Enciclopédia Genômica das Bactérias e Archea

Dá para imaginar um grupo de organismos mais diversificado do que os insetos? São cerca de 800.000 espécies. E de plantas? Cerca de 350.000. E de microrganismos?

A estimativa é que existam 1.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000 espécies de microrganismos. Se este número for verdadeiro, muito, mas muito menos de 1% são conhecidas e caracterizadas. E destas, uma pequena fração é de uma enorme importância histórica, econômica, social e científica. Histórica, sim, pois a descoberta da penicilina influenciou fortemente o desenrolar da II Guerra Mundial e o desenvolvimento dos antibióticos nos anos seguintes. Econômica, pois muitos produtos e processos são atualmente decorrentes da utilização de inúmeras linhagens microbianas: na produção de vitaminas, enzimas, aromas, antioxidantes, medicamentos, álcool combustível. Social, consequentemente. Científica, pois, desde que Antonie van Leeuwenhoek observou pela primeira vez estes seres microscópicos, estes nunca tiveram sua importância diminuída. Pelo contrário. Análises de DNA atuais só se tornaram possíveis com o advento da técnica de PCR, polymerase chain reaction, que possibilita a amplificação do DNA em quantidades apreciáveis para sua análise. A técnica de PCR só foi possível de ser utilizada graças ao isolamento da enzima que possibilita tais análises a partir da bactéria Thermus aquaticus.

Um projeto extremamente ambicioso pretende descrever as espécies de microrganismos do planeta Terra. Coordenado pelo Department of Energy Joint Genome Institute (DOE JGI), o projeto objetiva a elaboração da Enciclopédia Genômica das Bactérias e Archea [Genomic Encyclopedia of Bacteria and Archaea (GEBA)]. Os primeiro 56 genomas deste projeto foram publicados na revista Nature em seu número de 24 de dezembro. Um belo presente de natal para a ciência.

Segundo o diretor do DOE JGI, Eddy Rubin, “Os microrganismos participam em praticamente todos os processos biológicos do planeta. Sua descrição genômica revolucionou o conhecimento científico que hoje dispomos destes seres microscópicos. A informação obtida a partir do genoma destas 56 primeiras espécies analisadas forneceu uma enorme variedade de novas enzimas e rotas bioquímicas, que podem ser extremamente úteis para a humanidade, na produção de biocombustíveis, biorremediação e como o CO2 é ‘capturado’ da atmosfera, por exemplo.”

Até hoje, apenas as linhagens microbiológicas chamadas de “culturáveis” (por crescer em meios de cultura artificiais) puderam ser bem caracterizadas e exploradas. A intenção dos pesquisadores do DOE JGI é, literalmente, descrever a ‘matéria negra’ microbiológica do planeta Terra. Com isso, conhecer também como estes microrganismos interagem entre si e com outras espécies biológicas. Até hoje as descrições genômicas de microrganismos focalizaram o estudo de linhagens economicamente importantes. A intenção do projeto da GEBA é ampliar significativamente a “árvore filogenética” dos microrganismos, buscando aqueles pouco conhecidos e ainda totalmente desconhecidos. Como conseqüência, espera-se que o conhecimento adquirido como fruto deste projeto possa esclarecer a diversidade genética dos microrganismos, demonstrar como os microrganismos adquirem e/ou exercem novas funções no ambiente em que se encontram, entender como funcionam as comunidades microbiológicas e a sua complexidade. A obtenção de produtos microbianos na forma de sequências genéticas específicas, enzimas e metabólitos deve ser uma decorrência natural do desenvolvimento deste projeto.

Por exemplo, dois pesquisadores do DOE JGI, Natalia Ivanova e Athanasios Lykidis, descobriram novas celulases, enzimas que degradam celulose em seus componentes – diferentes tipos de açúcares – que podem ser utilizadas na produção de biocombustíveis.

O projeto GEBA está sendo desenvolvido conjuntamente por pesquisadores do DOE JGI e da DSMZ (Deutsche Sammlung von Mikroorganismen und Zellkulturen, ou Coleção de Microrganismos e de Culturas Celulares da Alemanha). As linhagens seqüenciadas estarão disponíveis para serem posteriormente utilizadas. As sequências genômicas já descritas no âmbito do projeto GEBA estão disponíveis na página da revista Journal Standards in Genomic Sciences (SIGS), que é de acesso aberto. A lista completa dos projetos piloto do GEBA pode ser encontrada na página http://www.jgi.doe.gov/sequencing/GEBAseqplans.html

Discussão - 3 comentários

  1. Leo Martins disse:

    Muito bom!
    Só um detalhe: a estimativa é de que existam uns 150 milhões de espécies de microorganismos, o nonilhão se refere à contagem bruta (número de micróbios).
    http://phylogenomics.blogspot.com/2009/12/story-behind-nature-paper-on-phylogeny.html
    http://www.nytimes.com/2009/12/29/science/29microbes.html
    um abraço,
    Leo

  2. Leo Martins disse:

    Obrigado pela divulgação! Apenas um detalhe: a estimativa é de que hajam 1 nonilhão de organismos (10 elevado a 30), enquanto o número de espécies é estimado em 100 milhões de taxa [1]. O prof. Jonathan Eisen, o último autor do artigo da Nature, tem um blog (chamado phylogenomics) com outros links interessantes.
    [1] Thomas P. Curtis, William T. Sloan, and Jack W. Scannell (2002) Estimating prokaryotic diversity and its limits. Proc Natl Acad Sci USA 99 (16): 10494-10499
    PS: tentei mandar esse comentário anteriormente mas talvez tenha sido bloqueado por causa dos links - por isso agora estou evitando 😉 se meu comentário anterior estiver preso na fila, pode desconsiderar um deles e me perdoe pelo reenvio. Ou cliquei o botão errado mesmo 😀

  3. Roberto disse:

    Caro Leo,
    Obrigado pela correção. 100.000.000 de taxa (espécies?) ainda é um número grande.
    Não recebi teu comentário anteriormente, não sei porque.
    abraço,
    Roberto

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