A grande jogada de estrela da NBA: a casa que absorve CO2

Rick Fox em frente a casa construída com concreto da Partanna. Fonte: Website Partanna

“Astro da NBA constrói casa capaz de sugar CO2 da atmosfera.”

Variações dessa headline chamaram minha atenção há umas semanas. Eram notícias sobre o lançamento da primeira construção feita com o concreto da Partanna, startup dirigida por Rick Fox.

Parêntesis para você que, como eu, não conhecia esse nome: Rick Fox foi tricampeão da NBA, a liga norte americana de basquete, pelos Lakers, uma das maiores franquias do campeonato.

casa “resiliente ao clima e carbono negativa” foi construída em Bahamas, país natal de Fox e região duramente atingida pelo furacão Dorian em 2019.

Se você também ficou curioso(a) para entender como blocos de concreto podem remover da atmosfera o principal gás do efeito estufa e ajudar no combate às mudanças climáticas, vem comigo para os próximos parágrafos.

A indústria do concreto: um rápido panorama

Depois da água, o concreto é o material mais usado no mundo. Segundo a Global Cement and Concrete Association (GCCA), estamos falando de 14 bilhões de metros cúbicos de concreto utilizados a cada ano. A.CADA.ANO!!

Concreto é feito, dentre outros ingredientes, de cimento e calcula-se que a indústria de cimento sozinha é responsável por 8% das emissões mundiais de gases de efeito estufa.

Para colocar sob perspectiva, especialistas afirmam que se a indústria de cimento fosse um país, seria o terceiro maior emissor do planeta, atrás apenas dos EUA e da China.😱

Fica fácil entender essa gigante participação nas emissões quando olhamos para o processo de produção. O cimento é constituído principalmente por clínquer, um material granular e rígido, obtido a partir da exposição de uma mistura de calcário e argila a altíssimas temperaturas.

Altíssimas mesmo, cerca de 1.400-1500 graus Celsius.🫠

A reação química da queima do calcário libera grandes quantidades de gás carbônico na atmosfera. Além disso, a produção de cimento envolve um consumo considerável de energia, seja na forma térmica – utilizando combustíveis para aquecer os fornos na produção do clínquer – seja na forma elétrica, utilizada em todo o processo industrial para operar máquinas, acionar os fornos e os moinhos. 

Vale  destacar também que os combustíveis usados na alimentação dos fornos são, em grande parte, de fontes não renováveis, como petróleo e carvão. 

Para ter melhor dimensão das emissões de uma fábrica convencional de cimento, dê uma olhadinha na imagem abaixo.  Perceba a quantidade de etapas, maquinário e processos intensivos em energia.

Fonte: Newtec

A participação de 8% nas emissões mundiais começa a fazer sentido, né?🧐

Mas e aí? Qual é a solução?

Para nossa sorte, apesar de diversos eventos recentes nos fazerem questionar essa afirmação 😣, somos uma espécie bem perspicaz e já estamos avançando em alternativas para reduzir o impacto climático da indústria de cimento.

Neste sentido, duas linhas de pesquisa se destacam: a redução da necessidade de concreto e a substituição do cimento em sua produção.

A primeira abordagem explora maneiras de ampliar a durabilidade do concreto e promover a reutilização de seus componentesminimizando a demanda por novos materiais.

Um exemplo dessa estratégia é a tecnologia batizada de “Self-Healing Bio-Concrete”, ou “Concreto Biológico Autocurável”, invenção creditada ao biólogo holandês Hendrik Marius Jonkers. 

Sua grande sacada foi incorporar no concreto bactérias que podem sobreviver por até 200 anos nas construções. Essas bactérias ‘despertam’ quando ocorrem danos e os reparam por meio da produção de calcário. Esse processo de “autorreparo” estende a vida útil do material e reduz a necessidade de aplicar camadas adicionais de concreto para consertos.

Já a segunda linha de pesquisa explora formas de diminuir ou até mesmo eliminar o uso do cimento na produção de concreto. No Brasil, há diversas pesquisas envolvendo a utilização de resíduos agrícolas em substituição ao cimento.

Segundo estudos da Coppe UFRJ, a cinza de bagaço de cana-de-açúcar, por exemplo, pode ser ótima obra-prima e reduzir o consumo de cimento em até 40%. As cinzas de casca de arroz e os resíduos da indústria de cerâmica também são alternativas para a mesma finalidade.

Bem interessante, né?

A tecnologia da Partanna

Feitas as devidas considerações, é hora de voltar para o case do início do texto: a startup Partanna, do ex-jogador da NBA Rick Fox. O que é intrigante na tese da empresa é que mistura elementos das 2 linhas de pesquisa mencionadas acima.

O concreto desenvolvido pela empresa não usa cimento. Em seu lugar, emprega-se salmoura (solução concentrada de sal dissolvido em água) de usinas de dessalinização e escória, um subproduto da produção de aço. Em outras palavras, os principais componentes do material são obtidos a partir de resíduos de outros processos industriais, o que impulsiona o conceito de circularidade na produção. 

Segundo a empresa, mesmo que uma estrutura feita de concreto Partanna seja demolida, os materiais ainda podem ser reutilizados como matéria-prima para produzir mais do concreto alternativo.

Além disso, a fabricação ocorre em temperatura ambiente, sem a necessidade do processamento em alta temperatura associado à produção tradicional de cimento, reduzindo os custos de energia e emissões. 

A essa altura, você deve estar se perguntando: mas e essa história da casa sugar CO2 da atmosfera?🏠

Bom, para entender como esse processo é possível, vou abrir um último momento palestrinha para explorarmos um conceito importante: carbonatação

De forma ultra simplificada, trata-se de um processo químico que ocorre quando o dióxido de carbono (CO2) presente no ar reage com materiais alcalinos, como os minerais presentes no concreto, criando um novo composto chamado carbonato de cálcio. Essa reação ajuda a fortalecer a superfície do concreto e protegê-lo contra danos.

Embora todo concreto tenha essa propriedade, segundo a Partanna, cada bloco de seu concreto pode absorver CO2 100 vezes mais rápido do que um bloco de concreto comum. Ainda de acordo com a startup, uma casa de 116 metros quadrados construída com o material pode capturar tanto CO2 quanto 5.200 árvores por ano🌳

É isso mesmo, galera. Estamos falando de uma tecnologia que produz concreto sem a necessidade de cimento, usando como matéria-prima resíduos de outras indústrias e que ainda absorve dióxido de carbono como nunca. 😵

Seria essa A solução dos problemas climáticos da construção civil?

Uma questão nada simples

Resumindo os fatos, precisamos encontrar formas mais sustentáveis de produzir materiais de construção. E já existem pesquisas e iniciativas bem avançadas na busca por soluções. 

Entretanto, avaliar a sustentabilidade de um material de construção como o concreto não é tão simples. Diminuir ou eliminar o cimento da produção de concreto é uma ótima ideia.

Porém, é preciso realizar extensas pesquisas e testes para garantir que a vida útil dos materiais não seja negativamente afetada. Afinal, se uma construção precisa ser reparada em um intervalo de tempo menor, a exigência de recursos não renováveis é maior. Sem falar no quesito segurança, que é inegociável em qualquer construção.

Além disso, é importante avaliar com abrangência as emissões dos processos envolvidos na produção do material alternativo.

A própria Partanna já foi criticada no passado por não contabilizar no cálculo de sua pegada de carbono as emissões derivadas da produção das matérias-primas, que são resíduos de instalações siderúrgicas e de dessalinização intensivas em energia.

A busca por soluções sustentáveis na construção civil é sem dúvida um caminho promissor, mas requer uma abordagem criteriosa para garantir que as inovações sejam verdadeiramente seguras e benéficas para o meio ambiente.

E aí, o que achou? Seria a Partanna a jogada decisiva de Rick Fox? 

FONTES:

Site da Partanna

Decarbonisation options for the cement industry

A indústria de produção de cimento emite tanto CO2 quanto a Índia

UFRJ cria alternativas ecológicas para materiais de construção

Self-Healing Bio-Concrete

O concreto: terceiro maior emissor mundial de gases de efeito estufa

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