Produção é só engenharia? Não, também é economia!

Fábrica de Camisetas. Fonte: Wikimedia Commons, 2010.

Por: Victor Augusto Ferraz Young

A economia é uma área das ciências humanas que estuda, em grande medida, a forma como uma sociedade se organiza para produzir e gerir a sua existência material. O estudo da economia geralmente abrange uma grande diversidade de áreas de conhecimento que, por si só, são bastante extensas, entre elas, o Pensamento Econômico, a Economia Internacional, a História Econômica, a Macro e a Microeconomia. Neste texto, buscaremos dar um exemplo de uma dessas abordagens, em especial, a da Microeconomia. Nesta, o estudo baseia-se na análise de unidades econômicas individuais como empresas e consumidores, uns em relação aos outros. Trataremos aqui de uma perspectiva de origem clássica, bastante difundida nos tradicionais manuais de introdução à economia, que se refere ao comportamento da empresa dentro de suas possibilidades e limitações físicas. Nosso foco é a questão da produção, ou seja, o processo de reunião de fatores produtivos como terra, trabalho e capital para sua transformação em bens ou serviços. Nos termos da microeconomia, terra refere-se aos recursos naturais sucessivamente transformados ao que hoje convencionou-se chamar de matérias primas. O trabalho, por seu turno, é a capacidade física e intelectual que os seres humanos podem empregar ao processo produtivo, enquanto o capital é composto por ferramentas, máquinas e elementos de infraestrutura produtivos muitas vezes necessário para a efetiva transformação de todos os fatores em bens e serviços.

A microeconomia clássica, no sentido de respaldar a força explicativa de sua teoria, exige algumas generalizações que, em tese, seriam comuns a maioria das empresas. No curto prazo, por exemplo, a firma[1] individual sempre apresentará limites para sua capacidade produtiva total. Estes limites, contudo, quase não existiriam no longo prazo. Para esta mesma firma, no curto prazo, os fatores trabalho e matérias-primas (fator terra) seriam variáveis, ou seja, não haveria falta destes enquanto a empresa deles precisasse. O fator capital (equipamento produtivo), por outro lado, não poderá ser ampliado a não ser no longo prazo. Resumindo, no curto prazo, os fatores terra e trabalho são variáveis e ilimitados, enquanto o fator capital é imutável.

Uma fábrica de camisetas

Até aqui, para aqueles que um dia já pensaram como funciona uma fábrica, até agora não há grande novidade. Talvez não exista ao seguirmos adiante. Estamos assim apenas verificando como a ciência econômica denomina e vislumbra de forma sistemática tais aspectos. Daqui para frente, nos utilizaremos de um exemplo bastante comum ao mundo real. Suponhamos a constituição de uma fábrica de camisetas de algodão. Nela, temos o galpão de produção, as mesas e máquinas de corte de tecidos e um certo conjunto de máquinas de costura. São estes os elementos que constituem o fator capital. Os operários que trabalham no galpão com as máquinas são o fator trabalho e o tecido de algodão e as linhas de costura a matéria prima são o fator terra. A dinâmica produtiva destes fatores será analisada neste texto apenas no curto prazo, isto é, para ampliarmos a produção rapidamente podemos apenas aumentar o número de trabalhadores e a quantidade de matéria prima empregada. O equipamento produtivo, por sua vez, será sempre o mesmo. Conjecturando que existe para a empresa uma demanda crescente por camisetas de algodão no verão, principalmente com o aquecimento global, o interesse desta firma é o de aumentar suas vendas, ampliando sua produção. Como ela poderá fazer isso no curto prazo? E como o empresário poderá enxergar seu limite produtivo neste mesmo período?

Para a primeira pergunta, podemos responder que basta que o empresário empregue um número maior de trabalhadores e adquira mais matéria prima. Para a segunda questão, lançaremos mão de uma análise da performance produtiva da empresa, traduzida nos números apresentados na tabela abaixo. Nela, apresentam-se cada um dos meses de produção, as máquinas disponíveis ao longo desse período, um crescente número de trabalhadores e as medidas de Produção Total, Produção Média e Produção Marginal[2].

Elaboração própria.

Para nossa análise, temos que saber que a Produção Total (q) corresponde a toda a quantidade de camisetas que é possível produzir com os fatores disponíveis em cada mês. A Produção Média (PMe) é a Produção Total (q) dividida pelo número de trabalhadores (L) e a Produção Marginal (PMg) corresponde ao que é produzido à mais por cada trabalhador que tenha acabado de ser contratado.

Para melhor compreensão, podemos descrever o cálculos desses números da seguinte maneira:

Produção Total = q

Número de trabalhadores contratados = L

Produção Médio = PMe = q / L

Produção Marginal = PMg = Δq/ΔL = (q’-q) / (L-L’)

Exemplo, considerando dados do mês 2:

PMe = 800 / 2 = 400 camisetas/trabalhador

PMg = 800 (ref. ao mês 2) – 300 (ref. ao mês 1) / 2 (ref. mês 2) – 1 (ref. mês 1) = (800-300) / (2-1) = 500 /1 = 500 , ou seja, 500 novas camisetas por cada trabalhador recém contratado.

Voltando a nossa questão, como podemos vislumbrar o limite de nossa fábrica de camisetas no curto prazo? Com estes dados em mãos, podemos ver, com base na informação da coluna de Produção Total da tabela, que a quantidade produzida atinge seu limite no mês 5. Neste mês há cinco funcionários e a produção foi de 1700 camisetas. Este limite de 1700 se manteve mesmo que um funcionário adicional fosse contratado no mês 6. O que se verifica é que o funcionário à mais não ampliou a quantidade produzida como se esperava, ou seja, a Produção Marginal foi zero. Mesmo que este fosse demitido e outro fosse colocado em seu lugar, não haveria mudança significativa. Vemos ainda, nos meses 7 e 8, que ao serem contratados mais funcionários, a Produção Total passa a cair. Por que isso acontece?

Efeito de Congestionamento e a Lei dos Rendimentos Marginais Decrescentes

Em grande medida, as restrições dadas pelo capital no curto prazo, ou seja, os limites físicos do galpão e do número de máquinas disponíveis para a fabricação de camisetas faz com que uma ampliação contínua do número de empregados e de matérias primas acabe tumultuando o processo produtivo. Isso pode ser verificado a partir do mês 6 quando a quantidade de produção estaciona para em seguida começar a cair com o aumento do número de empregados nos meses seguintes. Alguns denominam este fenômeno de Efeito de Congestionamento. Em microeconomia, a interpretação é a de que este fato se dá em função da Lei dos Rendimentos Marginais Decrescentes: “A lei dos rendimentos marginais decrescentes diz que, à medida que aumenta o uso de um insumo em incrementos iguais (mantendo-se fixos os demais insumos), acaba-se chegando a um ponto em que a produção adicional resultante decresce” (PINDYCK: 2014).

Salientamos que nosso empresário do ramo de confecções deverá estar atento para indicadores que podem mostrar as limitações de sua fábrica mesmo antes que a Produção Total passe a decrescer. Um dos sinais é o fato de que a Produção Média passa a cair logo depois do momento em que esta se iguala à Produção Marginal (ver mês 3). A partir deste ponto, mesmo que a Produção Total cresça, a tendência é a de que ela passe a caminhar para limites cada vez mais estreitos[3]. Quando a Produção Marginal atinge o valor zero, não há mais como aumentar a quantidade produzida, no curto prazo, ao agregar-se mais insumos como matéria prima e trabalhadores. É necessário, portanto, que se decida encerrar as tentativas de ampliação da produção até que, no longo prazo, se constituam novas unidades produtivas ou que novas tecnologias, em termos de processo ou de produto, sejam desenvolvidas e incorporadas. Quanto a este aspecto, podemos discutir seus impactos em uma outra oportunidade, mas, por enquanto, o que gostaríamos de afirmar é que a dinâmica econômica também pode ser analisada pelos seus aspectos individuais como é o caso deste estudo sobre uma única firma. Deixamos, de outra forma, um gráfico representativo da dinâmica produtiva para um vislumbre complementar. Até a próxima.

Elaboração própria.

[1] Este é o termo mais utilizado em Microeconomia para uma unidade produtiva do que propriamente empresa.

[2] Considera-se que a quantidade de matéria prima agregada ao processo produtivo ocorre na medida em que a produção exige, não havendo necessidade de apresenta-la numericamente. O número de equipamento de produção, 5 máquinas, é meramente ilustrativo.

[3] A queda na Produção Marginal apresenta esse fenômeno com maior clareza ao longo dos meses, pois mostra tais limites impostos a cada trabalhador novo que se junta ao processo produtivo.

Referências:

PINDYCK, Robert S. Microeconomia. Coautoria de Daniel L Rubinfeld. 8. ed. São Paulo, SP: Pearson Education do Brasil, 2014.

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