Confiança na ciência climática: um desafio global

Cientistas do Berkeley Lab, Michael Wehner e William Collins, autores do 5o Relatorio do IPCC. Foto: Roy Kaltschmidt

A confiança nos cientistas do clima é menor do que na ciência em geral, refletindo desafios políticos e comunicacionais na luta contra as mudanças climáticas.

A confiança na ciência desempenha um papel crucial na formulação de políticas e na adoção de medidas eficazes e escaláveis contra os impactos negativos das mudanças climáticas. No entanto, um estudo recente publicado na revista Science revelou que, em escala global, os cientistas do clima são menos confiáveis aos olhos do público do que os cientistas em geral. Essa lacuna de confiança, detectada em 43 dos 68 países analisados, levanta questões preocupantes sobre o impacto da percepção pública na urgência das ações climáticas.

O estudo, conduzido por Viktoria Cologna, do Collegium Helveticum/Instituto Suíço de Estudos Avançados, e sua equipe, coletou dados de quase 70.000 pessoas ao redor do mundo. Os participantes atribuíram uma nota média de 3,62 (numa escala de 1 a 5) para os cientistas em geral, enquanto os cientistas do clima receberam uma avaliação ligeiramente inferior, de 3,5. Embora a diferença pareça pequena, ela se manifesta de forma mais acentuada em determinados países. Na Bolívia, por exemplo, os cientistas foram avaliados com uma média de 3,22, enquanto os cientistas do clima receberam apenas 2,78. Em contraste, na Austrália, onde a diferença foi menor, os cientistas receberam 3,91 e os cientistas climáticos, 3,77.

No Brasil, a percepção pública segue tendências globais, mas com particularidades importantes. Os dados mostram que a confiança nos cientistas do clima é menor do que nos cientistas em geral, embora não seja extremamente baixa. No entanto, fatores políticos influenciam a forma como a população percebe a credibilidade da ciência climática. A polarização política influencia a aceitação das evidências científicas, refletindo um padrão observado em outros países. Para aumentar a confiança no Brasil, especialistas recomendam que comunicadores da ciência utilizem fontes confiáveis e diversifiquem as fontes, incluindo influenciadores e figuras públicas respeitadas.

Cientistas em Haia, na Holanda, se juntaram aos protestos climáticos globais. Foto: Romy Arroyo Fernandez, Associated Press.

Isso reforça a percepção dos pesquisadores, que sugerem que fatores políticos são determinantes no engajamento dos dados científicos. Indivíduos com crenças políticas mais conservadoras tendem a confiar menos nos cientistas do clima. Esse fenômeno decorre da dissonância entre descobertas científicas e posições ideológicas, conforme explica Edward Maibach, especialista em comunicação sobre mudanças climáticas da Universidade George Mason, nos Estados Unidos. Esse embate ideológico acaba minando a aceitação de evidências sobre o aquecimento global e suas consequências.

Nesse contexto, a estratégia de comunicação se torna fundamental. Maibach sugere que o uso de “fontes confiáveis e carismáticas”, como militares e líderes comunitários, pode ser mais eficaz para transmitir a urgência das mudanças climáticas a céticos. Além disso, a colaboração com influenciadores de mídia social pode ampliar o alcance da ciência climática, tornando-a mais acessível e engajadora para diferentes públicos.

A ciência climática enfrenta um desafio duplo: combater a crise ambiental e ganhar a confiança do público. Para alcançar esse objetivo, estratégias de comunicação mais eficazes, capazes de ultrapassar barreiras ideológicas e reforçar a credibilidade dos cientistas, são essenciais, especialmente por se tratar de uma ciência complexa, cuja linguagem e intersecções com outros campos do conhecimento não são nada triviais. Afinal, a luta contra as mudanças climáticas não pode ser vencida sem o apoio da sociedade.

Referências

COLOGNA, Viktoria et al. Trust in climate science and climate scientists: A narrative review. PLOS Climate, v. 3, n. 5, p. e0000400, 2024.

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Jaqueline Nichi é jornalista e cientista social, pesquisadora de pós-doutorado no Centro de Síntese USP Cidades Globais (IEA/USP) e doutora em Ambiente e Sociedade pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade de Campinas (NEPAM/UNICAMP). Sua área de pesquisa é centrada nas dimensões sociais e políticas das mudanças climáticas: Governança Multinível, Políticas Climáticas, Planejamento Urbano Sustentável e Cidades Inteligentes.

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