Em busca de uma nova era geológica: ainda não chegamos ao Antropoceno

O debate sobre a inclusão do Antropoceno como uma nova época geológica atingiu um ponto crucial, mostrando não apenas a complexidade da narrativa da história da Terra, mas também as interconexões entre as ações humanas e os sistemas naturais do planeta.

Ao longo dos últimos anos, cientistas têm argumentado que o Antropoceno, uma era definida pelo impacto humano significativo nas condições geológicas do planeta, merece seu próprio lugar na escala de tempo geológico. No entanto, o recente voto de um comitê de especialistas, decidindo contra a proposta, revela que a questão não é simplesmente uma matéria de reconhecimento científico, mas também envolve interpretações sobre quando exatamente essa era começou.

Os capítulos nomeados da história de nosso planeta são governados por um grupo de cientistas da União Internacional de Ciências Geológicas. A organização utiliza critérios rigorosos para decidir quando cada era começou e quais características a definiam. O objetivo é manter padrões globais comuns para expressar a história do planeta.

A definição proposta pelo comitê anterior, que situava o início do Antropoceno no meio do século 20, com os testes de bombas nucleares espalhando material radioativo globalmente, foi considerada limitada por muitos. Argumentou-se que o impacto humano na Terra remonta muito além desse período, incluindo eventos como a Revolução Industrial e a colonização de continentes inteiros.

Enquanto alguns cientistas defendem que o reconhecimento do Antropoceno é essencial para refletir as mudanças profundas que a humanidade trouxe ao planeta, outros enfatizam que a definição precisa ser cuidadosamente elaborada para atender aos critérios geológicos estabelecidos.

No entanto, independentemente da decisão, a evidência do impacto humano no planeta Terra é inegável. Desde as mudanças climáticas até a perda de biodiversidade e o aumento do nível do mar, os sinais das atividades humanas estão presentes em todo o mundo, exigindo ação imediata e coordenada para mitigar os danos. Além disso, é importante uma abordagem interdisciplinar e colaborativa entre diversas áreas do conhecimento.

Por ora, de acordo com a linha do tempo estabelecida pelos geólogos na história de 4,6 bilhões de anos da Terra, seguimos no atual Holoceno, que teve início há 11,7 mil anos. Adotar o Antropoceno como a próxima era representaria o reconhecimento de que as mudanças recentes induzidas pelo homem nas condições geológicas foram tão significativas que encerraram o período do Holoceno, fato repleto de evidências científicas que dá indícios de que essa nova era já começou há algum tempo.

Referências:

Blog Natureza Crítica. 2024 deve superar 2023 como o ano mais quente em 100 mil anos. Disponível em:  https://www.blogs.unicamp.br/naturezacritica/2024/01/18/2024-deve-superar-2023-como-o-ano-mais-quente-em-100-mil-anos/

Encyclopædia Britannica. (s.d.). Geologic Time. Disponível em: https://www.britannica.com/science/geologic-time

International Union of Geological Sciences. (s.d.). IUGS: International Union of Geological Sciences. Disponível em: https://council.science/pt/member/iugs-international-union-of-geological-sciences/

National Geographic Brasil. (2023, janeiro). O que é o Antropoceno e por que esta teoria científica responsabiliza a humanidade. Disponível em:  https://www.nationalgeographicbrasil.com/historia/2023/01/o-que-e-o-antropoceno-e-por-que-esta-teoria-cientifica-responsabiliza-a-humanidade

NYT Climate Team. (2024, March 5). Plan to Declare ‘Anthropocene Epoch’ Rejected by Geologists. The New York Times. https://www.nytimes.com/2024/03/05/climate/anthropocene-epoch-vote-rejected.html

 

Jaqueline Nichi é jornalista e cientista social. É doutora em Ambiente e Sociedade pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (NEPAM-UNICAMP) e mestre em Sustentabilidade (EACH-USP). Sua área de pesquisa é centrada nas dimensões sociais e políticas das mudanças climáticas, adaptação e planejamento urbano e governança multinível e multiatores.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*