SUPERORGANISMO: acredite, você é! – 3 de 3

PARTE 3
Microrganismos patogênicos, isso existe mesmo?

Leia a parte 1 AQUI.

Leia a parte 2 AQUI.

ResearchBlogging.org

Terminei o tópico anterior comentando sobre a tolerância do sistema imune à microbiota e sua intolerância a patógenos e levantando a questão: O que poderíamos definir como sendo um microrganismo patogênico?

Recentemente surgiu uma tendência em classificar um patógeno não apenas baseado em suas estruturas, mas também em relação a seu comportamento, afinal muitas das estruturas apresentadas pelos ditos patógenos também são encontradas nas bactérias ditas comensais/mutualísticas. Assim, podemos dizer que, teoricamente, qualquer microrganismo pode, em determinado momento, apresentar um comportamento patogênico. Dessa forma, passamos a ver que um microrganismo patogênico não é patogênico per see, e que a patogenicidade é determinada pela interação com o hospedeiro (Fig.1).

Fig. 1 – Mostramos aqui um modelo contínuo que questiona os modelos duais estabelecidos baseados no próprio X não-próprio ou patológico X fisiológico. Aqui se fala em um continuum de respostas que são geradas de acordo com a interação entre o microrganismo e seu hospedeiro – ou seja, um microrganismo de comportamento tido como mutualístico, em um determinada condição pode tornar-se patogênico – e o oposto também é verdadeiro. Neste modelo, a resposta inflamatória desencadeada numa condição patológica passa a ser vista também como algo benéfico, pois atua com a finalidade de manter a homeostase.

Podemos citar como “padrões de patogênese” (em inglês, POP): a capacidade de crescimento no hospedeiro após a invasão do hospedeiro, a capacidade do patógeno em invadir a célula do hospedeiro e alteração da função normal do citoesqueleto da célula do hospedeiro

Assim, juntando o conceito de POP, com os conceitos de padrões moleculares de patógenos e os receptores capazes de reconhecê-los – que foram introduzidos no primeiro post – podemos, por exemplo, traçar uma explicação para a presença de receptores TLR-5 apenas nas membranas basolaterais das células epiteliais intestinais (Fig.2).

Fig. 2 – Os receptores TLR-5 (em verde) são capazes de reconhecer a flagelina – proteína constituinte dos flagelos bacterianos – e assim desencadear uma série de respostas que levam a ativação do sistema imune. Observe em que tanto bactérias simbiônticas (brancas) como as bactérias patogênicas (vermelhas) podem apresentar flagelo e, portanto, flagelina. Na condição (A) temos que os TLR-5 estão presentes no ápice das células epiteliais intestinais. Em (B) retratamos uma condição mais próxima à real, onde esses receptores estão localizados na membrana baso-lateral das células do epitélio intestinal. Observe que, nesse desenho temo uma bactéria que foi capaz de atravessar a camada epitelial, chegando ao tecido conjuntivo. Essa localização permite que as bactérias simbiônticas não desencadeiem uma resposta imune, e que apenas bacterias que apresentem um comportamento invasivo/patogênico sejam reconhecidas.

Temos assim, que o sistema imune nos protege contra a invasão microbiana. Mas há imprecisão em afirmamos que ele nos protege de patógenos.

Ficou confuso?

A partir do momento que consideramos a capacidade de membros da própria microbiota como capazes de apresentarem um “mau-comportamento”, podemos dizer que eles violam a contenção estabelecida – ou seja, há uma quebra na homeostase e esse microrganismo deve ser eliminado. É importante ressaltar que a contenção microbiana é feita via um quadro de inflamação fisiológica que apresenta características distintas da imunidade pró-inflamatória desencadeada contra “patógenos”. Assim, seja patógeno ou não, o microrganismo invasor deve ser contido!

CONCLUINDO…

A proposta do superorganismo engloba a associação do hospedeiro à sua microbiota. Assim surge uma nova perspectiva do conceito do que é “próprio” ao organismo e do corportamento da microbiota. A homeostase deve ser mantida – e isso é feito com a ajuda do sistema imune – que mais do que proteger contra patógenos, tem como função manter a microbiota no seu nicho e reestabelecer o equilibro quando ele é rompido.

REFERÊNCIA

Eberl, G. (2010). A new vision of immunity: homeostasis of the superorganism Mucosal Immunology, 3 (5), 450-460 DOI: 10.1038/mi.2010.20

3 thoughts on “SUPERORGANISMO: acredite, você é! – 3 de 3

    • 21 de novembro de 2011 em 21:27
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      Vinicius, obrigado pelo comentário! A gente discutiu esse artigo numa aula da pós e essa questão da microbiota e superorganismo são tão fortes que hoje tem pesquisadores que consideram a microbiota como um órgão do corpo humano... Só pra se ter uma idéia, a microbiota influencia na maturação de diversos órgãos, inclusive influencia o sistema nervoso.

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      • 22 de novembro de 2011 em 16:24
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        Era o que faltava para então a gente cair na real e entendermos que hoje só estamos aqui porque os micros permitem, somos grandes depositórios e sacos protetores pensantes.
        Grande abraço

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