Foto da Semana: “Poente Ornitológico”

Era um final de tarde e eu estava de saco cheio de ficar dia inteiro no laboratório sentado em frente ao computador. Ainda me restava uma hora de luz do dia e antes que me desse conta eu já estava dentro do carro dirigindo rumo a uma lagoa que fica na beira de uma rodovia.

Quando cheguei ao meu destino o sol já ameaçava sumir entre as montanhas, foi então que percebi que um grande bando de marrecas-irerê (Dendrogyna viduata) se aproximava ao longe. Antes de pousar na lagoa elas fizeram questão de passar bem em frente ao pôr do sol, dai foi só clicar…

Tchau e bença urso-polar!

Segue abaixo notícia publicada ontem na BBCBrasil.com:
E tem gente que não acredita em aquecimento global…

Derretimento no Ártico atingiu nível crítico, dizem cientistas

Cientistas americanos advertiram que a área coberta de gelo no Ártico se reduziu a seu segundo menor nível desde o início dos registros por satélite, há 30 anos – o pode indicar que o derretimento chegou a um nível em que seus efeitos começam a se tornar irreversíveis.

O derretimento este ano foi medido mais cedo que o normal. Por isso, os cientistas acreditam que a área pode diminuir ainda mais, para uma superfície menor que a registrada em setembro do ano passado, a menor já registrada.

“Podemos muito bem estar em uma rápida trajetória rumo a superar um ponto sem volta”, disse o cientista sênior do Centro Nacional de Monitoramento de Neve e Gelo (NSIDC, sigla em inglês), no Colorado, Mark Serreze. “Estamos passando agora por esse ponto.”

Em 26 de agosto, a área coberta de gelo do Ártico media 5,26 milhões de quilômetros quadrados.

Em 2005, foi registrada uma área coberta semelhante, de 5,32 milhões de quilômetros quadrados – mas a medição desse ano foi feita em setembro, um mês antes da medição deste ano.

No recorde de derretimento, registrado em setembro de 2007, o gelo cobria apenas 4,13 milhões de quilômetros de quadrados. A título de comparação, a extensão de 1980 era de 7,8 milhões de quilômetros quadrados.

A maior parte da cobertura atual consiste em uma camada relativamente fina de gelo, formada durante um só inverno e que derrete mais facilmente que o gelo formado ao longo de muitos anos.

Verões sem gelo

Independentemente de o recorde de 2007 se manter ou ser quebrado nas próximas semanas, a tendência no longo prazo é evidente, dizem os cientistas: o gelo está declinando de forma mais acentuada que há uma década, o que transformará progressivamente o Ártico em uma região de mar aberto durante o verão.

Uma previsão feita há alguns anos estimava que até 2080 o verão ártico se caracterizará por ser uma estação sem gelo.

Posteriormente, modelos de computador começaram a antecipar as datas para algo entre 2030 e 2050; hoje, alguns cientistas crêem que isto pode ocorrer dentro de cinco anos.

Um fenômeno que trará novas oportunidades, incluindo a chance de explorar petróleo e gás na região. A queima deste combustível elevaria o nível das emissões de gases que causam o efeito estufa na atmosfera.

A ausência de verões gelados no Ártico teria impactos locais e globais. A imagem do urso polar em busca de gelo já é familiar; mas outras espécies, como focas, também sofreriam mudanças em seu hábitat, assim como muitos habitantes do Ártico.

Globalmente, o derretimento do gelo ártico reforçaria o fenômeno do aquecimento, já que águas abertas absorvem mais energia do sol que o gelo.

Morcegos e Energia Eólica

Embora seja considerada uma das fontes de energia mais “ecologicamente” corretas, as turbinas responsáveis pela geração da energia eólica representam um grande risco a animais voadores, como aves e morcegos que frequentemente são “fatiados” vivos ao se chocarem com as lâminas das turbinas.

No entanto, o problema pode ir um pouco além das consequências óbvias do choque físico entre animais e turbinas. Em um recente estudo publicado no periódico Current Biology, pesquisadores canadenses demonstraram que a causa da morte da maioria dos morcegos vitimados por turbinas eólicas deve-se a hemorragia interna. O problema é causado por uma diferença de pressão atmosférica existente próximo as lâminas, matando os animais mesmo que eles não venham a se chocar com as mesmas.

A rotação das turbinas causa uma queda da pressão atmosférica na região próxima a extremidade das lâminas. Quando um morcego passa por essa zona de baixa pressão seus pulmões sofrem uma expansão repentina, o que resulta no rompimento dos vasos capilares do órgão causando hemorragia interna, algo similar ao que acontece com mergulhadores que experimentam mudanças repentinas de pressão.

Embora também sejam vítimas frequentes das turbinas eólicas, as aves são menos impactadas que os morcegos, pois, graças ao seu sistema respiratório mais robusto, não sofrem com o problema de despressurização.

As alternativas das celebradas “energias alternativas” estão aumentando, agora podemos escolher se preferimos matar os animais afogados ou fatiados e com hemorragia interna.  “Se ficar o bicho pega, se correr o bicho come”…

Referência:

Erin F. Baerwald, Genevieve H. D’Amours, Brandon J. Klug and Robert M.R. Barclay. 2008. Barotrauma is a significant cause of bat fatalities at wind turbines. Current Biology; Vol 18, R695-R696 [link]

Há dez anos atrás…

As pessoas costumam metaforizar a vida em um livro e suas páginas, no meu caso o melhor seria uma caderneta, e aí embaixo está a página mais importante da minha vida.

Parece que foi ontem, mas a data no topo da página não me deixa esquecer, era uma manhã fria de inverno e pouco antes das 7:00 da manhã já estávamos de pé Bruno, Pedro e eu esperando pelo Bosco. Em 1998 nós éramos três bons amigos na sexta-série do ensino fundamental e não fazia nem uma semana que havíamos conhecido o Bosco durante uma feira profissional e universitária no ginásio da nossa escola. Ele também era aluno, mas diferente da gente já estava acabando sua faculdade de Biologia e na ocasião estava responsável por um dos estandes da feira.

Faculdade parecia ser uma coisa muito distante para três moleques entre 13 e 15 anos,  por isso caminhávamos sem muito propósito pela feira durante a hora do recreio. Não demorou muito e nos deparamos com o estande da universidade do Bosco e meia duzia de aves empalhadas estrategicamente posicionadas sobre uma mesa para atrair possíveis alunos do terceiro ano interessados em Biologia. Se as aves atingiram seu propósito não sei, mas me lembro bem no efeito que elas tiveram sobre mim, um menino fanático por passarinho que sem saber muito bem expressar sua paixão, passou a infância de estilingue e alçapão na mão.

Depois de um bocado de perguntas o Bosco se deu conta da nossa empolgação com as aves e disse que no dia seguinte traria alguns livros para vermos. No outro dia, enquanto folheávamos maravilhados aqueles livros com fotos e mais fotos de passarinhos ele nos explicou que observar aves era um passatempo praticado por muitas pessoas no mundo inteiro e nos convidou para uma saída de campo no próximo final de semana.

Como eu dizia… Parece que foi ontem, era uma manhã fria de inverno e pouco antes das 7:00 da manhã já estávamos de pé Bruno, Pedro e eu esperando o Bosco. Logo que ele chegou seguimos rumo ao nosso destino, uma estrada de chão que começava no final da rua do Bruno. Enquanto caminhávamos o Bosco foi nos apresentando passarinho por passarinho que cruzava o nosso caminho, nunca vou me esquecer de como fiquei impressionado de ouvir ele falando o nome científico de cada um deles.

Já era quase meio dia quando voltamos para casa do Bruno e o Bosco ditou e soletrou os nomes científicos das aves que havíamos observados naquela manhã de 22 de agosto de 1998 e eu cuidadosamente  os escrevi na minha primeira caderneta de campo. Antes de terminar de escrever o último nome eu já havia me decidido, “quando crescer quero ser um cientista estudioso de passarinhos”.

Acho que consegui…

Aquecimento global afeta habitats de aves, diz estudo

Notícia publicada ontem na seção Ambiente da Folha Online.

Aquecimento global afeta habitats de aves, diz estudo

da France Presse, em Paris

Os habitats de espécies de aves selvagens estão mudando em razão do aquecimento global, mas não o suficiente para aliviar os efeitos das altas temperaturas. A informação é de um estudo publicado nesta quarta-feira (20).
“A flora e a fauna ao nosso redor estão mudando ao longo do tempo devido ao aquecimento global”, afirmou Victor Devictor, principal autor do estudo e pesquisador no Museu Nacional Francês de História Natural.
“O resultado é uma falta de sincronismo. Se pássaros e as espécies de que eles dependem não reagem do mesmo modo, nós rumamos para uma mudança drástica na interação entre as espécies”, afirmou o pesquisador.
O estudo mostrou que a área geográfica de 105 espécies de pássaros na França –o que representa 99,5% do total de aves selvagens do país– se moveu, em média, 91 km para o norte, entre 1989 e 2006.
Mas, as temperaturas médias, mudaram em uma área de 273 km ao norte durante o período –cerca de três vezes mais rápido.
O fato de alguns pássaros responderem à mudança climática já havia sido notada em algumas espécies. O que surpreendeu Devictor foi o fato de essas mudanças afetarem praticamente todos os pássaros na França, e o descompasso com a elevação das temperaturas está cada vez maior.
Esses “desencontros” tendem a se intensificar durante o tempo e podem levar algumas espécies de pássaros à extinção.

Migração do Caapora

Como todos já devem ter percebido, o Caapora migrou em busca de condições mais favoráveis para sua sobrevivência, comportamento que não é de se estranhar em se tratando de um blog com “um leve viés ornitológico”.

O Caapora aceitou o irrecusável convite para se juntar ao portal de blogs científicos Lablogatórios e a partir de agora esse passa ser seu hábitat natural. Embora já com novo conteúdo, o blog ainda deve passar por algumas transformações no visual e ganhar novidades nas próximas semanas.

As postagens antigas continuarão disponíveis no endereço anterior (www.caapora.blogspot.com).

Não, não é história de pescador!

No último dia 14, pescadores de Palhoça, Santa Catarina, capturaram um peixe com aspecto de uma serpente e com nadadeiras cor de rosa. A história parece de pescador, mas abaixo seguem as fotos que comprovam a história.

Peixe-remo (Regalecus glens), capturado no litoral de Santa Catarina

Regalecus glesne é o nome científico da exótica criatura, que é popularmente conhecida como peixe-remo. A espécie detém o recorde de maior representante da classe Actinopterygii, da qual fazem parte todos os peixes ósseos, podendo atingir incríveis 11 metros de comprimeto e pesar até 270 kg!!! Se não bastasse o tamanho avantajado, Regalecus glesne possui ainda as nadadeiras e um extravagante “topete” cor de rosa pink, dando um aspecto ainda mais bizzarro ao animal.

<i>Peixe-remo </i>(Regalecus glens), <i>capturado no litoral de Santa Catarina</i>.

Peixe-remo (Regalecus glesne), capturado por pescadores no litoral de Santa Catarina.

O indivíduo capturado em Santa Catarina é um jovem, medindo “apenas” 1,66 metros de comprimento. Sua captura, no entanto, possui grande importância científica uma vez que trata-se da primeira prova documentada da ocorrência da espécie nos mares da América do Sul, segundo Jules Souto, do Museu Oceanográfico da Univali, intituição para onde o espécime foi depositado. Ainda segundo Souto o único registro anterior da espécie na América do Sul foi feito por ele mesmo há 20 anos atrás também na costa de Santa Catarina, mas naquela ocasião o peixe não foi fotografado e nem capturado.

Graças ao seu tamanho e aparência fora do comum o peixe-remo pode ser o responsável por boa parte dos antigos avistamento das mitológicas serpentes marinhas em mares de todo mundo, conforme demonstra a ilustração abaixo de um Regalecus glesne encalhado na costa das Bermundas em 1860 e que na ocasião foi descrito como uma serpente marinha.

<i>Ilustração de um </i>Regalecus glens <i>encalhado nas Bermudas em 1860, o espécime foi orignalmente descrito como uma serpente marinha</i>.

Ilustração de um Regalecus glesne encalhado nas Bermudas em 1860, o espécime foi originalmente descrito como uma serpente marinha.

O Paradoxo do Pombo

Há alguns dias atrás fui à república de um colega de universidade que está conseguindo faturar um dinheiro extra imprimindo monografias, trabalhos, artigos e similares para outros universitários que não se importam em caminhar um pouco por causa de uma diferença de dois centavos por folha entre os preços da impressão caseira do meu colega e de sua concorrente, a xerox da universidade. 100 folhas impressas dão uma economia de R$ 2,00, com mais 10 centavos se pode comprar três miojos e para muito graduando bolsista de iniciação científica o jantar está garantido por pelo menos três dias.

Como a maioria das repúblicas por aqui, a desse meu colega não fica muito longe da universidade, um apartamento a cerca de três quarteirões de distância. Olhando por fora uma república como outra qualquer, mas é só subir as escadas e olhar pela janela que logo se percebe a diferença, a sua frente você verá umas duas dezenas de árvores com uma meia dúzia de banquinhos espalhados pelo chão de terra batida. Esse conjunto, árvores mais banquinhos é pomposamente chamado de “Horto Municipal”. Algo pouco impressionante, mesmo quando comparado a muitos aglomerados de árvores com status inferiores de praça e/ou parque que existem em qualquer cidade brasileira, mas em Campos dos Goytacazes, no extremo norte fluminense, qualquer árvore ainda de pé é uma rara sobrevivente dos quase quatro séculos de monocultura de cana-de-açúcar.

Enquanto a impressora trabalhava, eu me debrucei na janela e me pus a admirar a paisagem. Não demorou muito e encontrei um belo casal de saíras-amarelas (Tangara cayana) na copa de uma das árvores. Alguns segundos depois escutei as vozes do sanhaço-de-coqueiro (Thraupis palmarum) e da maria-é-dia (Elaenia flavogaster). Ao longe, abafado pelo som da impressora, se podia escutar também o canto mavioso de um sábia-do-barranco (Turdus leucomelas), tratei de imitá-lo no assobio e não demorou muito ele veio me responder em uma das árvores bem em frente da janela. Ele cantava de lá eu imitava de cá e logo depois ele respondia, meu anfitrião e operador de impressora achou a cena engraçada e soltou umas boas gargalhadas enquanto me chamava de maluco por conversar com os pássaros, “tinha que ser mesmo o Luciano passarinho”, dizia ele. Continuei ali na janela e antes que as 107 páginas fossem impressas eu já havia registrado outras 12 espécies de aves silvestres: corruíra (Troglodytes musculus), siriri (Tyrannus melancholicus), bem-te-vi (Pitangus sulphuratus), bentevizinho (Myiozetes similis), caga-sebo (Coereba flaveola), ferreirinho-relógio (Todirostrum cinereum), beija-flor (Amazilia fimbriata), lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta), rolinha (Columbina talpacoti), gavião-carijó (Rupornis magnirostris), andorinha (Pygochelidon cyanoleuca) e o  urubu-de-cabeça-preta (Coragyps atratus).

Lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta), uma das muitas espécies de aves facilmente observadas na área urbana de muitas cidades do Brasil.

Lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta), uma das muitas espécies de aves facilmente observadas na área urbana de muitas cidades do Brasil.

Por mais incrível que possa parecer, conseguir registrar 16 espécies de aves silvestres em menos de meia hora a partir de uma janela em plena área urbana não é nenhuma façanha, muito menos um privilégio dos olhos e ouvidos sempre atentos de um ornitólogo. Em se tratando de Brasil, não importa a cidade, as pessoas só precisam abrir os olhos e os ouvidos e prestar um pouco mais de atenção a sua volta e logo se verão rodeadas por inúmeras criaturas interessantíssimas com nome e sobrenome e que até então não passavam de simples “passarinhos”.

A maioria das espécies de aves que habitam ambientes urbanos são geralmente bastante comuns nas regiões onde ocorrem e pouco exigentes quanto a qualidade ambiental, sendo por isso carionhosamente conhecidas como ornitolixo para alguns ornitólogos. Apesar disso, estas espécies podem ser de grande impotância para sensibilização e educação ambiental, agindo  como embaixadores da conservação de seus parentes não muito distantes, dependentes de áreas naturais mais conservadas. Em um trabalho publicado no periódico científico Conservation Biology, Robert R. Dunn e colaboradores (2006) definiram essa situação como “O Paradoxo do Pombo”. Segundo Dunn, a conservação dos ambientes naturais dependerá cada vez mais das chances das pessoas nas cidades conseguirem manter algum tipo de conexão com a natureza, o que na maioria dos casos se dará em áreas verdes encravadas dentro de grandes cidades e com a fauna e flora que habitam esses locais.

Na sua essência, o pensamento de Dunn e seus colegas é facilmente compreendido e remete ao fato que as pessoas estão muito mais suscetíveis e dispostas a conservar a natureza quando elas experimentaram algum tipo de contato direto com o mundo natural, seja em uma trilha no meio da floresta amazônica ou em um parque urbano próximo ao centro de São Paulo. Dessa forma, no quesito sensibilização, conscientização e educação ambiental, áreas verdes urbanas e as espécies oportunistas que nelas ocorrem possuem importância comparável a unidades de conservação situadas em áreas quase intocadas e as espécies raras e endêmicas que as habitam. Em uma sociedade cada vez mais urbanizada, compreender o “paradoxo do pombo” e promover a criação e manutenção de áreas verdes urbanas pode ser fundamental para acabarmos com um outro paradoxo, o fato de sermos um dos países mais ricos em biodiversidade do planeta e ao mesmo tempo um dos que menos cuida de tamanha riqueza.

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