Com esta pergunta do título, você deve imediatamente imaginar que este texto irá buscar lá nas teorias de neurociência como se processam as informações, os dados e o nosso pensamento dentro da nossa cabeça, mas não é bem isso que vamos propor. Aqui, vamos focar na ideia mais filosófica do pensamento. Já parou pra pensar na forma como pensamos? No sistema de pensamento que usamos? Não?
[Primeiro, espaço para #publi… Antes de começar este texto, quero, de imediato, convidar vocês a ouvirem nossa primeira temporada do podcast Pensando com PemCie que está em todas plataformas de música e vai tratar de diferentes temas como este que coloco aqui.]
Voltando às perguntas: vamos usar um exemplo
Você está pedalando na rua (espero que do lado certo de acordo com as normas de trânsito). Então, vê ao longe que alguém está saindo da calçada e começando a atravessar na sua frente. Ao observar aquela ação, você imediatamente parte para uma decisão: vira o guidão pro lado e desvia da pessoa; ou dá uma buzinadinha para a pessoa te ver; ou dá um grito “ei”; talvez ainda, freia bruscamente bem perto da pessoa.
Em todas essas possibilidades, você usou o seu raciocínio rápido para evitar atingir aquela pessoa e agiu rapidamente com a coordenação motora dos braços, da voz, ou das mãos (para buzinar ou frear). Usamos também este “raciocínio” em situações de nosso cotidiano. Quando precisamos resolver questões, buscar soluções, etc.
Vamos utilizar a bike num outro exemplo. Digamos que você estava andando e “puf”, um dos pneus da sua bicicleta furou. Algo ocorreu, o que você faz?
Talvez, depois de esbravejar um pouco, claro (ninguém é de ferro!)… Você analisa o estrago e tenta pedalar mais um pouco, mas logo percebe que não vai rolar porque o pneu logo murcha e você está a 5 km de casa. A roda também não aguentaria girar tanto sem ele. Você não tem instrumentos de troca de pneu e muito menos uma câmera reserva. Não avista nenhuma borracharia perto. Seus familiares não tem carro para ir buscá-lo. O negócio é ligar pro parceiro que tem bike também e que poderia te acudir. Mas o cara não atendeu. A opção vai ser você caminhar empurrando a bike até em casa.
Esse é o seu (e nosso!) modo de pensar. Isto é observamos, analisamos, pensamos possibilidades, tiramos conclusões, decidimos metas e, por fim, agimos. É a este “sistema de pensamento” que eu me referia lá no início do texto. Se você reparar, sempre pensamos assim. Ou quase sempre! Às vezes, o impulso parece não ser assim racional (sei lá…, o tal do sentimento de logo beijar a garota ou o garoto não passa por essa razão, não é?).
Sistema de Pensamento
Fazendo uma análise de todas estas situações, podemos dizer que este é um sistema de pensamento. É o que o filósofo Michel Foucault tratou pelo conceito de episteme e está bem vinculado, no nosso tempo presente, ao modo como a ciência se processa, a este modo analítico trabalhado pela produção científica. A episteme é o solo positivo em que repousam os domínios de saber, é a descrição dos modos elementares de uma cultura e como ela produz seus saberes e suas práticas. Ou seja, segundo Foucault (2009, p. 126), é a episteme de cada momento histórico “que permite escolher, entre todos os enunciados possíveis, aqueles que poderão ser aceitáveis no interior, não digo de uma teoria científica, mas de um campo de cientificidade, e a respeito de que se poderá dizer: é falso, é verdadeiro”.
Complicou? Para ajudar, você pode resgatar o texto do Pedro Leal (Epistemes e alienígenas) aqui no blog. Ele traz exemplos dessa discussão também. Ou pode ler o artigo científico de PRADO (2014), que também analisou, filosoficamente, o livro.
Bom, a civilização ocidental contemporânea se desenvolveu sob a episteme moderna que contempla este nosso modo de pensar aí. E você já se perguntou se a espécie humana “sempre pensou” deste modo? Quero dizer, será que sempre tivemos este sistema de pensamento da episteme moderna? Sempre existiu esse modo de raciocínio sobre o que nos acontece e sobre as coisas do mundo? Essa pergunta é respondida em parte no livro As Palavras e as Coisas de Foucault.
Para saber mais: podcast Pensando com PEmCie
Se você quiser saber um pouco sobre as epistemes que tivemos, vou fazer uma sugestão. O nosso grupo de pesquisa aceitou o desafio de ler o livro, discutir e filosofar sobre ele, gravando podcasts de cada capítulo pra vocês. É a primeira temporada do Pensando com PemCie, que tem 12 episódios. Está nas plataformas Spotify™, Deezer™ e GooglePodcasts™.
Se vocês preferirem, podem começar pelo episódio final em que organizamos um resumo de cada um dos capítulos do livro e passamos pela episteme clássica até a constituição da moderna e suas características (acho que aqui já respondi a minha pergunta anterior, não é? Apareceu uma “episteme clássica” na jogada!). Percebemos, com essa leitura, que o modo como o ser humano entendia seu mundo e como produzia conhecimento era diferente do modo como fazemos hoje. A partir dele, você pode buscar por tema aquele episódio que mais te interessou.
O livro traz muito mais que essa discussão da episteme. É muito interessante e tem uma escrita bem densa! O autor fala desse conceito; dos discursos ao longo da história; como se fazer uma pesquisa arqueológica e em ciências humanas; da formação dos saberes da Gramática e Filologia, da História Natural e Biologia e da Análise das riquezas e Economia; da formação das Ciências Humanas – que é o objetivo principal do livro –; passando pela análise do livro de Dom Quixote, do autor espanhol Cervantes; e do quadro Las Meninas, do pintor espanhol Velásquez.
A dinâmica do podcast
Líamos um capítulo por semana e discutíamos, a partir da leitura, aquilo que nos interessava como um grupo de pesquisa em Educação em Ciências: docência, pesquisa, ciência, formação dos sujeitos, filosofia, linguagem, dia a dia, política e muito mais! Assim, venha, ouça e nos acompanhe ao longo dessa temporada! Qualquer sugestão de leitura para as próximas temporadas, críticas, ou outra informação, mande contato para pemciegrupodepesquisa@gmail.com.
Vem pensar com a gente!!
Referências que usei aqui…
FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
FOUCAULT, Michel. Sobre a História da Sexualidade. In: _____. Microfísica do Poder. São Paulo: Graal, 2009.
PRADO, T. M. DA S. Foucault, a história e a linguagem em “As palavras e as coisas”. Princípios: Revista de Filosofia (UFRN), 2014, v. 21, n. 35, p. 37-62. Disponível em: https://periodicos.ufrn.br/principios/article/view/6021.
SOUZA, Pedro Leal. Epistemes e Alienígenas. Blog PEmCie, ago 2020. Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/pemcie/2020/08/10/epistemes-e-alienigenas/
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