Em Janeiro de 2020 defendi meu mestrado em Divulgação Científica e Cultural pelo Labjor-Unicamp (A dissertação pode ser conferida aqui) e por essa dissertação se tratar de divulgação científica a partir desse canal de blogs de ciência, resolvi colocar os desafios de estudar esse tema. No primeiro post dessa série falo sobre a pluralidade do conceito da própria divulgação científica…
Divulgação Científica e sua pluralidade
Em um primeiro momento podemos responder que a divulgação científica é falar sobre ciência de forma que as pessoas entendam, contudo desde as comunicações orais feita pelos cientistas, aos primeiros artigos em jornais sobre ciência produzidas por jornalistas, até os canais de mídia interativa, a definição de divulgação científica vem sofrendo reformulações a partir da evolução da comunicação, da ciência e da tecnológica.
Na minha busca sobre a definição da divulgação científica, o primeiro passo que escolhi dar foi uma olhadinha no que o dicionário e a Wikipedia[1] tinham a dizer:
No Dicionário Dicio[2], ‘divulgação’ significa “Ação de divulgar, de tornar público, de difundir e propagar alguma coisa; propagação, difusão”, e ‘científica’ “é o feminino de científico. Relativo à ciência: interesse científico. Em que se mostra ciência”.
Já no Wikipédia[3], podemos encontrar divulgação científica como: “também conhecida como popularização da ciência, são as atividades que buscam fazer uma difusão do conhecimento científico para públicos não especializados”.
Confundiu, né?
Para ajudar, sugiro dar uma olhadinha nesse post do Roberto Takata em seu blog Gene Repórter, falando sobre as diferenças de comunicação, propagação, difusão, entre outros.
Mas é claro, que como mestranda, precisei de mais informações, então fui conferir o que os autores tinham a dizer sobre o assunto, uma vez que a essa altura a confusão já havia se instalado.
Então vamos lá, comecemos em 1984 com Bueno 🙂
- Bueno (1984, p.19) definiu a divulgação científica como um processo de recodificação, que deve ter como objetivo tornar compreensível e descomplicado o conhecimento científico ao público, utilizando-se de transposição de uma linguagem especializada para uma linguagem não especializada.
- Mora (2003, p. 99) apresentou a importância de combinar conhecimento científico com sensibilidade e imaginação, de forma a despertar o interesse do público. Em sua visão, o conhecimento científico não deve somente ser entregue à sociedade, mas deve despertar o prazer e o interesse independente do tema, uma vez que “conhecimento é partilhado, e não comunicado”.
- Dias et al. (2013) e Camargo (2015) comentam sobre a divulgação científica ir além de recodificar e transmitir a informação de forma atrativa, também é preciso que essa seja realizada a partir de um planejamento, para que a informação não se restrinja a mídias impressas, mas contemple canais audiovisuais, mídias interativas e sociais. O divulgador científico deve preocupar-se em desenvolver materiais e suportes acessíveis à sociedade como um todo.
- Caldas e Zanvettor (2014 p. 5) acrescenta que não se trata apenas de divulgar a produção da ciência, mas de possibilitar a apreensão desse conhecimento, para que o público em geral possa não apenas compreender seus processos, mas também participar de decisões sobre temas de interesse da sociedade.
- Silva (2015) pontua que a divulgação científica deve, inclusive, servir como instrumento da formação de cultura científica e ensino não formal; deve dialogar com a sociedade sobre assuntos que antes eram de nicho específico, propiciar a aproximação com as universidades, incentivar a discussão sobre ciência e tecnologia, além do estímulo à autonomia e ao aprendizado.
- Bessa (2015 p.15), a divulgação científica é tornar a ciência de domínio público, ou seja, trata-se de ações, estratégias e tarefas realizadas por profissionais de comunicação e cientistas com o objetivo de informar a sociedade sobre o que é produzido pela ciência. Entretanto, para que essa divulgação científica de fato chegue ao seu destino, é fundamental que o conhecimento científico saia do ambiente acadêmico e comece a circular em ambientes acessíveis à sociedade, ou seja, estar mais próximo do cotidiano da mesma.
- Andreetto de Muzio (2019 p.1) ressalta a importância de da divulgação científica não ser uma transferência de conhecimento unidirecional, mas um exercício de diálogo que possibilite a troca de saberes e a transformação da realidade.
Observe que essa pequena revisão bibliográfica não contempla todos os anos de estudos e análises sobre o conceito de divulgação científica, mas serve para dar uma ideia da extensão do assunto e os principais pontos que foi preciso se preocupar para realizar essa atividade…
Portanto…
Para que um conteúdo ou canal seja considerado divulgação científica é preciso responder sim para as seguintes perguntas:
- Seu conteúdo está sendo produzido de forma clara, compreensível e descomplicada, mas sem perder a sua ética e embasamento?
- O conteúdo é científico e produzido por profissionais especialistas sobre o assunto tratado ou por profissionais de comunicação?
- O conteúdo foi planejado e disseminado de forma a atrair a atenção do público e contempla mídias que saia de seu nicho específico?
- O conteúdo circula em ambientes acessíveis a sociedade?
- O conteúdo possibilita a apreensão do conhecimento e instrumentaliza o cidadão em suas tomadas de decisão?
- O divulgador científico dialoga com o consumidor do conteúdo?
Por fim… Devo insistir sobre a importância do diálogo na divulgação científica.
Durante esses anos cuidando da comunicação do Blogs de Ciência da Unicamp pude notar a diferença entre só produzir o conteúdo e dialogar com o público que chega até você.
Responder suas perguntas, dar retorno dos seus comentários e encaminhar material de apoio aproxima o público e pode fazer toda a diferença para alguém que está buscando saber mais sobre ciência.
Quer um exemplo? Visite o blog da casa Fêmur Distal , o Dr. Alessandro Zorzi responde todas as dúvidas e comentários que recebe e a maioria delas são de pessoas de fora do ambiente acadêmico procurando informações sobre saúde e tratamentos ortopédicos.
Tá, mas… E os HATERS ou comentários ofensivos?
Quando o comentário não contribui com o diálogo e só tem como objetivo ofender ou disseminar fake news, optamos por fazemos assim.
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[1] Se você tem problemas com a Wikipedia dá uma olhadinha aqui: https://www.blogs.unicamp.br/apedra/2016/06/30/vamos-falar-serio-sobre-wikipedia/
[2]Disponível em: https://www.dicio.com.br/pesquisa.php?q=divulga%E7%E3o+cient%EDfica. Acesso em 12/04/2019.
[3]Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Divulga%C3%A7%C3%A3o_cient%C3%ADfica. Acesso em 12/04/2019.
Referências:
ANDREETTO DE MUZIO, Paulo. A importância da divulgação científica para a proteção das áreas naturais. [S. l.], 1 jul. 2019. Disponível em: https://www.infraestruturameioambiente.sp.gov.br/educacaoambiental/2019/07/01/a-importancia-da-divulgacao-cientifica-para-a-protecao-das-areas-naturais/. Acesso em: 13 jul. 2019.
BESSA, Eduardo. O que é divulgação científica? In: ARNT, Ana de Medeiros; FRANÇA, Cecília; BESSA, Eduardo. Divulgação científica e redação para professores. [S. l.]: Tangará da Serra: Ideias, 2015.
BUENO, W. da C. 1984. 365f. Jornalismo Científico no Brasil: os compromissos de uma prática dependente. Tese de Doutorado. ECA/USP, São Paulo, 1984.
CALDAS, Graça; ZANVETTOR, Kátia. O estado da arte da pesquisa em divulgação científica no Brasil: apontamentos iniciais. Ação Midiática–Estudos em Comunicação, Sociedade e Cultura., v. 1, n. 7, 2014.
CAMARGO, Vera Regina Toledo. Dialogando com a ciência: ações, atuações e perspectivas na divulgação científica e cultural. Comunicação & Sociedade, v. 37, n. 3, p. 43-71, 2015
DIAS, Camila Delmondes et al. Divulgando a arqueologia: comunicando o conhecimento para a sociedade. Ciência e Cultura, v. 65, n. 2, p. 48-52, 2013.
MORA, A. M. S. A divulgação da ciência como literatura. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003.
SILVA, Ricardo., GARCIA, André; AMARAL, Sérgio. Desenvolvimento de um modelo potencializador para a utilização de blogs como meio de educação não formal e divulgação científica. XIII Congresso Internacional de Tecnologia na Educação, São Paulo, 2015.
Como divulgar informações de prevenção do Covid-19 se a língua de seu país não é a sua? | Coronavírus (COVID-19) | Especial Blogs de Ciências da Unicamp
[…] do ideal de que a divulgação científica, principalmente neste momento da pandemia do Covid-19, deve chegar a TODOS, responda com […]
Erica Mariosa
Obrigada pelo comentário, sem dúvida a informação precisa chegar a todos.
Vinícius Nunes Alves
Uma postagem sucinta e simples, com boa fundamentação do que é DC e do que é um veículo de DC. Gostei da diferença entre só produzir a DC X produzir e dialogar sobre ela. De fato, a maioria só deve publicar e "esquecer" que a postagem está lá, aberta ao amplo público que pode comentar, ter dúvidas... O Paulo no blog Natureza Crítica também responde todos os comentários na página original blog e na página do blog no facebook.
Erica Mariosa
Vinícius muito obrigada pela leitura e pelo comentário.
O Natureza Crítica é um exemplo de bom diálogo, sem dúvida!
vivian battaini
Olá Érica. Meu nome é Vivian Battaini e sou professora da Universidade do Estado do Amazonas. Estou dando um curso junto com duas outras professoras chamado: Educação científica em meio à pandemia. Nele estamos focando na educação e divulgação científica no contexto escolar. O curso é voltado para estudantes de licenciatura da UEA e professores de Manaus. Os encontros são as quartas feiras. Seria muito interessante ouvir um pouco uma especialista, como você. O que acha de participar de uma aula conosco? Desde já agradeço
Paloma Maroni Martins
Erica, gratidão por todo o conteúdo!!! Desejo iniciar um trabalho de Divulgação Científica dentro das Terapias Integrativas e Complementares e o que li até aqui foi extremamente agregador!!!
Erica Mariosa Carneiro
Obrigada por nos visitar.
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