Dia dos Namorados

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“Afinal”, disse Frazier, “o que é amor se não reforçamento positivo?” “Ou vice-versa”, disse Burris.
Estavam ambos errados. Eles deveriam ter dito “um ato de amor”. Amor como um estado é uma disposição para agir em direção a outra pessoa de maneiras que sejam reforçadoras, mas sem prestar atenção a quaisquer contingências. No amor agimos para agradar e não para ferir, para ser genuíno e não para ser sedutor, mas não agimos para mudar comportamento. Sem dúvida que o modificamos, uma vez que estamos mais predispostos a agir de maneiras reforçadoras quando acabamos de ser tratados dessas formas. Ação recíproca pode sobrepor-se, sem que isso implique em um contrato (nenhum dos dois lados diz “eu o amarei mais, se você me amar mais”).
Na terapia e na educação, afeição genuína não pode ser usada para resolver problemas. Ela não pode ser “ligada” ou “desligada” no momento certo. Mas, isso significa evitar seu uso? Suponha que você descobre que ao amar alguém você está reforçando comportamento perigoso; você pode interromper sinais de seu amor enquanto continua amando? Não seria isso simplesmente uma forma ligeiramente mais elaborada de fazer algo bom para alguém, isto é, de amar?
Epstein, R. (Ed.) (1980) Notebooks, B. F. Skinner. Englewood Cliffs, New Jersey: Prentice Hall, Inc. p.132.

Menstruar ou não menstruar: that is the question…

Os últimos acontecimentos na blogosfera feminista têm me deixado de cabelo em pé. Vinha eu vivendo a minha vidinha tranquila dentro da bolha que me protege das atrocidades do mundo (a.k.a. “amigos inteligentes, interessantes e pensantes”) quando a realidade da ignorância humana me atingiu em cheio, bem na cara, com o post da Lola Aronovich no blog Escreva, Lola, Escreva. O post é genial, bacana, certeiro e com um argumento impecável sobre o machismo imbecil e a misoginia destilada no programa CQC. O que é de morrer-de-catapora-preta são tanto os comentários (não só lá no blog da Lola, como no Twitter, nos jornais, no Facebook…) quanto a repercussão da coisa: ameaça de processo por calúnia e difamação por parte do Marcelo Tas. É. Pois é.
Depois, na sequência, em Sampa na semana passada aconteceu a Marcha das Vadias: movimento inspirado na Slut Walk canadense, cujos objetivos são, além de dar visibilidade ao movimento feminista moderno, exigir a atenção da sociedade e da mídia para o tratamento dado às mulheres vítimas de preconceito e agressão. De uma maneira irônica (ah… o problema em ser irônico…), as manifestantes vestem-se de forma provocativa e carregam cartazes com frases de protesto, como “Meu corpo. Minhas regras.”, ou “Nem santa, nem vadia!”.
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Aí a coisa azedou de vez… A quantidade de gente que não entendeu, ou simplesmente não quis entender a ironia no nome da marcha e nem – muito menos – a reivindicação das feministas chegou a níveis estratosféricos. Mas, de qualquer modo, isso é bom, sabia? É bom pra chacoalhar o povão, pra dar o que pensar, pra instigar o debate. (Eu e o meu irremediável otimismo.)
Toda essa introdução pra dizer que, no meio dessa fogueira, vou repostar esse texto que causou um certo “incômodo” na galerinha descolada, porque toca, justamente, naquilo que as mulheres têm de mais particular: a menstruação. Divirtam-se…

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Mulher, realmente, tem cada uma que eu vou te contar, viu…
A Gisele Bündchen dá à luz em casa, dentro do banheiro (limpinho, né? Antisséptico bagarái…) e as vozes femininas aclamam. Até hoje, o moleque já deve estar indo pra faculdade, e eu não entendi qual foi a da moça: fazer graça, medo de injeção, ou só burrice mesmo. Uma coisa é fazer parto normal, com profissionais altamente treinadas e capacitadas, num ambiente preparado para isso e com autorização e recomendação médica, como é feito em alguns países europeus (com procedimentos e legislação estabelecidos e aprovados). Outra coisa, bem diferente, é o tal do “parto natural”, parto na água, parto de cócoras, parto com golfinhos (juro que isso existe!) e o escambáu. Pesquisinha rápida e não encontrei NADA nas bases de dados de Saúde que indicasse esses métodos como seguros ou eficazes. Mas enfim… esse post não tem nada a ver com parto e nem com a Gisele. *** (FAZ FAVORZINHO DE VER A ATUALIZAÇÃO LÁ EMBAIXO!)
Mas o assunto continua na esfera feminina: menstruação.
Eis que, outro dia, a mulherada do Twitter estava conversando sobre o tal do Moon Cup, um dispositivozinho de silicone, como um Tampax só que retornável, pra ser usado durante a menstruação. A vantagem do troço é que ele elimina a montanha de lixo não biodegradável que a gente acumula com os absorventes higiênicos. A Claudia Chow falou sobre eles no Eco Desenvolvimento. Eu, particularmente, prefiro acabar de uma vez por todas com todos os desperdícios provocados por Mr. Chico: não menstruar de todo. Isso se faz INDO AO MÉDICO e discutindo com ele sobre a possibilidade de se tomar anticoncepcionais de uso contínuo. As vantagens, pessoalmente, são que além de evitar o incômodo e a produção de lixo, elimina a TPM, as cólicas, pode diminuir a ocorrência de crises de enxaqueca (como foi o meu caso) e te dá 100% de aproveitamento mensal. De resto, esse resultado parece ser o esperado, estudos mostram que há uma melhorazinha nos sintomas pré-menstruais em mulheres que usam esse tipo de medicação (Coffee, Kuehl, Willis & Sulak, 2006).
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Do ponto de vista fisiológico, estudos apontam que as mudanças metabólicas causadas pelos contraceptivos de uso contínuo são similares àquelas causadas pelo uso da pílula “normal”, de ciclo curto, e portanto, os possíveis efeitos colaterias são os mesmos (Machado, Fabrini, Cruz, Maia & Bastos, 2004). Comparações de eficácia entre os dois métodos também não mostraram diferenças significativas e o fato de não haver sangramento não causa nenhuma doença, disfunção ou prejuízo às pacientes (Wright & Johnson, 2008).
Pois é aí que se dá o busílis: não menstruar não causa, ao que parece, nenhum problema para as mulheres, certo? Algumas acham que não. Baseadas em observações fisiológicas, em sintomas físicos, em problemas causados pela falta de menstruação, certo?
Não.
Baseadas em argumentos como:
“Se eu não menstruar vou me sentir menos mulher.”
“A menstruação é o que marca a identidade feminina.”
“A mulher é um ser cíclico, o ciclo menstrual espelha o ciclo cósmico, as marés, a lua, blá, blá, blá, whiskas sachê…”
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Sobre o tal do ciclo cósmico, não há nenhuma evidência que comprove alguma relação entre qualquer ciclo (lunar, de marés, cósmico, do campeonato paulista ou whatever) e o ciclo menstrual. O ciclo lunar pode ter alguma influência sobre o início do trabalho de parto (em gente ou em qualquer outro mamífero), mas não é determinante dele. Pode até ser que cortar o cabelo na lua crescente melhore sua aparência, mas esse efeito é tão pequeno que vale mais à pena investir numa boa duma hidratação. Ou seja, argumento inválido!
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Sobre a tal da “identidade feminina”, podia-se começar por definir que raio é isso. Identidade pode ser todo um conjunto de padrões de comportamento e de sentimento que definem o que é ser “feminino”, “ser mulher”. Desde muito cedo, as meninas aprendem determinadas regras (sociais, de higiene, de relacionamento, etc.) que são reconhecidas pela comunidade em que ela vive como marcadamente “femininas”. Depois,com o tempo, essas regras se tornam tão fortemente estabelecidas no repertório de comportamentos que a própria pessoa pode descrevê-las como “parte da sua identidade”, “parte de si”, sua “personalidade” ou “é assim que eu sou”. Mas, de fato, a determinação foi social e cultural. Em poucas palavras, aprendemos a ser mulher, quase do mesmo modo que aprendemos a jogar ping-pong ou a fazer tricô. Do mesmo modo que, depois de um tempo, essas atividades tornam-se mecânicas e os movimentos quase inconscientes, os comportamentos ditos femininos os e símbolos a eles ligados tornam-se “identificados” como a feminilidade.
O ponto é esse: os comportamentos e sentimentos ligados ao menstruar e à menstruação acabam por formar uma categoria estreitamente conectada à tudo o que é feminino, e assim, fazem parte da grande “identidade feminina”. Mas, do mesmo jeito que isso tudo foi aprendido ao longo da vida de uma mulher (e dos homens também, afinal de contas, eles convivem o tempo todo com mulheres, né?), nada determina que não possa ser re-aprendido, ou substituído por outras categorias mais adequadas e até mesmo mais importantes. Do meu modesto ponto de vista, prefiro que minha identidade feminina seja baseada, por exemplo, na minha sensibilidade para acolher pessoas em sofrimento; na minha habilidade de fazer trabalhos manuais delicados e complexos; no meu senso estético e na apurada discriminação de cores; na minha capacidade de prestar atenção a diferentes estímulos ao mesmo tempo… e por aí vai.
Mas tem gente que prefere basear sua identidade feminina em sofrer de cólica e de dor de cabeça cinco dias por mês, ficar mal-humorada e se entupir de chocolate, aumentar seu risco de ter endometriose e ovário policístico, a sofrer durante horas num trabalho de parto… Percebe que parece que a identidade feminina é baseada em sofrimento? Ah, não. Obrigada. Diria minha avó: vai catar coquinho na ladeira, vai caçar sapo com bodoque, vai ver se eu tô na esquina de pijama!
Concluindo, não há nada que, universalmente psicológica ou fisiologicamente, impeça a suspensão da menstruação. Só você e seu médico é que devem tomar a decisão, baseados nas suas necessidades e limites individuais e em uma boa dose de bom senso e racionalidade. Juro que sua vida vai ficar bem mais fácil.
Referências:
Coffee, A.L., Kuhel, T.J., Willis, S., & Sulak, P.J. (2006). Oral contraceptives and premenstrual symptoms: Comparison of a 21/7 and extended regimen. American Journal of Obstetrics and Gynecology, 195(5), 1311-1319. doi:10.1016/j.ajog.2006.05.012
Machado, R.B., Fabrini, P., Maia, E., & Bastos, A.C. (2004). Clinical and metabolic aspects of the continuous use of a contraceptive association of ethinyl estradiol (30 μg) and gestodene (75 μg). Contraception , 70(5), 365-370. doi:10.1016/j.contraception.2004.06.001
Wright, K.P., & Johnson, J.V. (2008). Evaluation of extended and continuous use oral contraceptives. Therapeutics and Clinical Risk Management, 4(5), 905-911.
***ATUALIZAÇÃO:
Pra quem não entendeu (é, tem gente que não passa do primeiro parágrafo e já não entende. God knows why…) o que eu estou demonizando é o monte de “métodos alternativos” para dar à luz, quase assim uma homeopatia-ortomolecular-do-parto, sabe?
Uma coisa é o chamado Parto Domiciliar (o Homebirth europeu) feito por profissionais formados e com indicação do médico que fez o pré natal. Esse tipo de parto é feito com a mãe na CAMA.
Outra coisa bem diferente é o parto na ÁGUA (a.k.a. parto-gisele), que não tem nenhum apoio científico e nem dos médicos. Quem duvida, favor dar uma olhadinha nos links abaixo:
Water birth – is it safe?
Neonatal Sudden Death Due to Legionella Pneumonia Associated with Water Birth in a Domestic Spa Bath
Pseudomonas Otitis Media and Bacteremia Following a Water Birth
Effects of water birth on maternal and neonatal outcomes
Water birth and infection in babies
Legionella pneumophila Pneumonia in a Newborn after Water Birth: A New Mode of Transmission