Brasilianização do mundo e precarização do trabalho

Por: Leonardo Dias Nunes

Introdução

Neste artigo, de acordo com a obra A fratura brasileira do mundo: visões do laboratório brasileiro da mundialização [1], apresentamos de forma sucinta a noção de brasilianização do mundo e sua relação com a precarização das condições de trabalho no capitalismo contemporâneo. Para tanto, dividimos o artigo em duas seções. Na primeira parte, apresentamos a noção de brasilianização do mundo. Na segunda parte, apresentamos o fenômeno da precarização do trabalho enquanto uma das consequências da brasilianização do mundo. Nas considerações finais, consolidamos a relação proposta no artigo e apontamos para a atualidade da obra de Paulo Arantes.

Brasilianização do mundo

A obra A fratura brasileira do mundo: visões do laboratório brasileiro da mundialização, escrita por Paulo Arantes e publicada em 2001, recebeu nova edição neste ano de 2023. A obra é composta por um conjunto de ensaios e, em suas três partes, o autor nos convida a refletir sobre a impossibilidade de superação do subdesenvolvimento e sobre a nova clivagem social existente no capitalismo contemporâneo.

Como apresentamos em dois artigos anteriores, na década de 1970, os processos de mundialização do capital e de transnacionalização da classe capitalista trouxeram modificações radicais no funcionamento do sistema capitalista. Uma das consequências dessa nova conjuntura foi a morte do mito de que a sociedade brasileira estava condenada ao progresso.

Paulo Arantes argumenta que a destruição desse mito criou em parte da intelectualidade brasileira um sentimento de frustração, pois os seus integrantes eram os técnicos que planejavam e geriam o caminho para o progresso.

Na segunda parte do ensaio, Paulo Arantes apresenta a noção de brasilianização do mundo. Para o autor, diante da impossibilidade de difusão do progresso, a atual fase do capitalismo criou uma sociedade em que a) a desigualdade social é tão grande que se assemelha à sociedade de castas; b) há uma dimensão horizontal da guerra de classes na qual o ressentimento é um importante ingrediente; c) os detentores da riqueza vivem entrincheirados.

Tais características são a expressão do divórcio ocorrido entre a economia política do livre mercado e a economia moral da civilização burguesa. Elas são mais evidentes nas metrópoles, local onde a simbiose entre riqueza e pobreza se apresenta em cada esquina, em cada viaduto, em cada semáforo. Nesses pontos observamos com facilidade os contrastes de uma cidade cindida [2].

Precarização do trabalho

Na terceira parte do ensaio, Paulo Arantes menciona obras de literatura e de cinema para apreender uma característica marcante da sociedade brasileira, qual seja, por aqui a norma é frouxa e, por isso, a infração é feita sem remorso. Tal apreensão foi realizada por meio de cenas selecionadas do filme Cronicamente inviável e do livro Cidade de Deus que mostram a convivência cotidiana entre o legal e o ilegal, entre a ordem e a desordem.

A norma frouxa existente nas relações de trabalho criou um trabalhador totalmente flexível que atualmente se difunde para todas as partes do mundo. Na conjuntura histórica em que os postos de trabalho são concentrados nas atividades de trabalhadoras domésticas, motoristas de aplicativo, coaches e freelancers das mais diferentes atividades, a sociedade brasileira se destaca por saber gerir desigualdades e por exportar esse know-how para o mundo. Como sabemos, na economia brasileira há sinal verde para a precarização do trabalho.

Considerações finais

O artigo apresentou o argumento de Paulo Arantes de que a precarização do trabalho é um destacado aspecto do processo de brasilianização do mundo. Ressaltamos que a relação entre a brasilianização do mundo e a precarização do trabalho apresentada nesse artigo foi publicada pela primeira vez em 2001. Quando se iniciava o século XXI, antes mesmo de acontecimentos turbulentos que marcaram esse período no Brasil, o autor já apontava para características estruturais da sociedade brasileira difíceis de serem transformadas e para a difusão delas para outras partes do mundo. Por essa razão, e também por outras que não foram apontadas nesse sucinto artigo, a obra A fratura brasileira do mundo: visões do laboratório brasileiro da mundialização oferece uma profunda reflexão para pensarmos o atual mundo dual, de acentuada desigualdade e violência. Portanto, o mundo da brasilianização.

* A foto que ilustra este artigo é do fotógrafo Johnny Miller, encontra-se no site unequalscenes.com e mostra a vista aérea do Jurujuba Iate Clube e de uma tradicional colônia de pescadores na cidade de Niterói.

Notas

[1] ARANTES, Paulo Eduardo. A fratura brasileira do mundo: visões do laboratório brasileiro da mundialização. São Paulo: Editora 34, 2023. A versão eletrônica dessa obra pode ser encontrada aqui. Uma resenha dessa obra pode ser lida aqui.

[2] Sugerimos que a leitora e o leitor desse artigo visitem ao site https://unequalscenes.com/projects, organizado pelo fotógrafo Johnny Miller cujo objetivo é mostrar através de fotos aéreas as linhas de desigualdade inscritas pelo homem em diferentes cidades do mundo.

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