Novos Artigos – Por uma matemática que vá além dos cálculos

Por Kátia Kishi,
Publicado no blog SciELO em Perspectiva – Humanas

Desde os anos 70, as teorias que estruturam a atual matemática como disciplina científica é baseada nas psicologias europeia e americana, com grande ênfase no psicólogo Jean Piaget abordando um conceito de educação no qual o aluno é classificado como ser autônomo, propenso a crescer intelectualmente por meio de “conselhos” ou “regras” transmitidas pelos professores.

educao e pesquisa

Nesse panorama, Luis Radford quebra o padrão de ensino com suas pesquisas longitudinais e a aplicação da Teoria Cultural da Objetivação na matemática, como discute em entrevista na primeira edição de 2015 do periódico Educação e Pesquisa (vol. 41, n° 41), publicado pela Universidade de São Paulo (USP).

A Teoria Cultural da Objetivação defende ser insuficiente o ensino individualista proposto no século XX e ressignifica as ideias de “saber, conhecimento e aprendizagem”, sendo que o saber é visto como uma potencialidade de pensar, o conhecimento uma atualização desse saber e a aprendizagem (que é objetivação) a “tomada de consciência das maneiras como se atualiza o saber”, explica Radford. Nessa linha, a consciência debatida não é considerada algo inato do ser humano, mas algo que se forma através de processos sociais, culturais e históricos que também devem ser aplicados na matemática de forma que o professor não seja um mero conselheiro, mas participante ativo dessas operações sociais.

Para exemplificar a teoria, Radford apresenta suas pesquisas na escola primária, em especial o ensino e aprendizagem de álgebra com crianças de 7 a 8 anos. No trabalho de sua equipe, são analisadas as possibilidades de levar a criança ao pensamento algébrico pelas interações culturais, ou seja, focando primeiro nas formas de pensar seguida pela tomada de consciência desse conhecimento, e não diretamente na aplicação numérica da álgebra: “Uma vez que adotamos a natureza social dos saberes e dos seres, propomos espaços de debates de comple­xidade crescente, que começam com grupos de dois ou três alunos, que trabalham visando resolver certos problemas. Depois, provocamos intercâmbio entre os grupos para que os alu­nos aprendam a defender suas ideias, a ouvir as dos outros, a tentar entendê-las, etc.”, detalha.

Radford também defende que esses debates devem ser incorporados de acordo com o contexto histórico e cultural de cada grupo: “Existem for­mas matemáticas de pensar o mundo que não estão guiadas simplesmente para fazer cálculos. Filósofos importantes como um Heidegger, como Hegel, lamentaram em seu momento a mudan­ça tecnológica utilitarista e calculista que estava tomando a matemática que eles conheceram. Na matemática contemporânea, talvez o mais dra­mático seja o esvaziamento do sujeito e a crítica que Hegel faz precisamente à matemática é que não há sujeito. […] Penso que essa é a contribuição mais importante para a educação matemática. Isso é um convite para ver a educação não somente como uma educação de saberes mas também como formação do sujeito como sujeito humano.”

Artigo: Educação, educação matemática e teoria cultural da objetivação: uma conversa com Luis Radford
Revista: Educação e Pesquisa (USP)
Autores: Vanessa Dias Moretti — Universidade Federal de São Paulo — e-mail: vanessa.moretti@unifesp.br
Maria Lúcia Panossian — Universidade Tecnológica Federal do Paraná — e-mail: mlpanossian@utfpr.edu.br
Manoel Oriosvaldo de Moura — Universidade de São Paulo — e-mail: modmoura@usp.br
Jornalista: Kátia Kishi – Jornalista do Dilvuga Ciência e pesquisadora do Labjor/Unicamp – Telefone: (14) 98110-0814 – e-mail: katiakishi@gmail.com

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