso claro e de forma consensual a discussão de Belo Monte não existirá. Simplesmente por que se decidirmos que o nosso modelo é de explorar todos e quaisquer recurso até o fim sem pensar se haverá amanhã fazer essa obra é tudo de coerente, mas se o nosso modelo é de preservação, eficiência e tecnologia provavelmente Belo Monte não é parte dessa discussão. Simples assim. Ok, discutir esse modelo e chegar a esse consenso pode não ser tão simples, mas pra mim é a discussão que realmente interessa, o resto é só confirmação de que ainda não estamos maduros o suficiente pra sabermos de fato o que queremos como nação.
Depois de alguns comentários no post Belo Monte, um ponto de vista, tive a impressão que talvez a capacidade de me expressar pela escrita estivesse falhando absurdamente. Mas achar isso foi um exagero meu, afinal eu não escrevo tão mal assim, então resolvi escrever outro post a respeito e tentar ser mais clara agora, pra quem sabe não restar dúvidas sobre meu ponto de vista em relação à obra.
Outro dia zapeando pela TV vi o final do programa que está aqui em cima (infelizmente os conteúdos das globo tem tempo de vida na internet) e hoje buscando mais informações sobre Belo Monte pude assistí-lo e compartilhá-lo. Achei sensacional colocarem 2 pessoas para debater sobre o assunto, uma a favor e outra contra. Conheço o Roberto Smeraldi pessoalmente, inclusive sigo-o no twitter.
Hoje na Folha de S. Paulo, coincidentemente ou não, saiu na seção debate um ponto de vista a favor e outro contra sobre a usina (infelizmente exclusivo para assinantes). Mudou apenas a pessoa a contra , dessa vez o Marcelo Furtado, do Greenpeace. Seria Luiz Pinguelli Rosa o maior e único defensor da Usina?
De verdade, em ambos debates achei que o Luiz se saiu melhor, tanto no discurso do Roberto Smeraldi como no do Marcelo Furtado encontrei falhas em seus argumentos, achei suas argumentações fracas e insuficientes para me convencer que fazer aquela hidrelétrica é pior coisa que pode acontecer. Mas nem por isso acho que a usina tem que ser feita, só constatei que os argumentos de quem a defende são melhores e mais consistentes.
Quais argumentos do Roberto Smeraldi e do Marcelo Furtado são fracos? Estamos falando de uma mega obra de engenharia que por si só gera um impacto enorme independente de onde for feita, falar que o local não está preparado para receber uma obra dessas é chover no molhado, existe algum lugar no mundo que estaria? Ela causaria impactos de todos tipos onde quer que fosse instalada, imagine fazer uma obra desse porte no Estado de São Paulo (lugar mais impactado e desmatado do Brasil, achismo meu), ela causaria tantos impactos, diferentes dos que serão causados na Amazônia, mas causariam também. Marcelo cita um estudo do Greenpeace chamado de (R )evolução energética, ainda não li, mas a maneira como ele fala parece que para termos energia eólica e solar é a mágica que ninguém descobriu ainda, só Greenpeace! Por favor, energia causa impacto não importa de onde venha, ou você acha que os painéis solares são feitos de que? E as hélices das usinas eólicas? E que fazendas de captação de energia eólica não causa impacto nenhum? Não existe mágica nem mundo perfeito e duvido que as energias alternativas sejam tão cor-de-rosa assim.
Roberto Smeraldi também cita argumentos dos quais eu concordo como a inacessibilidade à energia gerada por essas grandes hidrelétricas para as pessoas da região norte, a falta de subsídio de igual tamanho para energia eólica ou a falta de efeciência na geração, tramissão e consumo da energia. Mas esses argumentos não são especificamente relacionados à Belo Monte, são argumentos para serem usados para criticar a política energética do país, entao ao meu ver não cabem necessariamente nessa discussão.
A grande maioria das pessoas que entraram no post anterior para defender o fim de Belo Monte apontam fatores sociais para a não construção da Usina. Ok, entendo que é um dos fatores mais delicados da obra e de verdade a única solução que eu vejo pra esse caso ao invés de se sair bradando contra a usina (ou talvez essa seja uma boa alternativa, depende do ponto de vista), eu defendo que a Amazônia como um todo tem de ser defendida, defendida com um desenvolvimento tecnológico e científico agressivo para toda a floresta, só assim todos envolvidos poderão se defender de projetos impactantes como esse de forma coerente e inteligente, não como já foi feito 2 vezes pelos índios com agressões e ameaças físicas. De verdade, antes de ser contra ou a favor de Belo Monte eu defendo tecnologia, ciência e educação da mais alta qualidade para todaa as pessoas da região norte do país, sem isso tudo me parece atrasado e incoerente.
Sobre a obra de Belo Monte, de verdade, a única certeza que eu tenho é que temos dúvidas demais. Pelo menos tudo que tenho lido a respeito me leva a crer nisso. Mas com todo o bafafá da licença que foi liberada para a construção do canteiro de obras resolvi dar uma olhada em alguns dados.
Essa licença parcial polêmica que saiu autoriza a supressão de 238 hectares de vegetação, entre outras ações. E será que isso é muito? Talvez a questão nem seja discutir isso, mas vou me ater a esse dado. 238 hectares equivale a 2,38 km2, isso é uma área de aproximadamente 1,5km x 1,5km.
Ok, ok, essa é só a licença de instalação e a área total da obra são 51,600 ha, ou seja, mais desmatamento por conta da obra vem por ai. Mas vamos combinar que pra quem já desmatou em um único mes, só na Amazônia, 48,500ha, desmatar por conta de uma obra um pouco mais que isso em aproximadamente 4 anos não me parece tão absurdo assim. A gente desmata, queima e destrói provavelmente ilegamente um número absurdo de floresta e agora para construir uma hidrelétrica fica todo mundo fazendo drama? Energia tem que vir de algum lugar e infelizmente tem seus custos e alguém tem que pagar.
Calma! Antes que comecem a me apedrejar aqui é o seguinte, eu nao to dizendo que a obra de Belo Monte tá tudo certo e vamos que vamos construir mais uma hidrelétrica, não é isso! O que eu to querendo demonstrar aqui é que a gente destrói de floresta sem construir nada em troca e muitas vezes ilegalmente muito mais floresta do que vão desmatar com Belo Monte, percebe a lógica? Belo Monte tem vários outros problemas além do desmatamento? Sim, com toda a certeaza, só pra começar uma licença parcial que inexiste na legislação ambiental brasileira para caso de hidrelétricas, mas também não podemos esquecer de outros argumentos para esse discussão, todo mundo quer falar de crescimento, desenvolvimento, mas tudo isso tem um custo e alguém tem que pagar por ele. Torço e espero de verdade que os técnicos do IBAMA e do Ministério do Meio Ambiente estejam fazendo o melhor para que essa obra não se torne um arrependimento ambiental no futuro. Eu só tenho percebido que o debate tem ficado somente de um lado e não podemos esquecer que tudo pode ter vários lados.
Hoje quando abri o portal Globo.com apareceu um pop-up do Governo Brasileiro que levava para um site falando da participação do Brasil na COP-15.
Numa das páginas do site chamada Panorama que fala de matriz energética limpa eles afirmam (no texto) que 45,9% da produção de energia brasileira vem de fontes renováveis. Ai mostram 2 gráficos, um mostrando a matriz energética brasileira separada em renovável (46,4%, afinal qual o número correto?) e não renovável (53,6%) e outro gráfico as fontes de geração de eletricidade. Mais de 75% é de origem em hidrelétricas.
Ai o Brasil resolve falar em investimentos, é essa parte que mais me irrita. “A estimativa do Ministério de Minas e Energia para o período 2008-2017 indica aportes públicos e privados da ordem de R$ 352 bilhões para a ampliação do parque energético nacional.” “Para a área hidrelétrica estão previstos cerca de R$ 83 bilhões.” “Outros R$ 23 bilhões devem ser aplicados na expansão da produção e oferta de biocombustíveis como etanol e biodiesel.”
Ótimo, são R$106 bilhões que serão investidos hidrelétricas e biocombustíveis, ou seja, 30,12% do total dos investimentos. Tá e os outros R$ 246 bilhões? Vão investir em que? Vento? Nuclear? Gás Natural? Petróleo e derivados? Vejam bem são praticamente 70% de todo o dinheiro e eles não falam onde vão investi-lo, por que será? Não pega bem num site que fala de desenvolvimento sustentável e matriz energética limpa dizer que 70% dos investimentos em matriz energética não terão nada a ver com fontes alternativas de energia. Espero realmente estar errada e que o texto foi feito as pressas e esqueceram de mencionar o quanto vão investir em outras fontes renováveis.
A ideia do site de mostrar o que o Brasil tem feito pelo seu “desenvolvimento sustentável” é louvável, mas não precisava entrar na maquiagem verde, né? Tá querendo enganar quem, Brasil, ainda mais depois do pré-sal?