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Desinformação

Fake News ou Desinformação?

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

Iniciamos uma série de posts sobre a temática Eleição-desinformação.

O objetivo aqui não é fazer fact-checking das informações dos candidatos, até porque isso as agências de checagem já o fazem com muita competência.

O que se busca é aproveitar uma das épocas em que mais se circula a desinformação para debater com o público como ela acontece, os motivos, se dá para combater e (caso isso for possível) como?

Começamos por refletir sobre a necessidade de abandonar o termo Fake News e buscar uma boa definição para Desinformação

Fake News ficou cringe?

Nos últimos anos, o termo “fake news” se tornou onipresente. Desnecessário aqui citar os motivos, mas para quem estava em Marte nos últimos 10 anos, ele foi muito usado em algumas eleições para renomear a velha mania que os políticos têm de mentir para ganhar eleições.

Logo aparecerem uma série de estudiosos para mensurar o fenômeno e tentar entender o que estava acontecendo. Fato é que chegamos em 2024 sem aguentar ouvir o termo, que ficou “cringe”, estacionado em 2016. Ouvir “fake news” atualmente é tão constrangedor quanto ouvir seu avô dizendo que “paquerava uns brotinhos”. 

O que aconteceu com “fake news”?

A jornalista Claire Wardle, do Instituto First Draft, disse que abandonou “fake news” porque o termo se tornou inadequado para descrever a complexidade do fenômeno da desinformação e por ter sido apropriado por interesses políticos para descredibilizar informações legítimas.

Imagem 1: Captura de tela do, então presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, chama a rede estadunidense CNN de “fake news” Fonte: C-SPAN.ORG. Janeiro / 2017

E ela tem muita razão, o ex-presidente Trump é useiro e vezeiro (termo antigo também) em utilizar dessas artimanhas para descredibilizar seus críticos. Alguns políticos brasileiros também, mas não convém perder tempo com eles.

Vamos ao que interessa:

Entenda por que é hora de repensar o uso desse termo e adotar uma abordagem mais precisa.

Problemas do Uso de “Fake News”

Limitado e Enganoso:
O termo “fake news” simplifica em excesso um problema complexo. Ele não consegue abarcar a variedade de táticas de manipulação da informação que vemos hoje, desde boatos e teorias da conspiração até distorções deliberadas de fatos.

Uso Político:
Em todo o mundo, políticos têm utilizado “fake news” para desqualificar reportagens e informações que não lhes são favoráveis, mesmo quando estas são baseadas em fatos verídicos. Esse uso oportunista mina o debate público ao transformar qualquer crítica ou investigação em alvo de desconfiança.

Ataques à Imprensa:
Rotular reportagens como “fake news” tornou-se uma ferramenta para reprimir a liberdade de imprensa. Governos e figuras de poder usam o termo para desacreditar jornalistas e veículos de comunicação, criando um ambiente de desconfiança e hostilidade em relação à mídia.

O que realmente pode ser chamado de “fake news”?

“Fake news” refere-se a informações não factuais ou imprecisas que são produzidas e disseminadas no formato jornalístico, seja em plataformas digitais, impressas, radiofônicas ou televisivas (GOMES,2023, p.88). Estas imitações do padrão jornalístico buscam aproveitar-se da credibilidade da imprensa para enganar o público. No entanto, essa definição é limitada e não abrange todas as formas de desinformação que circulam atualmente.

Fake ou News?

A jornalista Ângela Pimenta sugere que se algo é “fake”, não pode ser “news” (1), pois uma notícia, por definição, deve ser verdadeira. Assim, o termo “desinformação” surge como uma alternativa mais adequada e precisa para descrever o fenômeno.

O que é Desinformação, afinal?

Todo processo intencional de influenciar o debate público e/ou amealhar vantagens, sejam elas econômicas, políticas ou de qualquer outra natureza, em favor de alguma ideia ou de um produto, utilizando para isso informações não factuais (GOMES,2023, p.88)

Por que “desinformação” é um termo mais adequado?

Abrangência:
“Desinformação” cobre uma ampla gama de práticas prejudiciais, incluindo não apenas notícias falsas, mas também boatos, meias-verdades, teorias da conspiração e manipulação de informações verdadeiras.

Precisão:
O termo “desinformação” foca no impacto da disseminação de conteúdo falso ou distorcido, destacando o potencial de engano e os danos causados ao público.

Neutralidade:
Ao utilizar “desinformação”, evitamos a conotação política carregada que “fake news” carrega, promovendo um debate mais sério e centrado nos fatos.

As definições são parte do problema da desinformação

Já discuti neste blog que os múltiplos conceitos sobre fake news são parte do problema da desinformação. Na ocasião, ao analisar oito artigos sobre o tema, destaquei que existe uma dificuldade de se chegar a um consenso sobre sua definição. 

Constatei que que 1/3 das definições de fake news incluem a “intenção de enganar”, mas apenas uma faz referência à “ausência de fatos”. A subjetividade na definição de fake news é problemática, especialmente em um cenário polarizado e influenciado pelo poder econômico das Big Techs, como observado no debate sobre o PL 2630.

Conclusão

Substituir o termo “fake news” por “desinformação” não é apenas uma questão de semântica, mas um passo crucial para melhorar o debate público e identificar corretamente aqueles que buscam manipular e contaminar o fluxo de informações. Ao adotar “desinformação”, contribuímos para um entendimento mais claro e uma resposta mais eficaz ao desafio da manipulação informativa em nossa sociedade.

Para saber mais:

  1. Essa afirmação foi feita em vídeo do curso “Como desbancar Fake News e não chamá-las mais por esse nome”, de que participei em 2018. Ângela Pimenta foi presidenta do Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo, coordenadora-executiva do Projeto Credibilidade e coordenadora do projeto Atlas da Notícia.

Outras Leituras recomendadas:

Referências

GOMES, Cesar Augusto. Letramento midiático e informacional: leitura de desinformação sobre vacinas na escola. 2023. 1 recurso online (434 p.) Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem, Campinas, SP. Disponível em: https://hdl.handle.net/20.500.12733/9148. Acesso em: 27 ago. 2024. 

WARDLE, Claire; DERAKHSHAN. Hossein. Information Disorder – Toward an interdisciplinary framework for research and policy making.Council of Europe. Estrasburgo, França. 27 out 2017.Disponível em https://rm.coe.int/information-disorder-toward-an-interdisciplinary-framework-for-researc/168076277c 

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