Publicado
20 de out de 2011
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A ideia para este post nasceu, literalmente, quando eu estava com a cabeça nas alturas, sobrevoando os Alpes, voltando da Itália pra casa. Vocês vão entender o porquê, mas vamos devagar.
Um conceito importante em qualquer tipo de medida é o de quanto tempo se passa entre uma medida e outra. Isso é especialmente importante quando você quer entender um processo que muda com o tempo. Você mede agora, mede daqui 1 minuto, depois de outro minuto mede de novo e por aí vai. A diferença no resultado das medidas vai dar uma ideia de quão rápido/devagar é o processo que você está estudando.
O meu exemplo favorito para ilustrar esse conceito é quando você encontra um conhecido num dia e encontra no outro e nota que ele, por exemplo, cortou o cabelo. Conclusão: o fenômeno (no caso, o corte de cabelo) aconteceu em algum momento dentro de 24 horas. Mas, se você encontrou com ele logo antes e logo depois do almoço, então a “taxa de medida” foi muito maior e facilmente você pode afirmar que o corte se deu em algum momento naquela uma hora entre as duas “medidas”. Se você tentar investigar a fundo e perguntar, por exemplo, para o segurança do salão de cabeleireiro que horas ele entrou e saiu, a distância em tempo entre as duas medidas é ainda menor e sua “precisão” em apontar o exato momento do acontecimento do fenômeno aumenta grandemente. E assim vai.
Mas veja que isso tem um limite interessante: o cabeleireiro, por exemplo. Ele NUNCA vai poder apontar um instante específico de tempo no qual o cabelo foi cortado. Como ele faz parte do processo e, digamos, mede o corte mais rápido do que o próprio corte como um todo acontece, ele vê o processo de uma forma completamente diferente. Para ele, faz sentido perguntar que horas cortou a franja, ou aparou a lateral, etc, etc.
Esse exemplo bobo mostra como é importante encontrar formas mais e mais eficientes de se medir um sistema a taxas cada vez maiores. É isso que cientistas buscam quando desenvolvem, por exemplo, lasers pulsados com tamanhos de pulso menores (a taxa com a qual você mede) ou métodos mais sensíveis que permitem testar um sistema por um tempo mais curto ou pontas de prova menores que permitem medir pedacinhos cada vez menores do que quer que seja.
Mas toda história é como toda moeda: tem dois lados. Vamos nos ater ao exemplo do cabeleireiro. Imagine que ao invés de ver seu amigo todo dia, ou toda hora você só o vê de 6 em 6 meses pontualmente e que ele, um metódico exemplar, corta o cabelo também (e sempre da mesma forma) de 6 em 6 meses. Qual é a sua conclusão, óbvia e inapelável? O cabelo dele não cresce! O ponto é: se você mede algo que é periódico com a mesma (ou muito próxima) periodicidade de que o fenômeno acontece, isso pode te levar à conclusões muito erradas… MUITO ERRADAS!
Bom, essa história toda para mostrar os dois três vídeos abaixo. Eu estava em um avião pequeno, movido à hélices sobre os alpes e filmando o visual bacana lá de cima. Aí eu notei que o movimento que eu via das hélices pelo visor da câmera era diferente (muito mais lento) do que com meus olhos. A explicação eu acho que você já deduziu dessa conversa aí de cima. A taxa com que a câmera salva os frames que compõe o vídeo é bem próxima da freqüência de rotação da hélice e dá a impressão de ela estar rodando devagar… (Aos que gostam de exatidão: a freqüência de gravação da câmera pode ser levemente diferente da freqüência de rotação da hélice dividido pelo número de pás desta ou qualquer múltiplo.) Na hora que eu vi isso quase pulei da cadeira e falei pra minha mulher que estava do meu lado: preciso colocar isso no blog. Vai ficar bem legal. Fora o visual que é imbatível…
Uma meia hora mais tarde eu fiz este outro vídeo, quando o avião estava descendo e a hélice estava rodando em outra freqüência. Veja você mesmo como o resultado que você tem é bem diferente, com as hélices meio borradas a cada frame. Eu não mudei minha taxa de observação, ou seja, a câmera é a mesma, mas o resultado…
Sei lá, eu gosto de tirar lições dessas coisas, e pra mim, isso só reforça a certeza que o cuidado em medir no laboratório tem que ser dobrado. Ainda bem que, no momento, não meço nada periódico… 😉
Pra finalizar, que este post já está longo, eu fiz o mesmo filminho lá de cima com um celular. Descobri que: 1) não faço a menor ideia de como celulares guardam os frames dos filmes e 2) coisas esquisitíssimas podem aparecer quando sua “máquina de medida” não faz a coisa do jeito certo. Dá só uma olhada no jeito que as hélices ficam filmadas do celular…