O que é essa tal de ABA?
[Uma versão anterior deste texto foi publicada originalmente na página da Escola de Magistratura do Paraná, em parceria com a ABPMC Comunidade, em 13/01/2017.]
Toda mãe e todo pai de uma criança diagnosticada como Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) já ouviu falar que sua filha ou seu filho deveria “fazer ABA”. É, muitas vezes, o início de uma série de confusões e mal-entendidos sobre o que deve ser feito, que profissional deve-se procurar, quanto tempo isso vai demorar, o que as mães e pais devem fazer… E, principalmente, sobre o que é (e o que não é) essa tal de ABA.
Muitas vezes chamada confusamente de “terapia ABA” ou “método ABA”, a sigla ABA vem do inglês para “Análise do Comportamento Aplicada” (Applied Behavior Analysis), e faz exatamente o que diz no rótulo: aplicação de procedimentos, técnicas e tecnologias provenientes da Análise do Comportamento. Ou seja, usa as descobertas científicas da ciência do comportamento e as técnicas e tecnologias comprovadas cientificamente nessa área para propor soluções para problemas de comportamento humano. Analistas do comportamento são profissionais capazes de, usando seu conhecimento sobre o comportamento humano, programar, implementar e avaliar intervenções para problemas comportamentais dos mais diversos tipos, nos mais diferentes contextos. Analistas do comportamento aplicam seu conhecimento para programar o ensino de diversas habilidades acadêmicas no âmbito escolar e no treinamento e capacitação profissional em diversos campos de trabalho. Também podem ser consultores na proposição de políticas públicas para melhorar ou modificar a maneira como as pessoas usam o cinto de segurança ou a faixa de pedestres, por exemplo. A Educação Especial se beneficia amplamente das técnicas comportamentais para o ensino de pessoas com diversas necessidades especiais. Na área da saúde, a ABA está presente nos serviços de terapia comportamental, reabilitação e, com grande sucesso, no tratamento de pessoas com TEA.
O que todas essas intervenções em contextos tão diferentes têm em comum é que analistas do comportamento usam sempre, em qualquer situação, seus conhecimentos científicos para modificar o comportamento das pessoas: para eliminar ou diminuir comportamentos problemáticos, ajustar ou adequar comportamentos disfuncionais e ensinar novos comportamentos quando eles são necessários. Para isso, partimos da premissa de que todo comportamento tem uma razão de ser, que toda ação tem um efeito sobre o ambiente de quem se comporta. Quando uma criança faz birra, esse comportamento pode ter diversos efeitos no ambiente dessa criança, desde conseguir um brinquedo ou um pacote de biscoito recheado até se livrar de uma situação desconfortável para ela, como ir para a escola. Analistas do comportamento têm diversas técnicas para observar e descobrir qual o efeito ambiental importante para aquela criança, naquele momento, que a leva a fazer birra em determinados ambientes. De posse desse conhecimento, podemos, então, programar intervenções para modificar o comportamento de birra da criança e ensiná-la a se comportar de outros modos – mais adequados – para alcançar os efeitos desejados.
Especificamente no tratamento de pessoas com TEA, além de avaliar as habilidades e repertórios dos indivíduos e programar o ensino de comportamentos novos e necessários para a autonomia e a qualidade de vida dessas pessoas, o que analistas do comportamento fazem é, inicialmente, descobrir quais as causas dos comportamentos problemáticos de clientes, procurando justamente quais os efeitos que esses comportamentos têm no ambiente. Pessoas com TEA podem ter dificuldade de se comunicar e expressar suas vontades e seus sentimentos e muitas vezes desenvolvem comportamentos estranhos ou inadequados porque os efeitos dessas ações comunicam coisas para as pessoas em seu ambiente social. Uma criança com TEA pode, por exemplo, bater com a cabeça numa porta porque toda vez que ela faz isso alguém abre a porta e ela pode sair para brincar lá fora. Quando esse efeito é identificado, analistas do comportamento aplicam diversas técnicas para, gradualmente, eliminar o comportamento problemático de bater a cabeça e ao mesmo tempo ensinar uma maneira da criança comunicar sua vontade de sair para brincar lá fora. De modo geral as técnicas de intervenção comportamental consistem em programas estruturados de tentativas de ensino em que clientes tomam contato com várias oportunidades de aprendizagem de um comportamento novo que tem o mesmo efeito ou outro efeito igualmente desejável e importante para aquele indivíduo. Quando a pessoa com TEA aprende que apontar para a porta e falar “sair!” tem o mesmo efeito sobre as pessoas (alguém abre a porta) e produz a mesma consequência ambiental de bater a cabeça (poder sair para brincar lá fora), ao mesmo tempo que o comportamento inadequado de bater com a cabeça não mais produz o efeito desejado (ninguém abre a porta), ela passa a se comportar de outra maneira ao longo da intervenção.
Juntamente com a família e a escola, analistas do comportamento vão identificar quais a necessidades de aprendizagem e quais as habilidades e comportamentos que aquele indivíduo precisa aprender, assim como quais os comportamentos problemáticos que ela ou ele apresenta e que podem estar dificultando essas aprendizagens ou impedindo que a pessoa tenha acesso a oportunidades de ensino. Uma vez identificado o que precisa ser ensinado, profissionais com capacitação adequada vão programar em que sequência esses comportamentos podem ser ensinados da maneira mais efetiva, porque muitas vezes precisamos aprender primeiro uma habilidade mais simples para depois desenvolver um repertório mais complexo. Por exemplo, é preciso que a criança saiba como segurar um lápis e como traçar linhas no papel antes que se tente ensinar a habilidade de escrever letras e números. O objetivo da intervenção comportamental é sempre construir gradualmente os repertórios de habilidades e comportamentos, no tempo do aprendiz e de maneira gratificante para ele ou ela. Para cada tipo de comportamento a ser ensinado, podemos usar diferentes arranjos e programas de intervenção. Podemos trabalhar com materiais sobre uma mesa (por exemplo, um tablet com imagens em movimento ou diversos cartões apresentados sobre a mesa podem ser usados para ensinar o nome dos algarismos…); estruturar o ambiente natural de clientes (como colocar as roupas empilhadas na ordem em que devem ser vestidas depois do banho, de modo que ao chegar no fim da pilha a criança esteja vestida de maneira adequada e sem problemas na execução da tarefa); ou aproveitar situações e contextos do dia-a-dia como oportunidades para o ensino (usar a hora da refeição, por exemplo, para ensinar clientes a pedir o que desejam comer).
As intervenções comportamentais para pessoas com TEA também são muito eficientes para ensinar diversas habilidades que os programas educacionais tradicionais não conseguem. Por meio da apresentação de tentativas de ensino estruturadas com começo, meio e fim e que produzem efeitos imediatos no ambiente, do uso de instruções simples e claras e da repetição da quantidade necessária de tentativas para que o indivíduo aprenda um habilidade de maneira eficiente e a seu tempo, as intervenções comportamentais são ferramentas importantes para que as pessoas com TEA adquiram um repertório social que permita, por exemplo, sua inclusão escolar efetiva. A ABA tem demonstrado resultados benéficos no ensino de habilidades comunicativas, linguagem, leitura e escrita, matemática, autocuidados, habilidades sociais, habilidades para o trabalho e diversos outros repertórios importantes para a autonomia e a qualidade de vida de pessoas com TEA, atrasos de desenvolvimento ou com outras necessidades especiais.
Tanto por sua amplitude de aplicação em ambientes e contextos diferentes, como pela complexidade dos procedimentos, técnicas e tecnologias que são aplicados em um programa de intervenções ABA, a formação profissional nessa área é imprescindível para o sucesso do tratamento. Analistas do comportamento que conduzem intervenções ABA para pessoas com TEA devem ter formação e capacitação específicas para avaliar comportamentos, programar intervenções comportamentais adequadas e eficientes, implementar e acompanhar programas de intervenção comportamental. Além disso, é necessário ter experiência supervisionada no trabalho com pessoas autistas, para adquirir, na prática, as habilidades necessárias para a condução eficaz dos tratamentos. A formação e a capacitação profissional em ABA/TEA se dá no nível da pós-graduação, em cursos de especialização, mestrado e/ou doutorado, em que terapeutas estudam as bases teórico-conceituais da Análise do Comportamento e as técnicas e procedimentos de ABA, praticam essas técnicas em ambiente de ensino e adquirem experiência supervisionada ao longo de sua carreira. A intensidade dos tratamentos comportamentais para pessoas com TEA exige que a formação profissional se dê em diferentes níveis de competência: inicialmente temos as aplicadoras e os aplicadores, que recebem treinamento técnico e supervisão direta para a implementação dos procedimentos indicados, em contato com clientes no dia-a-dia, nos diversos ambientes em que a intervenção acontece (em casa, na escola, na comunidade e/ou no consultório). Depois de uma formação técnica e teórica mais aprofundada e de um período de prática supervisionada, tais profissionais passam a ser terapeutas com capacidade e autonomia para conduzir avaliações comportamentais, programar e implementar programas de intervenção comportamental, e ainda se responsabilizar pela aplicação dos procedimentos pelos aplicadores e pelas aplicadoras. Além disso, passam a supervisionar o trabalho durante as intervenções, contribuindo para a formação profissional de analistas do comportamento menos experientes. Profissionais muito experientes e com formação ampla e sólida coordenam a prestação de serviços em ABA, supervisionam os programas e ajudam terapeutas a conduzirem as avaliações, programações e implementação de intervenções, garantindo a formação adequada e a supervisão de terapeutas e aplicadores menos experientes.
Internacionalmente, o Behavior Analyst Certification Board (BACB, da sigla em inglês para Comitê de Certificação de Analistas do Comportamento) certifica profissionais com comprovada formação, que deve ser feita em cursos cujos currículos são verificados pelo comitê juntamente com um número fixo de horas de experiência supervisionada por um profissional certificado e com a aprovação em um exame escrito de proficiência na área. No Brasil, a Associação Brasileira de Medicina e Psicologia Comportamental (ABPMC) atesta a formação global em Análise do Comportamento por meio de uma acreditação concedida a profissionais que comprovem documentalmente sua formação, mas não seleciona profissionais especialistas que têm formação e experiência específicas em ABA, sendo necessário que clientes dos serviços ABA exijam que se apresente certificados de formação específica para comprovar a competência de profissionais da área. Por isso é importante que mães e pais de crianças com TEA estejam atentos para a qualidade da formação profissional dada a terapeutas que se responsabilizarão pelo tratamento de seus filhos, garantindo que essa formação seja feita em instituições competentes e de qualidade comprovada. A prestação de serviços em ABA para pessoas com TEA e outras necessidades especiais, no Brasil, ainda é uma área em desenvolvimento, mas com potencial para produzir importantes mudanças na inclusão social dessa população.
Links úteis e mais informações:
Cartilha da ABPMC sobre TEA: http://abpmc.org.br/arquivos/publicacoes/1521132529400bef4bf.pdf
Página do Comitê Internacional de Certificação de Analistas do Comportamento: https://www.bacb.com/about-behavior-analysis/
Recomendação da Comissão Especial de Desenvolvimento Atípico sobre a formação de profissionais em ABA/TEA: http://abpmc.org.br/arquivos/publicacoes/1523286467145093a07e.pdf
Precisamos falar sobre autismo… (Parte II)
Sinais precoces do TEA
(Ou: Como saber se seu filho, sobrinho, vizinho, aluno, amiguinho, etc é autista?)
Geralmente os pais começam a perceber que tem alguma coisa errada no desenvolvimento das crianças quando elas não falam nada ou não se comunicam verbalmente, lá pelos 2 ou 3 anos de idade. Mas há vários outros sinais mais precoces ainda que podem ser observados em bebês bem pequenos. É importante ficar de olho nesses sinais precoces porque, mesmo que não se tenha um “diagnóstico fechado”, os déficits de comportamento podem ser tratados bem precocemente e as pesquisas mostram que a terapia comportamental intensiva e precoce beneficia tanto as crianças com autismo que elas podem acompanhar os coleguinhas da mesma idade na escola, mesmo tendo o diagnóstico de TEA.
Os sinais mais importantes para desconfiar que um bebê pode ter características autísticas são:
Logo ao nascer: o bebê não faz contato visual com a mãe durante a amamentação e não se interessa por brincadeiras ou atividades com adultos;
Por volta dos 3 meses de idade: o bebê não sorri e não segue objetos mostrados pelos adultos;
Por volta dos 7 meses de idade: o bebê não demonstra expressões faciais e não sorri em resposta aos adultos;
Por volta dos 8 meses de idade: nessa fase, bebês com desenvolvimento típico começam a mostrar apêgo aos pais e cuidadores frequentes, chorando e demonstrando desconforto quando vão para o colo de estranhos ou pessoas pouco familiares. Bebês que são indiferentes e “vão com qualquer um” sem reclamar não são “nossa que neném dado!”, podem ser bebês com TEA!
Por volta dos 9 meses de idade: o bebê parece ser “apático”, não responsivo e não comunicativo. Ou seja, não sorri ou ri de volta quando um adulto faz gracinha, não acompanha brincadeiras ou objetos mostrados por adultos e não se engaja em interações sociais;
Por volta de 1 ano de idade: as crianças com desenvolvimento típico começam a falar pelo menos “mamãe” e/ou “papai”. Bebês com TEA podem não falar nenhuma palavra, ou apenas balbuciar sons sem sentido de maneira rítmica e repetitiva;
Por volta dos 18 meses de idade: crianças típicas já imitam ações de adultos ou de crianças mais velhas. Bebês com autismo têm dificuldade de imitar ou não se engajam de modo algum nessa atividade.
Quer mais links maneiros, tem sinsinhô!
Como reconhecer os sinais precoces do TEA, no ABCMed.
Outras fontes de informação sobre os sinais do autismo, no site da Autismo Science Foundation.
Videozinho e informações sobre o diagnóstico precoce do TEA, no Autism Speaks.
O que fazer se meu filho, sobrinho, vizinho, amiguinho, etc apresenta vários desses sinais?
Olha só, a primeira coisa é procurar um pediatra ou neuropediatra e relatar o que acontece. Não se contente se o médico disser que “é assim mesmo, meninos demoram pra falar” ou “cada criança tem seu tempo” ou qualquer coisa do tipo “sua/seu mãe/pai apavorada/o, o moleque não tem nada”. Os pais que realmente fizeram diferença na vida de seus filhos com autismo são aqueles que não se contentaram com a primeira opinião e foram atrás de entender o que acontecia com suas crianças. Pode sim ser um atraso normal no desenvolvimento e desaparecer em algum tempo, mas se não for, se for TEA ou outro atraso global de desenvolvimento, o prognóstico é tanto melhor quanto mais cedo se comece o tratamento.
Também não espere ter um diagnóstico fechado para começar a procurar um tratamento. Se a criança tem problemas motores, ou não se comunica, ou não brinca de maneira adequada, um terapeuta comportamental é capaz de lidar com esses comportamento isoladamente e de maneira comprovadamente eficaz, com técnicas de intervenção individualizada. Mesmo que a criança não esteja no espectro, é melhor resolver logo o problema antes que ele comece a realmente atrapalhar a socialização típica da criança, quando ela for para a escola ou entre os amiguinhos do condomínio…
COISAS QUE A GENTE *NÃO SABE* SOBRE O AUTISMO:
Por que está aumentando o número de crianças com autismo?
Não se sabe ao certo. A estimativa do CDC americano é de que 1 em cada 68 crianças com 8 anos de idade nos EUA tem autismo. Uma das hipóteses é de que há mais diagnósticos e mais informação entre a comunidade médica e mais recursos governamentais e das seguradoras de saúde para o tratamento de pessoas no espectro, então o número tem aumentado porque há mais informação e antes várias pessoas que acabavam sendo diagnosticadas com distúrbios de linguagem ou apenas deficiência intelectual podiam ser, na verdade, autistas. Outra teoria é a da causação ambiental: o aumento do contato com substâncias tóxicas (mercúrio, chumbo, PCBs) pode estar causando a “epidemia de autismo”. Ainda outra hipótese é a de que os genes implicados no TEA são de grande herdabilidade e portanto é normal que dentro da população geral haja um aumento progressivo do TEA.
O que *CAUSA* autismo?
O autismo não tem uma única causa, e o mais provável, dentre as informações que temos hoje em dia, é que haja uma interação entre fatores genéticos, ambientais e de formação durante o desenvolvimento intra-uterino que contribuem para o quadro final de transtorno autístico. Mas ninguém sabe ainda com certeza o que causa autismo e nem porque ele acontece com algumas pessoas e não com outras…
Qual a *CURA* para o autismo?
Até o presente momento não existe *NENHUMA* terapia ou medicamento que *CURE* o autismo. Há melhoras significativas em comportamentos problemáticos com terapia comportamental e determinadas medicações apresentam evidências de funcionarem para melhorar sintomas que comumente são associados ao autismo, como ansiedade, déficit de atenção, agitação motora e epilepsia, por exemplo. Quando a intervenção é feita intensivamente desde muito cedo, pode-se prevenir que problemas comportamentais graves se instalem, e a pessoa pode ter um desenvolvimento muito acelerado quando comparado com o desenvolvimento de outras crianças com TEA que não tiveram tratamento intensivo. Mas o autismo é uma condição pervasiva e crônica durante toda a vida do indivíduo.
COISAS QUE A GENTE *JÁ SABE* SOBRE O AUTISMO:
O que *NÃO CAUSA* autismo?
1. Vacinas *NÃO CAUSAM AUTISMO*. Não há nenhuma relação comprovada entre vacinação – ou substâncias presentes nas vacinas (alô, mercúrio! estou olhando pra você…) – e autismo. Ao contrário, há uma quantidade imensa de estudos que comprovam que vacinas *NÃO CAUSAM AUTISMO* e que não há nenhuma relação entre o aumento da quantidade de crianças vacinadas e aumento do número de casos de autismo.
2. A relação entre a mãe e o bebê, por mais atribulada que seja, *NÃO CAUSA AUTISMO*. A tal da “Teoria da Mãe Geladeira” nunca foi comprovada cientificamente e não há nenhuma evidência que relacione abandono ou negligência infantil com autismo. A culpa *NÃO É DA MÃE*, por mais que alguns ignorantes por aí insistam nessas besteiras.
3 & etc… Outras teorias sem nenhuma sustentação em bases científicas são as de que o autismo pode ser causado por infecções bacterianas ou alergias alimentares. Essas teorias só serviram para enriquecer gente ávida para vender soluções e dietas mirabolantes aos pais de crianças autistas e nunca tiveram nenhuma comprovação científica de serem verdadeiras.
O que *NÃO CURA* ou *NÃO MELHORA* o autismo?
1. Terapias e métodos de tratamento sem nenhuma evidência científica como quelação, câmara hiperbárica, dietas especiais ou MMS (Miracle Mineral Supplement) são inócuos e na maioria das vezes perigosos para as pessoas que se submetem a eles. Apesar disso, há uma crescente “indústria do autismo” pronta para vender aos pais qualquer esperança de cura ou de “normalização” dos sintomas de crianças autistas.
2. Outras terapias como Integração Sensorial ou Equoterapia não apresentaram até o momento nenhuma evidência de eficácia para melhora de comportamentos problemáticos de pessoas com TEA. Há algumas indicações de que quando usadas de maneira adequada, conjuntamente ou em suporte a terapia comportamental e feitas por profissionais qualificados, elas podem ajudar a melhorar aspectos pontuais e sintomáticos do autismo, como ansiedade, coordenação motora e equilíbrio, por exemplo. Mas se usadas isoladamente e sem acompanhamento comportamental adequado, não há nenhum benefício para o quadro de TEA de forma significativa.
Quais tipos de tratamento ou terapias *MELHORAM OS COMPORTAMENTOS DO AUTISMO*?
A terapia comportamental ou Análise do Comportamento Aplicada (ABA) tem sido a terapia “de escolha” indicada pela OMS e pela maioria das agências governamentais de saúde nos EUA. Diversos estudos avaliaram diferentes técnicas usadas nos tratamentos e intervenções comportamentais e há fortes evidências de que as crianças com autismo se beneficiam mais desses tratamentos do que de qualquer outro disponível atualmente, principalmente quando o tratamento é iniciado bem cedo e quando é aplicado por profissionais capacitados. Essas terapias são baseadas no ensino de comportamentos adequados de maneira sistemática e individualizada, para cada criança a seu tempo e de acordo com seu desenvolvimento individual; e no manejo de comportamentos problemáticos usando técnicas positivas de modificação comportamental.
Muitos e muitos links!!! É uma surra de links, minha gente:
Sobre o que é ABA, no Autism Speaks.
Como funciona uma intervenção comportamental/ABA, na Revista de Autismo.
Mais ainda sobre ABA, num textinho maneiro do Caio Miguel, no site Desvendando o Autismo.
E mais UM MONTÃO de artigos CIENTÍFICOS, publicados em PERIÓDICOS RECONHECIDOS, sobre a eficácia das intervenções comportamentais:
Efficacy of applied behavior analysis in autism.
Applied behavior analysis treatment of autism: the state of the art.
Se você não viu, o primeiro post sobre autismo tem bastante informação, viu?!!
Ainda tem a última parte dessa série! Sobre pessoas autistas e whatnot! Stay tuned!!!
Precisamos falar sobre autismo… (Parte I)
O que *É* autismo?
Autismo é uma SÍNDROME COMPORTAMENTAL, quer dizer, um conjunto de comportamentos que se desenvolvem de maneira diferente, que dificultam o funcionamento “normal” da pessoa e diminuem sua qualidade de vida. No autismo, esses problemas comportamentais acontecem nas áreas de comunicação e relações sociais, e são acompanhados de padrões comportamentais estranhos, repetitivos e restritivos.
Uma pessoa com autismo pode ter sérios comprometimentos na socialização, porque não consegue se comunicar de maneira eficiente, pode apresentar dificuldades de manter contato visual com outras pessoas e ter a linguagem pouco desenvolvida. Por causa da falta de contato visual, fica difícil para as pessoas com autismo entenderem o que a gente chama de “linguagem não-verbal”: as expressões faciais, entonações e pausas, e gestos comunicativos. Por isso essas pessoas acabam tendo dificuldade de manter conversações e até mesmo de manter relações sociais profundas e duradouras, porque é difícil para os outros se comunicar com elas, e difícil para elas entenderem os outros.
Além disso, por apresentarem comportamentos considerados “estranhos”, como fixação por determinados assuntos, ou ficarem repetindo o mesmo gesto ou palavra, ou se focarem muito em um só tipo de estímulo, as pessoas com autismo acabam sendo afastadas do convívio social considerado “típico”. Esses comportamentos repetitivos restringem o tempo e a motivação das pessoas autistas para se engajar em relações sociais com as outras pessoas e diminuem as chances de que elas aprendam a se comunicar e se relacionar de maneira “aceita socialmente”.
Onde estão os links bacanas com muitas informações?
Estão aqui, abiguinha e abiguinho:
Diagnóstico, na Autismo e Realidade
Critérios diagnósticos do DSM-5, na Autism Speaks, em inglês.
A “invenção” do autismo
Eugen Bleuler (parça do Freud) foi o primeiro a usar o termo AUTISTA para descrever crianças com problemas de interação social, em 1911. A palavra “autismo” significa “fuga para dentro de si mesmo”, e tem a mesma raiz – “auto” – de autômato ou auto-estima. Mas foi em 1943 que Leo Kanner, um médico da Johns Hopkins University, publicou um artigo descrevendo 11 crianças que, segundo ele, tinham um “poderoso desejo de solidão” e “uma insistência obsessiva por monotonia persistente”. Mais ou menos na mesma época, um alemão chamado Hans Asperger descreveu o que era conhecida como “Síndrome de Asperger” em 400 meninos com alta inteligência, mas incapazes de desenvolver habilidades sociais e relações interpessoais e que apresentavam interesses obsessivos por determinados assuntos.
Até mais ou menos a década de 1960, o autismo clássico estava fortemente ligado a esquizofrenia (foi chamado de “esquizofrenia infantil” por muito tempo, a nomenclatura “autismo” só foi oficialmente introduzida no DSM em 1980), mas nessa época os médicos começaram a descrever conjuntos de comportamentos típicos do autismo e que se relacionavam com fatores hereditários. Nessa mesma época os primeiros tratamentos comportamentais que focavam em ensinar comportamentos sociais adequados e comunicação para as crianças autistas começaram a ser desenvolvidos e a demonstrar eficácia.
“Mas onde saber mais?” você me pergunta…
Fret not:
História do autismo, no site Parents e no WebMD.
O “cérebro autista”
O autismo é um Transtorno Global do Desenvolvimento porque afeta várias áreas da vida, e é pervasivo ao longo de todo o desenvolvimento da pessoa. (quer dizer, vai estar presente em todas as fases do desenvolvimento…) Mais que isso, o autismo é considerado um *ESPECTRO*, porque cada indivíduo vai desenvolver os sintomas de maneira diferente, em diversos graus, desde os mais severos até os mais moderados. Atualmente, classifica-se o autismo em 3 níveis, dependendo da quantidade de ajuda – ou “suporte” – que a pessoa com autismo necessita para viver. Algumas pessoas com autismo precisam de supervisão constante e de ajuda para todas as tarefas do dia-a-dia, enquanto outras têm apenas dificuldades de manter relações sociais ou de se comportar adequadamente em contextos diferentes.
Ninguém sabe com absoluta certeza *O QUÊ* causa o autismo. Existem fatores hereditários envolvidos, se uma família tem um criança com autismo, as chances de que outro filho também esteja “no espectro” aumentam 75 vezes. Mas isso não quer dizer que existe um “gene do autismo”. Na verdade, os pesquisadores já descobriram que 20 dos nossos 23 cromossomos têm regiões que podem estar envolvidas no autismo. Pesquisas com famílias mostraram que uma variedade de “defeitos” genéticos pode levar ao aparecimento dos sintomas do autismo, algumas pessoas estudadas tinham genes “faltando”, outras tinham genes “mutados” e outras ainda tinham genes “a mais” quando comparados com seus pais ou irmãos que não tinham o Transtorno.
Além de fatores genéticos, fatores ambientais podem ser causa, ou ao menos aumentarem as chances de que uma pessoa tenha autismo. Sabe-se que a exposição precoce a algumas substâncias tóxicas como mercúrio, chumbo e PCB (polychlorinated biphenyls, um troço usado em alguns lubrificantes) pode causar autismo em crianças pequenas. Outras pesquisas demonstraram altos níveis de testosterona pré-natal produzida pelo feto no primeiro trimestre da gravidez estão associados com a redução de habilidades sociais e com a hipersensibilidade a alguns estímulos.
Tanto os esses fatores genéticos quanto ambientais provavelmente causam autismo porque interferem no desenvolvimento típico de estruturas do cérebro como o corpo caloso (que faz a comunicação entre os dois hemisférios cerebrais), a amígdala (que regula emoções e comportamento social) e o cerebelo (envolvido no equilíbrio do corpo, coordenação e controle motor). Também é possível que estejam implicados na regulação dos neurotransmissores serotonina (que afeta emoções e comportamentos) e glutamato (que é importante para a atividade neural). Todas essas mudanças em conjunto podem explicar o aparecimento dos comportamentos típicos do Transtorno do Espectro Autista (daí que vem a sigla, TEA, que é muito usada para designar o autismo).
Recentemente alguns estudo demonstraram que os “comportamentos autísticos” podem ser efeito do aumento de conexões cerebrais – as sinapses. No desenvolvimento cerebral típico, ocorre uma “explosão” no número de sinapses do córtex na primeira infância, mas depois esse número diminui pela metade. Em crianças com autismo, essa diminuição é de apenas 16%, levando a um excesso de sinapses que atrapalham o funcionamento “normal” do cérebro.
E os link?
Mas é claro:
Informações básicas sobre o cérebro, no How Stuff Works.
Sobre autismo e hereditariedade, no The Tech.
Genética do autismo, na Autism Speaks.
Textinho da Cambridge University sobre o cérebro autista.
Pesquisa sobre depleção de genes no autismo, link para o artigo original.
Notícia da Columbia University sobre as sinapses extras.
Nas próximas postagens…
Posts sobre as características comportamentais do autismo, tipos de tratamento, e fact checking dos mitos sobre o autismo.