Vida, morte e imortalidade: desvendando a história das células Hela

Assim que recebi um email da livraria de Harvard avisando que Rebecca Skloot participaria lá de uma discussão sobre o seu mais novo livro, nem pensei duas vezes e enfrentei a congelante noite para conhecê-la. Com voz suave e envolvente, a jornalista norte-americana fez a plateia refletir sobre temas de ciência e seus bastidores, propriedade intelectual e patentes de células, a precária comunicação entre médicos e pacientes, entre outros. O livro intercala tais discussões com uma narrativa que prende o leitor (sabe quando um livro não te larga?), resultado de uma profunda investigação sobre a vida de Henrietta Lacks: uma mulher negra que viveu nos Estados Unidos entre os anos de 1920 e 1950, da qual foram extraídas células cancerosas que originaram a primeira linhagem imortal de células humanas (HeLa). O impacto de tal façanha na ciência médica moderna foi profundo e vasto, muito embora a família de Lacks tivesse vivido um enorme silêncio (e falta de informação) sobre sua importante contribuição.

Acredito que muitos cientistas que estão neste momento crescendo células HeLa em placas de cultura no laboratório não têm ideia da sofrida história de vida de Henrietta Lacks.

Tamanha motivação virou uma resenha para a Ciência&Cultura.

Se te chamarem de louco, você está no caminho certo

Das mãos do famoso Dean Kamen já saíram extraordinárias invenções.

Sempre buscando criar objetos que efetivamente mudam a vida das pessoas, o inventor e empreendedor inspirou a plateia presente no evento BetterWorld, que aconteceu dia 30 de abril no MIT. Organizado pelo fórum de empreendedorismo do instituto, o tema deste ano foi “Acelerando inovações do laboratório para o mercado”. Ao resgatar um pedaço da sua história, Kamen motivou e emocionou os ali presentes.

Fiquei imaginando Kamen-criança-inventora trabalhando no porão da casa dos seus pais, montando e desmontando objetos, criando máquinas. Seu talento me parece nato. Há 32 anos ele inventou a primeira bomba de insulina (AutoSyringe) para pacientes diabéticos. A pedido do cliente Johnson&Johnson, mudou em apenas seis semanas a geometria dos stents cardíacos. No início da década de 1990, ajudou a desenvolver o ThinPrep, teste muito mais sensível do que o tradicional teste Papanicolau para detecção de câncer cervical. 

“Talvez a nossa história de maior sucesso tenha sido o equipamento de diálise Homechoice PD”, disse. O aparelho é pequeno e permite que o paciente faça diálise em casa, todas as noites, evitando as inúmeras visitas ao hospital, o que faz com que ele se sinta bem melhor. Lembrei dos sofridos pacientes em diálise que eu esbarrava no Hospital das Clínicas, durante meu doutorado. Kamen contou que quando ele propôs tal tecnologia, disseram que ele era louco e que o produto nunca seria aprovado pelas agências regulatórias. “Esta é a melhor maneira de começar um projeto, sinal de que você está no caminho certo”, destacou.

Segundo o inventor, o equipamento mais sofisticado que eles conseguiram aprovar até hoje foi o iBot. Usando uma tecnologia de auto equilíbrio, o iBot é uma reinvenção da cadeira de rodas por possibilitar subir e descer escadas e deslocar em terrenos esburacados. Vale assistir ao hilário vídeo em que Kamen é entrevistado por Stephen Colbert.

iBot. Fonte: DEKA Research & Development Corporation

Ao tentar extrapolar o uso do iBot para uma área fora da medicina, Kamen lançou o Segway, um veículo – ecologicamente correto – de transporte pessoal . “Hoje sou conhecido como o homem Segway, mas confesso que gastei apenas um fim de semana para desenvolvê-lo e anos para chegar a outros produtos”, disse.

Segway, veículo de transporte pessoalFonte: Segway

Projetos e produtos não param por aí. Um de seus projetos atuais é o desenvolvimento de um braço protético (The DEKA Arm), encomendado pelo departamento de defesa do governo norte-americano. Kamen está envolvido também com o problema da falta de água limpa e de energia ao redor do mundo. Ao tentar superar o modelo antigo de grandes reservatórios de água, ele criou uma caixa – facilmente transportável para qualquer lugar – que fornece água potável a partir de qualquer fonte de água. “A política global e modelos de negócios desatualizados impedem a disseminação de tecnologias como esta. A solução tecnológica existe, mas não sei como resolver este problema não-tecnológico”, desabafou.

Foi tocante ouvir sobre invenções que vêm impactando a vida de tanta gente. Mas a parte mais comovente, na minha opinião, foi quando ele descreveu o programa FIRST (For Inspiration and Recognition of Science and Technology), criado em 1992 com o objetivo de inspirar jovens para carreiras de ciência, tecnologia, engenharia e matemática, por meio de competições em robótica. Segundo Kamen, a ideia partiu do desconforto com o peso quase que exclusivo que o esporte tem na vida das crianças norte-americanas. “Elas sabem tudo sobre as ligas de futebol e de basquete, mas não sabem dizer o nome de um cientista”. Já ouvimos sobre este problema antes, certo? 

Não resisti e tive que colocar mais uma foto dessa figura inspiradora. E sorrindo ainda, como ele deve ter recebido as milhares de crianças que têm participado do FIRST.

Detecção precoce de câncer tem limite*

Prometi que não publicaria a mesma informação aqui e no blog da SBI, mas, neste caso, não resisti. 

“Quanto mais cedo o câncer for detectado, maiores serão as chances de cura”. Não há nada de novo nesta afirmação, certo? Mas para garantir tal detecção precoce, você estaria disposto(a) a implantar em seu corpo um sensor que libera um sinal (câncer!) lido por um equipamento do tamanho de um celular que você mesmo carrega? Fico imaginando a seguinte cena: a pessoa acorda, liga o aparelho e pergunta: “será que é hoje o dia em que serei diagnosticado(a) com câncer?”

Sensores in vivo para detecção de câncer. Fonte: Koch Institute/MIT

Escutei sobre tais sensores in vivo na última sexta-feira (30/abril), como parte de uma das atividades do evento BetterWorld, organizado pelo Fórum de empreendedorismo do MIT. Urvashi Upadhyay, médica e pesquisadora do Koch Institute (MIT), explicou que os sensores utilizam sistemas micro-eletromecânicos que detectam, por exemplo, uma alteração de pH. Combinados a nanopartículas que permitem visualizar alterações moleculares e celulares, os sensores podem ser utilizados não só para detecção precoce mas também para liberação de drogas no local e no momento apropriados. 

Não há dúvidas de que a tecnologia é de fronteira e pretende tratar eficientemente a doença mais temida da humanidade. Robert Urban, diretor executivo do Koch Institute, falou sobre a estratégia que os engenheiros e cientistas do instituto estão adotando. “O câncer é uma doença tão complexa que optamos não por buscar a cura, e sim por usar tecnologias para melhorar o tratamento”, disse.

Mas será que é saudável carregar tais sensores? Eles devem ser adotados por todos ou apenas por grupos de risco? Será que eles nos fariam doentes? Há algum paralelo entre os sensores e os testes genéticos? O que você faria com a informação de que está escrito no seu DNA que você tem 30% de chance de desenvolver um câncer aos 58 anos? E onde entram os RNAs, que podem regular tudo isso?

Enfim, este post deveria ter seguido o modelo do Perguntas de Biruta, de André Báfica.

E, para terminar, mais uma pergunta: será que Ray Kurzweil está certo? Segundo o futurista, sofremos tantas doenças pois o nosso DNA está desatualizado. Está na hora de reprogramar o nosso código genético com implantes de microchips para acompanhar a contento o desenvolvimento tecnológico?

Adoro a liberdade que o blog permite. Mais perguntas do que respostas.

*Publicado originalmente no SBlogI.

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