Solução do Cunha: abra uma igreja e salve um parque

"Quer um conselho? Abra uma igreja, Niéde."
“Quer um conselho? Abra uma igreja, Niéde.”

Eu sei que estou comparando alhos com bugalhos aqui, mas ver essas duas notícias na minha linha do tempo do facebook me fez vomitar um pouquinho para dentro. Sabe né, aquela azia que sobe pelo esôfago até a base da língua? Esse mesmo.

Primeira notícia: CUnha enfia mais um jabuti.

Podia ser uma excelente notícia se fosse mesmo um jabuti (animal) e fosse em outro lugar que não na MP 668, que versa sobre o aumento de impostos sobre produtos importados. Jabuti é o apelido que se dá a um item que não tem nada a ver com o tema da MP. Afinal, isenção de imposto para trabalhadores de igrejas não tem muito a ver com aumentar impostos de importação, certo?

Basicamente, se for aprovada, e vai ser, afinal já foi tudo conversado por lá, comissões e gastos de servidores de igrejas não pagarão impostos. Vai se abrir uma via imensa de sonegação, já que o pastor pode estar registrado com um salário mínimo mas ganhar 100 mil por mês em comissão limpinha.

Segunda notícia: o fim da Serra da Capivara.

O Brasil pode mudar a história da raça humana. Os estudos da Niéde Guidon no Parque da Serra da Capivara têm mostrado que o homem pode ter chegado aqui nas américas muito antes do que se acreditava. As pinturas rupestres nas cavernas são patrimônio da humanidade, o que obriga o Brasil a preservá-las. Mas com que dinheiro?
Em entrevista, Guidon fala que até o fim do ano o parque fecha por falta de verba. O aeroporto, que poderia trazer muitos turistas para aquela região e manter o parque, foi começado e nunca terminado.

“Eu acho que perdi realmente a minha confiança no Brasil, inclusive estou pensando que tenho que voltar para a França, porque aqui não deu certo. (…) E não tem nada a ver o fato de o Parque ser no Piauí, ele é nacional e é obrigação do governo federal, do qual sempre tivemos apoio, mas agora está em redução completa porque o Brasil está falido. ” – Niéde Guidon.

Não vá não, Niéde Guidon. Quem sabe se montarmos a Igreja da Serra da Capivara a coisa não se resolve?

A NATURE liberou geral! Como ler artigos científicos sem pagar por eles

Denunciando a idade com a Porta da Esperança.
Denunciando a idade com a Porta da Esperança.

Vamos abrir as portas da esperança!!!

A Nature liberou para ler online todo o seu acervo! Não dá pra baixar, como eu disse é só para ler online, mas já é alguma coisa.

Ah, também não é qualquer um, você tem que receber um link de algum assinante para poder ver.

É, na verdade não ajudou muito né?

Mas e daí?

É que pirataria na ciência acontece e muito. Não estou falando de plágio de dados ou coisas assim (que também acontecem), mas de artigos científicos distribuídos sem autorização das editoras. Sabe baixar música de torrent? [Torrent? eu? Magina…] Sei sei… Então, é a mesma coisa, só que com informação científica.

As revistas mais importantes, que os cientistas mais usam para se informar e se manter atualizados, são pagas. E são muito caras. E rola uma polêmica, porque funciona assim: o cientista produz o artigo, escreve, manda pra revista, ela escolhe se publica ou não, e se publicar ela cobra de todo mundo que quiser ler. Lembrando que o cientista que escreveu não recebe NADA por isso. Sacanagem, né? Ficou claro que publicar revistas científicas é um ótimo negócio, e que só institutos grandes conseguem pagar isso tudo.

Por causa disso, um cientista pobre, ou um jornalista, ou um professor, ou um ex-cientista blogueiro que escreve sobre ciência ( o/ ), fica sem poder se atualizar. E é impossível fazer ciência sem ler os artigos. Daí o moleque cruza o braço e chora? Claro que não. Ele Pirateia.

Como conseguir um artigo sem pagar por ele:

Mandar email para o autor:

Esse era o mais comum e antigo. Houve época em que se mandava pedaços de celulose com traços de tinta (carta) para o autor e este enviava uma fotocópia do artigo. Bacana disso é que estreitava laços e o autor sabia quem estava interessado na sua pesquisa. Com o email foi a mesma coisa, apesar de o autor em geral não poder fazer isso sem autorização da editora.

Pedir ajuda para os universitários:

[segunda referência a Silvio Santos, aff] – Universidades e outros institutos grandes fazem assinaturas para que todos os seus funcionários possam ler os artigos que quiserem. Se eu não trabalho lá, mas conheço alguém que trabalha… Bom, entendeu né? É só pedir. E ninguém na lista interna de emails do Scienceblogs tinha pensado nisso! Olha que exemplo de retidão. O novo sistema da Nature parece que vai ser só uma evolução desse tipo de envio, agora com uma autorização da editora.

Esquema russo

Quando imaginávamos que o comunismo não mais nos ajudaria… ele não ajudou mesmo, afinal a Russia não é mais socialista. Mas lá está hospedado um site que tira, sabe Darwin de onde, os artigos abertos para você. É só colocar o site com o artigo que ele se abre todo. Às vezes funciona, às vezes não, mas é o preço da clandestinidade, de quem tem que ficar fugindo a todo momento das editoras com advogados farejadores. O endereço é sci-hubPONTOorg, e você NÃO viu isso aqui!

Réxitégui

Sim, o twitter serve para alguma coisa! É só pedir o seu artigo com a rashtag #icanhazpdf.

Google, sempre ele:

Google Acadêmico indexa pdf de qualquer fonte (site pessoal, rede social científica, etc) e coloca tudo em um mesmo link ( http://scholar.google.com.br/ )

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Dica do Massa Crítica

Nature makes all articles free to view

O maior mistério, e o post mais inútil, de 2013

Quem é macaco velho já sabe que o que vem fácil vai fácil. E com informação é a mesma coisa.

A gente vive num mundo onde ninguém paga nada para ter informação. Mas como pode ser isso se um bom escritor/jornalista/roteirista é caro? Porque a informação de graça que temos quase sempre é ruim. Muito ruim.

Nessa fome que os sites têm por cliques, que é o que paga as contas pela publicidade, eles fazem alguns absurdos.

Quer um exemplo simples?

O maior mistério de 2013…

We have absolutely no clue what built this crazy-complex structureSabe o que é isso? Não? Nem eu. Nem NINGUÉM!

Em março de 2013 saiu num post no site io9 uma notícia (copiado do post original da WIRED) a imagem de uma estrutura encontrada na amazônia que ninguém fazia ideia do que era. Bonitinha, estranha e realmente ninguém sabe o que é. Ok, isso é uma notícia ou pelo menos uma informação interessante e instigante. Passa.

Agora em dezembro aparece um UPDATE dessa notícia com o título “Cientistas estão prestes a desvendar o maior mistério de 2013”, e lá estava a foto da coisinha estranha. Cliquei. [Mas você não precisa clicar, viu. Só ponho o link aqui por princípio, mas leia o resto antes]

…e o post mais inútil do ano

É um post citando um twit de um grupo de cientistas dizendo que encontraram 11 dessas estruturas e que estão prestes a resolver esse mistério. E é isso. Mais nada.

Não, io9, isso NÃO é uma notícia. Não me interessa saber que alguém está quase desvendando um mistério, principalmente quando essa pessoa só disse que está perto de conseguir. Nem pra mandar um email pra esse pessoal? Esperar uma resposta minimamente informativa? Aliás, nem pra me dizer quem é esse cara, se é um cientista mesmo ou só um charlatão.

Mas pra quê apurar, né? O negócio é ter o máximo de cliques pelo mínimo esforço.

A revista WIRED é que fez direito: mandou uma repórter para a amazônia e está lá para dar em primeira mão os resultados.

 

Eu fiquei na dúvida se eu esperava esse resultado sair antes de publicar isto aqui. Mas sabe como é, se eu resolver tudo em um post, perco a chance de fisgar o seu click em mais um texto. Então FIQUE LIGADO NOS PRÓXIMOS CAPÍTULOS!  😉

PÁRA, PÁRA, PÁRA! Depois dos comerciais eu mostro

Jornalistas de ciência são caros. Quem vai pagar?

Hunter S Thompson by nevarraven
Hunter S Thompson
by nevarraven

O jornalismo está em crise. E uma crise feia.

Se você é um cidadão, mesmo que não-jornalista, você TEM QUE LER esse artigo chamado O que podemos fazer para salvar o jornalismo, que dá uma boa ideia de toda a situação. Ele até sugere meios de resolver isso tudo. Muito bom esse artigo. LEIA! 

O problema é sempre a grana. Agora, com a internet, a publicidade saiu dos jornais e revistas impressos mas não foi todo para as mídias digitais: de cada  4 dólares de publicidade que saem dos impressos, só 1 vai para a internet, ou seja, os blogueiros não ganham mais e os jornalistas da impressa ficam desempregados.

Bons jornalistas, experientes e especializados em política e economia, por exemplo, são importantes, claro. Nenhum estagiário pode fazer o papel de uma Mirian Leitão ou um William Waack. O problema é que eles são caros, e com razão.

Bom, se o jornalismo como um todo já está passando por maus bocados, imagina os pobres jornalistas de ciência, que sempre cobriram esse tema tão difícil, delicado e importante como política e economia, mas que é tratado como uma curiosidade supérflua nas redações do mundo todo. Contamos nos dedos os bons jornalistas de ciência brasileiros, e eu tenho a honra de  ter muitos deles como colegas aqui no ScienceBlogs Brasil. Foi o contato com esse pessoal que me mostrou a diferença de um jornalista generalista e um especializado, e a diferença é imensa, acredite.

Todo cidadão tem que estar esperto com esta questão do jornalismo porque ele é uma ferramenta indispensável para o nosso sistema democrático. A gente precisa de informação pertinente, imparcial, investigativa e de qualidade pra tocar o país.

E em ciência, viver de press release não dá!

 

Como um doutor em biologia pode ser anti-Darwin?

Three_Wise_Monkeys

Uma amiga minha, Rubia, me mandou este texto que mostra um inconformismo parecido com o que eu senti quando fiquei sabendo, nas palavras dela, que ” 51% dos norte-americanos não acredita na evolução darwiniana e eles dizem isso na maior cara-de-pau”. Absurdo né? Farei os meus comentários depois, talvez em outro post, mas agora veja o que ela tem a dizer sobre isso.

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Esta semana eu estava fazendo as leituras obrigatórias para uma disciplina que curso como ouvinte no Departamento de Comunicação da Universidade de Cornell. O tema é o debate sobre o ensino da teoria da evolução versus design inteligente (D.I.) nas escolas norte-americanas. Vale ressaltar neste ponto que sou formada em ciências biológicas e que acredito na evolução tanto quanto acredito na lei da gravidade.

Enquanto lia, visualizava os adeptos do D.I. como uma minoria caipira do tipo que vai fazer compras no supermercado vestindo a cueca por fora da calça. A cavalo.

Estava cansada de ler e as três gurias com quem eu moro estavam conversando sobre as aulas da semana, então resolvi aproveitar a pausa para falar do tema da minha aula. Falei por uns 3 minutos sobre as leituras e li em voz alta uma ou outra frase de uma entrevista que dizia que Darwin era o responsável pela difusão do ateísmo no mundo. Tudo com bastante sarcasmo e ironia, pois achei que estava falando de algo bastante óbvio. Uma delas então me perguntou o que eu achava da evolução. Não entendi a pergunta e ela repetiu, “você acredita na evolução? Acha que é verdade?” Ainda confusa com a pergunta (dãh!) respondi que sim, e com bastante medo praticamente sussurrei: “você…não?”

ATENÇÃO – OS PRÓXIMOS PARÁGRAFOS PODEM CAUSAR ARRITMIA, CONFUSÃO MENTAL E TAQUICARDIA

Ela com a cara mais lavada me diz que não. E uma por uma, as outras três (tínhamos uma visitante) confirmaram que “também não acreditam na evolução”. E pasmem, também não acreditam na teoria do Big Bang.

Eu simplesmente não sabia o que dizer, estava horrorizada. Chocada. Triste. Com pena do Darwin. Para os desavisados como eu, saibam que algo entre 48% e 51% dos norte-americanos não acredita na evolução darwiniana e eles dizem isso na maior cara-de-pau, sem o menor medo de ser feliz. Aqui é normal.

A entrevista da qual eu falei foi feita em 2009 com o Jonathan Wells, um Doutor em biologia celular e molecular pela Universidade da Califórnia (ele também é Doutor em estudos religiosos pela Universidade de Yale). Selecionei dois trechos particularmente interessantes, a entrevista na íntegra pode ser encontrada aqui:

Entrevistador: “Este ano é o bicentenário de Darwin. O que você poderia dizer

que é um bom resumo, hoje em dia, dos seus escritos sobre evolução?”
JW: “Por quê não celebramos o centenário de Mendel nos anos 1920, ou o
tricentenário de Newton nos anos 1940? Ambos foram grandes cientistas.”

Pausa: Hein?! O que tem a ver o c….

Prosseguindo:

JW: “Darwin não é celebrado por suas contribuições científicas, mas porque sua
teoria se tornou o mito criador do ateísmo.”

Outro trecho peculiar:

JW: “(…) dados do projeto genoma estão revelando grandes inconsistências no
argumento Darwiniano de que todos os organismos compartilham um ancestral
comum, e que ninguém nunca observou a origem de uma nova espécie – muito
menos a origem de novos órgãos – por variação e seleção. Por outro lado, a
evidência para o design inteligente está aumentando. Mais cedo ou mais tarde,
evidência vencerá.”

O que não sai da minha cabeça é: como uma pessoa que passou por um doutorado em biologia celular e molecular pode ser anti-Darwin? Mais ainda, com uma quantidade irrefutável de evidências científicas e de consenso quanto à teoria da evolução, como é possível que de cada 2 norte-americanos, só 1 acredite nela?

Para Chris Mooney e Matthew Nisbet, a polêmica tem raízes religiosas mas grande parte da culpa é da mídia. Eles afirmam em um artigo intitulado “Undoing Darwin” (ou “Desfazendo Darwin”) que quando a evolução sai do campo científico e entra no campo político e jurídico, ela deixa de ser coberta por jornalistas com conhecimento científico para navegar entre páginas sobre política e opinião, e também nos jornais televisivos. Todos esses contextos, cada um ao seu modo, tendem a retirar a ênfase na forte evidência científica em favor da evolução para dar credibilidade à ideia de que há uma crescente controvérsia sobre a ciência evolutiva, e assim a mídia está cumprindo o seu papel e cobrindo “os dois lados” do tópico. Eles afirmam categoricamente que esta prática “pode ser politicamente conveniente, mas é falsa”.

O Estado é laico mas mesmo assim temos referencias religiosas no dinheiro, nas escolas, na política com o caso escandaloso do pastor Feliciano como presidente da Comissão de Direitos Humanos. É o verdadeiro samba do crioulo doido.

Algo semelhante acontece com o caso das mudanças climáticas e aquecimento global. Ao tentar veicular ambos os lados do debate de maneira “imparcial”, a mídia retrata de maneira bastante desproporcional a opinião partilhada pela maioria dos cientistas quando dedica o mesmo tempo no ar (ou o mesmo espaço na mídia impressa) para os céticos. Dá nisso, o público fica confuso e a ignorância se espalha feito fogo no milharal.

 

@rubiagaissler é doutoranda em ambiente e sociedade e estuda as relações entre mídia e ambiente. Seu blog, Ciência Sapiens, pode ser visto aqui: rubiagaissler.wordpress.com.

 

UPDATE: continue lendo sobre este assunto no próximo post:

Se a sua fé precisa de embasamento científico é porque está fazendo alguma coisa errada

 

Ato Público na SBPC sobre a distribuição dos royalties do pré-sal!

Sei que está muito em cima da hora, mas não posso deixar de divulgar o evento que acontecerá hoje na sede da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a SBPC, em São Paulo.

Trata-se de um Ato Público que começará às 14h30 no Salão Nobre da entidade e tem como objetivo chamar a atenção e tentar reverter o quadro atual de distribuição dos royalties do petróleo que não inclui um percentual de destinação para as áreas de educação, ciência, tecnologia e inovação (C,T&I).

O evento é aberto ao público e reunirá dirigentes de instituições de educação e C,T&I, docentes, pesquisadores, parlamentares e autoridades dos governos estadual e federal.

Eu estarei lá. Quem não puder comparecer saberá tudo o que aconteceu aqui pelo RNAm.

Mais informações sobre o evento em Entidades científicas fazem novo ato público em favor da Educação e C,T&I.

Já escrevi sobre a situação dos royalties do pré-sal no post Royalties do pré-sal: como transformar óleo em desenvolvimento nacional.

Aproveite a oportunidade para contribuir com a sua assinatura e ajudar essa importante causa!

“Overdose homeopática” Dia 5 de fevereiro tem Desafio 10:23!

No próximo sábado acontecerá o Desafio 10:23, um protesto que busca conscientizar o público sobre o que a homeopatia realmente é.

Às 10h23 da manhã do dia 5 de fevereiro, horário local, ativistas em mais de 10 países realizarão uma “overdose homeopática” coletiva para demonstrar que:

1023-Brazil-300x205.pngHomeopatia – É feita de nada

A “overdose” será registrada por fotos e filmes, sendo em seguida compartilhada em redes sociais como Twitter, Facebook, Orkut etc. pelos voluntários e apoiadores. Há alguns dias apoiadores, organizadores e voluntários estão divulgando material relacionado à campanha. Alguns deles são:

Homeopatia não é feita de nada (Rainha Vermelha)

Médicos, CFM, homeopatia e imoralidades (Uôleo)

Para uma ideia diluída, o remédio é conhecimento concentrado. (RNAm)

Será que ele é? (RNAm)

Para saber como o protesto funciona, confira o vídeo abaixo!

A mídia também tem dado cobertura ao evento:

Céticos questionam a eficácia da homeopatia (Gazeta do Povo – PR)

Ativistas contra a homeopatia vão tomar “overdose” (Portal R7)

Ativistas contra a homeopatia vão tomar ‘overdose’ no próximo sábado, 5 (Estadão.com.br)

Mais informações sobre a ação em http://1023.haaan.com/

Será que ele é?

Tirinha.jpg

Hunf, tolerância tem limite…

Essa tirinha foi traduzida do ótimo Saturday Morning Breakfast Cereal e inaugura os posts relacionados ao Desafio 10:23, um protesto em que ativistas em mais de 10 países se reunirão no fim de semana de 5-6 de fevereiro de 2011 para
esclarecer que:

1023-Brazil-300x205.png

Querem saber mais? Acessem http://1023.haaan.com/ e saibam tudo sobre a ação!

ps 1: Culpem o GIMP e suas fontes gringas pela falta de acentuação, eu juro que tentei encontrar uma fonte boa que as aceitasse.

ps 2: Por favor, não me façam explicar a piada da tirinha. Sério.

O caso dos aminoácidos perdidos…

A motivação desse texto vem de uma reportagem sobre a possibilidade de alguns aminoácidos serem provenientes do espaço, na qual senti necessidade de corrigir alguns escorregões:

  1. “Os aminoácidos são importantíssimos porque ajudam a compor as proteínas, indispensáveis para a existência de todas as formas de vida no nosso
    planeta.”
  2. “Ao estudar os fragmentos de um meteorito… descobriram… aminoácidos do tipo canhoto.” (nunca ouvi aminoácidos D e L serem chamados “destros” e “canhotos”, alguém pode confirmar?)
  3. “Na Terra, todos os seres vivos têm aminoácidos canhotos… Mas isso não quer dizer que a versão destra seja impossível
    por aqui. Cientistas já conseguiram sintetizá-la em laboratório.”

Sabemos que os aminoácidos são moléculas que, interligadas,
formam a cadeia principal de todas as proteínas. Ao contrário do comentado na reportagem, não é uma questão de
“ajudar a compor” e sim de definir. Desse modo, sem os os aminoácidos simplesmente não há proteína.

Aproveitando o tema, existem dois “causos” relacionados aos aminoácidos que me incomodam demais há algum tempo:

  1. Por que quase ninguém fora da área de proteínas reconhece a existência de 2 aminoácidos “extras” além dos 20 clássicos?
  2. O que diabos há com um mundo em que ainda é comum encontrar a frase “os L-aminoácidos são os únicos presentes nas proteínas” e suas variáveis?

O mistério dos aminoácidos proscritos
Os dois aminoácidos nunca citados são a selenocisteína e a pirrolisina. Pode-se imaginar que os dois sejam resultado de alguma modificação pós-traducional, ou seja, a informação para sintetizá-los não estaria no DNA mas seria um produto indireto da expressão genética. No entanto, dados científicos já demonstraram que ambos são codificados como os 20 aminoácidos “clássicos”. Por que continuamos com o padrão “existem 20 aminoácidos codificados pelo nosso genoma”?

Uma explicação óbvia poderia ser: “o conhecimento é muito novo, por isso ainda não foi incorporado aos livros e é desconhecido por gente fora da área”.

Essa justificativa pode ser válida para a pirrolisina, identificada em bactérias do gênero Methanosarcina apenas em 2002, mas no caso da selenocisteína esse conhecimento está disponível desde a década de 1960! Qual é a explicação?

Aminoácidos através do espelho

Quem já estudou Biologia e nunca ouviu a frase “todos os aminoácidos biológicos (com exceção da glicina) são L-aminoácidos”?

quiral.jpgA nomenclatura D ou L vem da comparação estrutural com a molécula quiral do gliceraldeído. Quiral é o nome dado a moléculas que possuem um átomo de carbono ligado a 4 grupos químicos diferentes, de modo que sua estrutura não é sobreponível à sua imagem num espelho. É a distribuição espacial dos grupos químicos em torno desse carbono quiral que denomina, em comparação às formas do gliceraldeído, os aminoácidos L ou D.

Voltando à questão: em biologia sempre teremos L-aminoácidos, certo? Errado!

Em mais um inexplicável caso, desde a década de 1940 são conhecidos D-aminoácidos em organismos vivos. Inicialmente identificados nas paredes celulares de bactérias Gram-positivas, a suspeita da existência biológica desses aminoácios existia desde a década de 1930, quando foi descoberta uma enzima de mamíferos chamada D-aminoácio oxidase EC 1.4.3.310.

A suspeita é lógica: porque haveria uma enzima especializada em D-aminoácidos se os mesmos não participassem no metabolismo desses animais? Como esperado, algum tempo depois foram identificados e quantificados D-aminoácidos nos fluidos corporais de vertebrados. Novamente: porque esse conhecimento não foi atualizado?

O que justifica essa defasagem do ensino? Tomara que as atualizações dos livros de Biologia não demorem muito mais tempo, afinal, a situação já está ficando feia!

Notícias:

Referência:

SILVA, João J. R. Fraústo da  and  SILVA, José
Armando L. da. D-aminoácidos em biologia: mais do que se julga. Quím. Nova [online]. 2009, vol.32, n.2 [cited  2011-01-20], pp. 554-561 (Link para a versão PDF.)

A ingenuidade de Bill Gates sobre a Biologia

Caro Bill Gates,

Sinto informar que células não são tão rápidas quanto elétrons. Mais que isso: burocracia para mexer com gente e com o ambiente não é tão simples quanto programar um software.

Digo isto em vista da reportagem do New York Times, repassado pela Época, sobre o balanço dos investimentos em pesquisa em saúde feitos pela fundação Gates.

 

“Cerca de 1.600 propostas chegaram, e as 43 principais eram tão promissoras que a Fundação Bill & Melinda Gates liberaram US$ 450 milhões em bolsas de cinco anos _ mais de duas vezes a estimativa inicial.
Recentemente, a fundação chamou todos os cientistas a Seattle para avaliar os resultados e decidir quem seguirá recebendo os financiamentos. Numa entrevista, Gates soou de certa forma moderado, dizendo diversas vezes: “Nós fomos ingênuos”.”

[Leia a história e os projetos selecionados aqui]

 

Mas na verdade não dá pra saber se ele foi ingênuo ou enganado pelo hype alardeado pelos projetos. Afinal o objetivo de escrever um projeto é justamente convencer a todo custo quem o lê. O famoso “puxar a sardinha pro seu lado”, coisa que as vezes (muitas vezes) os cientistas fazem exagerando nas expectativas e enviesando as perspectivas. Outra coisa é que tem vários ganhadores do Nobel participando, e convenhamos que receber um projeto de um cara desses e dizer “não” não deve ser fácil.

Fato é que ele parece não ter gostado do resultado. E muita gente, incluindo um comentarista da reportagem acima, os cientistas e o próprio Bill Gates acham que o dinheiro investido nessas pesquisas foi algo bem significativo! Quando na verdade o gasto é irrisório comparando com gastos militares por exemplo. Para entender meu ponto de vista você precisa ler este texto espetacular do 100 Nexos, onde se lê que antes do telescópio Hubble, o instrumento mais fantástico da astronomia por muito tempo, que ajudou a desvendar milhares de mistérios do espaço, do tempo passado e do futuro, é uma aplicação tardia de um projeto de satélites-espiões que somaram 9 em nossa órbita!

Ou seja, enquanto mendigamos por recursos para a astronomia e também para outras áreas como a saúde e o bem-estar humano, uma quantia gigantesca é gasta sem que nós sequer saibamos onde.

Obrigado Bill Gates, continue assim gastando parte da sua fortuna pelo bem do próximo (e olhem que eu não estou nem questionando o como essa fortuna foi adquirida), mas acho que mesmo este esforço é uma gota num oceano de descaso pela vida humana.