Author Archives: Claudia Chow

A Amazônia por um herdeiro

Desde o lançamento do livro Arrabalde – Em busca da Amazônia estou curiosa para saber o que um herdeiro como João Moreira Salles tinha a dizer sobre o assunto. Eu sei que ele é documentarista, produtor de cinema e fundador da revista Piauí, mas nada disso seria possível se ele não tivesse antes de mais nada nascido herdeiro de uma das maiores fortunas do Brasil. Acontece, nascer na classe trabalhadora ou na classe dona dos meios de produção é uma loteria.

Pois bem, dito isso vamos ao livro…

Passei boa parte do início da leitura procurando o que eu estava esperando, histórias sobre a Amazonia hoje, sobre a experiência do homem rico ir viver por lá um tempo para poder escrever sobre sua experiência. Ele começa o livro com um resgate histórico de como o Brasil iniciou sua exploração da região, histórias que muitas vezes me entediaram, mas por certo ele achou necessário, só não era o que eu esperava.

Quando ele começa a relatar dados, fatos e causos da Amazonia hoje, começou a me interessar mais, mas isso só começou lá pelo meio do livro. Seja paciente.

Talvez eu não seja a pessoa mais desinformada sobre a região, acompanho mais ou menos o que se passa, tenho amigos que moram ou moraram por lá e posso dizer que boa parte do que li no livro não me foi totalmente novo ou uma grande descoberta, mas o fato de ter tudo isso em detalhes e compilado em um só lugar é muito importante e necessário. Para pessoas que não entendem a Amazônia, o que se passa por lá ou a complexidade de lidar com a floresta o livro é muito bom, porém ele é escrito por um intelectual para outros intelectuais, ok, um livro, por si só já é coisa para intelectual nos tempos de hoje, uma pena.

Fiquei imaginando um livro menos cabeçudo e com menos divagação para pessoas comuns lerem e não morrerem de tédio. Por que se você não quiser saber mesmo sobre a Amazônia, você se distrai fácil e não engata a leitura ali. Enfim, não é um livro para pessoas comuns, e tá tudo certo.

É triste a constatação de que o Brasil nunca teve um plano decente para a região. Todas as vezes que o Estado tentou alguma ação por lá a opção sempre foi derrubar a floresta e fazer outra coisa. Me pergunto quando esse ponto de vista sobre desenvolvimento vai ser superado e vamos todos concordar que manter a floresta de pé e conseguir usufruir de suas benesses sem destruir é possível e a melhor opção. Clamo para que consigamos chegar nesse consenso logo, na verdade acho que já estamos atrasados.

O livro é uma ótima referência sobre como o Brasil tem lidado com a Amazônia ao longo do tempo. Você encontra referências históricas e muita coisa recente, o livro foi lançado em dezembro de 2022. Se fosse escrito de forma mais simples eu recomendaria para alunos do ensino médio, mas a verdade mesmo é que o brasileiro médio se interesse pouco pela floresta amazônica, é algo tão distante que parece que ela nem nos pertence ou dela dependemos aqui no Sudeste. Então só pessoas metidas a intelectual como eu vão se interessar por essas 424 páginas que pedem por um melhor tratamento para o ar condicionado do mundo que muito em breve vai começar a dar defeito.

Em tempo, para quem não sabe, assim como eu não sabia, arrabalde segundo o Aurélio significa: Cercanias de uma cidade ou povoação; subúrbio. Entende o que eu quero dizer quando esse é um livro pra intelectual?

15 anos!

Há exatos 15 anos eu começava esse blog. Relendo o primeiro post acho que o objetivo dele nunca mudou, sempre tive em mente a possibilidade de encontrar mais pessoas que pensassem nos mesmos assuntos que eu e não me sentir tão sozinha. Mas nos últimos tempos, acho que anos mesmo, ele se tornou apenas um lugar em que eu compartilho minhas indignações sobre o tema ambiental. Só um lugar de depósito de pensamentos.

Confesso que me sinto tentada a fechar esse blog, a pauta ambiental continua a mesma desde que comecei aqui, mas sinceramente tenho pouca esperança de que as coisas mudem e quase nenhuma força para me esforçar para alguma mudança significativa. Deve ser a idade… Eu tinha 25 anos quando comecei esse blog, hoje beirando os 41 vejo uma segunda onda da sustentabilidade acontecendo e muita gente, mais velha que eu até, olhando para ela como se fosse a primeira. É cansativo.

Não declaro esse blog oficialmente fechado, afinal o mundo sempre foi expert em me irritar quando o assunto é meio ambiente. Porém, confesso que não vejo mais a pauta ambiental como prioridade na minha vida e tenho me tornado cínica para muitas coisas que vejo, infelizmente. Então deixo aqui meu desabafo e celebro as oportunidades que esse blog me trouxe nesses 15 anos de existência, sem dúvidas as pessoas que conheci por causa dele foi o que mais importante aconteceu e seria injusto tentar nomeá-las pois sem dúvida me esqueceria de alguém. Mas ser parte do ScienceBlogs Brasil foi uma das minhas grandes sortes nessa caminhada, fiz amigos para a vida e certamente esse foi o melhor presente que esse diarinho virtual poderia me dar. Muito Obrigada, vocês sabem quem são!

Greenwashing urbanístico

No meu passado como servidora pública paulistana, sim em trabalhei no executivo e legislativo da capital paulistana em 2 momentos distintos, parques lineares foram assunto quando se falava de solução para córregos da cidade. Sinceramente não tenho bem certeza de como isso foi levado pra frente pela Prefeitura. Existiam vários projetos, não sei se todos se tornaram realidade e dos que foram pra frente quais ainda sobrevivem hoje. É, sofremos desse mal na gestão pública, alguns projetos são abandonados ao longo do caminho (pelos mais diversos motivos) ou simplesmente não saem do papel.

Mas o que me faz escrever esse post é o “caso de sucesso” que ouvia naquela época. Era um córrego no centro de Seul, na Coreia do Sul, que foi canalizado e coberto no passado e construído um viaduto elevado, tipo o minhocão em São Paulo ou a falecida perimetral no Rio de Janeiro. Esse rio corta a cidade leste-oeste passando pelo centro e tem 8,4km de extensão no total. Esse rio chama-se Cheonggyecheon. Você pode dar um passeio por ele nesse vídeo aqui abaixo:

A obra foi iniciada em 2003 e foi entregue em 2005. Gastou-se na época algo em torno de US$280 milhões.

Confesso que fiquei maravilhada com o resultado, mas não se iludam, isso tudo é apenas um cenário construído que custa por ano mais de US$7 bilhões de dólares em manutenção (dados de 2010). Apenas os 5,8km finais do rio Cheonggyecheon foi restaurado, o trecho inicial continua fechado e serve de esgoto. A água que corre nesse canal vem de outro rio, o Han, são bombeadas sem parar 120.000 toneladas de água diariamente. Ou seja o que vemos nada mais é que um cenário fabricado. O artigo do professor Myung-Rae Cho, da Universidade de Dankook : The politics of urban nature restoration -The case of Cheonggyecheon restoration in Seoul, Korea, de onde eu tirei essas informações aponta todos os problemas da obra e diz ainda que ela foi uma obra política com o intuito de eleger o então prefeito da cidade como presidente da Coreia do Sul 2 anos depois da entrega.

Podemos chamar essa obra de um greenwashing urbanístico? O professor Myung-Rae Cho chama o local de parque público decorado com o tema natureza. No projeto, a restauração ecológica não foi levada em conta, apenas aspectos de engenharia. O que se tem ali é uma obra de engenharia para evitar problemas de inundação com um projeto paisagístico de natureza. É melhor do que era antes? Veja algumas fotos:

Esse é uma daquelas soluções que eu diria que odeio amar. Num dá pra dizer que ficou ruim, melhorou a paisagem milhões de vezes, porém não foi escolhida a melhor solução pensando em longo prazo e uma restauração ecológica verdadeira. Só o fato de bombear água de outro rio para passar por esse canal, assim, indefinitivamente já era motivo suficiente para terem pensado melhor a solução, isso não faz nenhum sentido do ponto de vista ambiental, na minha opinião chega ser meio estúpido, ainda mais por ser uma solução de obra pública.

E qual o sentido de restaurar uma parte do rio e largar o trecho inicial como antes? Não dá pra dizer que a razão principal dessa obra era o meio ambiente. Dá pra sentir ai uma vontade maior de parecer verde e ambientalmente correto do que de fato ser. Infelizmente não são só as empresas que sofrem desse mal…

Muitas outras questões sociais também entram na conta dessa obra coreana, como a especulação imobiliária, a gentrificação da região, o esquecimento cultural que ela provocou, etc. Só mais um exemplo do ser humano fazendo “humanice” no planeta.

Mas como eu não sou coreana vou achar tudo lindo se um dia for passear lá! hehehe

O documentário do momento e ações individuais

Eu não vi Seaspiracy, nem Cowspiracy e provavelmente não verei. E por algum motivo depois de ver esses filmes tem gente que se acha no direito de sair fiscalizando a carteirinha de ambientalista das pessoas.

Vi gente perguntando como um ambientalista poderia comer carne, vi outra pessoa dizendo que questionar o tal documentário era passar pano, vi uma pessoa manifestando seu desprezo pela Ásia por causa do documentário… e tudo mais que as redes sociais permitem.

Como já disse ali, não vi o documentário e não preciso dele para saber que a indústria da pesca está acabando com os estoques pesqueiros do mundo e que segundo projeções, em 2050 teremos mais plásticos nos mares do que peixes. Também sei que por culpa da mesma indústria pesqueira as baleias azuis, provavelmente o maior bicho que esse planeta já viu, estão em extinção. Quem me conhece sabe que eu tenho um amor por mega fauna e acho um absurdo viver num planeta com um número cada vez menor desses indivíduos. Enfim, é triste? É duro? É difícil? Me sinto impotente? O tempo todo.

Mas a questão ambiental não se resume a consumir ou não carne e ações individuais são pífias perto do que as indústrias poderiam estar fazendo. A maioria das pessoas no mundo sequer sabem que podem ter opção de comida, mesmo quando elas sabem e mesmo assim optam por comer carne é impraticável pensar que num futuro próximo, digo nos próximos 10 anos, conseguir que a cultura da carne se acabe aqui no Brasil, por exemplo. Ah, então não vamos fazer nada? Olha, eu sei de uma coisa que a gente pode fazer que também é uma ação individual e pode fazer uma diferença absurda: votar melhor.

Veja a diferença

Do que adianta você separar seu lixo em casa, não comer carne e recusar canudinho de plástico quando temos um Ministro contra o meio ambiente? Quando temos um presidente que já tomou multa ambiental, se recusou a pagá-la e ainda puniu o servidor que aplicou a multa? Enquanto tem gente que fica ai conferindo se quem fala que é ambientalista come ou não carne a Comissão de Meio Ambiente da Câmara Federal está sendo presidida por uma pessoa que mente sobre desmatamento e defende garimpo em terras indígenas. Lamento informar mas todo seu esforço de fazer a sua parte pode não estar surtindo assim tanto efeito, só para você ter uma ideia o Biden com uma canetada lá nos EUA quer acabar com subsídios para combustíveis fósseis, sabe o que isso pode representar? Que se esse dinheiro for bem investido, ele pode fazer muito mais pelo planeta do que a sua existência inteira sendo vegano. Lamento mas é a realidade. Pra você ter uma ideia, só no primeiro pacote de incentivo fiscal do governo dos EUA na pandemia, foram dados nada mais nada menos que US$8,2 bilhões de isenção fiscal pra 77 empresas de combustível fóssil. Imagina esse valor sendo revertido em investimentos em formas de energia limpa e conservação da vida selvagem. Alguém aí faz a conta e me fala quantas pessoas mais precisamos que sejam vegetarianas para chegarmos nesse impacto?

Ah, então desiste de fazer qualquer coisa?

A minha questão aqui não é dizer: ser vegetariano/vegano é inútil, reciclar é bobagem ou queimem mesmo todos os combustíveis fósseis do mundo. A questão é entender a complexidade dos problemas ambientais, o tamanho deles e como as ações individuais representam pouco perto de uma decisão do alto escalão de uma grande empresa ou de um governo. Sim, temos que pressionar, sim mudar de hábitos é importante como forma de pressão, mas não sejamos inocentes de achar de que é só isso que vai nos tirar dessa situação. Demonizar as pessoas que não querem ou não podem fazer a parte delas não ajuda na solução do problema.

Eu devo ser provavelmente a única pessoa que já leu todos os posts desse blog, no passar desses 14 anos de blogueirinha de meio ambiente eu fiz uma listinha dos meus pecados ambientais e acreditei que ações individuais pudessem fazer toda a diferença, mas revi esse ponto de vista e creio que devemos cobrar de quem de fato impacta o planeta e tem o poder fazer as coisas mudarem numa outra escala. Consciência é importante, ação ajuda muito, mas focar energia na ação que vai trazer mais resultados é o que de fato fará o rumo das coisas mudarem.

Uma história real

Isso tudo me faz pensar numa amiga que trabalha numa empresa de petróleo, será que algum ambientalista já perguntou para ela como ela consegue trabalhar numa empresa que é a principal responsável pelo aquecimento do planeta? Mas calma gente, ela é vegetariana, sério, desde criancinha porque ela cresceu num sítio e não suportava a ideia de comer as galinhas que ela alimentava todos os dias. E ai fiscal de carteirinha de ambientalista, você vai dar o título de ambientalista para minha amiga ou não?

P.S.1: Tem umas coisinhas nessa minha resenha de um outro documentário que podem ser úteis para esse debate, confira Planet of Humans.

P.S.2: Gosto muito desse texto quando ouço pessoas focando apenas na importância das ações individuais, em inglês.

Sobre o que o Brasileiro pensa sobre mudanças do clima 2

Me empolguei com esses dados e resolvi explorar um pouco mais.

Conversando com o master jedi em computação Felipe Campelo, descobri que essa minha “análise” pode ser chamada de análise exploratória de dados…

Pois bem, dessa vez resolvi juntar as 2 perguntas que analisei no post anterior. E resolvi ver qual a coerência das pessoas quando escolheram Proteger o meio ambiente, mesmo que isso signifique menos crescimento econômico e menos empregos e depois dizer se concordavam ou não com a frase: As queimadas na Amazônia são necessárias para o crescimento da economia.

Para essa análise eu desconsiderei quem respondeu que não sabe para as 2 questões, não responderam uma das questões ou as 2. Esse grupo desconsiderado equivalem a 4,42% das respostas.

Não me surpreendeu descobrir que 62,39% das pessoas foram muito coerentes e além de priorizarem a proteção do meio ambiente também discordavam que as queimadas na Amazônia são necessárias para o crescimento da economia. Apenas 3,9% das pessoas que priorizam o crescimento da economia concordam que as queimadas são necessárias para esse crescimento. Gostei de ver que 12,98% mesmo priorizando o crescimento econômico não concordam que as queimadas são necessárias. Porém as pessoas que não sabem ou estão em cima do muro (na minha opinião) em qualquer uma das questões, somam 11%.

https://public.tableau.com/views/PesquisaPercepoclimaBrasil2/Planilha6?:language=pt&:display_count=y&publish=yes&:origin=viz_share_link

Dessa vez eu resolvi levar em consideração o posicionamento político declarado dos entrevistados. Como comentei no outro post achei bem alto o dado que 25% dos entrevistados não responderam ou não souberam escolher entre direita, esquerda e centro.

https://public.tableau.com/profile/claudia.chow7385#!/vizhome/PesquisaPercepoclimaBrasil2/Planilha7

Ai, com esses dados eu resolvi cruzar com a pergunta: Você já votou em algum político em razão de suas propostas para defesa do meio ambiente?

Ok, ok, vamos desconsiderar que “propostas para defesa do meio ambiente” é algo muito amplo.

Algumas coisas que achei curioso: todas as pessoas que se declararam de esquerda responderam essa pergunta. E o grupo político com maior número de pessoas que responderam sim à questão foram os declarados de esquerda.

https://public.tableau.com/views/PesquisaPercepoclimaBrasil2/Planilha8?:language=pt&:display_count=y&publish=yes&:origin=viz_share_link

O curioso caso de quem não sabe se votou em alguém por conta de suas propostas de defesa de meio ambiente somam 0,51%.

Porém é triste perceber que quase 60% das pessoas não consideram a pauta ambiental na hora de votar. E essa mesma pesquisa mostrou que 86% das pessoas se declararam preocupadas ou muito preocupadas com o meio ambiente.

Mais algumas conclusões que me permiti tirar dessa pesquisa: Parece que as pessoas não conseguem relacionar voto e política com ação pelo meio ambiente. Parece que as pessoas pensam: Meio ambiente é uma questão para mim, mas na hora de votar esse não é um fator a ser levado em consideração.

É muito curioso pois mais da metade das pessoas disseram nessa pesquisa que acham que os Governos são os principais atores na resolução do problema das queimadas na Amazônia!

E pra quem pensa que as pessoas podem responder o que acham que é certo na pesquisa e não o que de fato pensam. Eu respondo que se as pessoas acham que se preocupar com meio ambiente, entender que para o crescimento econômico queimadas na Amazônia não é a melhor opção e que o tema aquecimento global é algo importante ou muito importante, eu acho que já é o suficiente para mostrar que estamos num bom caminho. Talvez seja demais afirmar com precisão que 90% dos brasileiros consideram a questão do aquecimento global importante ou muito importante. Mas vamos pensar que parte desses 90% só acham que é certo considerar esse tema importante ou muito importante, já não é um bom começo? Alguma coisa certa está sendo feita!

Sobre o que o Brasileiro pensa sobre mudanças do clima

Faz um pouco mais de 1 mês (início de fevereiro de 2021) o ITS junto com a Universidade de Yale e o Ibope divulgaram o resultado de uma pesquisa sobre a percepção do brasileiro com relação às mudanças climáticas. Confesso que só fiquei sabendo essa semana, pois o mesmo ITS lançou uma chamada pública para Programa de bolsas da pesquisa “Mudanças climáticas na percepção dos brasileiros”.

Pedi os dados da pesquisa pra eles e resolvi usar meus rudimentares conhecimentos de Tableau (um software de visualização de dados) pra entender melhor os dados dessa pesquisa.

Se você quer saber mais detalhes de como a pesquisa foi feita acesse: https://www.percepcaoclimatica.com.br/

AVISO: Eu só estudei estatística 1 semestre durante a graduação, meus conhecimentos de Tableau, como já mencionei, são rudimentares, mas eu tenho bom senso, é suficiente? Talvez. Veja aí onde eu cheguei com os dados e me corrija se você ver erros.

MINHA “ANÁLISE” – (É muita pretensão minha chamar isso de análise.)

Eu selecionei algumas perguntas que achei mais interessante da pesquisa e resolvi destrinchar melhor como as respostas apareciam regionalmente. Até tentei fazer uns gráficos com a posição política declarada pelos entrevistados, mas achei que a quantidade de gente que não sabia ou não respondeu esta questão era muito grande (quase 25%).

Eis o meu achado.

Quando os entrevistados foram perguntados se concordavam ou não com a afirmação: As queimadas na Amazônia são necessárias para o crescimento da economia, em todo o Brasil a resposta foi que 74% deles discordavam essa afirmação. Achei sensacional esse resultado e ai resolvi fazer um recorte por região. Como a discordância ou não dessa afirmação se distribui pelas regiões do país? Eis que a região com maior número de “concordos” sobre a questão acima veio da região Norte, onde a Amazônia está localizada em sua maior parte. Enquanto no Sudeste nem 15% dos entrevistados concordavam com a afirmação, no Norte quase 30% concorda.

Você pode ver o gráfico melhor aqui: https://public.tableau.com/views/PesquisaPercepoclimaBrasil/Planilha1?:language=pt&:retry=yes&:display_count=y&:origin=viz_share_link

Essa tendência meio que se confirma quando a pesquisa pergunta o que é considerado mais importante para o entrevistado: A) Proteger o meio ambiente, mesmo que isso signifique menos crescimento econômico e menos empregos ou B) Promover o crescimento econômico e a geração de empregos, mesmo que isso prejudique o meio ambiente. No geral o brasileiro respondeu que a alternativa A é mais importante (77%). Mas quando abrimos as respostas por região, é o Norte mais uma vez que detém a maior quantidade de pessoas respondendo a opção B. Na região Norte 24,51% dos brasileiros consideram a alternativa B como mais importante para eles, enquanto que nas outras regiões esse número não chega a 17%.

O gráfico fica melhor de ver aqui: https://public.tableau.com/views/PesquisaPercepoclimaBrasil2/Planilha23?:language=pt&:display_count=y&publish=yes&:origin=viz_share_link

A minha opinião sobre esses dados pode estar muito errada, mas vou manifestá-la mesmo assim. Eu achava que era uma minoria de pessoas na região Norte que é a favor do desmatamento e pensa que pelo crescimento econômico vale tudo. Esses dados me mostram que não é bem assim, ainda tem muita gente por lá com esse tipo de pensamento desenvolvimentista a qualquer custo. E ai temos 2 possibilidades para mim: 1) eu era ingênua de acreditar que os maus eram a minoria, talvez eles até sejam, mas tem uns pseudos bons que os apoiam; 2) eu não sei mexer no Tableau, muito menos analisar dados e isso ai tá tudo errado… Aceito ajuda dos universitários!

UPDATE: Fiz mais uma análise dessa pesquisa aqui.

Futuro 5: Ikea compra de volta a mobília que você não quer mais

Futuro é/era uma série de notícias falsas criadas por mim, que pretende representar o que deveria ser um futuro mais sustentável. Mas o incrível é que dessa vez a notícia do título não é falsa, ela de fato se tornará realidade em lojas da rede em 26 países.

Mats Ekdahl/Ikea

A Ikea irá comprar de volta os móveis da marca dos consumidores e depois irá revendê-los numa loja de segunda mão da marca. E por que essa iniciativa é tão incrível?

Pra mim mostra que a marca está de fato se empenhando em entrar na economia circular e quem sabe futuramente mudar seu modelo de negócio. Já imaginou o dia que a Ikea não venderá mais móvies mas sim simplesmente alugará e estará sempre responsável por toda a vida de seus produtos?

Eu sei que esse conceito é muito estranho para a maioria das pessoas no Brasil, somente quem é muito rico troca móveis da casa com frequência, mas em países ricos trocas de móveis da casa é quase que nem comprar roupa nova a cada estação.

Quem já faz isso e durante muito tempo foi case de sucesso de sustentabilidade por anos é a Interface floor. Uma empresa de carpetes e pisos de vinil que não apenas os vende, mas se responsabiliza pelo recolhimento, reciclagem e reuso do material. Tudo bem que carpete é algo muito relacionado a países frios e aqui são poucos os ambientes que usam esse tipo de solução, mas pensar em reutilizar o material e se preocupar com o destino dos resíduos é algo bem inovador (não deveria, mas é).

Voltando ao caso dos móveis da Ikea, de certo modo, isso meio que existe no Brasil, toda cidade tem sua loja de móveis usados ou herdar móveis de alguém que está mudando não é algo incomum. Mas quem já não viu por ai um sofá descartado num riacho? Ou mesmo algum móvel dando as caras no esgoto na época de chuva e enchentes em grandes cidades? Torço que várias marcas se empenhem nesse sentido e até mesmo outras indústrias como de carro ou tecnologia por exemplo. Gostaria de vê-las se preocupando com o que acontece com seus produtos depois que seus clientes se desfazem deles.

Copos plásticos usados viram embalagens de Humor

Pena que meu humor não seja dos melhores, Natura!

Sim, a ideia de reciclar os copos plásticos de um festival de música é incrível, aglomerações de gente é algo que gera MUITO resíduo e me pergunto se isso é sustentável. Falei especialmente disso no post que fiz em 2016 quando fui voluntária nos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro.

Mas sobre a ação da Natura com a Heineken e o Rock in Rio: a ação tem seu mérito sim, mas não tenho bem certeza se ambiental. O que mais me incomoda nela é a simplicidade com que parece que o problema foi resolvido. E na verdade não foi simples, nem o problema do plástico foi resolvido. O plástico do copo que você usou e virou tampa de perfume só foi adiado para ir para o aterro. O copo que saiu do festival de música e virou tampa de perfume para finalmente chegar no consumidor final fez um rolê considerável. Na breve existência desse plástico ele deve ter rodado mais que muito ser humano com o mesmo tempo de vida. Isso sem pensar no destino da tampa depois que o perfume acabar ou a tampa simplesmente quebrar, pois sim elas podem quebrar.

O mais engraçado é que o Rock in Rio e a Heineken simplesmente repassaram (provavelmente mediante pagamento) uma parte do problema de resíduo deles para a Natura. Ela assumiu o passivo para de fato resolver o problema do ciclo de vida do plástico do copo, que será, sei lá no fim, reciclar novamente a tampa do perfume ou mandá-lo para um aterro?

Me pergunto até que ponto somente adiar a ida de produtos plásticos para o aterro é algo válido, o aproveitamento desse material nunca é 100%. Deve ter a sua validade, mas pra mim não resolve o problema.

O mérito dessa ação está na parceria de um festival de música, uma empresa de bebidas e uma marca de beleza. Uma vez que são 3 grandes corporações, creio que conciliar todos esses interesses deve ser algo bastante complexo.

Mas do ponto de vista ambiental qual seria a melhor solução para o copo de plástico? Penso que usar copos de plástico não descartáveis no festival e permitir que as pessoas usem o mesmo copo várias vezes e os levem para casa e continuem usando-os. Mas um festival de música com milhares de pessoas é algo complexo que eu absolutamente não manjo nada. Só tô dando meus pitacos de velha blogueira de meio ambiente rabugenta.

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De todo modo, bela tentativa Natura, Heineken e Rock in Rock. Continuem tentando, um dia a gente consegue, ou não.

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Wildeverse, o PokémonGo da vida selvagem

Em 2018 descobri a Internet of Elephants e contei sobre eles neste post. Ai, por coincidência, ou não, fiz um estágio lá enquanto fazia minha pós em Gestão em Inovação Social enquanto estava no Quênia.

Quando escrevi o post eles já tinham planos de lançar o Pokémon Go Ecológico, enquanto estava lá os primeiros testes para esse jogo estavam sendo feitos. Eu até ajudei na produção de videos mostrando esses testes nas redes sociais deles e eis que em Outubro de 2019 eles lançaram a primeira versão de Wildeverse.

Wildeverse é um jogo para celular sobre macacos (pelo menos por enquanto) que usa a tecnologia de realidade aumentada. O objetivo do jogo é ajudar a encontrar e monitorar um orangotango, um gorila, um chimpanzé e um gibão. A ideia é o jogador coletar dados sobre esses animais e enviar para cientistas e pesquisadores de vida selvagem para tentar entendê-los e principalmente protegê-los. Os dados usados para a criação do jogo são baseados em dados reais e foram obtidos com a ajuda de duas organizações de conservação: Borneo Nature Foundation (na Indonésia) e a Goualougo Triangle Ape Project (no Congo).

Além disso o jogo será usado como fonte de dados para uma pesquisa científica, da Universidade de Oxford. O objetivo da pesquisa é verificar a eficácia do uso de jogos online para comportamentos pró meio ambiente.

Infelizmente o jogo só está disponível em inglês.

Eu não consegui jogar Wildeverse porque meu celular não é compatível com o aplicativo do jogo 🙁

Mas tenho certeza que se você gosta de PokémonGo, você vai gostar de Wildeverse.

Aqui o trailer do jogo:

Uma curiosidade meio fora do assunto, você sabia que uma das empresas unicórnio no Brasil chama-se Wildlife? E é um studio de jogos mobile, sabe quantos jogos deles tem alguma coisa a ver com vida selvagem? Nenhum…

Planet of the Humans

Eis que despretensiosamente fui assistir o último documentário produzido pelo Michael Moore. Pra quem já viu algum dos filmes dele esse Planet of the Humans segue o mesmo estilo, porém o narrador não é ele. Mas o estilo é MUITO igual.

Fui ver o filme meio as cegas sem saber do que se tratava e fiquei contente em saber que era sobre meio ambiente, energia verde, sustentabilidade e afins.

Como todo documentário, ele conta um ponto de vista, uma visão de mundo, entrevista pessoas que interessam para a narrativa e muitas vezes não aprofunda no assunto que pode de alguma forma contradizer a tese. 

O problema do filme é você assisti-lo querendo ver o mundo de forma simplista. E é isso que me incomoda nele, num mundo complexo cheio de problemas cruéis a serem resolvidos não é polarizando a questão ambiental e tratando de forma superficial que vamos chegar num lugar melhor do que estamos hoje. (O detalhe é que essa abordagem hoje em dia parece que tem sido regra para qualquer conflito, seja na política, na economia, na saúde).

Dois pontos que abusam da superficialidade e simplismo

1) carros elétricos. Em 2009 escrevi um post sobre o documentário Quem matou o carro elétrico? E qual foi a minha principal questão naquele post? Qual é a origem da energia produzida para abastecer os carros elétricos? 11 anos depois essa pergunta já foi respondida e superada. O desempenho e o custo por km rodado do carro elétrico é muito melhor que o carro a combustão, ou seja, ele faz mais com menos. Então mesmo emitindo mais CO2 o carro elétrico faz mais. Acho preguiçoso o argumento: “ah se a energia do carro elétrico não tiver origem sustentável, então o carro elétrico não serve”. Você acha inteligente o pensamento de que se toda a produção de comida no Brasil não for orgânica, então nem quero saber de produção orgânica e ela nem deve ser incentivada?

Lembrando aqui que o carro elétrico não é a bala de prata pra problemas de transporte no mundo e tem várias problemas também, mas como a vida já deve ter te ensinado, não há solução única e perfeita no mundo.

2) combustíveis fósseis são a pior opção sempre. Longe de mim querer defender os combustíveis fósseis, eles são um problema sim mas é importante ter claro que o uso deles não vai parar na terra da noite para o dia. É ingenuidade achar que isso é possível e a menos que você seja um indígena isolado na floresta amazônica ou integrante de alguma tribo isolada africana é impossível não depender de combustível fóssil de alguma forma. E o fato de aceitar que ele é parte da vida não significa que você não pode defender que outras formas de energia e matéria-prima sejam usadas e desenvolvidas.

A falsa dicotomia

Ter conhecimento dos problemas da energia dita verde renovável, do consumo de carne, da produção da soja, das viagens de avião, dos bilionários no mundo, do plástico de origem vegetal, da reciclagem como solução para o problema de resíduos no mundo não me fazem uma pessoa que incentiva e apoia tudo isso. Nem me fizeram defensora da energia fóssil, vegana, deixei de separar meu lixo, vão me impedir de viajar de avião ou deixar de acreditar que uma outra solução além da reciclagem é possível. Felizmente o mundo não é feito só de sim ou não, certo e errado, preto ou branco.

Talvez o filme ajude os desavisados a simplesmente passarem a odiar as soluções alternativas de energia, provavelmente ambientalistas e defensores da energia verde se sintam ofendidos e/ou traídos e talvez o filme seja usado pela indústria do petróleo como endosso aos seus produtos. Tudo isso é possível e nem posso dizer que está errado. Talvez se o filme tentasse ao menos seguir no meio do caminho, não só criticando as energias alternativas, mas mostrando que ela tem vantagens e outros aspectos da origem dos problemas ambientais, seria uma maneira de ampliarmos nossas conversas e ajudaria a diminuir a polarização.

É meio estranho o que vou dizer aqui, mas o ponto alto de Planet of the Humans para mim foi a frase da Rachel Carson nos créditos finais

Mais opiniões sobre The Planet of Humans

Achei que esse texto reforça a ideia de dicotomia do filme (em inglês), provavelmente faz parte do grupo ambientalista que se sentiu traído/ofendido com a abordagem.

esse outro texto (em português) sugere que o filme deveria ter focado mais na base do problema: consumo, ideia de crescimento infinito possível e modelos econômicos alternativos. Válido, mas ai acho que seria um outro filme.

EXTRA: No site do filme planetofthehumans.com tem um guia de discussão para professores (em inglês). Gente, queria tanto que no meu tempo de escola tivesse tido esse tipo de discussão sobre os filmes que assisti… Um dos exercícios que mais me empolgaram foi: se esse filme fosse o primeiro de uma mini-série o que você gostaria que fossem os próximos episódios?