Car@ leitor@, para acessar o capítulo anterior,clique aqui.
Foi um encontro com ares de final de semestre, isto é, três pessoas faltaram e a própria M.
Parecia também que energia estava mais baixa, pelo menos assim eu estava. O ritual quando
chegamos: montar tatame e warm up. Tive dificuldades de me concentrar, estava barulhenta.
Reunimos em nossos grupos. Eu e I, a terceira continua viajando. M deixou proposta/
direção/restrições e desafios para cada grupo. O nosso:
– tirar adereços ( colar, brinco, etc..)
– não trabalhar com o foco da atenção na emoção. Retirar a emoção do trabalho, da
skinsphere.
-prender o cabelo de uma forma que eles não soltem durante a prática.
-atenção é uma palavra chave no CI. Colocar sua atenção na fisicalidade do seu corpo em
alongamento, transferência de peso, apoios, tônus musculares, etc.
Não podemos mais explorar os cabelos. Isso deve ter tomado muita conta de nossa dança
semana passada e provavelmente este não é o foco. Interessante. Pergunto-me se eu
trabalhava com atenção nas emoções semana passada, acho que não, mas será que me
apresentava desta maneira? Onde estava a minha atenção semana passada na dança com I?
Teremos três rounds de dezessete minutos e uma performance.
1º round: Começamos separadas. Ela andando no tatame e eu parada de joelhos no centro.
Aos poucos vamos nos aproximando, sinto uma dificuldade e demora em estabelecer contato
com ela. Entramos em contato e tento estabelecer um diálogo, construir uma dança. Sinto que
ela dança a sua dança e eu tento acompanhá-la. Trabalhamos na proposta e alguns
momentos, os que me chamaram atenção foi: Um movimento em que ela se apoia no meu
sacro de lado e utilizando ele e minha coxa como apoio faz uma ponte. Sinto que fui mais apoio
e base nesta dança, modo não usual para mim. Tenho mais facilidade de jogar o meu peso no
outro do que sustentar o peso do outro. I é maior que eu, então a maneira mais fácil que
encontro é ela jogando o peso em minhas costas, é preciso encontrar um ponto de equilíbrio
entre nós se não o seu corpo desliza e cai do meu.
2º round: Está difícil me concentrar. Movimento interessante: equilibro-me no me centro
gravitacional, bunda, apoiado no chão com o dorso- cabeça e pernas levantas, de maneira que
formo a figura de um V, ela me gira pelo pé e na hora de sair, ainda em movimento de giro e
viro o meu corpo, apoiando pela barriga. Trabalhamos o movimento de jogar o peso do corpo
em direções opostas tracionando os nossos braços dados até encontrar um ponto de equilíbrio.
Tento trabalhar outros pontos de apoio- equilíbrio. Vou colocando o meu pé em partes do corpo
de I, jogando peso e tentando me equilibrar e me mover a partir desse ponto de apoio diferente.
3º round: Iara sentiu o tornozelo estranho, então, ficamos vendo os outros grupos dançarem
enquanto ela passava polpa de maracujá congelada no lesão. Confesso que senti um pequeno
alívio, não estava com muita vontade de dançar. A proposta do grupo CDR era bem clara:
enquanto um se movia os outros ficavam parados, e o último movimento teria que encaixar no
do outro, sempre em contato, sem deixar espaços vazios e formando figuras várias figuras
interessantes. Um se enfiando no meio do outro. O grupo LC explorou muitos levantamentos e
rolamentos e pelo que L falou no meio da dança, V não podia usar as mãos. Um movimento
muito legal foi em um rolamento com V embaixo, L em cima, como estavam quase saindo d
área do tatame, L estava de barriga baixo, torce o corpo de uma maneira que sai do rolamento
e indo para outro movimento de maneira fluída. L está bem centrado e parece bem ciente dos
caminhos que escolhe na dança, isso dá uma fluidez incrível.

AF, a assistente de direção e ensaiadora, nos propõe estar em estado performático
mesmo quando assiste e pede para que alguém grave e tire foto das apresentações. O que é
estado performático?
Performance como improvisadora: I muda muito quando tem gente assistindo. O seu
lado “artista” aflora. Sinto dificuldade de manter o contato físico mesmo. Em vários momentos
estou apoiada ou em toque com ela e ela sai. Usamos os apoios e a tração nas mãos
trabalhados nos rounds anteriores.
Como público: filmei as duas apresentações e isso me tirou o foco. Mas acredito que é
necessário nível de atenção grande para sustentarmos a dança que ocorre e não ficarmos
esparramados enquanto assistimos.
Por fim, terminamos compartilhando nossas percepções. Muitos comentaram sobre
cenas/ jogos chamam a atenção e agradam. Por exemplo, no encontro passado, um
improvisador ficou batendo o pé incessantemente e nisso outra improvisadora teve algumas
reações para ele parar com expressões faciais bem marcantes. Outro exemplo, quando um
improvisador no meio da dança começa apontar para cima. Isso seria uma improvisação
cênica? Um jogo? Ou até o clown? Esses tipos de manifestações tem espaço e fazem parte do
CI? O que é uma cena? Outro tema levantado foi à presença do olhar para o público. De fato,
olhar para o outro que assiste estabelece uma relação e chama a atenção daquele que assiste.
Mas penso que em várias danças contemporâneas, os dançarinos só olharam para o público
no cumprimento final, mas mesmo assim, a apresentação consegue afetar o público. No CI, é
comum ficarmos com o olhar “vidrado”, mas porque o olhar em si está para dentro. Mas
também é possível deixar ele acordado para o ambiente externo, causando outro efeito. Sinto,
de modo bem incerto e inseguro, que estes dois elementos citados acima são trazidos de outra
áreas para a performance de CI.Será que não tem outra maneira de chamar atenção do público
sem isso, mas pela própria dança de CI? Ou será que a dança de CI envolve estes elementos?
Acredito que envolva, CI envolve tudo, mas, talvez, isso não seja o que procuro.
Palavras para deixar anotadas: conexão, fluidez, centramento, atenção, tédio, fisicalidade.
Encontre os capítulos anteriores que compõe esta novela em https://www.blogs.unicamp.br/mucina/category/series/hipoteses-para-o-leitor-uma-novela-performatica-gestual. Para receber as notificações no seu email, cadastre-se no RECEBA A MUCíNá na barra lateral. Ou siga pela página no Facebook. E não se esqueça de deixar o seu comentário abaixo!;)
Nascida em São Paulo, em uma família tradicional japonesa, que me incentivava quando criança às artes orientais, odori e karaokê. Depois de uma caminhada que tomou trajetos inesperados, me formei em Ciências Sociais, Bacharelado em Antropologia, pela Unicamp, em 2015. Nesse período, encontrei o meu corpo em uma aula de Contato Improvisação oferecida por Marília Carneiro, na Casa do Lago, em 2014. Corpo desperto, ele se tornou o seu próprio caminho. Em busca de novas aventuras, encontrei a Cia. do Circo, onde meu corpo foi transformado em um campo com potência e pode experimentar diferentes relações com o peso, espaço e limites no tecido, trapézio e contorção desde novembro de 2014. Em 2015, comecei a me apresentar com a Cia. do Circo em eventos. O meu corpo também está sendo transformado com as técnicas de Klauss Vianna apreendidas nas aulas de Jussara Miller há um ano. Incorporei-me no projeto dirigido por Marília Carneiro, o Ciper- ContactImprovisation&Performance, grupo de pesquisa em performance de Contato Improvisação, em que participei como improvisadora e escritora.