A fim de discorrer sobre esse tema, os Colecionadores de Ossos irão organizar uma série de posts sobre peculiares grupos de dinossauros terópodes proximamente relacionados às Aves. As aves são hoje, em termos numéricos e de diversidade, o grupo de vertebrados mais bem sucedido do planeta. E tudo começou nos idos do Mesozóico.
Vamos procurar abordar aqui passos da marcha evolutiva de “primitivos” dinossauros com penas, até as primeiras aves verdadeiras.
A idéia é discorrer sobre a biografia geral de alguns importantes grupos de dinossauros terópodes que ajudaram a lançar luz sobre o estudo da evolução das Aves.
Cladograma mostrando os grupos dentro de Coelurosauria, por Thomas Holz
O primeiro grupo a ser abordado será o do Tyrannosaurus rex e seus parentes:
O Poderoso T-rex, suas modestas origens e toda parentela
Os coelurossauros incluem uma grande quantidade de dinossauros predadores. Desde Coelurus, com 2 metros de comprimento, até o colossal Tyrannosaurus rex, de 14 metros. A divergência evolutiva dos tiranossauros a partir de pequenos e modestos coelurossauros está sendo agora melhor compreendida desde que recentes descobertas de pequenos tiranossauróides basais, como Eotyrannus e o emplumado Dilong, da China, foram feitas.
Os membros mais primitivos do grupo, a exemplo de Coelurus fragilis, datam
do Jurássico tardio (por volta de 150 milhões de anos atrás), portanto, os primeiros tiranossauróides são contemporâneos às primeiras aves, entre elas o Archaeopteryx.
do Jurássico tardio (por volta de 150 milhões de anos atrás), portanto, os primeiros tiranossauróides são contemporâneos às primeiras aves, entre elas o Archaeopteryx.
Coelurus fragilis foi tema de muito debate sobre em que posição ele se encaixaria na história evolutiva dos tiranossauróides, principalmente porque seu gênero somente é conhecido com base em um esqueleto parcial, ao qual lhe falta a maior parte do crânio. Não obstante, especialistas tendem a concordar que ele se encaixa em algum lugar próximo ao início da história evolutiva dos dinossauros com penas. Coelurus trata-se de um terópode generalizado, que mostra as primeiras adaptações importantes requeridas para a evolução das aves. Primeiro: ele tem ossos leves e ocos; e segundo: ele e todos os seus parentes têm cérebros relativamente grandes em relação à outros carnívoros primitivos como o Allossaurus ou os abelissauros, do Gondwanna.
A linha que leva ao Tyrannossaurus deve ter começado com formas de tamanho moderado como Tanycolagreus, um caçador de 3 ou 4 metros de comprimento, levemente construído, com braços e dedos fortes feitos para agarrar. Eram animais relativamente ligeiros, que deveriam ser predadores ágeis e letais. Tanycolagreus compartilha certas similaridades em sua estrutura pélvica e fêmur com os primeiros tiranossauróides.
Tanycolagreus
O primeiro Tyrannosauroidea, aferido com certeza, é Guanlong, de 3 metros de comprimento, do Jurássico da China. Ele possuía uma estranha crista em sua cabeça, mas está intimamente ligado à Tyrannosaurus rex e seus parentes por possuir uma sessão peculiar na sua mandíbula superior em formato de U e seus ossos nasais fusionados em uma única estrutura óssea. Era um predador claramente secundário em seu ambiente, um coadjuvante em relação a outro grande carnívoro contemporâneo da mesma região: Sinraptor, de 10 metros.
Reconstituição em vida de Guanlong, por Raul Martin e destaque do crânio do mesmo animal.
Dilong, outro tiranossauróide basal da China, demonstra indubitavelmente a presença de penas adornando sua cauda. Embora pequeno (cerca de 1,6 metros de comprimento), ele é mais avançado que Guanlong por ter um crânio mais parecido com o de tiranossauróides derivados : Há uma série de caracteres especilizados e é notável também a presença de pneumatização em muitos de seus ossos.
Reconstituição em vida de Dilong paradoxus, por Peter Schouten
Durante o início do Cretáceo, um grupo diversificado de pequenos tiranossauróides primitivos (de 3 até 5 metros de comprimentos), incluindo Eotyrannus, perambulava nas florestas do Sudoeste da Ásia e Europa. Já chegou a pensar-se, que Siamotyrannus, da Tailândia, fosse um tiranossaurídeo basal, porém a falta de elementos diagnósticos no material até agora encontrado, leva esse animal a não ser mais considerado com segurança como pertencente à famosa família.
Reconstituição de Eotyrannus
Reconstituição de Siamotyrannus
A principal radiação dos tiranossauróides é exemplificada pelas muitas estranhas formas que apareceram no final do Cretáceo da América do Norte e Ásia. A maioria de grande (8 a 9 metros) ou muito grande porte (mais de 14 metros de comprimento), com membros anteriores reduzidos portando somente dois dedos em cada mão. A maioria possuía alguma forma de ornamentação rugosa no topo do crânio, desde uma série de cones afiados sobre o focinho, como em Alioramus, até superfícies irregulares e/ou pontuadas sobre os olhos, possivelmente para atrair parceiros ou engalfinharem-se disputas corporais com rivais.
Reconstituição de Alioramus por Peter Schouten
O primeiro esqueleto relativamente completo de Tyrannosaurus rex foi descoberto em 1902 no leste do estado de Montana, EUA, e somente foi descrito pelo paleontólogo americano Henry Fairfield Osborn em 1905. Depois de várias expedições, Barnum Brown, o coletor de Osborn, trouxe de volta uma série de esqueletos parciais que complementariam os seus estudos (oito espécimes foram encontrados até 1912). Em 1915, o American Museum of Natural History, montou o primeiro e mais completo esqueleto de Tyrannosaurus rex em seus salões. Stephen Jay Gould atribuiu publicamente que seu desejo por estudar paleontologia se deu devido ao T. rex em exposição no American Museum, o qual ele teria visitado com seu pai quando tinha 5 anos de idade.
Stephen Jay Gould
Tyrannosaurus e seu primo asiático Tarbosaurus atingiram tamanhos entre 12 e 14 metros de comprimento e pesos estimados em torno de 6 toneladas. Porém, a maioria dos tiranossauróides eram animais mais moderados: Daspletosaurus, Gorgosaurus e Albertosaurus atingiram cerca de 8 a 9 metros de comprimento e deveriam pesar em torno de 2 toneladas.
O grupo era considerado restrito aos continentes do norte, porém descobertas recentes sacudiram esse paradigma. Um púbis isolado de 30 cm de comprimento, portando características indubitavelmente relacionadas à tiranossaurídeos, foi descrito para os depósitos de Dinosaur Cove, na Austrália. Descrições baseadas em espécimes parciais como esse australiano sempre são problemáticas, porém na ausência de outros melhores registros, eles devem considerados como relevantes e a possibilidade aceita até que melhores materiais venham lançar maior robustez sobre a especulação. O que esse material australiano leva a concluir é que tiranossauróides de tamanho mediano (com cerca de 3 metros de comprimento) invadiram Gondwana, e habitaram a Austrália, assim como a Ásia, durante o Cretáceo Superior.
Pubis encontrado na Autrália e sua classificação taxonômica (NMV P186069)
Apesar de filmes populares como Jurassic Park terem nos feito acreditar que Tyrannosaurus rex era um veloz corredor e hábil caçador, estudos confiáveis considerando restrições fisiológicas em relação ao seu peso descomunal e o grau de movimentação de seus membros posteriores sugerem velocidades mais modestas em torno de 10 milhas por hora no seu máximo. Tais estudos levaram alguns paleontólogos como Dr. Jack Horner a sugerir que Tyrannosaurus e seus parentes deveriam ser mais como animais carniceiros ou predadores lentos de emboscada. Outros pesquisadores acreditam que as presas de T. rex eram provavelmente tão lentas quanto ele, portanto, eles poderiam sim ser predadores ativos.
Novos estudos sobre Tyrannosaurus mostram que seu desenvolvimento era rápido, embora sua taxa de crescimento acelerado somente se desse nos seus anos tardios. Um T. rex de 10 anos de idade deveria pesar cerca de meia tonelada. Sua maior arrancada no crescimento se daria entre os 13 (peso de uma tonelada) e os 20 anos de idade (alcançando 5 toneladas), sendo que eles devem ter vivido em torno de 30 anos (entre 5 e 6 toneladas). Apesar de tecidos moles fossilizados terem sido encontrados e extraídos de materiais fósseis desses animais, nenhum DNA foi recuperado, e com idade entre 65 e 70 milhões de anos, é altamente improvável que seja, até mesmo pequenos fragmentos de seu genoma.
Tyrannosaurus e seus parentes incendiaram a imaginação de pessoas de todas as idades, com seus esqueletos glorificados nos museus de história natural. Agora devem ser vistos sob uma nova perspectiva: como parentes próximos das aves. Todavia, para contar o resto da história evolutiva desses animais nós temos que prosseguir e narrar a biografia de outros terópodes mais derivados, aqueles que realmente começaram a assemelhar-se mais a criaturas definitivamente avianas.
No próximo capítulo dessa história: Ornithomimosauria. (Clique aqui)