Espécies invasoras causam prejuízo econômico de bilhões ao Brasil, aponta pesquisa

Bemisia tabaci (mosca-branca) é uma das espécies exóticas invasoras que causam grande impacto na economia brasileira. Foto: Stephen Ausmus/Wikipedia

País gasta cerca de 3 bilhões de dólares por ano com reparação dos danos causados por espécies invasoras, mas somente 2% disso é gasto com prevenção das invasões biológicas

Por Vinícius Nunes Alves

Pesquisador da Universidade Estadual de Londrina (UEL), em parceria com pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (UFLA) e da Université Paris-Saclay (França), desenvolveram a primeira avaliação de custos econômicos para o Brasil atrelada à presença de espécies exóticas invasoras. Em geral, o estudo indica que o país gasta muito com as consequências das invasões biológicas, mas pouco com a prevenção delas. Os resultados do artigo publicado no fim de julho no periódico internacional NeoBiota trazem um importante apelo para a criação de políticas e ações de gestão que reduzam as perdas econômicas oriundas da invasão de espécies exóticas invasoras.

Atualmente, estima-se que no Brasil já existem pelo menos 1214 espécies exóticas estabelecidas, das quais 460 são reconhecidas como espécies invasoras. Estas são espécies que foram introduzidas, de forma acidental ou deliberada, em um ambiente que não é o seu de origem e, por resposta a fatores ecológicos como ausência de predadores ou outros inimigos naturais, conseguem se adaptar e proliferar sem controle ameaçando as espécies nativas e o equilíbrio dos ecossistemas. Para o estudo, os pesquisadores analisaram os custos econômicos para o Brasil de 16 espécies presentes no InvaCost (banco de dados global sobre espécies exóticas invasoras).

Para quantificar os custos econômicos da invasão biológica, J. Ricardo Pires Adelino – doutorando em Ciências Biológicas e o primeiro autor do estudo – explica que “os dados amostrados vieram de um grupo colaborativo de pesquisadores internacionais que sistematizaram as informações dos custos econômicos das espécies invasoras em escala global”. O objetivo do estudo foi gerar uma avaliação global que dimensione os custos da invasão biológica, considerando a identidade das espécies invasoras, os setores socioeconômicos impactados e as estratégias de manejo. Ricardo pondera que  “os custos podem ser gerados em diferentes estágios da invasão biológica. Em estágios iniciais, quando as populações introduzidas estão em baixa densidade, o controle ou manejo dessas populações ainda é considerado uma abordagem preventiva, pois se limita a remover o agente antes da ocorrência de impactos mais severos. Por outro lado, em estágios mais avançados os custos tendem a ser maiores devido a necessidades adicionais nas estratégias de erradicação e manejo das espécies invasoras”. Nesse segundo caso, “resta ao país gastar também com a recuperação dos danos ambientais, resultantes da presença de espécies invasoras”, completa o pesquisador.

Bancada home office com breve representação dos dados, análises e gráficos do estudo. Arquivo pessoal: Ricardo Adelino (Twitter: @RicardoAdelino_ )

Dentre as 16 espécies selecionadas para o período de 35 anos avaliado, estão insetos, plantas, moluscos, anfíbios, répteis e mamíferos que acumularam um custo econômico de cerca de 105 milhões de dólares, tanto para controlar suas populações quanto para mitigar seus impactos em diferentes setores da sociedade. Os valores variaram desde o teiú (Salvator merianae) com US$ 3,15 mil até e a mosca-branca (Bemisia tabaci) com US$ 27,69 bilhões. Ricardo comenta que “o interesse pelo tema da invasão biológica no Brasil vem aumentando nos últimos anos e alerta que mesmo com a visível limitação de informação quanto ao número de espécies invasoras, já se pode ver a dimensão do impacto econômico em que nos encontramos”.

Na saúde pública, destaca-se o mosquito do gênero Aedes spp., gênero de mosquito que transmite arboviroses como dengue, febre Chikungunya, Zika vírus e febre amarela. Na agricultura, destacam-se Bemisia tabaci (mosca-branca) e Sus scrofa (javali selvagem) que, respectivamente, transmitem doenças e danificam plantações de soja, café, tomate e outras. No meio ambiente, destacam-se Brachiaria eminii (gramínea brachiaria) e Pinus spp. (pinheiro) que reduzem a diversidade da flora nativa de savanas e florestas tropicais, além da qualidade de serviços ecossistêmicos, como ciclagem de nutrientes, fornecimento de água. 

Grupo de javalis selvagens (Sus scrofa), espécie exótica invasora. Crédito: Guilherme Willrich

“Apesar dos resultados alarmantes, nossas inferências são certamente conservadoras”, declara o autor Ricardo Adelino. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Na discussão do artigo científico, os autores ponderam que a estimativa dos custos econômicos provavelmente é conservadora, pois leva em conta apenas os dados que estão disponíveis de forma evidente na literatura. Ricardo ressalta que “as 16 espécies utilizadas no estudo correspondem aos custos que foram devidamente reportados em periódicos revisados por pares e literatura cinza (teses e dissertações não publicadas) que de alguma maneira estimam o impacto econômico dessas espécies”. Além disso, os dados disponíveis possuem significativa disparidade entre os diferentes ambientes analisados. Por exemplo, o pesquisador comenta que “apesar do monitoramento e prevenção das espécies invasoras em ambiente marinho ser listado como uma das 10 prioridades estabelecidas pelo Ministério do Meio Ambiente, não fomos capazes de estimar os custos para este ecossistema. De modo similar, apesar do vasto suporte hídrico do Brasil, os custos associados aos rios se limitam à presença do caramujo africano (Limnoperna fortunei)”. Por outo lado, para ecossistemas terrestres, “a classe dos insetos (Insecta) corresponde ao grupo taxonômico mais amostrado que, com exceção do capim-annoni (Eragrostis plana), os insetos fazem parte da lista dos cinco organismos mais custosos para o país”.  

Independente dessa disparidade, só considerando as informações já disponíveis, é razoável afirmar que a atenção dos governos e dos tomadores de decisão sobre as invasões biológicas é subestimada. Isso porque é um problema que tem custos para sociedade em geral há décadas e que está silenciosamente no cotidiano das pessoas. Por exemplo, no valor de produtos hortifruti, contas de luz e água, insumos para o Sistema Único de Saúde (SUS). A percepção popular muitas vezes não é formada, uma vez que os efeitos do impacto de uma espécie invasora precisam ser bem observados, reconhecidos e reportados.  “Há impactos que são diretos como danos em culturas agrícolas e reduções da flora nativa por espécies invasoras, mas também há impactos indiretos como a perda da qualidade dos serviços ecossistêmicos na região”, pondera Ricardo.

O planejamento do manejo deve se moldar ao estágio da invasão biológica

O impacto gerado por organismos invasores é o resultado de um processo que envolve a superação de barreiras geográficas, ambientais e ecológicas para que o organismo exótico possa estabelecer população viável no ambiente introduzido. Como pontua o pesquisador: “Apenas uma fração das espécies introduzidas apresenta sucesso em superar todas as barreiras necessárias para estabelecer uma população ecologicamente viável e gerar um impacto observável. Desta forma, quanto mais avançado é o estágio do processo de invasão biológica, mais atrelado é a interação da espécie introduzida com a biota nativa”.

Quando a invasão biológica está em estágio avançado, os esforços de manejo das espécies invasoras devem levar em consideração um planejamento que previna a ampliação do impacto ecológico e ambiental sobre o ambiente nativo. Ricardo avalia que nesse caso, “realizar o manejo das espécies após as consequências da invasão biológica é, muitas vezes, uma medida de controle efêmera e que não previne que a espécie invasora manejada ou mesmo novas espécies similares possam se reestabelecer na mesma região”.

Por outro lado, o manejo de espécies não nativas em estágios iniciais do processo invasivo permite direcionar os esforços operacionais e financeiros. O biólogo explica: “Durante os estágios iniciais da invasão biológica, a espécie ainda não necessariamente estabeleceu populações ecologicamente viáveis na região introduzida (p. ex., baixa densidade populacional)”. Dessa forma, “o planejamento do manejo da espécie no ambiente é mais simples, eficaz e com baixo custo em tecnologias, especialmente aquelas atreladas à minimização ou compensação dos impactos observados”, acrescenta.

Vinícius Nunes Alves é licenciado e bacharel em Ciências Biológicas pelo IBB/UNESP, mestre em Ecologia e Conservação de Recursos Naturais pela UFU, especialista em Jornalismo Científico pelo Labjor/UNICAMP. É Professor Escolar da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo e também atua como colunista no jornal Notícias Botucatu.

4 Comentários

  1. Fico muito feliz com seu retorno, André! E mais satisfeito ainda em saber que entrou e leu no/o artigo científico (do Ricardo e colaboradores) divulgado nesta reportagem, e que aproveitará para sua tese.

  2. oi boa tarde estou realizando uma lide com algumas perguntas

    • A que conclusão o estudo chegou?

    • Quem é o responsável pelo estudo?

    • Onde ele foi realizado?
    R:

    • Quando ele foi desenvolvido?

    • Como esse estudo foi elaborado?

    se você puder responder hoje ficaria muito grato mesmo

  3. Oi Guylherme,
    As principal conclusão é referente a dimensão dos custos, que apesar de subestimados devido a limitado acesso a esse tipo de informação, e mesmo com dados que certamente não representam o total de espécies invasoras no Brasil, sabemos que a dimensão do custo é elevada.

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