Fisico, mas pode chamar de técnico em refrigeração com especialização em fotografia

Este é o post inaugural do blog aqui na sua nova casa, o Science Blogs Brasil. Por ser assim, achei apropriado me apresentar e explicar pra você o que eu faço pra “garantir o leite das crianças” (não, eu não tenho filhos, ainda) e porque eu escrevo aqui.

Eu sou físico. Até a raiz dos cabelos. Daqueles que costumam ser chatos a ponto de conseguir discutir física na mesa do bar na sexta à noite. E gostar disso. Eu gosto absurdamente de ciência, de saber. E é fantástico porque o meu prazer virou o meu trabalho (e vice-versa). Do vestibular até aqui já se vão 14 anos de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado. A maior parte no Brasil. Os últimos 2 anos na Alemanha. E (quase) sempre me divertindo.

O que eu faço é algo relativamente simples de entender. Primeiro de tudo, é física experimental, por isso é preciso preparar o experimento. Assim sendo, eu primeiro pego uma caixa de metal e tiro tudo de dentro. O “nada” que sobra lá dentro é comparável ao “nada” que preenche o espaço interestelar. Só um milhão de vezes mais denso. Mas ainda assim um milhão de milhões menos denso que a nossa atmosfera. Isto feito, eu coloco dentro dessa caixa, costumeiramente chamada de “câmara de vácuo”, um gás de um único elemento. Eu já trabalhei com Sódio e Rubídio, mas hoje eu trabalho com um gás de Cromo (é, Cromo, que cobre as rodas dos carros dos manos).

A partir desse ponto, o experimento está (quase) pronto para acontecer. Falta apenas resfriar esse gás. O refrigerador que eu uso é feito de lasers e outras combinações de ondas e campos eletromagnéticos. De fato, ele é bastante ineficiente, mas ainda assim é capaz de resfriar o gás dentro da caixa à temperaturas baixíssimas. O que eu quero dizer com temperaturas baixas? Aproximadamente -273.1499998 ºC ou, em outras palavras, alguns bilionésimos de grau mais quente que a temperatura mais baixa possível de ser alcançada, o famoso “zero absoluto”, ou -275,15 ºC. Este é o conhecido “frio pra car…o!”

E para quê eu quero esse gás tão frio desse jeito? Simples: porque quando ele está bem frio, ele deixa de se comportar como nós o conhecemos normalmente, ou seja, tal qual bolas de bilhar que andam a esmo batendo em si mesmas e nas paredes da caixa que as contém. Os átomos que formam o gás passam a se comportar como ondas. Você leu certo, ondas. Mais do que isso, essas ondas se comportam coletivamente como… como se dançassem uma coreografia, todas juntas, cada uma desempenhando o seu papel indivudalmente, mas no qual apenas o conjunto faz sentido, no qual cada uma individualmente é indistinguível.

Onde você já ouviu essa história de ondas? Exatamente: essa é a manifestação mais básica da Física Quântica: matéria agindo como onda. Pois bem, é por ser capaz de fazer esse tipo de resfriamento e atingir esse tipo de regime, dito quaântico, com o meu gás, que eu me vejo muitas vezes como um “técnico em refrigeração”, só metido a besta.

Com o gás frio é possível fazer um bocado de experimentos bacanas, que andaram dando uns prêmios para algumas pessoas aqui e acolá.

E onde entra a fotografia nessa história? Fotografia é o que eu faço para olhar para os átomos e medir os fenômenos quaisquer que sejam eles. Não, aqui não tem nenhuma simplificação, é fotografia do mesmo jeito que você faz nos seus passeios por aí. Talvez com uma diferença: eu fotografo a sombra dos átomos… mas quem nunca fotografou uma sombra, não é? Mesmo sem querer.

E aí está, em resumo, o que eu faço da vida: congelo átomos pra depois tirar fotos. 😉

E o blog? O blog é minha outra paixão: ensinar, transmitir conhecimento. É uma sensação quase orgástica ver nos olhos de alguém que entendeu/aprendeu algo que você ensinou. Então o blog é um pouco isso, minha vontade de discutir e espalhar ciência e por isso que aqui vai ter discussão em todos os níveis, do mais básico até… bom, até onde a gente conseguir. O céu é o limite… 🙂

Mais uma vez, seja bem vindo!

 

>O que se espera de um professor?

>

O professor ideal? Ele dava aula,
fazia pesquisa de campo e a extensão…
bom, essa era pouco convencional: 
enfrentar nazistas de vez quando.  
Este post nasceu de uma reflexão que venho fazendo a algum tempo já, sobre como deve se portar, agir e que tipos de atividade deve desenvolver um professor universitário durante a sua vida acadêmica. Bom, como eu sou do tempo em que a gente aprendia que a Universidade contruía-se, existia até, sobre um tripé de funções essenciais: ensino, pesquisa e extensão, me parece natural que o professor, como parte integrante e, por que não dizer, parte fundamental da estrutura universitária tem que ter as suas atividades norteadas por esse trio de princípios.
Algumas considerações sobre cada um deles separadamente.
Ensino. Não é sobre dar uma aula decente. Isso, com um pouco de prática e treino, qualquer um dá. O comprometimento com o ensino é o de dar uma aula empolgante, que desperte nos alunos a vontade de saber mais, querer mais. O comprometimento com o ensino, é o comprometimento com transmitir o conhecimento, formar novas gerações capazes não de reproduzir, pura e simplesmente, aquele conhecimento, mas capazes de pensar, de saber (e querer) procurar mais respostas e outras perguntas. Parodiando uma conhecida minha, é dar aos alunos a infra-estrutura, o “serviço de água e esgoto”, sobre o qual eles vão poder construir, sobre essa base sólida, seu próprio conhecimento.
Pesquisa. Se no ensino, transmite-se conhecimento, aqui é o lugar de produzí-lo. Não importa o impacto. A pesquisa pode ser pequena ou revolucionária. De base ou aplicada. O importante aqui é produzir conhecimento. Novo. De fato, pesquisa e ensino andam de mão dadas muitas vezes pois, normalmente, se somos capazes de transmitir conhecimento bem, somos capazes de produzí-lo bem. Ainda tem, a pesquisa, uma outra face: a formação de novos pesquisadores. Pensadores independentes, com vontade de saber, capazes de dominar técnicas e conceitos avançados porque você, como professor/orientador, soube direcioná-los assim.
Extensão. O patinho feio do nosso trio, muitas vezes negligenciado, mas pelo qual eu tenho carinho especial. A extensão é a atividade onde a universidade se abre à comunidade externa e busca se integrar com ela. As formas de agir aqui são as mais variadas: um site sobre ciência, a produção de vídeos educativos, programas com estudantes de ensino médio, crianças ou pessoas de terceira idade. Não importa muito. A Universidade, especialmente a pública é financiada por todos e não pode se furtar, como o faz muitas vezes, de devolver para a comunidade parte desse financiamento, na forma de divulgação de ciência ou o que quer que seja.
É óbvio que as atividades de um professor não se restringem, nem poderiam, à esse trio. Sempre é preciso buscar fontes de financiamento, participar da administração da própria Universidade, organizar reuniões científicas, buscar colaborações, enfim, contribuir para o crescimento da instituição de uma forma ou de outra. Mas é naquele trio ali em cima onde, na minha forma de ver, residem os requisitos essenciais para que um professor se torne alguém que deixará uma marca no mundo, seja nos seus alunos, seja no crescimento do conhecimento científico, seja na sua comunidade.

>Não é justo…

>

(…mas também ninguém disse que ia ser) O ritmo de trabalho em muitas profissões influi diretamente na vida pessoal. Médicos que têm de dar plantão, jornalistas que têm que cobrir um evento fora de hora ou nos fins de semana, operador de tráfego aéreo que tem que trabalhar sob pressão e muitas vezes à noite. No entanto, na maioria dos casos, há uma folga ou compensação financeira, na forma de hora extra ou o que quer que seja. 
Eu não sei se vocês vêem isso como eu vejo, mas sinto que o trabalho na ciência pode ser tão ou mais puxado sem as devidas compensações. Ficou trabalhando até a madrugada no laboratório? Ninguém vai nem falar de hora extra. Folga então? Passou o fim de semana conectado ao computador da universidade mandando ele rodar uma simulação atrás da outra? Nem tapinha nas costas seu chefe vai te dar. Teve que ficar corrigindo monografia ou respondendo críticas de referees ou escrevendo projetos noite adentro? Ou seu chefe marca reunião sexta às 20h, enquanto qualquer um com um trabalho normal está no bar ou com sua família? Ou pior, ele te liga no sábado (ou domingo) à tarde perguntando se você não pode dar uma passadinha na Universidade para uma reunião? Esses são alguns poucos exemplos de situações que eu já vi/vivi trabalhando com ciência. Isso sem contar as viagens para congressos que fazem a gente ficar semanas longe de quem a gente gosta.
No final das contas, é óbvio que tem compensações: um artigo aceito, um resultado bacana, a excitação de uma descoberta aparecendo e mesmo o conhecer novos lugares para cada conferência que você vai. E, claro, mais importante que tudo: a gente (falo por mim) curte muito o que faz, e por isso as agruras são um pouco menores e as alegrias um pouco maiores.
Mas fato é que definitivamente não é como “profissões convencionais”, sem nenhum julgamento aqui. 
Bom, todo esse discurso pra compartilhar aqui que esse fim de ano vai ser especialmente injusto pra mim e pra minha família. A pouco descobri que no meu aniversário E no aniversário da minha mulher, eu vou estar longe, a trabalho. Na maioria dos outros casos/profissões, eu tenho certeza que dá pra dar um jeitinho, trocar um plantão, mudar uma escala, adiantar/atrasar um compromisso. No nosso caso, é inapelável. Definitivamente, isso não é justo.

>Humor: como as pessoas na ciência vêem uns aos outros

>Esta imagem circulou aqui no instituto… Se você está na ciência a algum tempo, provavelmente vai entender várias das menções e talvez gargalhe tanto quanto eu gargalhei por aqui…

O original, até onde eu pude descobrir veio daqui: http://biomatushiq.sotak.info/

>Ser referee… A arte da pureza

>Antes de mais nada um aviso: vou usar ao longo do texto o termo em inglês referee – árbitro em português – e ainda paper – trabalho científico na nossa língua – já que estes são termos mais que comuns na linguagem científica. Aviso dado, de volta à vaca fria.

Recebi esta semana um artigo para ser referee. Não, não é a primeira vez e também não, não é tão comum que se tornou banal. Longe disso. Acho que com esse eu encho uma mão, ou um pouco mais. Voltando ao ponto, eu recebi um artigo essa semana para ser referee e isso acabou por me fazer praticar um dos meus esportes prediletos: refletir sobre o processo.
Neste caso, por processo, eu quero dizer como deve se portar um referee para julgar um trabalho com imparcialidade e justiça? No fim das contas, como eu devo me portar ao me deparar com uma situação dessas? 
Confesso que a minha primeira resposta era que ser referee era um exercício de humildade. Conversando com ela, deu pra concluir que humildade não era a melhor palavra. Pensei em desapego… mas também não… no fim, cheguei à pureza como uma boa definição do estado de mente/espírito de um referee ideal frente a um paper. Os motivos? Seguem abaixo:
(1) é preciso se livrar dos preconceitos. E aqui eu nem me refiro a preconceitos do tipo “no Chile não se faz pesquisa de qualidade” (só um exemplo, não me entendam mal) e o paper é do Chile, então já vou lê-lo com viés de baixa. Ou ainda, um dos autores é super-ultra conhecido por trabalhos de qualidade, então este novo trabalho vai ser bom de qualquer jeito. Não, eu não me refiro a esse tipo de preconceito. Ser cego pro nome/grupo/país dos autores é absolutamente fundamental. O meu conceito de preconceito é com a ciência que está sendo descrita ali naquele trabalho. Você pode achar que teoria das cordas é uma besteira completa, ou que difração de raios-x é “ciência velha” (de novo, só exemplos genéricos!), ou ainda que relatividade geral é o supra-sumo do que há de mais perfeito em ciência. Nada disso pode importar. A ciência contida ali tem que ser julgada pelo que ela representa, dentro do seu próprio contexto e independente das suas opiniões.

(2) não se deve descontar uma frustração no cientista errado. Você teve um paper recentemente recusado? Ou tem um paper submetido e o seu referee está levando o triplo do tempo pra responder? (caso real e beeeeem atual) Os autores do trabalho que você vai julgar não tem nada com isso. É preciso esquecer as frustrações científicas passadas ou presentes para julgar um paper. (Adendo: não se deve descontar frustrações em caso nenhum)

(3) ser referee não é um exercício de poder e/ou arrogância. Uma vez eu soube de uma história de um pesquisador que se orgulhava por nunca ter aprovado um trabalho para uma determinada revista prestigiada… Outro que adorava reprovar e/ou criticar duramente trabalhos simplesmente pela diversão de exercer o seu poder de recusar, pisar nos outros, enfim, ser arrogante.
(4) é preciso se livrar da condescendência. É isso mesmo. Não se pode ser propositadamente mau. Mas também não se pode ser propositadamente bom. Aquele grupo não publica a muito tempo? Ou você conhece um dos autores e ele está precisando MUITO de um trabalho publicado? (isso vale igualmente para projetos pedindo bolsa, auxílio, etc…). Não importa. Ser referee é julgar sem viés qualquer, venha este da cabeça ou do coração.

Enfim, julgar a qualidade científica de um paper é um belo exercício de limpeza, quase como se fosse muito necessário um banho mental e espiritual para julgar com justiça. Não é fácil, mas não custa nada tentar. 

E você, acha que tem mais alguma “sujeira” que deve ser expelida antes de partir pra julgar um trabalho? Deixe sua opinião aí nos comentários… E agora deixa eu ir lá porque o prazo pra devolver meu parecer é semana que vem! 😉

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