Lançado hoje, 09/08, o 6º relatório do Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC) mostra que secas e queda da produção agrícola são problemas que o Brasil terá que enfrentar em pouco tempo
A Terra está esquentando mais rápido do que era previsto e se prepara para atingir 1,5ºC acima do nível pré-industrial dez anos antes do que seria esperado. Eventos climáticos extremos serão mais frequentes. Enchentes, incêndios florestais, aumento do nível do mar e mortes por calor, por exemplo, serão mais frequentes e rotineiros. No entanto, ainda há uma esperança. Se conseguirmos reduzir as emissões de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa (GEE) será possível limitar esses riscos climáticos e evitar que países como o Brasil sofram com secas e queda na capacidade de produzir alimentos. O IPCC já aponta que o país, Amazônia e Nordeste devem sofrer com secas mais longas, enquanto Centro-Sul do país deve ter tempestades mais intensas.
Para limitar o aquecimento abaixo de 2oC até 2100, como propõe o Acordo de Paris, de 2015, é preciso avançar na corrida por uma economia de baixo carbono e atingir pelo menos zero líquido de emissões (até 2050, como prevê esse acordo assinado pelos 175 países signatários), que é o saldo das emissões menos a absorção de carbono.
A queima de combustíveis fósseis segue como a principal fonte de emissão. O uso de energias advindas do petróleo, gás e carvão, em especial, para alimentar o uso de veículos a combustão e usinas termelétricas, a acelerada geração de resíduos sólidos e o metano e óxido nitroso resultantes da agropecuária são os principais vilões desse aquecimento crescente.
Os responsáveis pelo mais recente relatório do IPCC – 234 cientistas de 66 países – são unânimes em afirmar que as causas antropogênicas têm estimulado essa progressão em nível global. A essas evidências científicas só confirmam o que já estamos testemunhando: ondas de calor em países tradicionalmente mais frios, incêndios florestais no Brasil, Turquia e Austrália e enchentes sem precedentes que devastaram cidades na Alemanha.
“As regiões tropicais vão ser as grandes prejudicadas pelo aquecimento global e isso atinge diretamente o Brasil“, diz o físico Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo e membro do IPCC.
Este é o primeiro de um trio de relatórios que comporão a sexta maior avaliação climática do IPCC desde 1990: um segundo relatório, sobre impactos climáticos e adaptação, e um terceiro, sobre esforços de mitigação, seguirá no próximo ano. Uma novidade, é um Atlas Interativo online, onde é possível navegar e observar os efeitos na temperatura segmentados por região.
O relatório projeta cenários futuros possíveis decorrentes do aumento da temperatura global em curto, médio e longo prazos. E as previsões não são nada otimistas. A temperatura da superfície global continuará a aumentar, o aquecimento de 1,5° C e 2° C será ultrapassado ainda neste século e secas, ciclones e derretimento de geleiras serão corriqueiros caso nada seja feito.
No ano passado, após o anúncio de que ficaria de fora da conferência do clima (COP) da ONU, o Brasil se comprometeu zerar suas emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2060. O então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que a meta poderia ser antecipada, desde que outras nações se comprometessem a financiar até US$ 10 bilhões por ano.
Sexto maior emissor do planeta, o Brasil vai na contramão do que se espera do país e é cada vez mais pressionado por países como os EUA a assumirem metas mais ambiciosas. Sob a gestão Bolsonaro os índices de desmatamento da Amazônia e do Cerrado dispararam e bateram recordes negativos. Atividades ilegais como grilagem, garimpo sem licença e invasões de terras públicas também são cada vez mais comuns.
Este novo relatório do IPCC aponta que muitas das mudanças observadas no clima não têm precedentes em milhares de anos. Algumas dessas alterações, como o aumento contínuo do nível do mar e o derretimento de geleiras já são irreversíveis. Se indivíduos e governos não começarem a agir agora para mudar esse cenário, pode ser tarde demais.
Relatório completo: AR6 Climate Change 2021 – The Physical Science Basis. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg1/
Jaqueline Nichi é jornalista e cientista social com mestrado em Sustentabilidade pela EACH-USP. Atualmente, é doutoranda no Programa Ambiente e Sociedade do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (NEPAM-UNICAMP). Sua área de pesquisa é centrada nas dimensões sociais e políticas das mudanças climáticas nas cidades e governança multinível e multiatores.
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