Um caso de “preguiça de intérprete” de primeira

Apresentada no teatro do Sesc Campinas ontem a noite, a obra Alla Prima – criação e interpretação de Tiago Cadete (Portugal/Rio de Janeiro), me faz refletir sobre a “preguiça de intérprete”, um sintoma possível na dança contemporânea.

A “preguiça de intérprete” se mostra no corpo do bailarino. Em Alla Prima, Cadete parece acreditar que a nudez seria suficiente para garantir seu trabalho de cena. As poses, que seriam a própria essência da obra, não foram trabalhadas a ponto de ganharem precisão, tônus ou timming na relação com seus “originais” mostrados nas imagens de pinturas, gravuras e fotos que ocupam a outra metade do palco. O movimento dos globos oculares exigido para acompanhar a projeção e a movimentação mal acabada chega a provocar tontura em quem sentou nas primeiras fileiras.

Cadete mostra sintomas da “preguiça”: não teve o cuidado de estudar as imagens no corpo e colocar em cena o gesto preciso que remeteria às poses representadas – muito belas, escolhidas por consultor de história da arte, para falar do corpo brasileiro. O criador parece acreditar que apenas estar nu seria suficiente para realizar a obra. Não foi.

 

Doutora na área de Educação, Conhecimento, Linguagem e Arte (Brasil/UNICAMP, Canadá/UQAM e Moçambique/UEM), dançarina e coreógrafa indisciplinar, bacharelou-se em Dança na Faculdade Angel Vianna (Rio de Janeiro) e bailarina criadora no Ateliê Coreográfico sob a direção de Regina Miranda (RJ/NYC). É especialista em Saúde Pública pela Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP, mestre em Ciências da Saúde pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz e atuou por 10 anos nas políticas públicas de saúde, inclusive a implantação do programa integral de atenção à saúde dos povos indígenas aldeados no Parque do Xingu, pela Escola Paulista de Medicina da UNIFESP. Na área da Dança trabalhou com muita gente competente no meio profissional internacional da dança contemporânea. É improvisadora mais do que tudo, bem que gosta de uma boa coreografia. Esteve em residência artística em Paris por 3 anos, com prêmio do Minc. Mulher de sorte, estudou de perto com Denise Namura & Michael Bugdahn, da Cie. À fleur de peau (Paris). Pela vida especializou-se no Contact Improvisation (Steve Paxton), onde conheceu as pessoas mais interessantes do mundo. Estudou pessoalmente com Nancy Stark Smith, Alito Alessi (DanceAbility), Daniel Lepkoff, Andrew Hardwood, Cristina Turdo e toda uma geração de colegas que começou ensinar Contact na mesma época que ela. Interessa-se por metodologia de pesquisa em arte, processos de criação de obras e ensino-aprendizagem e formação profissional em Improvisação de Dança. Estudou no Doctorat en études et pratiques des arts (Montreal, no Canadá) com o privilégio da supervisão de Sylvie Fortin. É formada no Método Reeducação do Movimento, de Ivaldo Bertazzo (BR). Seu vínculo com a Unicamp é de ex aluna da Faculdade de Ciências Médicas e da Faculdade de Educação. Suas pesquisas triangulam a dança contemporânea no Brasil, Canadá e Moçambique. Idealizou, fundou em 2016, e dirige a plataforma interdisciplinar de ensino e pesquisa em prática artística Mucíná - Aquela que Dança. E-mail: marilia.carneiro@alumni.usp.br

Compartilhe: