Relatório do clima do IPCC tem que ser mais social

david parkins
imagem David Parkins

 

Ok, já sabemos que o aquecimento global existe, é causado por nós e que muita gente vai se dar mal no futuro se não fizermos nada. Isso os relatórios do clima do IPCC deixam bem claro. Eles também dão dados, tabelas, gráficos, limites de quanto CO2 ainda podemos gastar, etc.

Mas algumas coisas eles não nos dizem, como de que jeito implantar mudanças na sociedade para resolver o aquecimento?

Só saber o que está errado, e até indicar uma solução para o problema, não garante que as pessoas vão partir para a ação e resolvê-lo. As pessoas e os governos simplesmente não funcionam assim.

Por isso é importante que daqui para frente esses relatórios tenham mais participação de cientistas sociais, porque eles estudam pessoas, sociedades e suas relações.

Saiu um comentário na Nature falando sobre isso. É de um dos raríssimos cientistas políticos que participaram deste último relatório do IPCC, por isso ele sabe como a coisa funcionou por dentro. Ele conta que só uma área das ciências sociais estava bem representada: a economia. Outras áreas como sociologia, ciência política e antropologia tem que estar juntas e misturadas com a física e economia.

E tem um bom motivo para as ciências sociais ficarem de fora disso, e o motivo é que elas tocam em polêmicas que muitos querem evitar. A gente tem que lembrar que o IPCC está num cabo de guerra entre a ciência e a diplomacia, e por isso não basta um dado estar cientificamente certo para ser apresentado. Ele tem que ser um consenso político, e é aí que o bicho pega, porque cada país tem um interesse diferente sobre o mesmo dado. Por exemplo, alguns dos maiores poluidores são países emergentes, que poluem justamente porque estão emergindo, enquanto os países desenvolvidos já se desenvolveram, já poluíram, e podem se dar ao luxo de reduzir. Então de quem é a culpa do aquecimento? Quem tem mais responsabilidade para resolver? Como convencer pessoas a agir agora para evitar um mal futuro?

Ao tentar fugir desse tipo de polêmicas políticas e comportamentais, o IPCC perde força. Afinal, o objetivo é resolver o problema, e não fazer relatórios eternamente.

É isso que a imagem que ilustra este post, tirado do comentário da Nature, representa. Genial o desenho, né? A ciência tem que cair fundo na sociedade.

Mas só colocar cientistas sociais não vai resolver o problema, porque pessoas e sociedades são as coisas mais complexas de se estudar, e mesmo dentro de cada área dessas ciências  tem muita discordância. A ajuda que as sociais podem trazer é justamente focar e direcionar essas polêmicas, já que elas estão acostumadas com isso e também porque que acabam sendo as polêmicas do IPCC em alguma escala.

O importante é deixar de fugir de polêmicas e tentar resolver. É pra pegar a polêmica e pôr uma melancia na cabeça dela pra todo mundo ver, e chamar os cientistas sociais para tentar solucionar. Uma ideia é fazer relatórios paralelos focando nesses problemas e entregar para cientistas sociais de todo o mundo discutirem de forma independente.

Quer ganhar um Nobel? Agora VOCÊ PODE!

nobelmedal.jpgQuer ganhar o prêmio Nobel? Agora VOCÊ PODE!!!
Pode pelo menos tentar pedir um pedacinho dele concorrendo a bolsas do IPCC, o Painel Intergovernamental para Mudança do Clima. Eles ganharam o Nobel da Paz por constatarem que realmente os humanos estão esquentando a Terra. Sim, porque antes disso ninguém tinha muita certeza, e o setor de energia e petróleo sempre torceu os dedos para que a resposta fosse outra. Mas a verdade é essa, doa a quem doer.
A grana que o painel ganhou junto com a “medaglia” do Nobel foi para um fundo de financiamento de bolsas para pesquisas do clima – Na verdade foi metade dos 1,6 milhões de doletas do prêmio, porque ele foi dividido com o Al Gore. Leia o email abaixo que recebi pela pósgraduação da USP:

Prezado(a),
Gostaríamos de informar que está aberta a Chamada para Propostas para o Programa da Bolsa de Estudos do IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change.
O programa foi estabelecido com os fundos recebidos do Prêmio Nobel da Paz concedido ao IPCC em 2007. Sua finalidade é dupla: desenvolver conhecimento, habilidades e a capacidade de novos acadêmicos de algumas das regiões mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas, e fortalecer a habilidade de países em desenvolvimento de contribuir à ciência e à pesquisa do clima.
Estudantes graduados ou doutorandos dos países em desenvolvimento que desejam se engajar na formação acadêmica, empreender habilidades avançadas de pesquisa e de aperfeiçoamento são bem-vindos aplicar-se para uma bolsa de estudos até o dia de 31 de julho 2010.
Mais informações podem ser obtidas diretamente no site do IPCC: http://www.ipcc.ch/ipcc-scholarship-programme/ipcc_scholarshipprogramme.html
Atenciosamente,
Monique Souza
Climate Change, Sustainable Development and Energy Policy Team
British Embassy, Brasilia
Visit our blogs at http://blogs.fco.gov.uk

Bom, a minha pesquisa com vírus e câncer não tem nada a ver com clima, mas até podemos sugerir um projeto para criar um vírus que acabe com pelo menos metade da população mundial. Isso talvez resolva o problema na raíz.
Ok, acho que não passa no comitê de ética.
Mas passaria se eu conseguisse fazer um vírus que esterilize especificamente subcelebridades, como ex-BBBs ou maria-chuteiras!
Invente você também um projeto esdrúxulo para acabar com o aquecimento global!

Enchentes até na capa da Science

capa science.gifGente, tá tudo alagando. Alagou São Paulo, Santa Catarina, Rio de Janeiro, suas ruas, avenidas e casas. Alagou até a capa da revista Science desta semana!

Ok, não tem nada a ver com Brasil, ou excesso de chuvas, mas sim com furacões. Esta foto é de Pinar del Rio, em Cuba, após o furacão Ike.

ResearchBlogging.org

Mas dá pra prever as consequencias do aquecimento? E as nossas enchentes?

Estudos usando modelagem matemática mostraram que a tendência com o aquecimento global é que os furacões diminuam mas fiquem mais fortes, causando mais estragos do que causam hoje

modelo furacão.gif

Mas muita calma nessa hora, porque os próprios pesquisadores afirmam que os modelos não são definitivos.
O que estes caras fizeram foi unir várias projeções de condições climáticas para o fim do século 21 (a projeção é que vai aquecer), e colocar esses dados num modelo de formação de furacões. Tudo isso calculado para o Atlântico Norte.

O resultado é: menos tufões só que mais fortes. Calcula-se um aumento dos prejuísos de 30% comparando com a média atual.

Agora mais um momento “Muita Calma Nessa Hora”: As enchentes destes meses no Brasil não podem ser ligadas diretamente a aquecimento global. Qualquer um que disser isso está se precipitando (sim, a televisão e os jornais se precipitam e erram, vcs não sabem o quanto). Não tem como dizer num curto período de tempo, em eventos isolados, o que causou o que.

Prever o clima deve ser a coisa mais difícil de se fazer. Afinal é muita variável! É como dizem: dependendo das condições, até o bater de asas de uma borboleta pode gerar uma enchente na marginal Tietê.

  • Artigo (para assinantes):

Modeled Impact of Anthropogenic Warming on the Frequency of Intense Atlantic Hurricanes

Bender, M., Knutson, T., Tuleya, R., Sirutis, J., Vecchi, G., Garner, S., & Held, I. (2010). Modeled Impact of Anthropogenic Warming on the Frequency of Intense Atlantic Hurricanes Science, 327 (5964), 454-458 DOI: 10.1126/science.1180568

Espiões, a CIA, e o aquecimento global.

urso polar se escondendo.jpg

Legenda:“Malditos espiões, escondam-se!”

“Temos uma tecnologia que faz imagens de satélites muito, mas muuuito precisas. Pra que você quer usar: pra monitorar o descongelamento de geleiras e outros usos científicos, ou para espionar seus inimigos subdesenvolvidos que nunca seriam páreo militar pra você?”
Adivinha o que qualquer governante responderia?
Fantástica a capacidade do ser humano de descontar o futuro, ou seja, apostar no curto prazo em detrimento do longo.
A CIA dos EUA está colaborando com cientistas do clima liberando imagens da região ártica tiradas por seus satelites-espiões. Mas não não foi fácil convencer, pois os agentes não acham estratégico mostrar estas imagens. Claro, elas mostram um pouco do como eles tiram as fotos, revelando alguns segredinhos de espionagem, como o nível de definição das fotos, posição dos satélites, etc.
spy_vs_spy_counterserveilla.jpgConcordo que este perigo existe e tem sua importância. Existe para os EUA, mas o que o resto do mundo tem a ver com isto? Aquecimento global não é ainda uma prioridade maior que ataques terroristas? Agora pode não ser, mas aguardemos 50 anos que eles vão ver.
Não sou ingênuo, mas quero ainda acreditar que devemos sempre desejar o bem maior.
Esta iniciativa é bem vinda, mas é só uma fresta por onde a gente pode ver a diferença de força entre diferentes interesses nacionais/globais ou político/científico
Pra se ter uma idéia, a definição das imagens cedidas para estudo pela CIA tiveram a definição diminuida para não mostrar ao mundo a capacidade real dos satélites-espiões (provavelmente por serem capazes de ler a etiqueta da sua calça de lá do espaço).
O que me deixa fulo da vida é a militarização da tecnologia, sempre a frente de questões mais nobres. Agora tão lá, os mega-satelites (sem falar em outras pesquisas militares que são as mais fortemente financiadas), nas mãos não dos cientistas que os criaram, ou de comissões de ética responsáveis, mas nas mãos de políticos. Se você confia no seu, ótimo. Se não…
E é essa apropriação da ciência, ou tecnociência que é a regra. O cientista não tem controle sobre suas descobertas. Depois de adquirido pulveriza-se o conhecimento tecnocientífico, que acaba sendo controlado por poderes econômicos e políticos.
Já aconteceu antes, no caso da bomba nuclear, e vai continuar acontecendo
Os cientístas e os cidadãos têm que ficar mais espertos e engajados. Afinal temos que saber quem é que tem autorização para a pertar o grande botão vermelho.Pentagono.jpg

Já que a COP15 não resolveu, nos dê o poder para ajudar.

cop15 lula obama.jpgCOP15 chegando ao fim e chegam ao fim nossas esperanças de uma revolução política e econômica no assunto ambiental. Ações locais e algumas ações concretas foram firmadas, ok. Mas a revolução necessária para resolver o problema não foi nem esbarrada. Não que eu tivesse grandes expectativas quanto a isso, afinal perdi a minha ingenuidade há algum tempo. Mas esperava pelo menos uma abordagem maciça da mídia, que até tentou fazer a sua parte sim, não recrimino. Mas o cidadão continua blindado contra informação de profundidade. Falar na TV sobre clima não é suficiente. Este é um tema que requer uma base de conhecimentos que o cidadão não tem, e chegamos, como sempre, ao ponto crucial que é educação básica.

Então tudo bem, a COP15 não salvou o mundo. E o que um jovem doutorando empolgado e com um sentimento de obrigação social de melhorar o mundo pode fazer? NADA.

É isto que sentimos. Eu e mais vários jovens que iniciam sua vida produtiva agora. Bem neste momento em que entramos em maior contato com o mundo percebemos que quem comanda o mundo falhou, e nós ainda não temos o poder minimamente necessário para fazer a diferença. Para pelo menos sermos ouvidos.

Quem disser “Mas jovens descolados podem se unir e fazer grandes ações. A internet está aí como uma ferramenta de mobilização, de divulgação…” está muito enganado. Talvez a internet seja a pior das maldições dos nossos dias. Ela traz esta falsa idéia de mobilização e ação. Como se escrever um blog pudesse ser uma ação social válida. Como se clicar num banner para plantar uma árvore ou alimentar uma criança fosse resolver algum problema. E feito isto podemos dormir com a consciência tranqüila da boa ação feita. Com isso o cidadão lava as mãos.

Quem acha que isto é o suficiente não tem noção real do problema. E a noção real do problema é: NINGUÉM TEM NOÇÃO REAL DO PROBLEMA!

O problema climático depende da ciência, da política, da economia, da sociedade e da educação. Cada uma com seus nuances, metodologias e agentes.

E os agentes de poder atuantes hoje, falharam. O seu sistema é lento. Quando surge um resultado científico tão alarmante quanto o aquecimento global, deveria haver como este sistema se auto-regular a tempo. Ainda mais quando os estudos também já determinam metas a serem atingidas. Aliás, estes estudos que deveriam ser a parte difícil do problema. Mas a complexidade política, que deve levar em conta todas as outras áreas e suas complexidades individuais, parece um obstáculo intransponível.

Diante desta complexidade as pessoas travam, e não há como culpá-las. A coisa é difícil mesmo.

Mas ver jovens, melhor preparados que muitos agentes formadores de opinião ou tomadores de decisão, sempre a margem da discussão é doloroso.

Sabemos que um dia tomaremos o poder. Estes jovens serão os formadores de opinião e tomadores de decisão em alguns anos. (e eu estou sendo otimista aqui, afinal poderiam me perguntar “onde estão os jovens visionários das décadas passadas agora?” Eu não saberia dizer)

Mas a questão climática coloca uma coisa em perspectiva: Certos problemas, não só o climático, precisam ser corrigidos num tempo certo. É como comprar uma Harley-Davidson: Quando se é jovem e se tem energia, força e espírito de aventura para USAR uma moto destas, não temos o dinheiro para comprá-la. Quanto juntamos o dinheiro para tal, já estamos velhos demais para usá-la como se deve.
Talvez depois, quando a competência chegar ao poder, já seja tarde demais.