
O plástico é um produto barato, versátil e bastante difundido por todo o mundo. Seu descarte inadequado constitui um problema ambiental que cresce cada vez mais. Microplásticos já haviam sido encontrados em peixes, aves, água engarrafada e até mesmo no leite materno humano. Neste contexto, uma pesquisa recém-publicada apresentou o primeiro registro de morcegos contaminados por microplásticos.
O morcegos são uma ordem de mamíferos bastante diversa, prestando serviços ecossistêmicos imprescindíveis, como a polinização, a dispersão de sementes e o controle de insetos (inclusive pragas agrícolas). Algumas espécies de plantas pioneiras necessárias à regeneração de áreas degradadas, por exemplo, são polinizadas e dispersas exclusivamente por morcegos.
Desde 2017, foram analisados 81 morcegos de 25 espécies diferentes, que ocorrem em 26 pontos rurais e urbanos do estado do Pará, como áreas de vegetação natural, de plantação de cacau e dentro de cidades ou próximo a elas. Os resultados mostraram que 96,3% dos morcegos possuíam resíduos plásticos em pelo menos um de seus órgãos analisados: pulmões, estômago e intestino.
Os microplásticos compreendem tamanhos micro (1 a 5 milímetros) e nano (menores que 1 milímetro). Os resíduos plásticos estão distribuídos em todos os ambientes, seja no ar atmosférico, seja no ambiente terrestre. Aqueles do tipo fibra são os mais abundantes no ambiente e provêm principalmente das roupas, da degradação das fibras têxteis plásticas. Esse produto de degradação tem sido observado na precipitação atmosférica, transformando-se em microfibras respiráveis, o que por si só sugere potencial exposição das microfibras a organismos que apresentam respiração pulmonar. O estudo acende um alerta, já que seres humanos e morcegos possuem sistemas respiratórios semelhantes, podendo ser suscetíveis a contaminações semelhantes. Ainda assim, nos resultados da pesquisa, houve uma diferença significativa entre a contaminações do sistema respiratório e do digestivo, sendo que o segundo foi mais afetado.
A ingestão de microplásticos causam efeitos adversos em diferentes espécies, como alteração das funções endócrinas alteradas, diminuição da massa corporal dos filhotes e inflamação dos tecidos. Nas aves, causa desaceleração no desenvolvimento sexual. Em altas concentrações, podem ainda causar uma falsa sensação de saciedade, levando os indivíduos à fome. Além disso, microrganismos e metais podem aderir às superfícies dos microplásticos, sendo contaminantes adicionais. Nos morcegos, a ingestão e a inalação de microplásticos podem causar até a extinção local de espécies, afetando as funções do ecossistema, como como polinização, dispersão de sementes e controle de insetos.
Os morcegos possuem diferentes características de forrageamento, considerando tanto o tipo de alimento (flores, frutos, invertebrados e vertebrados) e estratégia de captura (áreas abertas, clareiras, bordas de vegetação) e habitat (urbano ou intocado). Assim, a contaminação de morcegos insetívoros e onívoros pode ser explicada pela transferência de resíduos plásticos entre diferentes níveis tróficos. As microfibras também podem ser depositadas nas superfícies de frutas e organismos terrestres. Dessa forma, os morcegos podem absorver alimentos e inalar microfibras em aerossol, permitindo a contaminação por ingestão e inalação, respectivamente.
O artigo “The First Record of Ingestion and Inhalation of Micro- and Mesoplastics by Neotropical Bats from the Brazilian Amazon” foi publicado na revista Acta Chiropterologica, periódico científico do Museu e Instituto de Zoologia da Academia Polonesa de Ciências.
O trabalho é resultado da pesquisa de mestrado de Letícia Lima Correia, no âmbito do Programa de Pós-graduação em Biodiversidade e Conservação da Universidade Federal do Pará (UFPA) – Campus Altamira.
Paulo Andreetto de Muzio é graduado em Relações Públicas (2005) pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA/USP. Especializou-se em Jornalismo Científico (2016) pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo – Labjor, da Universidade de Campinas – Unicamp, e é mestre em Divulgação Científica e Cultural (2020), também pelo Labjor. Atua na Frente Ampla Democrática Socioambiental (FADS).
Um trabalho muito importe, pois destaca muito bem as alterações causadas na vidas desse animais, prejudicando assim seu meio natural e os serviços ecossistêmicos desenvolvidos por eles. O trabalho mostra mais um organismos contaminado com Microplástico e como precisamos ter consciência sobre o uso e descarte incorreto de itens plásticos.