O crescimento do PIB em 2021

Imagem de Justin Cobb por Pixabay.

Por Valter Palmieri Júnior e Ulisses Rubio U. da Silva

Introdução

O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,2% no primeiro trimestre de 2021 (comparado ao quarto trimestre de 2020). Já quando comparamos o período de abril de 2020 a março de 2021, o PIB caiu 3,8%, comparado ao período de abril de 2019 a março de 2020. Em valores correntes, o PIB no primeiro trimestre de 2021 totalizou R$ 2,048 trilhões.

O resultado do PIB trimestral de 1,2% foi visto como positivo, pois surpreendeu as expectativas do mercado, que esperava crescimento menor. Entretanto, surpreender positivamente em relação às expectativas não significa que os resultados são bons, principalmente por duas razões: a) estamos numa crise dentro da crise (a economia brasileira já estava em crise quando foi impactada pela pandemia) e, portanto, crescer 1,2% no trimestre é um valor tímido para começarmos a sair da nossa crise; b) os componentes que explicam o crescimento mostram que a “recuperação” atual da economia não está sendo capaz de beneficiar a todos: muito pelo contrário, é um crescimento que amplia a desigualdade.

O PIB pelas Óticas da Oferta e da Demanda

Quando os economistas analisam e quantificam o PIB, eles podem fazer isto através de duas perspectivas: 1) pela ótica da oferta, isto é, olhando para os setores que produzem os bens e serviços; 2) pela ótica da demanda, isto é, olhando para a finalidade daquilo que foi produzido, para que foi utilizado.

Ótica da oferta

Na ótica da oferta, a Agropecuária foi a única que obteve um crescimento expressivo (5,7%), enquanto a Indústria (0,7%) e Serviços (0,4%) tiveram avanços tímidos. Esse resultado do setor Agropecuário é explicado principalmente pela cultura da soja, mas também pelo fumo e arroz, além de crescimento da produtividade geral (produção/hectare)

Na Indústria, o componente que mais contribuiu positivamente foi a indústria extrativa (3,2%), seguido pela construção (2,2%). No entanto, na indústria de transformação, que é o setor mais dinâmico, o resultado foi negativo (-0,5%). Já nos Serviços, o subsetor transporte, armazenagem e correio foi o responsável por um crescimento maior (3,6%), sendo que a administração, saúde e educação pública cresceram apenas 0,6%.

Ótica da demanda

Na ótica da despesa, no setor interno, o Investimento (Formação Bruta de Capital Fixo) foi o componente que mais cresceu (4,6%), enquanto a despesa do Consumo das Famílias e do Governo diminuíram 0,1% e 0,8%, respectivamente. Já no setor externo, as exportações de bens e serviços cresceram 3,7 %, muito abaixo do crescimento das importações, que foi de 11,6%. Isto é, o que o Brasil compra do exterior aumentou, em porcentagem, muito mais do que o Brasil vende para o exterior.

Esses dados são sintetizados na tabela a seguir.

PIB lento

Mesmo com o crescimento do PIB positivo no último trimestre, a economia brasileira está longe de recuperar o dinamismo econômico. O gráfico abaixo mostra que a renda total da economia mal atingiu os níveis de antes da crise da COVID-19 e ainda está bem distante do nível atingido em 2013. Isto é, os brasileiros ainda não estão sequer ganhando o que ganhavam em 2013.

Comportamento semelhante tem ocorrido com os investimentos (FBCF), que também estão longe de atingir os níveis de 2013.

PIB e desigualdade

O Produto Interno Bruto é uma forma de medir a renda total gerada no Brasil. Então, se o PIB cresce, a renda gerada também está crescendo. Mas isto não necessariamente significa que todos os brasileiros estão ganhando mais. E, se isto não ocorre, significa que o crescimento do PIB não está beneficiando a todos. Uma forma que tem sido muito utilizada pelos analistas é mostrar que, a despeito do crescimento neste último trimestre, a taxa de desemprego permanece muito elevada. E, de fato, a taxa de desemprego continuou aumentando e atingiu 14,7% (no final de 2014 era de 6,5%). Entre os jovens de até 17 anos, a taxa de desemprego atingiu 46,3% e entre os que tem entre 18 e 24 anos atingiu 31%. Isto tem impacto no total de rendimentos do trabalho, que também segue diminuindo. Já a taxa de participação (que é a População Economicamente Ativa (PEA) dividida pelas pessoas em idade de trabalhar) também caiu, significando que a redução de pessoas que se retiraram do mercado de trabalho em tempos de pandemia contribuiu para que a taxa de desemprego não fosse ainda maior.

A conjuntura atual para o segmento mais vulnerável no mercado de trabalho é ainda mais preocupante quando observamos os índices de preços dos últimos meses, que mostram o encarecimento do custo de vida para a população. O IPCA-Geral acumulou uma inflação de 7,9% desde janeiro de 2020 até maio de 2021. Mas, o IPCA apenas para o seguimento de Alimentos e Bebidas foi consideravelmente maior (16,7%). Os dados da Pesquisa do Orçamento Familiar (POF) revelam que quanto menor o rendimento das famílias, maior é o peso da categoria Alimentos e Bebidas nas despesas. Um aumento maior dos preços num segmento tão significativo para as famílias de menor renda  cria, portanto, uma situação grave para esta parcela da população.

A Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN) revelou, em pesquisa realizada em dezembro de 2020, que a insegurança alimentar aumentou consideravelmente; 9% dos domicílios no Brasil se encontram em situação de insegurança alimentar grave (fome); e esse número é seis vezes maior quando a pessoa referência na família estava desempregada; e quatro vezes maior entre aquelas com trabalho informal, quando comparadas com as que contavam com algum tipo de trabalho formal. Esse número, assim como outros indicadores sociais, se agravam dependendo da região, cor/raça e gênero.

Mas, podemos também utilizar outros caminhos para indicar que o crescimento da renda gerada não tem beneficiado igualmente a população brasileira.

Um indicador disto é que, a despeito do desemprego e da renda total do trabalho, a taxa de poupança bruta aumentou. Isto ocorreu porque a Renda Nacional Bruta (RNB) cresceu proporcionalmente mais do que as despesas finais em consumo. Esse fato só pode ser explicado pela grande desigualdade do país na atual conjuntura, uma vez que o crescimento da poupança da parcela mais privilegiada compensou consideravelmente a queda da poupança de quem perdeu o emprego ou teve diminuição da renda real média.

Por exemplo, entre o primeiro trimestre de 2020 e 2021, a RNB se ampliou 230,6 bilhões, enquanto o consumo aumentou proporcionalmente bem menos (57,6 bilhões), fazendo com que a Poupança Bruta crescesse 173 bilhões. Isso fez com que a taxa de poupança bruta subisse de 13% para 21% entre o 1º trimestre de 2020 e o 1º trimestre de 2021. Esses números surpreendem, pois a taxa de poupança bruta sobe quando há alto crescimento econômico, uma vez que parte da renda adicional é direcionada para a poupança. Entretanto, na nossa conjuntura atípica, a poupança cresce de modo surpreendente em um cenário de grande crise.

Considerações finais

Há vários modos de interpretar o resultado do PIB. Em um país em que a distribuição da renda é muito desigual, olhar apenas para o resultado geral do PIB não é suficiente, pois isto pode camuflar os resultados econômicos de parcela significativa do país. No Brasil, onde múltiplas desigualdades sociais convivem com a desigualdade de renda, não basta associarmos os resultados trimestrais do PIB apenas com a reação positiva da bolsa de valores. É importante associarmos sempre os resultados trimestrais do PIB com indicadores sociais. Procedendo assim, podemos revelar a real situação da vida material do conjunto dos brasileiros. Além disso, por estarmos em uma crise dentro de uma outra crise, é relevante reconhecer que as políticas econômicas adotadas desde 2015 não estão sendo adequadas para uma recuperação mais rápida e dinâmica de nossa econômica.

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