Os tempos estão mudando

O que os pesquisadores acham de seus artigos científicos estarem completamente disponíveis, de graça, na web depois de 1 ano de publicação?

Se você, pesquisador, ainda não tem opinião formada a este respeito… é bom saber que isso pode acontecer, muito em breve.

Segundo editorial da revista Science desta sexta feira, dia 22/01/2009, na semana passada foi realizada uma mesa-redonda intitulada “Mesa-Redonda do Comitê Norte-Americano de Ciência e Tecnologia em Publicações Científicas” (U.S. House Science and Technology Comittee’s Roundtable on Scholarly Publishing). Como resultado, foi disponibilizado um relatório no qual se apresentam decisões que artigos de revistas científicas financiados com fundos federais norte-americanos deverão se tornar públicos e de acesso livre o mais rapidamente possível – em um ano ou menos após sua publicação. O objetivo desta iniciativa seria melhorar o acesso ao conhecimento científico por parte da sociedade em geral, bem como de se estabelecer relações entre os trabalhos científicos publicados, da maneira mais ampla possível. Embora não tenha havido consenso qual versão dos trabalhos científicos seria disponibilizada, como tendência se observou que seria a forma definitiva dos mesmos, tal como publicada nas revistas científicas.

Atualmente muito se especula sobre os caminhos a serem seguidos pelas publicações científicas. O relativamente recente surgimento do “acesso aberto” (open access) de várias revistas (pagas; mas nem todas) está ganhando importância, porém o preço a se pagar para se publicar em algumas destas revistas pode ser proibitivo. Sendo assim, o relatório apresentado discute vários aspectos relacionados à disponibilização de informações científicas de maneira irrestrita, sem que existam diretrizes específicas. Mas enfatiza a importância crescente de uma criteriosa revisão-por-pares (peer review), da participação de proprietários de empresas editoriais de publicação científica (stakeholders – é isso mesmo?), bem como de uma contínua inovação deste processo.

De maneira a que estas mudanças sejam efetivas, será necessário um processo extremamente colaborativo e flexível por todas as partes envolvidas. Em particular as agências de fomento norte-americanas deverão estimular a disponibilização das publicações científicas, de preferência nos próprios sites das revistas, em vez de se criar um repositório onde todas estas publicações estariam centralizadas. A elaboração de um sistema desta natureza envolveria pesquisadores, editores, bibliotecários, administradores de universidades e, obviamente, o público em geral. Deverá ser criado um sistema que proporcione um sistema eficaz de busca de informações bibliográficas, de maneira a que estas possam ser utilizadas de maneira mais eficaz e gerar conhecimento.

Os signatários do editorial da Science – Paul N. Courant, James J. O’Donnell, Ann Okerson e Crispin B. Taylor – se mostraram particularmente otimistas em vista de tais mudanças.

É isso. Os tempos estão mudando. A disponibilização do conhecimento científico de forma irrestrita pode trazer mudanças radicais à sociedade em geral. Seria de se prever que o aumento do nível geral de informação e de educação da sociedade como um todo levasse à total derrocada de crenças obscurantistas e totalmente infundadas, como o criacionismo por exemplo.

Não li o relatório resultante do encontro da mesa-redonda. Mas este pode ser acessado livremente aqui.

A referência do editorial da Science é:ResearchBlogging.org
Courant, P., O’Donnell, J., Okerson, A., & Taylor, C. (2010). Improving Access to Research Science, 327 (5964), 393-393 DOI: 10.1126/science.1186933

Discussão - 11 comentários

  1. A medida sem dúvida é alvissareira, mas não partilho do otimismo em relação à derrota do criacionismo.
    Qto ao stakeholder, é uma palavra difícil de se traduzir. Ela envolve todos os que estão decisivamente envolvidos no sucesso de um empreendimento - inclui os investidores (proprietários ou não), no caso de revista, os editores tb.
    []s,
    Roberto Takata

  2. Tati Nahas disse:

    Acho essa uma excelente notícia!!! Que bom que estejam pensando em como resolver o montante muitas vezes proibitivo que o pesquisador tem que pagar para publicar em periódico aberto. Porque resolvido esse entrave, acredito que todos tenham a ganhar em um mundo open access.

  3. Marcelo Hermes disse:

    A ideia é ótima, bem "obamista". Mas eu queria saber se vai ser o povo americano é que vai pagar a conta. Não existe almoço gratis !
    Meus dois centavos nessa discussão

  4. Roberto disse:

    Pô, só dois centavos?
    Roberto

  5. Roberto disse:

    Oi Takata,
    Gostei do "alvissareira". Chique.
    Obrigado quanto aos esclarecimentos sobre o significado de "stakeholder". Difícil de traduzir.
    abraço,
    Roberto

  6. André disse:

    Long time ago, a ciência era restrita a intelectuais, e a massa trabalhadora não sabia nada de nada. A Royal Institutions na Inglaterra tinha sido criada para levar saber e conhecimento ao Zé Povinho. Só que ralando cerca de 80h semanais, num regime semi-0escravoi, era difícil alguém se interessar por ciência. Daí, temos a alienação.
    A Plos One, apesar das críticas que lhe dirigem, dá acesso aberto e irrestrito. O cientista paga 2 mil doletas para publicar, mas e daí? 2 mil dólares "lá", não é tanto. E o conhecimento está de livre acesso a qq um. Não podemos permitir que o conhecimento fique restrito só a cientistas (mediante assinatura das publicações, óbvio); senão, isso não é conhecimento, que em latim se escreve Scientia.

  7. Roberto disse:

    Concordo plenamente que a ciência deve estar disponível para todos aqueles que quiserem conhecê-la e explorá-la.
    Só que não são todos os cientistas que podem pagar 2 mil dólares para publicar um artigo na PLOS One, isso eu garanto. Mesmo que seu artigo tenha mérito para tal. Mas, como o MHL disse (http://scienceblogs.com.br/quimicaviva/2009/12/sobre_twitter_facebook_e_acess.php#comment-2222380), isso não é problema 🙂

  8. Sibele disse:

    Não é de se espantar que todo esse impasse sobre como, quando e onde disponibilizar em acesso aberto a produção de cientistas se dê num país como os EUA, tão cioso de seu "Estado Mínimo". Tanto que a reforma na saúde proposta por Obama, tema necessário e urgente por lá, enfrenta séria oposição, adivinhem de quem (oposicionistas com cacife para um poderoso lobby e muito bem representados no Senado americano, diga-se de passagem).
    Talvez o maior problema, nesse caso das publicações científicas, seja o excessivo liberalismo dos tais "stakeholders". E concordo que o termo é mesmo de difícil tradução. Mas acrescento mais uma à já bem completa explanação do termo pelo nosso Takata: "atravessadores".
    Ah sim, e também, como ele, não partilho do mesmo otimismo polianesco quanto à hipotética derrocada do criacionismo. O buraco é (bem) mais embaixo, chegando mesmo a ser um buraco negro.

  9. Karine disse:

    A decisão reflete bem as novas tendências da disseminação da informação e faz jus aos investimentos federais na produção do conhecimento.
    Apenas lamento o comentário final sobre o criacionismo. Não há como informar e educar a sociedade taxando de crenças obscurantistas e totalmente infundadas qualquer linha de pensamento. Se faz necessário sim, que haja o debate e respeito as divergências que permeiam as mais diversas linhas de produção do pensar humano.

  10. Roberto disse:

    Oi Karine,
    Antes de mais nada, obrigado por seu comentário.
    O problema é que o criacionismo não é exatamente uma linha de pensamento, se o considerarmos em um contexto de disseminação de informação científica, como é o caso desta postagem. Neste caso, de disseminação de informação científica, o criacionismo situa-se completamente fora de contexto, por não constituir informação de natureza científica e sim de crença.
    As divergências de idéias devem ser discutidas - no que concordo absolutamente com você - porém o âmbito de discussão deve ser definido. De outra forma, não se chega a lugar algum.
    Tudo de bom.
    Roberto

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