Atualmente, temos ouvido/lido muito sobre os termos código genético do vírus, DNA e RNA mensageiro. Mas o que esses termos significam?
Nós não estamos sozinhos na Terra. Ela é a casa de mais de 8.7 milhões de espécies, isso contando apenas os eucariontes – daqui a pouco conto o que eles/nós temos de especial – e não inclui as bactérias e vírus. Já parou para pensar em como essas espécies garantem que a sua prole tenha as mesmas características da espécie?
A ideia de como as informações sobre como os organismos fazem cópias de si mesmos, assim como a instrução para a construção de estruturas e funcionamento de um novo organismo, foi um mistério por um longo tempo. As primeiras peças do quebra-cabeça para enterdemos como as informações estão organizadas nos organismos começou a ser encontrada há muitos anos atrás.
Para se ter uma ideia, a célula, a estrutura mínima que compõe os seres vivos, foi descoberta por volta de 1660 graças a invenção do microscópio. Quando Robert Hooke olhou para as fatias finas de cortiça através do microscópio, viu que elas eram compostas por pequenas estruturas, que lembravam buraquinhos de um favo de mel a que ele deu o nome de célula (pequena cela).
Esse foi só o início. Com o desenvolvimento da ciência e o aparecimento de novos instrumentos e técnicas continuamos a descobrir cada vez mais sobre essa pequena unidade que nos compõe.
O núcleo de tudo isso
A unidade morfológica em que se baseia a vida, a célula, pode ser classificada em dois grupos principais, as eucarióticas, que possuem núcleo envolto por uma membrana e que contém o material genético – dos quais fazemos parte – e os procariotos que não possuem núcleo e o material genético fica disperso no citoplasma, como é o caso das bactérias.
Apesar da diferença quanto a presença de núcleo, tanto as células eucarióticas quanto as procarióticas possuem membrana plasmática que separa o interior da célula do seu ambiente. Ela tem um papel extremamente importante e acaba selecionando o que entra no interior da célula por meio de diferentes processos.
Além disso, as células são compostas pelo citosol, ou seja, o interior da célula. Ele é repleto de espécies químicas e organelas, o citoplamas. As organelas são estruturas celulares com funções específicas e separadas do citoplasma por meio de uma membrana.
A maior organela da célula eucariótica é o núcleo. Ele abriga o DNA (ácido desoxirribonucleico), que contém a informação genética para todas as funções da célula/organismo.
Mas essa informação não está escrita de maneira como lemos esse texto, seria muito texto para tantos comandos que nosso organismo executa. Ao invés disso, a informação está codificada, ou escrita por meio de códigos moleculares. Como uma sequência de blocos menores, as bases nitrogenadas constituem a molécula de DNA.
O DNA
O DNA é composto de quatro tipos diferentes de bases nitrogenadas, representadas pelas letras A,T, C, G (de adenina, timina, citosina e guanina).
As bases nitrogenadas estão em sequência na molécula de DNA, cuja estrutura é em dupla hélice, em que as duas fitas compõem o DNA que interagem e dão forma à molécula. A interação entre as fitas do DNA ocorre graças a complementaridade entre as bases nitrogenadas, em que A (adenina) se liga com T (timina) e a C (citosina) com a G (guanina).
Essa complementaridade entre as fitas é importante, pois torna possível a replicação (duplicação) da molécula de DNA. Quando ocorre a duplicação do DNA, as duas fitas se separam e a partir do molde são formadas as fitas-filhas complementares.
A descoberta da estrutura em hélice do DNA
A informação chave para a estrutura do DNA foi obtida por Rosalind Franklin que conseguiu uma fotografia do DNA por uma técnica chamada de difração de raio X. A partir desse achado de Rosalind, dois pesquisadores, Watson e Crick, determinaram a estrutura do DNA – nunca mencionaram a pesquisadora – e anos mais tarde foram laureados com o prêmio Nobel.
Para saber mais sobre Rosalind Franklin leia o texto Celebrando Rosalind Franklin – a mulher que ajudou a desvendar a estrutura do DNA no Ciência pelos Olhos dela do Blogs Unicamp.
O sistema de tradução da informação do DNA em proteínas é regulado por uma série de interações e reações químicas. Além disso, a informação necessária não é entregue de forma direta para a preparação de proteínas pelos ribossomos, uma organela presente no citoplasma das células.
DNA como molde para o ácido ribonucleico, RNA
Além de se replicar no procesos de duplicação, o DNA também serve de molde para a preparação de uma outra molécula importante na síntese de proteínas, o RNA mensageiro, mRNA, em um processo chamado de transcrição. A partir dessa última molécula é que ocorre a tradução com a síntese de proteínas.
Então, o DNA tem a informação transmitida ao mRNA. A partir do mRNA é que há a tradução – daquela informação codificada – em proteínas. Essa tradução ocorre fora do núcleo em uma outra organela da célula, no ribossomo.
Não é sopa de letrinha
A sequência desses bloquinhos de base nitrogenada no DNA não é aleatória. A combinação de cada três bloquinhos é traduzida pela célula em um aminoácido – a menor parte da estrutura de uma proteína. O conjunto de aminoácidos ligados é que dá origem a uma proteínas. Quantidade e sequências diferentes de aminoácidos estão associados a proteínas diferentes. E é nelas que está a beleza da vida. Entre outras coisas, as proteínas fazem parte de estruturas das células, transportam o oxigênio necessário para a nossa respiração, conseguem deixar as reações químicas mais rápidas nos organismos. Enfim são fundamentais para a manutenção e funcionamento dos organismos.
Combinando as sequências
O interessante sobre o código genético é que a sequência das bases nitrogenadas presentes em um códon (sequência de três bases nitrogenadas) específica corresponde a um aminoácido específico e isso é praticamente universal entre todas as formas de vida na Terra.
Um pouco de matemática
Podemos inferir a quantidade de combinações possíveis de bases nitrogenadas para a formação de códons por meio de uma fórmula matemática chamada de Arranjo com Repetição:
A(n, r) = nr, em que
n é o número de elementos do conjunto, no caso são quatro (A, T, C, G)
r é a quantidade de elementos por agrupamento, no códon são 3.
Dessa forma,
A = 43
A = 64
Existem 4 pares de base nitrogenadas diferentes (A, T, C e G). A combinação entre elas em uma das três posições em um códon nos dá a possibilidade de 64 códons diferentes. Desses 64 códons, 61 são traduzidos em aminoácidos e 3 estão associados a uma espécie de sinalização para a parada de tradução da sequência do DNA, os códons de Parada (Stop codons).
Mas alguns códons diferentes sinalizam para a produção de um mesmo aminoácido. Os 61 códons produzem apenas 20 aminoácidos diferentes. Por esse motivo, o código genético é considerado redundante ou degenerado,
A sequência de aminoácidos que compõem uma determinada proteína é codificada por um gene específico. Dessa forma, o DNA contém o genoma da célula que é a totalidade da informação genética que além de dar origem a milhares de proteínas, também regula quando e onde elas serão feitas.
Material genético materno
Na reprodução sexuada, a composição do DNA presente no núcleo das células eucarióticas é uma contribuição de 50% de cada um dos sexos.
Além disso, a célula eucariótica abriga outra organela com material genético próprio, a mitocôndria. Como regra, o material genético presente na mitocôndria é de origem apenas materna. Se compararmos com o DNA do núcleo, a quantidade de informação genética presente na mitocondria é bem menor, mas ambas informações são muito importantes.
Mas e os vírus?
Os vírus não têm a maquinaria para fazer cópias de si mesmos, nem mesmo para a transcrição e tradução em proteínas, mas contém a informação genética para a sua produção, o mesmo acontece com o SARS-CoV-2, o vírus que causa a COVID-19.
Para saber um pouco mais sobre a necessidade dos vírus por um hospedeiro leia Valentões dentro da célula, sensíveis fora dela: os vírus
Dica
Em comemoração aos 20 anos de existência, o Instituto Suiço de Bioinformática (Swiss Institute of Bioinformatics) lançou o jogo Gene Jumper. O jogo é gratuito e está disponível em 3 idiomas, inglês, francês e alemão. Apesar de não ter disponível a versão em português, é bem divertido jogar e se tem uma idéia do processo de tradução do DNA.
Para saber mais
Alberts, B.; Johnson, A. Lewis, J.; Morgan, D.; Raff, M.; Roberts, K. Walter, P.; Molecular Biology of the Cell. Sixth Edition. 2015
Mora C, Tittensor DP, Adl S, Simpson AGB, Worm B (2011) How Many Species Are There on Earth and in the Ocean? PLoS Biol 9(8): e1001127. doi:10.1371/journal.pbio.1001127
Voet, D. e Voet, JG. Bioquímica. 4 Edição. Editora Artmed. 2011.
Este texto foi escrito originalmente no blog Ciência de Fato
5 comentários
Clarissa Torresan · 10/02/2021 às 15:32
Olá Graciele!
Muito legal o seu texto! Didático e com figuras boas 🙂
Apenas sugiro dar uma revisada no termo “transcrição”, pois foi usado em algumas frases como sinônimo de replicação/duplicação do DNA. São processos diferentes 😉
Abraços!
Graciele Oliveira · 10/02/2021 às 16:15
Oi Clarissa,
Opa, correção feita.
Obrigada
Abraços
Sebastiao Donizeti da silva · 25/02/2021 às 21:54
Espetacular de materia, aprendi bastante, de nada sabia e agora saberei para continuar o caminho. Obrigado.
Lucas Santos · 26/05/2021 às 17:57
Estou tendo genetica esse semestre na faculdade e meu professor indicou essa material a sala. Muito bem didatico e descritivo, parabens!
Rafaela Lucas · 16/03/2021 às 19:11
Muito bom. Super didático. Parabéns!