Sem dúvidas, todos nós fomos pegos de surpresa com essa pandemia e com os impactos dela em nossa rotina diária. E qual foi o impacto de todas essas mudanças na sua pesquisa e na sua forma de fazer ciência?

Um grupo de pesquisadores, em sua maioria de Harvard, resolveram investigar como os pesquisadores estavam respondendo às mudanças ocasionadas pela pandemia e, para isso, distribuíram um questionário para diversos pesquisadores e professores universitários no dia 13 de Abril. A ideia deles foi espalhar esse questionário para cientistas de diversas áreas nos Estados Unidos e na Europa um mês após a declaração de pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Eles tinham o intuito de comparar o desempenho desses profissionais pré e pós pandemia, e identificar quais características estavam afetando mais o desempenho desses pesquisadores.

Com 4.535 respostas, durante a análise dos resultados eles identificaram um grande impacto na quantidade de horas trabalhadas, que foi reduzida de 61h para 54h semanais. Mas é preciso considerar que 55% dos participantes indicaram uma redução, e que uma parcela relativamente significante (18%) apresentou um aumento nas horas trabalhadas.  

Com isso em mente podemos nos perguntar em seguida se as pessoas que estão nesses grupos têm alguma característica em comum. Quais foram as áreas mais afetadas? Qual foi o gênero mais impactado pela pandemia quando falamos em horas de pesquisa? Em qual desses grupos você se identifica?

Eles observaram nesse trabalho que as pessoas que mais tiveram redução no tempo dedicado à pesquisa (30% e 40%) foram cientistas que precisam estar em laboratório físico, englobando principalmente áreas de ciências biológicas, bioquímica, química e engenharia química. Enquanto áreas de economia, matemática e ciências da computação apresentaram uma redução menor. 

Mas a parte mais interessante, na minha opinião, é que analisando esses dados eles identificaram que o trabalho de pesquisadores com dependentes jovens em casa (pelo menos um dependente de até 5 anos de idade) foi muito mais afetado pela pandemia, com uma redução de 17% de horas dedicadas a pesquisa quando comparados com outros grupos. E ao levarmos isso para a discussão de gêneros, as mulheres apresentaram um redução maior (~5%) nas horas dedicadas a pesquisa quando comparadas aos homens. 

O trabalho apresenta diversos pontos fracos a serem considerados, que impedem a sua utilização para conclusões mais gerais acerca de quais grupos realmente tiveram sua pesquisa mais impactada, mas ao mesmo tempo, ele abre caminho para diversos outros questionamentos, inclusive sociais.

Nessa pesquisa, só foi considerado o impacto em pesquisadores e professores, mas qual o impacto que atingem os estudantes? Quantos moram longe da família e foram mantidos afastados totalmente de um convívio social? Quantos arriscam suas vidas todos os dias para desenvolverem pesquisas em COVID-19 nas bancadas? Quantos estão em desespero por terem prazos a cumprir ou por não saberem se terão bolsas no próximo ano? Como medir o real impacto causado pelo estresse e pela ansiedade da situação na pesquisa? 

As perguntas são sempre muitas, e pra mim, a única que realmente devemos considerar nesse momento, é “Como reduzir os danos da pandemia na nossa saúde mental e na nossa rotina de trabalho dentro da pesquisa?”. 

É preciso aprender a definir as nossas prioridades (de trabalho e pessoal) e a distribuir o nosso tempo de acordo com elas. É preciso nos olharmos com mais ternura e compaixão e entendermos que nós também somos humanos. É preciso buscar ajuda quando não damos conta. É preciso dizer não quando não nos fará bem. E é preciso decidir sempre, com consciência e com sabedoria, afinal, a única pessoa a arcar com a consequência das suas escolhas, será você mesmo. O lado maravilhoso disso? Ao decidirmos o que fazer com a nossa vida, nós podemos escolher o que nos faz feliz e o que nos faz bem, e ninguém NUNCA saberá mais o que você precisa, do que você mesmo. 

E se eu puder dar algum conselho: Agarre essa oportunidade com unhas e dentes, decida tudo que você puder decidir, descubra quem está com você independente de quem você seja ou de que decisões você tome, divirta-se fazendo a sua pesquisa, agradeça sempre, ame muito e seja feliz, só por hoje.

Referências:

Myers, K.R., Tham, W.Y., Yin, Y. et al. Unequal effects of the COVID-19 pandemic on scientists. Nat Hum Behav (2020). https://doi.org/10.1038/s41562-020-0921-y

Este Texto foi produzido originalmente no Blog Terabytes of Life

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Os argumentos expressos nos posts deste especial são dos pesquisadores, produzidos a partir de seus campos de pesquisa científica e atuação profissional e foi revisado por pares da mesma área técnica-científica da Unicamp. Não, necessariamente, representam a visão da Unicamp. Essas opiniões não substituem conselhos médicos.


Sheila Tiemi Nagamatsu

Formada em Biotecnologia pela UFSCar, Dra. em Genética e Biologia Molecular com ênfase em Bioinformática na UNICAMP, apaixonada por desenvolvimento pessoal e, atualmente, pós-doutoranda em YALE na área de psiquiatria.

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