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Comunicação para Divulgadores Científicos

Não existe lugar certo para divulgar ciência

Texto por Erica Mariosa Carneiro, Carol Frandsen e Ana Arnt


É comum encontrarmos, nas palestras realizadas pelos Blogs Unicamp, pessoas que estão empolgadas em começar seus próprios canais de divulgação científica mas não sabem muito bem como fazer isso. 

Assim, sempre recomendamos que a primeira coisa a se fazer é sentar e montar um planejamento: escolhendo seu público e seu assunto macro e, a partir dessas decisões, pensar em qual o veículo de comunicação ideal, mesmo que com o passar do tempo e amadurecimento da análise, seja preciso mudar.

por Carol Frandsen @clorofreela

“Falar para todos” é um mito

Pensar em com quem o seu canal quer conversar é fundamental para dar início a todo o planejamento de seu canal de divulgação científica. Afinal, para cada público existe um tipo diferente de trabalho, ou seja, um tipo de linguagem, um veículo de comunicação, um tipo de conteúdo que funciona melhor…

Para visualizar melhor essa diferença observe canais que você segue e as semelhanças entre eles.

A título de exemplo, trago nesta postagem, um canal que eu sigo e gosto muito. O canal Funkeiros Cults Oficial, pretende trazer para o Instagram postagens sobre literatura, filosofia e discussões sociais e para isso, este canal adequa brilhantemente a linguagem característica do seu público para apresentar, discutir e sugerir este conteúdo.

Sócrates já aviso! Por @funkeiroscults

A partir dessas observações, você irá notar que não é possível fazer divulgação científica da mesma forma para todos os públicos, sendo assim, entender como o público na qual você pretende conversar, pensa, discute, interage, quais são as suas dificuldades, questões pertinentes no seu dia a dia, formas de acesso a comunicação (online e offline) e interesses ajuda a se comunicar com ele.

O Canal Funkeiros Cults percebeu que o Instagram era um bom veículo de comunicação para o seu público, mas se ele pretendesse falar com pessoas acima dos 60 anos será que este seria o melhor veículo? E não só isso…

Será que o seu investimento de tempo, trabalho e dinheiro seria o mesmo em veículos diferentes do Instagram? Se o Funkeiros Cults pretendesse fazer uma propaganda na televisão ou um podcast ou um canal no TIKTOK o planejamento seria o mesmo? E o seu resultado? O canal conseguiria chegar no público que ele gostaria?

E como isso tudo funciona para o público do seu canal?

Ele tem dinheiro para acessar o canal na Twitch? O celular que ele possui tem capacidade para rodar o jogo que eu estou usando para fazer divulgação científica? Na região geográfica que este público está é possível acessar a internet?

Sugiro outras postagens sobre o assunto: Como divulgar meu conteúdo de divulgação científica nas mídias sociais? Público alvo, furar bolhas e outras coisas mais da Divulgação Científica nas redes, Comunicação sobre ciência – pensando no público, Plataformas digitais, usuários de redes sociais e escolhas de conteúdos.

Então será que existe mesmo um veículo perfeito para divulgar ciência? Que chegue a mais pessoas e realmente fure bolhas?

Ao identificar e entender o público do seu canal, também será preciso conhecer e acompanhar os canais de divulgação científica que seu público já gosta, segue e consome. Conhecer e se espelhar nesses canais ajuda a visualizar os itens iniciais do planejamento, como: custo financeiro, tempo necessário, perfis de seguidores e quem sabe até, prever dificuldades. 

E após essas definições iniciais, o divulgador científico precisa estudar o veículo de comunicação que irá trabalhar, afinal para cada um deles há um tipo de funcionamento.

Por exemplo, ao optarmos por podcasts, a qualidade do áudio é uma questão importante, e para garanti-la são necessários equipamentos de gravação e habilidades de edição específicas.

Já quando optamos por nos comunicar via redes sociais, o conteúdo fica fragmentado, e cada canal tem formatos e peculiaridades de exposição diferentes.

Em ações presenciais é praticamente impossível realizá-las sem uma equipe ou sem uma estrutura, ainda mais neste contexto pandêmico.

Contudo…

O áudio viabiliza o acesso para quem não consegue acompanhar um vídeo sem áudio-descrição, além de ser uma boa opção para pessoas que passam muito tempo com deslocamento.

O vídeo permite maior didática e uma relação empática. As redes sociais penetram o cotidiano das pessoas mesmo que elas estejam lá por outro motivo.

Mídias escritas como blogs e sites permitem organizar e localizar o conteúdo de uma forma que nenhum dos outros meios ainda deixa fazer, e não só isso. Ao escolhermos um veículo também é preciso pensar em como ele se comporta como repositório.

Repositório?

Repositório não é só um local dedicado a armazenar conteúdos, esses locais também garantem a consulta de materiais ao longo do tempo. Com o desenvolvimento de novas ferramentas na internet, o repositório deixou de ser apenas offline, como drives e servidores e passou a ser também online, como blogs e sites, que podem ser aberto a consulta de terceiros, servindo assim como uma biblioteca virtual.

E por que isso é importante?

É normal que com as facilidades de manutenção e de alcance de público, as redes sociais atraiam a atenção dos futuros divulgadores científicos. Afinal basta 05 minutos para que a nova conta esteja aberta e visível a 150,0 milhões de usuários, conforme aponta o  relatório de 2021 produzido em parceria por We Are Social e Hootsuite.

Contudo, lidar com redes sociais não se restringe a abrir uma conta e começar a postar, existe todo um arsenal de conhecimento e planejamento que essa estratégia de comunicação exige do divulgador científico.

E, para além disso, às redes sociais são plataformas sujeitas ao funcionamento, prioridades e códigos de conduta estabelecidas por empresas que nem sempre possuem o interesse de divulgar essas regras de forma clara. Falamos mais sobre isso nas postagens: Estratégias de Divulgação e Mídias Sociais

A instabilidade dessas plataformas ficou ainda mais evidente em 04 de outubro de 2021 quando uma falha no Facebook provocou o bloqueio de vários outros serviços da empresa, incluindo o WhatsApp e o Instagram, que somam mais de 3 bilhões de usuários.

Nesse dia, apesar das maravilhosas postagens engraçadas sobre esta queda das redes sociais, ficou claro para os produtores de conteúdo a fragilidade em manter seu material sem um repositório adequado.

Afinal, se as redes sociais decidirem não retornar como eu recupero todo o conteúdo que já depositei na plataforma?

Imagem: Erica Mariosa – Apresentação de Palestra em Viçosa

Outro ponto a ser levado em consideração está na enorme dificuldade em encontrar um conteúdo depois de algum tempo.

Experimente procurar um conteúdo do ano passado no Instagram, por exemplo.

Os repositórios offline são importantes por proporcionarem esse resgate de conteúdo para consulta e reutilização em caso de perda do canal, reestruturação ou mudança. Um roteiro de vídeo, pode vir a se tornar base para um outro material e com essa preservação fica fácil do divulgador científico encontrá-lo no futuro.  

Ter um repositório online, bem organizado e em locais que possuem ferramentas de busca, como palavras chaves, por exemplo, além de possibilitar o seu acesso ao seu conteúdo e resgate de material em caso de necessidade, também pode ser visitado pelo seu público, ou por públicos diferentes do inicialmente planejado, ampliando assim a visibilidade do seu conteúdo.

Esse armazenamento online também serve como registro de sua produção e reduz o risco de plágio, em caso de plataformas, como blog é possível, inclusive pedir o ISSN que se trata de um identificador de padrão internacional feito pela biblioteca nacional que garante o registro de sua obra e pode ser adicionado no Currículo Lattes.

Esse acesso aberto é importante não só para a academia e seu registro de produção como pesquisador e divulgador científico, mas para outras camadas da sociedade. Aqui no Blogs de Ciência da Unicamp percebemos que nosso conteúdo é usado também como material de apoio a professores e estudantes, além do material referenciado em artigos e pesquisas.

Nosso portal é construído para facilitar a consulta, assim muitas postagens são revisitadas ao longo do tempo, contribuindo para que possamos cumprir um dos princípios da divulgação científica que é:

O de tornar o conteúdo científico de domínio público (Bessa, 2015 p.15).

Para finalizar

Cada forma de comunicar ciência tem suas particularidades. É importante refletir sobre o público pretendido e o objetivo que deseja alcançar com clareza antes de se lançar em um determinado formato – ou de desmerecer mídias com o qual não se tem afinidade.

Não existe receita de bolo, mas temos espaço pra todes!

Update 04/07/2023

Desde a publicação desse texto temos debatido muito sobre a importância de entendermos, como divulgadores de ciência, que o acesso do nosso público ao conteúdo que produzimos é diferente para cada local desse país.

Para além da discussão sobre letramento científico e/ou alfabetização, a ideia dessa discussão é demonstrar que ao abrirmos um canal digital, fatalmente escolhemos um público.

O ponto a ser considerado é se estamos fazendo divulgação científica com planejamentos e diretrizes que visam o acesso ao público previamente escolhido, com os ajustes necessários ao longo do tempo e crescimento, ou se abrimos um canal devido as nossas facilidades com a plataforma.

Abrir um Instagram, por exemplo, só porque gostamos não é um problema. O problema está em acharmos quer TODO MUNDO acessa essa plataforma e, por consequência, todo mundo acessa seu conteúdo.

Esse é o primeiro texto de uma série sobre o assunto:

Abaixo segue o quadrinho feito especialmente para este texto. Arte da Carol Frandsen, outros materiais dela podem ser conferidos em seu portfólio online – Clorofreela

Referência e outros conteúdos interessantes:

BESSA, Eduardo. O que é divulgação científica? In: ARNT, Ana de Medeiros; FRANÇA, Cecília; BESSA, Eduardo. Divulgação científica e redação para professores. [S. l.]: Tangará da Serra: Ideias, 2015.

ALMEIDA, Carla et al. O novo coronavírus e a divulgação científica. 2020.

Fontes, D. T. M. (2021). ‘Uma comparação das visualizações e inscrições em canais brasileiros de divulgação científica e de pseudociência no YouTube’. JCOM – América Latina 04 (01), A01. https://doi.org/10.22323/3.04010201.

Sobre o  “ninguém mais lê” e a importância do blog: Blog como ferramenta de divulgação científica 

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