a culpa é dos cientistas? Em parte (II)

A segunda parte desta postagem se refere à divulgação científica propriamente dita.

A culpa é dos professores/pesquisadores que não se dedicam a esta atividade? Em parte.

Durante 3 anos (2009 – 2011) mantive um blog chamado “Química de Produtos Naturais”. Na época estava muito animado com a comunicação com estudantes e alguns poucos colegas através do blog. Lia muito, postava muito, respondia comentários, pesquisava, escrevia, entrei para o Science Blogs Brasil, além de fazer minha pesquisa, dar minhas aulas, escrever projetos, fazer análises de projetos, relatórios e artigos (revisão por pares), participar de comitês, organizar eventos, participar de ações de política científica, gerenciar os recursos do meu grupo (felizmente sem gerenciar a grana, diretamente, mas sim como gastar esta), a formação de meus alunos, interagir com os colegas, enfim, uma vida extremamente intensa.

Mas, aos poucos fui percebendo que minha atividade de divulgação científica no blog não tinha a menor importância. Muito pelo contrário. Aos poucos fui observando que não somente meus colegas liam, mas não comentavam (com poucas exceções), mas também os alunos. E mais: percebi que esta minha atividade estava virando motivo de chacota entre meus colegas acadêmicos. Um me disse “Não perco tempo lendo blogs. É totalmente inútil. Leio literatura científica.” Outro: “Faça isso, professor, que é isso o que você faz bem.” “OK”, pensei, “então paro por aqui”.

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E parei.

Poucos colegas, muito poucos mesmo, se importaram com o fato de eu ter interrompido as atividades do blog “Química de Produtos Naturais”. A maioria nem percebeu (mesmo seguindo por RSS). Apenas alguns leitores assíduos perceberam.

Desde então, nunca deixei de acompanhar os blogs do Science Blogs Brasil, e outros como o Gene Reporter, o do Simon Schwartzman, o do Roger Pielke Jr. (excelente blog sobre política científica e outros assuntos, mas que também foi interrompido), o do The Breakthrough Institute, Polimerase de Mesa, Ciência na Mídia, o blog Scielo em Perspectiva, DNA Cético, Sobrevivendo na Ciência, Ciência Prática, Seed Magazine, Maurício Tuffani e Cultura Científica. Querem saber? Acho muito legal, e aprendo muito. E acho muito bacana mesmo que existam pessoas que trabalhem com divulgação científica de diferentes maneiras.

Já conversei com diversos colegas meus de outros países, dizendo que eu tive um blog. Ficaram muito (positivamente) surpresos, e pediram que eu escrevesse em inglês. Bom, não é tão fácil assim. Mas, fiquei espantado de ver como vários destes colegas estrangeiros acharam isso interessante.

Na crise atual em que se encontra a atividade científica no Brasil, todas estratégias são válidas para minimizar os estragos. Melhorar a gestão das universidades, institutos e centros de pesquisa. Tentar mesmo fazer pesquisa de melhor qualidade (o que não quer dizer simplesmente publicar em melhores revistas, de maior fator de impacto). Investir de verdade na formação dos alunos, levando muito a sério as atividades de docência. E divulgar o que está acontecendo nas universidades, em pesquisa, ensino e extensão.

Alguns sites de universidades são indecentes, de tão ruins. Às vezes é muito difícil encontrar o endereço de e-mail de um pesquisador/professor. As informações são pífias, tanto em forma quanto em conteúdo. Buscar informações sobre pesquisas, então, nem se fale. Eu diria que mais de 95% dos professores/pesquisadores não estão nem um pouco interessados em divulgar suas atividades para os próprios colegas e possíveis candidatos a alunos ou pesquisadores, quanto mais para a sociedade.

Entre 2013 e 2014 o programa BIOTA da FAPESP (também aqui) decidiu realizar uma série de palestras sobre biodiversidade, biomas do Brasil e outros aspectos ligados à pesquisa e conhecimento desta natureza, uma iniciativa chamada BIOTA Educação (veja que legal, aqui). Foi um sucesso absoluto. O auditório da FAPESP ficou muitas vezes lotado de gente que ia assistir as palestras, muitas vezes alunos de escolas.

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Estou absolutamente convencido que a sociedade QUER saber mais sobre pesquisa. QUER mais conhecimento e mais informação científica. Mas, não basta os professores/pesquisadores se engajarem nestas atividades se estas não forem minimamente reconhecidas pelos pares. As próprias instituições tem que reconhecer tais esforços e estimular aqueles que se engajam nestas atividades. Seria MUITO LEGAL que fosse possível obter algum financiamento, mesmo pequeno, para se escrever um blog, escrever textos e livros de divulgação científica, participar de atividades culturais, fóruns de discussão sobre este assunto, etc.

Os pesquisadores, as instituições de ensino e pesquisa, os órgãos de fomento, os governos, todos falam muito do problema da educação no país, que é muito sério. Penso que, se houvesse mais divulgação científica, e esta fosse valorizada e reconhecida, a sociedade em geral iria querer se educar cada vez melhor, para entender cada vez melhor o mundo à sua volta.

Milagres não existem. Por melhores que sejam os governos, administradores, professores/pesquisadores, se não houver um trabalho conjunto para se melhorar o nível da educação e do conhecimento científico da sociedade em geral, esta mudança será muito mais lenta.

Discussão - 1 comentário

  1. Atila disse:

    Ótimo que o texto trouxe mais discussão! Acho ótimo iniciativas individuais como o blog, são sempre bem-vindas. Mas, como você mesmo disse, nem sempre elas têm muita repercussão (posso dizer isso do meu blog, raros foram os posts lidos ou compartilhados que me marcaram).

    O que realmente critico é a falta de iniciativas institucionais, como você descreve a Fapesp fazendo. Por isso mesmo nomeei a SBPC no texto, não pesquisadores individuais. Com suporte financeiro, treino e pessoal tentando, conseguiremos desenvolver iniciativas realmente populares que atendam ao público. Mas tudo isso ainda passa pelo gargalo administrativo que você citou.

    Só vi mudanças do tipo em órgãos americanos que passaram por uma mudança administrativa, como a California Academy of Sciences, que pude conhecer (e a UM de acordo com seu post anterior). Não foram mudanças tranquilas para quem estava dentro e dependeram de um pulso firme e direcionado de profissionais competentes, contratados com esta finalidade em mente.

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