A inflação em 2020

Foto: Ramiro Furquim/Sul21.

Por Ulisses Rubio Urbano da Silva.

A inflação é tema que constantemente recebe atenção da mídia e da população, sendo de grande importância para as distintas faixas de renda, pois tem repercussões no poder de consumo e também nas remunerações financeiras. Um dos índices para medir a inflação é o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). Além da importância como indicador da inflação no Brasil, o IPCA também é o indicador oficial de inflação para decisões do Banco Central sobre nível da SELIC (a taxa básica de juros da economia brasileira[1]). O IPCA relativo ao mês de dezembro de 2020 foi divulgado pelo IBGE no último dia 11. Assim, além da inflação deste mês, foi possível conhecer a inflação acumulada durante todo o ano passado. Nossa intenção aqui é fazer uma exposição sobre o IPCA de 2020 e apresentar a possibilidade de que as exportações tenham influenciado o aumento dos preços de alguns itens importantes no consumo dos brasileiros.

O IPCA mede a inflação através de uma cesta de bens que é derivada do consumo de famílias com renda entre 1 e 40 salários mínimos. Além disso, cada componente desta cesta tem peso maior ou menor para o cálculo dependendo do quanto da renda, em geral, é dedicada ao consumo deste componente. Assim, cada item da cesta de consumo contribui para a inflação na medida em que seus preços se alteram e na proporção da renda que é utilizada para seu consumo[2].

O IPCA encerrou 2020 com variação de 4,52%. Um dos subgrupos que compõem o IPCA, o que teve maior variação positiva de preços, foi o de “Alimentação e bebidas”, com variação acumulada de 12,14%[3]. Os transportes, a despeito de sua variação negativa no acumulado do ano (-0,38%), vem tendo altas constantes nos últimos meses, e é um grupo de consumo com elevado peso (19,8171%) no cálculo do IPCA, ficando atrás apenas de “Alimentação e bebidas”. Finalmente, o grupo “Habitação” teve variação positiva de 2,30% no acumulado do ano (sendo seu peso de 15,5426% em dezembro). Abaixo, apresentamos um gráfico com a variação de cada grupo ao longo do ano[4].

Quando fragmentamos o grupo “Alimentação e bebidas” em seus subgrupos, podemos perceber quais itens tiveram maior influência, considerando a inflação acumulada no ano. A “Alimentação no domicílio” contribuiu com 18,5% enquanto a “Alimentação fora do domicílio” ficou em 4,78%, ambos no acumulado do ano. Dentro do grupo de “Alimentação e bebidas”, os itens com maior aumento foram: Óleos e gorduras (61,77%); Cereais, leguminosas e oleoginosas (60,42%); Tubérculos, raízes e legumes (46,72%); Frutas (25,40%); Hortaliças e verduras (21,19%; Carnes (17,97%). Abaixo podemos visualizar o comportamento destes itens ao longo do ano.

Contudo, o peso do item “Carnes” é um dos mais elevados (2,943% em dezembro) dentre os itens do grupo “Alimentação no domicílio”. Este fato somado à tendência à elevação do preço das “Carnes” ao longo do ano (ver próxima figura) têm resultado em uma restrição do poder de consumo deste item.

Com relação ao grupo “Óleos e gorduras”, o grande impacto foi o Óleo de Soja, que teve aumento de 103,79% no acumulado do ano. Finalmente, no grupo “Cereais, leguminosas e oleaginosas”, o maior destaque foi o aumento do Arroz (70,01%) somado à importância que este item tem na cesta dos consumidores brasileiros (0,7806% em dezembro – maior peso neste grupo).

Do que temos falado até agora, podemos selecionar os itens “Carnes”, “Soja” e “Arroz” para observar o comportamento das exportações. A hipótese é de que as exportações tenham aumentado devido à desvalorização do Real (isto é, o aumento da taxa de câmbio verificado no último ano). Com o aumento da demanda externa, decorrente dessa desvalorização, os preços destes produtos se elevaram. Abaixo mostramos, no mesmo gráfico, o comportamento da taxa de câmbio e o comportamento da quantidade exportada (Kg líquido)[5].

Podemos perceber que estas  exportações acompanharam de perto a desvalorização do Real, apenas com um período de tempo de diferença para que uma variável pudesse influenciar a outra. Mas isto ocorreu apenas num primeiro momento (primeira metade do ano), pois, posteriormente, as exportações decresceram, ainda que o Real permanecesse desvalorizado comparado ao início do ano. Podemos dizer, assim, que de fato a desvalorização do Real e o consequente aumento das exportações destes itens tiveram impacto nos preços, mas apenas num primeiro momento.

[1]     Para mais informações, ver na página do Banco Central: https://www.bcb.gov.br/controleinflacao/taxaselic.

[2]     Uma explicação didática e bastante ilustrada sobre IPCA e INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) está disponível no canal do IBGE no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=JVcDZOlIMBk ; os pesos de cada item no IPCA é calculado através dos dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares). Sobre a POF o canal do IBGE também disponibiliza um vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=944F0paMei0.

[3]     Os dados referentes ao IPCA foram retirados do SIDRA/IBGE, tabela 7060. Os dados foram manipulados em planilha eletrônica usando LibreOffice Calc, e os gráficos foram gerados usando programação em linguagem Python e utilizando as funções do Pandas.

[4]     A despeito das variações de “Vestuário” e “Comunicação”, estes itens têm peso menor (4,3974% e 3,7917% em dezembro, respectivamente).

[5]     Os dados sobre as exportações foram retirados de COMEX STAT (http://comexstat.mdic.gov.br/pt/home), utilizando o filtro CUCI Item. A taxa de câmbio foi retirada de IPEA DATA (Taxa de câmbio – R$ / US$ – comercial – compra – média ), disponível em http://www.ipeadata.gov.br/.

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