“São as águas de março?”

Crédito da Foto: Camilla Brunelli

Temporal alaga as ruas de Petrópolis e impressiona moradores (Agência Brasil)

Sobe para 18 o número de mortos após temporal em Petrópolis (RJ). As fortes chuvas que atingiram a cidade causaram o deslizamento e centro histórico esta inundado (Correio Braziliense)

Chuva provoca 34 mortes, deslizamentos e arrasta carros em Petrópolis (RJ) (UOL)

Chuvas provocam mortes e deixam desaparecidos em Petrópolis (Estado de Minas)

Manchetes parecidas não? “Temporal alaga”, “As fortes chuvas/causaram”, “Chuva provoca” e “Chuvas provocam/ e deixam”. A similaridade encontrada nas palavras reside nos sentidos impregnados nos discursos político e midiático que circulam e nos chegam como enxurradas outras aos nossos sentidos.

Refletir sobre os sentidos destas manchetes em repetição é importante para que se possa entender melhor sobre o fenômeno natural e esses desastres.

Somos ensinados nas escolas sobre as estações do ano: Primavera, Verão, Outono e Inverno. Sabemos, portanto, os períodos nos quais teremos climas secos e chuvosos. Contamos com especialistas em Meteorologia, profissionais que dedicam a vida ao entendimento do clima e que cá entre nós, deveriam ser ouvidos e consultados junto a outras especialidades correlatas, na adoção PREVENTIVA de políticas públicas. No Brasil, mais precisamente na região sudeste o período chuvoso se dá entre os meses de Outubro a Março.

Posto isso, a chuva enquanto fenômeno natural “precipitação da água atmosférica sob a forma de gotas” é primordial para a manutenção da vida, para cheia dos rios, para a agricultura e as economias do campo. O que tem se visto, através da mídia e tais manchetes é a relativização das chuvas aos desastres ambientais que ceifam vidas, carregam lares e apagam memórias.

Grande parte da população brasileira é levada a fixar moradia à borda das grandes cidades, nas encostas dos morros, aquém de qualquer saneamento básico, ou seja, em terrenos não regularizados (leia-se, negligenciados) pelos poderes públicos, sem água potável, energia elétrica e menos ainda com acesso a politicas públicas essenciais de qualidade. Outra parte da população passa a ser vizinha de grandes complexos empresarias – hidrelétricos – mineradores e como resultado têm os leitos de seus rios assoreados e as rupturas de barragens em constante eminência.

É preciso salientar que desastres ambientais são ocasionados pela ação humana de forma irresponsável sobre a natureza, sem levar em conta o impacto a curto, médio e longo prazo que será gerado. O correto manejo da natureza é essencial para a vida humana, é preciso que especialistas, porta vozes da CIÊNCIA sejam consultados antes de qualquer ação, construção, implementação de novas obras por exemplo. É urgente, pois temos manchetes em repetição. Não são novidades! Nos períodos de outubro a março temos grandes chuvas em nosso solo, as pessoas que residem em lugares com risco de desabamento ou alagamento serão afetadas. Note-se serão afetadas não pelas chuvas, o fenômeno natural é a última gota em um copo cheio.

Qual é então o motivo que faz circular a ideia da culpabilidade da chuva perante as enchentes ao invés das autoridades responsáveis pelo planejamento estrutural das cidades e pela saúde e segurança de cada vida?

Fico cá pensando que o sentido resida aí. Residir, o verbo mesmo. Essas pessoas levadas a fixar moradia em locais de risco não são entendidas como cidadãos –“aqueles que residem nas cidades, com direitos e deveres”. Moram à margem, não significam. Então chove.

 

 


Camila Brunelli é graduada em Comunicação Social, Publicidade e Propaganda com ênfase em Marketing pela PUC- Campinas, fotógrafa pela Escola de Arte e Design de Campinas e mestra em Divulgação Científica e Cultural pela Unicamp. É co-autora e editora de fotografia do ebook Vozes e silenciamentos em Mariana: crime ou desastre ambiental?

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