Magia e crença no laboratório


Olhando esta imagem aqui em cima eu parei pra pensar se existe magia num laboratório. Não que ela exista, mas as vezes parece existir. Existe no como nós trabalhamos no lab. Muita coisa parte da fé. Nenhum ser humano já viu uma base de DNA, um A,T, C, ou G. Mas temos fitas de DNA desenhadas por todo o lado e trabalhamos com isso. Temos um tubo com DNA, e só o que se vê é a mais pura e clara água. Mas a máquina quantificadora nos diz: esta água contém 200 nanogramas de DNA por mL. Para cortar este DNA usamos enzimas que, pelo catálogo da empresa que a produz, irá cortar a dupla-fita no local exato. Montamos a reação e TCHA-NÂÂÂ… a mesma aguinha “sem nada dentro”. Mas quando adcionamos o reagente certo (brometo de etídio) vemos uma florescência. Algo brilha. É o DNA que prendeu o brometo. Pelo menos é o que me disseram…
Sempre vemos as coisas de forma indireta, pela máquina, pelo brilho, pela reação com outra coisa. Mesmo no dia a dia normal é assim. Mas no lab a coisa fica bem mais evidente. Esse é o “dia a dia”, fazer acontecer sem enxergar, ouvir ou tocar.
Mas a coisa não pode ficar na fé. O pesquisador que não sabe porque o DNA brilha quando adiciona-se o reagente brometo, esta sendo crente no protocolo. Acaba agindo cegamente. Tem acontecido muito hoje em dia. As pessoas que entram no lab não questionam o “porquê das coisas funcionarem assim”. Querem um kit pronto e acabou.
Isso pode indicar duas coisas preocupantes: falta de curiosidade e/ou falta de pensamento crítico. Sendo que nenhuma delas pode faltar num pesquisador, justamente por serem as PRINCIPAIS características de um cientista.

A lista dos cinco números


Um desafio se faz presente por meio do blog 1001 gatos de Schrödinger. Uma lista de 5 coisas. Que coisas? Coisas quaisquer. Por isto não se assuste, caro leitor, pois esta postagem pode fugir da realidade auto-construida deste blog.
Farei a lista com a essência dos próprios cinco números.
1- Existe um documentário simplesmente sensacional, chama-se “A história do número 1”, e eu nunca tinha dado bola para este detalhe: a importância do número UM. Ele foi o primeiro dos números, a unidade em si. E é o mais em uso hoje em dia, na linguagem binária dos computadores.
2- O lance da dualidade. Muita coisa se classifica entre DUAS categorias. O mundo que é assim mesmo ou o nosso cérebro que enxerga algumas coisas só em preto ou branco, certo ou errado, bem ou mal?
3- Algo que eu sempre achei fantástico: sabe quando você senta num bar e a mesa tem aquele gingado? Fica balançando toda hora? Isso me irrita muito. Como resolver isto de uma vez? Mesas com TRÊS pés! Elas NUNCA ficarão bambas. Quando os estabelecimentos responsáveis irão se tocar?
4- Mão de desenho animado. Por que todo personagem de desenho animado tem apenas QUATRO dedos nas mãos?!
5- Impossível cortar uma pizza em CINCO pedaços idênticos.
ps: na wiki “O número 5 (cinco) é o único número escrito na língua portuguesa que se escreve com o mesmo número de letras que o valor que representa.” Pôxa…

A genialidade da mulher-melancia. Só se aquilo tudo for omega-3


Depois das dicas para melhorar desempenho cognitivo, do leite materno e do chá verde, uma nova informação interessante neste campo: Omega-3 deixa meninas mais espertinhas.
Segundo notícia da Science, numa mega-pesquisa sobre nutrição e saúde feita nos EUA, com 4000 garotos e garotas entre 6 e 16 anos, os pesquisadores perceberam que meninas com mesma idade, classe social, etnia e resultados em testes de sangue equivalentes, mas que consumiam mais Omega-3, obtinham melhores resultados em testes cognitivos, inclusive de QI. Em meninos também ocorre um aumento, mas num nível duas vezes menor.
Essa importância do Omega-3 não é nova. Outros estudos já descobriram que a falta desta substância está associada a aumento na agressividade, depressão, suicídio e transtorno bipolar. Isto porque os neurônios utilizam ácido-graxos (que formam as gorduras, como o Omega-3) para formar seus axônios.
Mas agora pasme! O Omega-3 se concentra mais na gordura que se localiza no quadril, e o Omega-6 na cintura. Percebeu-se que mulheres com mais quadril e menos cintura têm melhor desempenho em testes cognitivos, assim como os seus filhos.
Um outro estudo mostrou que os homens preferem as mulheres com mais quadril que cintura ( o teste era simples, mostrando para homens siluetas de mulher com diferentes tamanhos de cinturas e quadris), numa proporção quadril x cintura de 0,7. Comparando esta relação cintura x quadril preferida pelos homens, o estudo, usando dados de clínicas de fertilização, constatou que as mulheres com esta relação 0,7 de medidas eram as mais férteis. Ou seja, corpo de violão é sinal de fertilidade, e os homens que preferem este tipo de mulher teriam maior sucesso reprodutivo, e seria por isso que esta relação 0,7 lota as capas de playboys e concursos de beleza.

Chegamos assim a uma conclusão esdrúxula: as mulheres capas de Playboy, misses e dançarinas de palco do Faustão, seriam as mais inteligentes dentre as mulheres!
Concordemos que isto foge do senso comum. Talvez porque o Omega-3 só é responsável por determinar 1% da diferença de inteligência. Fatores genéticos e educação influenciam muito mais.
Mesmo assim não podemos duvidar da inteligência destas mulheres-melancia, pois se formos ver quem ganha mais, uma capa de Playboy ou uma aluna de pós-graduação, talvez percebamos a “genialidade” que reside nos corpinhos de violão.

Seria eu um cientista?!

Estava pensando no que definiria um cientista. Mas não vou cair no clichê de procurar a definição no dicionário, e nem vou buscar a etimologia da palara para dizer que “vem do latim cientia …” ou algo assim.
A minha idéia resumida de cientista é a seguinte: o cara que tem uma idéia original e a desenvolve usando as técnicas apropriadas. Bom, segundo esta definição um artista poderia ser um cientista, afinal o artista desenvolveu sua idéia original em uma obra e a concretizou de maneira apropriada.
A diferença é que o cientista deve seguir as técnicas vigentes em cada área de investigação e seu resultado deve ser comprovado por todos os seus companheiros cientistas.
Definido o que é ser cientista, vejamos: Sou um cientista?
Apesar de estar no doutorado, conhecer bem a história da ciência, seus preceitos básicos, seus bastidores, planejar e realizar experimentos, ainda não me consideraria cientista, justamente por me faltar a tal idéia original. Eu seria então um técnico com nével superior, talvez.
Ciência não é algo fixo e estéril, como pode parecer. Demanda criação, também. É um processo criativo, não repetitivo.
Se o doutorado é o precesso de formação de um PhD, imagino que até o fim deste precesso tenha atingido minha maturação de cientista. Até lá posso ter o meu momento Arquimedes de EURECA, e ter minha idéia original.

Este post é parte integrante da blogagem coletiva “Um cientista em minha vida”, organizado pelo Brontossauros no meu jardim

Chá verde: o frio pede, os pesquisadores recomendam


Dica para o inverno que se aproxima: um chá verde bem quentinho todo dia. Afinal, o friozinho pede e os pesquisadores recomendam. Vários estudos sérios vem sendo feitos para testar o que os orientais por muito tempo se gabam de saber.
Por exemplo, parece que o chá verde reduz mortalidade por doenças cardiovasculares; pode reduzir problemas cognitivos; e a substância EGCG presente no chá diminui o crescimento de células de alguns tumores. Recentemente descobriu-se que este EGCG atrapalha a formação de estruturas que causam Parkinson e Alzheimer.
Tudo isto é muito preliminar, por isso nada de trocar a consulta médica e o remédio por uma cerimônia do chá.
Mas tentem fazer isto um dia. Quando estiver bem frio, chegue em casa, tire a roupa do trabalho, faça um chá verde do jeito que deve ser feito (esquente a água atá QUASE ferver; acrescente as folhas,não esse de saquinho que de chá não tem nada, deixando por 5 minutos; coe e sirva). Não ponha açúcar ou adoçante pelo amor de deus! Sinta o calor e o amargor revigorantes. Assim, mesmo se o tal do EGCG não tiver efeito nenhum, pelo menos o efeito placebo desse ritual o fará bem melhor.

Vi na Nature Structural & Molecular Biology

A genética como produto na revista Exame


Passei pela banca esta semana (coisa que a muito não faço por ter tanta coisa pra ler na internete) e me chamou a atenção a capa da revista Exame com uma dupla fita de DNA na capa. “Seu DNA vale bilhões” é o que diz a chamada. Claro, comprei a danada.
Muita coisa eu já havia escrito aqui (o que me alegra por saber que não estou defasado, e me entristece porque eu queria escrever um artigo maior justamente sobre isso). O foco são os testes genéticos e as empresas que estão surgindo neste ramo. Também cita o que empresas grandes como a Nestle e Siemens estão fazendo para se preparar para este novo movimento da “genômica pessoal”.
Quase soquei o computador quando vi que a matéria está disponível online e eu não precisava ter comprado a revista. No site da Exame tem um video de 2 min. sobre o tema. Mostra a repórter na exposição Revolução Genômica, que está rolando no Ibirapuera até julho, e o laboratório da Nestle aqui no Brasil.
Na verdade não comprei a revista a toa, já que o mais interessante da reportagem, na minha opinião, foi o relato de Maurício Lima sobre o exame genético que ele testou, e infelizmente não foi disponibilizado online. Neste relato ele conta que comprou o kit por 1000 dólares, cuspiu no potinho, e enviou esta amostra de volta ao laboratório da empresa 23andMe. Muito tempo depois obteve a resposta com o acesso online a algumas sequências, não do genoma inteiro, e sua comparação com estudos já realizados.
Basicamente se determina qual cópia de um gene relacionado a alguma doença você tem. Algumas cópias estão mais presentes em doentes. Daí se tira a tal chance de desenvolver a doença, coisa que é totalmente virtual, já que não se pode garantir que você terá ou não terá a doença. Mesmo ele sabendo disto, ficou ansioso ao saber que tem chance maior que a média de ter uma doença nos olhos que pode deixar a pessoa cega.
Se você se interessa pelo assunto, vale a pena comprar a revista Exame, e entrar também no site da 23andMe. Lá você pode, sem pagar nada, navegar pelos dados de sequenciamento de uma família fictícia, e ter uma idéia de como funciona o negócio.
P.S.: Esta não é uma postagem patrocinada. Nem pela Exame, nem pela 23andMe. Aliás deixo aqui o alerta de “CUIDADO-Determinismo Genético inside”. Para uma crítica, leia também aqui.

Super-ultra-mega evento científico-artístico-educacional


Como é que fazem um baita evento mirabolante e interessantíssimo, tentando unir ciência, arte e divulgação e não me avisam?!
Cadê a imprensa nacional cobrindo o evento?! Até a Revista Science mandou dois repórteres para atualizar um blog só do evento. Que evento? O World Science Festival (festival mundial de ciência), que estava acontecendo em Nova Iorque do dia 28 de maio até ontem. Duas lástimas: não me convidarem para ministrar uma palestrinha, mesmo que mixuruca (ha ha ha); e outra é o completo silêncio sobre o assunto aqui. Má divulgação americana ou descaso no Brasil?
Enfim, o evento, voltado para o povo não-cientista, deve ter sido maravilhoso. Organizado por cientistas e artistas, contou com os maiores pesquisadores, pensadores e divulgadores de ciência. Como já disse, a Science montou um blog especial para atualizar sobre o evento. Lá dá pra ter uma idéia da beleza que foi.
Palestras abertas; debates entre pensadores de diferentes formações; participação de estudantes nos debates junto com vencedores do prêmio Nobel; peças teatrais e coreografias de dança inspiradas em temas científicos; eventos sobre carreira para jovens; Disney para crianças; feira aberta com performances, uma loucura.
Os temas? Da origem do universo até o possível fim do mundo. Passando por ambiente, moral, experimentos que deram errado, Deus, o filme Identidade Bourne e a memória, genética, esporte, soluções para cidades, a por aí vai.
Aqui temos a Semana de Ciência e Tecnologia, que tem seu mérito por ser uma iniciativa por todo o território nacional. Mas o ideal seria juntar este alcance da Semana de Ciência com o ideal do World Science Festival, que é ser mais pop, mais hype. Nas palavras do organizador do festival, o físico Brian Greene: A ciência é inspiradora, excitante, pode influenciar vidas. Não é a ciência “engraçadinha”, mas a coisa real.

Células-tronco: o “caminho do meio” do ministro Direito.


Confesso que ao ver o pronunciamento do ministro Direito, uma ponta de esperança surgiu em mim. Afinal ele citou muita coisa sobre retirar células de embriões sem os inutilizar, ou usar embriões que páram de se dividir, caracterizando talvez o tão incerto termo “embriões inviáveis”, que consta na lei. Disse que já é feita extração de células de embriões para diagnóstico genético, onde se retira uma célula do embrião para detectar alguma doença hereditária grave. Mas esta técnica não garante a viabilidade do embrião. O risco envolvido é alto.
A outra alternativa seria usar embriões que pararam de se dividir, poderia ser uma boa opção, pois parece que há um bom número de células vivas nestes embriões. Mas em que condições estariam estes embriões? Se pararam é porque algo está errado com eles. Assim, seriam necessários muito mais embriões para se conseguir estudar o que se pretende. E no fim não teríamos certeza se aquelas células usadas se comportam como células-tronco normais. Muito esforço para nada.
Apesar de não ter falado nada que deixasse explícita a sua formação católica, Direito acabou mostrando um bom lado budista, ao tentar achar o “caminho do meio”, tão trabalhado pelo budismo. O que, dependendo da interpretação, pode ir de encontro com a fé católica, já que o próprio Jesus Cristo disse: “Sede frios ou quentes, os mornos serão vomitados”.
De qualquer forma parece não haver caminho do meio neste assunto. A lei foi aprovada. Aos trancos e barrancos mas foi. Estejamos atentos para que os medos levantados pela polêmica, como tráfico de embriões, ou descaso com material embrionário, não aconteçam mesmo, como prometem os cientistas.

Um dedo para o Fantástico

Se você viu a história do Fantástico deste domingo sobre o dedo regenerado, dê um sorriso discreto. Orgulhe-se da pessoa bem informada que você é, pois até já sabe do que vai falar este blog. Será que sabe mesmo?

E se eu disser que é bem possível isso ser balela? E se, não eu, mas o maior caçador de mitos científicos atuais, que realmente disse isso? Você acreditaria?

Pois é. Tudo parece ser, se não uma farsa, pelo menos um exagero tremendo. No blog Bad Science de Ben Goldacre, o tal perseguidor da má ciência, já havia sido denunciado isto dia 3 de maio (note, a reportagem do Fantástico saiu dia 25 de maio). O tal pó de bexiga de porco teria feito o dedo de um senhor se regenerar. Mas analisando as poucas fotos, um especialista em cirurgia de mãos Simon Kay diz que o ferimento não parece ter atingido o osso, nem a raiz da unha como dito da reportagem. E se isto não acontece, é mais que natural e normal a ponta do dedo crescer e ficar como antes. Ao pedido de mais fotos, não houve resposta.

Mas porque a farsa? O cientista que aparece, dr. Badylak diz a Goldacre que a história vazou na mídia antes de ser publicada como artigo científico, e na verdade não há um estudo preparado. No Fantástico, o tal amputado diz que utilizou o tratamento sugerido pelo irmão veterinário, já falecido. O que não se fala é que o falecido irmão é dono de uma empresa de biotecnologia chamada Acell, que produz o tal pó. Marketing ou homenagem póstuma? E porque não as duas?!

Aliás chamam o pó extraído da bexiga do porco de matriz extracelular, como se só lá houvesse tal matriz. TODOS os nossos tecidos possuem matriz extracelular em torno das células. Esse nome é o mais genérico possível.

Mas não critiquemos a pobre da Globo pela mancada. Esta notícia pode ser velha, afinal apareceu em fevereiro de 2007 no Wall Street Journal, MSNBC, e agora aparece novamente na BBC, Fox e ABC. É o famoso telefone sem fio das agências de notícias. O Fantástico acabou caindo nesta armadilha, que já estava mais do que desarmada.