Ginástica no Laboratório

estica e puxa

Estica e puxa, amassa e desamassa, prende e solta, corre e pára, bate e rebate, contrai e relaxa. Cada uma no seu ritmo, as células vivas estão sempre se movimentando. Conhecemos os aspectos bioquímicos das estruturas celulares há décadas, mas seus movimentos e suas características puramente físicas sempre foram deixados meio de lado. Sempre pareceu difícil estudar os impactos do incessante estica-e-puxa que acontece dentro dos seres vivos.

Alguns desses movimentos celulares (e seus impactos) são bem visíveis: graças às contrações musculares, não dá pra ignorar uma mão contraída esmurrando a sua cara, por exemplo. Quando o soco te atinge, é a deformação repentina e intensa das células de sua pele, seus músculos e seus nervos que te faz sentir dor.

Mas nem sempre os efeitos biológicos das forças físicas são tão perceptíveis (e doloridos). Por menores e menos intensas que nos pareçam, as forças físicas a que as células são submetidas existem. Nossos vasos sanguíneos, por exemplo, são constantemente deformados pela passagem dos pulsos de sangue em seu interior.

A influência das forças mecânicas em escala celular ainda está começando a ser estudada e compreendida. Teoricamente, os pequenos impactos cotidianos podem contribuir em muitas coisas, da expressão e proliferação de genes ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer. O problema sempre foi replicar os diferentes tipos de forças enfrentados por diferentes tipos de células. Ou melhor, era esse o problema.

A fabulosa microacademia de Alexandre Poulain

Pesquisadores da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL) e da Universidade de Lausanne (UNIL), ambas na Suíça, desenvolveram uma espécie de aparelho de ginástica para as células. A micro-academia é formada por uma pequena plataforma flexível — o que permite replicar os movimentos de esticamento e compressão das células — e transparente — o que torna possível usá-la sob o microscópio para fazer observações. O dispositivo e seus primeiros testes foram descritos em artigo publicado na revista Lab on a Chip em 17/08 sob a autoria principal de Alexandre Poulain.

A estrutura da academia celular criada por Poulain et. al. é simples: as células que devem ser estudadas são cultivadas sobre uma membrana de silicone mole equipada com um par de eletrodos flexíveis. A aplicação de uma voltagem entre os eletrodos faz a membrana se esticar, o que também deforma as células em sua superfície. O professor Herbert Shea, da EPFL, explicou ao Phys.org que os equipamentos para pesquisa de movimento celular que já existem “são contruídos com um sistema de bombas complicado e volumoso, que não permite o imageamento contínuo das células em alta-definição”.

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Além de ser menor e mais prático, o sistema (demonstrado no vídeo acima) também é mais preciso, segundo Poulin: “Nossa plataforma nos permite escolher precisamente as zonas na qual a deformação é aplicada e podemos ajustar exata e rapidamente a intensidade do estresse.” A equipe de Poulin já começou a testar sua maquininha de estica e puxa em células. Bióloga e professora da UNIL, Tatiana Petrova fez os primeiros testes com células endoteliais dos vasos linfáticos, que sofrem constante deformação pelo fluxo da linfa.

Petrova escolheu células linfáticas porque quando elas ficam doentes, acredita-se que elas não reagem aos estímulos mecânicos como deveriam. No caso da síndrome de linfedema-distiquíase, por exemplo, não há reação adequada ao estresse físico e assim os vasos linfáticos liberam seu fluido no corpo, o que leva ao inchaço dos membro afetados. Para Petrova, a nova plataforma vai permitir não apenas uma ampla gama de testes, mas também testar diferentes drogas para tratar diferentes tipos de problemas. O estica e puxa no laboratório está apenas começando…

rb2_large_gray25Referência
Alexandre Poulin et al. Dielectric elastomer actuator for mechanical loading of 2D cell cultures [Atuador elastômero dielétrico para carga mecânica de células de cultura 2D]. Lab Chip (2016). DOI:10.1039/C6LC00903D

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