Laços de união e comunicação em bactérias
Post dedicado à minha querida Bê Neviani. Ela que com seus autoindutores vai agregando e agregando pessoas, fazendo surgir novos laços de amizade – dos quais eu sou muito grato. Parabéns, Bê! E obrigado!
Bactérias se comunicam?
Até pouco tempo, era comum acharmos que as bactérias eram seres que viviam isolados uns dos outros. A célula estava ali, sozinha, buscando seus nutrientes, multiplicando… Enfim, uma forma de organização extremamente simples.
Nos anos 50, decobriu-se a relação entre bioluminescência e bactérias. Nos anos 80 foram descritas moléculas denominadas autoindutores – elas estavam envolvidas no processo de bioluminescência da lula Euprymna scolopes. A bioluminescência neste molusco ocorre devido à presença da bactéria Aliivibrio fischeri (anteriormente, Vibrio fischeri) que em um órgão especial do animal. Curiosamente essas bactérias só produziam luminescência quando em grande densidade populacional, e quando em células isoladas (planctônicas), esse fenômeno não era identificado. Enfim, ficou claro que, de alguma forma, as bactérias se comunicavam.
Os princípios dessa forma de comunicação, que chamamos de quorum sensing, são simples. Veja as imagens abaixo [retiradas de Antunes (2003)].


Unidas elas podem mais!
As células bacterianas são dificilmente encontradas isoladamente (na forma planctônica) na natureza. De fato, cerca de 90% das bactérias que estão na natureza econtram-se nos chamados biofilmes. Você pode ter uma ideia clara do que é isso, passando a língua nos seus dentes (compare a textura do dente antes e após a escovação). Na nossa boca temos uma quantidade muito grande de bactérias, e a formação de biofilme nos dentes é um evento natural – são as práticas de higiene (escovação e fio-dental, por exemplo) que permitirão a retirada deste biofilme e evitarão possíveis doenças que vão de uma simples cárie a uma periodontite com perda total de dentes.
Um biofilme começa quando células isoladas aderem-se a uma determinada superfície. Aderida, a bactéria muda a expressão de diversos genes, perde os flagelos (tornando-se imóvel) e inicia a produção da matriz. Ali elas crescem rapidamente e iniciam uma comunicação com outras células adjacentes – que se aderem à matriz, aumentando o biofilme (Veja a figura abaixo, retirada do Microbiologia de Brock).
Quer outros exemplos? Claro!
O primeiro é o “Río Tinto” na Espanha.

[Eu já havia comentado sobre esse processo de obtenção de energia a partir de oxirredução de minerais no post “Dê-me pedras… eu faço um banquete”. Relembre clicando AQUI]
O segundo exemplo, é a bactéria oportunista Pseudomonas aeruginosa, que é capaz de formar biofilme nos alvéolos pulmonares de indivíduos com fibrose cística, provocando sintomas de pneumonia.
E por que essa estratégia é tão comum entre as bactérias? Podemos citar algumas razões:
- Biofilmes funcionam como um sistema de autodefesa. Resistem à forças físicas que poderiam remover células isoladas; além de escapar da fagocitose pelas células de defesa do corpo e dificultar a penetração de moléculas tóxicas, como antibióticos. Podemos ter uma ideia da importância clínica dos biofilmes quando vemos dados como este: um biofilme pode tolerar concentrações de antibióticos de 10 a 1000 vezes maiores que a necessária para matar bactérias planctônicas.
- Biofilmes permitem que células permaneçam em um nicho favorável, ou permite que as bactérias cresçam em locais relativamente inóspitos: seja um tecido animal, uma superfície de rio, rochas, ou mesmo lentes de contato, sondas urinárias e outros aparelhos hospitalares.
- Biofilmes permitem uma estreita associação entre células bacterianas. Tanto há o favorecimento do quorum sensing e da sobrevivência, como a proximidade entre as células favorece o intercâmbio de material genético intra- e interespecífico (biofilmes podem ser formados por uma única espécie ou por espécies diferentes).
Concluindo…
Como já diziam no passado…
– “Quem não comunica se trumbica” (Chacrinha)
– “A união faz a força” (origem indeterminada)
Fontes consultadas
Antunes LCM (2003) A Linguagem das Bactérias. Ciência Hoje, 33(193).
Kaper J, Sperandio V (2005) Bacterial Cell-to-Cell Signaling in the Gastrointestinal Tract. Infection and Immunity 73(6), 3197-3209 DOI: 10.1128/IAI.73.6.3197-3209.2005
Madigan MT, Martinko JM, Dunlap PV, Clark DP (2010) Microbiologia de Brock. 12 ed. Porto Alegre: Artmed.
Mohamed J, Huang D (2007) Biofilm formation by enterococci. Journal of Medical Microbiology 56(12), 1581-1588 DOI: 10.1099/jmm.0.47331-0
Chacrinha era mesmo um filósofo!!! "Quem não se comunica se trumbica!"
Parabéns pelo belo post, Samir!
=D Obrigado, Si!
Que post lindo! 🙂
thanks, Bê!
Adorei! Vou roubar essa super explicação dos biofilmes pra minha aula sobre bactérias em breve, posso? Vou falar pra turma ler teu post!
A propósito, porque esse post não está no Research Blogging, heim?
Beijão,
Tati
o/ Poxa, Tati, vai ser um motivo de orgulho pra mim. Você primeiro infla meu ego pra depois puxar a orelha, né? Mas tudo bem. Pois é... Sobre o RB eu fiquei na dúvida se se encaixava ou não. Foi uma falha... Mas agora já foi. De qq forma, agradeço o elogio e ficarei aguardando um feedback do pessoal. Bjo!
Adorei, vou roubar umas partes para meu trabalho sobre biofilmes...Parabéns viu.
To estudando o assunto para um seminario. Tuas idéias me ajudaram bastante. vlw!
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