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O que os olhos nas asas de um inseto fóssil podem nos dizer?

Por Matheus P. dos Santos da Rocha & Cledston Matheus A. Macário

Quando falamos em Paleontologia, muitos a resumem como uma ciência meramente de descrição de aspectos morfológicos, como o simples trabalho de encontrar um osso, descreve-lo e, por sorte, dar nome a uma nova espécie. Porém, a Paleontologia vai muito além disso. Por meio dela, podemos especular sobre diversos aspectos da vida no passado. Até mesmo alguns cujas evidências, muitas vezes, são escassas no registro fossilífero. Um exemplo disso, seria encontrar uma resposta para a pergunta: como eram os olhos dos dinossauros não-avianos?

Como toda ciência, a paleontologia trabalha, inicialmente, com hipóteses, e essas, podem nos levar para linhas de raciocínio beeeem inusitadas, uma hora podemos estar debatendo sobre buracos negros e a extinção dos dinossauros e isso, mais à frente, pode terminar numa deliciosa (ou não) receita de macarrão com biscoito. A história de hoje começa com uma linhas de raciocínio inusitadas: ela parte de um grupo de insetos fósseis, os Kalligrammatidae…

O que são os Kalligrammatidae?

Chrysoperla carnea – Foto de Julia Stoess

Você já viu em algum jardim por aí pequenas bolinhas sustentadas por um fio bem fino, presas nas folhas das plantas? Se sim, com quase toda certeza você viu ovos de bicho-lixeiro. Pertencentes a uma ordem de insetos chamada Neuroptera, esses inofensivos (para os humanos) insetos são predadores vorazes de ovos de aranhas e outros invertebrados. Essa ordem inclui desde a formiga-leão, até coisas estranhas como os mantispídeos (que parecem uma mistura bizarra entre um marimbondo e um louva-a-deus).

Apesar de não serem um grupo muito comum nos dias de hoje, a representação fóssil deles é abundante. No Brasil, dados de um trabalho de revisão de 2018, dão conta que das 379 espécies de insetos descritos para a Formação Crato, da Bacia do Araripe, 76 são neurópteros, ou seja, 20% da diversidade de insetos da formação está em uma única ordem, que atualmente representa 0,6% das espécies de insetos viventes. 

No meio de toda essa diversidade, os fósseis mais enigmáticos de Neuroptera são os da família Kalligrammatidae. O primeiro de Kalligrammatidae foi descrito por Johannes Walther, em 1904, com base num material quase completo, encontrado no calcário jurássico de Solnhofen (Alemanha) – aquele mesmo do Archaeopteryx. Desde então, diversas espécies de Kalligrammatidae foram encontradas em várias localidades, com destaque para os achados na China e nos âmbares birmaneses, ao norte de Mianmar. 

Diversidade dos kalligrammatidae. a. & b. da Formação Crato (Brasil); c., d., e., f., g., h. & p. das Formações Jiulongshan ou Haifanggou (China); i., j., k., l., m. & n. da Formação Yixian (China); o. da Formação Karabastau (Cazaquistão).” – Imagem original por Julian Kiely (Editado).

Em 1997, o lendário paleontólogo Rafael G. Martins-Neto, descreveu, pela primeira vez, um Kalligrammatidae na Formação Crato, batizado de Makarkinia adamsi. De lá pra cá, outros trabalhos confirmaram a presença dessa família no Nordeste Brasileiro e, inclusive, descreveram novas espécies, sendo este, até hoje, o único lugar fora da Europa e Ásia a ter esses registros.

É uma sorte que esses animais ocorram em vários afloramentos do tipo lagerstätten (sítios com preservação excepcional) pelo mundo afora. A boa preservação dos fósseis permitiu notar rapidamente a semelhança dos kalligrammatídeos fósseis com as atuais borboletas e mariposas. Essa comparação não fica só por conta do formato, padrões de coloração e desenhos das asas, mas alguns espécimes bem preservados, principalmente em âmbar, mostram também a presença de uma “boca” modificada em um fino e comprido tubo chamado de probóscide, característica marcante das mariposas e borboletas (ambas pertencentes à ordem Lepidoptera). Mas isso aconteceu nos kalligrammatídeos num momento do tempo geológico em que as borboletas não existiam e as mariposas não eram tão abundantes e diversificadas como são hoje.

Fora do Brasil, alguns Kalligrammatidae chegam a ser apelidados de “giant lacewings” (crisopídeos gigantes) e isso chegou ao extremo em algumas espécies fósseis. Comparativamente, algumas espécies fósseis são enormes em relação aos seus irmãos ainda viventes. Estima-se que as espécies encontradas no Araripe, por exemplo, alcançavam entre 24 a 32 centímetros de envergadura! 

A história dos “olhos” nas asas

Insetos grandes e chamativos podem virar comida facilmente, por isso, precisam ter alguma forma de se proteger da predação. Os kalligrammatídeos que viveram entre o Eojurássico ao Neocretáceo estavam dividindo espaço com lagartos, dinossauros avianos e não-avianos, pterossauros, entre outros predadores . Logo, teria que haver alguma forma deles não sucumbirem a seus colegas de habitat!

As mariposas e borboletas de hoje em dia têm algumas estratégias para evitar a predação. Desde projeções nas asas para desviar a atenção do predador, como as mariposas do gênero Actias, até mimetizar (imitar) folhas secas, tal qual Zaretis itys faz. Outra forma é ter “olhos”, ou melhor, ocelos em suas asas. Os ocelos são desenhos circulares que aparecem em diversos animais, especialmente nos lepidópteros. Esses círculos podem aparecer com 2 estratégias diferentes de uso:

Mycalesis patnia – Foto por L. Shyamal
  • A primeira é ter eles próximos às margens da asa, fazendo com que a atenção de um provável predador seja focada na ponta da asa e não no centro do corpo do organismo.
  • A outra é simplesmente aterrorizar! As mariposas da família Saturniidae e as borboletas-olho-de-coruja do gênero Caligo, por exemplo, fazem isso muito bem. Elas têm ocelos enormes no centro das asas, que imitam – algumas vezes de forma assustadora – os olhos de uma coruja, afastando assim qualquer predador que ouse atacá-las.
Caligo beltrao – Foto por Quartl

E é nesse ponto que queríamos chegar. Justamente essa segunda estratégia é atribuída a várias espécies fósseis de kalligramatídeos. Desde o primeiro espécime descrito, os ocelos gigantes estão presentes nas asas, e há trabalhos que descrevem e comparam os diversos formatos encontrados.

Makarkinia irmae – Imagem de Machado et al. (2021).

O que isso tem a ver com dinossauros?

Agora, chegou a hora que, ou vocês sairão desse blog nos chamando de loucos, ou terão o famoso “Mind Blow”. Vamos ao ponto principal: você já parou para pensar sobre o formato dos olhos dos dinossauros não-avianos? Essa é uma discussão complicada, pois o número de olhos de dinossauro preservados no registro fossilífero é: zero! Mas é uma curiosidade legítima querer saber essa informação, tanto que pode ser encontrado por aí, em fóruns pela internet, pessoas debatendo sobre essa questão.

Como esse tipo de material fóssil para dinossauros é inexistente, parte-se para a comparação com animais recentes, tanto seus parentes mais próximos ainda vivos, quanto possíveis análogos ecológicos. Mas existe ainda outra linha de raciocínio para se debater: não olhar para os dinossauros em si, mas para seus colegas de habitat e, no nosso caso especifico, os kalligramatídeos da Formação Crato.

A reação dos leitores daqui a alguns instantes, pelo menos, na expectativa dos autores…

Como já foi mencionado anteriormente, os “Giant Lacewings” poderiam ter se utilizado da segunda estratégia de uso dos ocelos: para assustar prováveis predadores, imitando os olhos de animais com os quais conviveram. Aí está o “pulo do gato”. Para um predador se assustar com os olhos desenhados nas asas das borboletas-olho-de-coruja é preciso que tenha um animal no mesmo habitat, que vá servir de gatilho (o “modelo” dos ocelos de Caligo, uma coruja, por exemplo: um predador assustador, que assuste o predador da Caligo). Mas há 120 milhões de anos não existiam corujas no Ceará, então…quem eram os modelos dos Kalligrammatidae do Crato?

Pantano do Crato – Arte de Olmagon.

Existem dois principais suspeitos: pterossauros e dinossauros, mas vamos por partes. Pterossauros na Bacia do Araripe, segundo Mendes et al. (2020), eram majoritariamente piscívoros (comedores de peixes), com algumas exceções como Lacusovagus magnificens, que provavelmente vagava pelos pântanos da região para caçar anfíbios e outras pequenas presas. O trabalho de Mendes, inclusive, coloca os pterossauros como animais no topo da teia trófica da região na época. 

“Teia trófica da fauna Cretácea do Araripe” – Mendel et al. (2020)

Mas se os pterossauros cearenses comiam peixes, majoritariamente, os possíveis predadores dos kalligramatídeos (outros insetos, anfíbios, pássaros, pequenos dinossauros, etc.) não estavam no cardápio deles, a priori. Por esse fator, seria compreensível a exclusão desses animais como possíveis modelos para os ocelos.

Escultura do Santanaraptor placidus do Museu Plácido Cidade Nuvens, de Santana do Cariri, CE.

Já os dinossauros, por outro lado, são os candidatos perfeitos para esse quebra-cabeças ecológico. Animais como Aratasaurus museunacionali, Mirischia asymetrica (que, assim como “Ubirajara“, foi traficado para Alemanha #MirischiaBelongtoBR) e Santanaraptor placidus, ocupavam o nicho de predadores de médio a pequeno porte da região do Cariri. Como apontado por Julian Kiely, em seu artigo para o blog “Paleoflora,  a forma da asa dianteira na maioria das espécies de kalligramatídeos, e o grande tamanho dessas asas,  correspondiam, aproximadamente, ao tamanho e a forma das cabeças de muitos pequenos dinossauros predadores que conviviam com esses insetos (como as espécies mencionadas acima). Desta forma, poderíamos inferir que as pupilas dos dinossauros de médio a pequeno porte do Jurássico Superior e do Cretáceo Inferior, como os maniraptores (pelo menos), deveriam ser arredondadas, já que os ocelos de todos os kalligramatídeos conhecidos até então, possuem esse mesmo formato. O que se soma à evidência indireta parelela, que considera como base comparativa o formato da pupila dos dinossauros viventes, que são as aves.

Mimetismo de Kalligrammatidae a um Maniraptora  – Imagem de Julian Kiely, 2022.

O poder da especulação

Alguns podem estar se perguntando: qual a importância de especular aspectos biológicos e evolutivos tão difíceis de se comprovar por meio do registro fossilífero? Muito da ciência começa com especulação. As descobertas científicas, em geral, nascem de hipótese de alguém. Um exemplo clássico foi a detecção das ondas gravitacionais em 2015, que haviam sido previstas por Albert Einstein em 1916.

Focando na área da Paleontologia, um exemplo muito interessante, e, à época, considerado extremamente especulativo, foi o da existência de um radiodonte (grupo que inclui o Anomalocaris) filtrador, batizado de “Ceticaris”. Nada mais que uma especulação concebida pelo artista John Meszaros, publicada no livro All Your Yesterdays, de 2013. Porém, para surpresa de muitos, em 2014 foi realmente descrito um radiodonte cambriano com hábito filtrador, Tamisiocaris borealis.

Ceticaris” – Arte de John Meszaros

Em homenagem à previsão de Meszaros, Tamisiocaris foi incluído em um novo clado denominado Cetiocaridae. Infelizmente, o nome deste clado não é mais considerado válido, de acordo com o Código Internacional de Nomenclatura Zoológica, por não existir nenhum gênero real chamado “Cetiocaris“, então foi formalmente substituído pelo nome Tamisiocarididae.

Reconstrução de Tamisiocaris – Arte de Rob Nicholls

Finalmentes

Com base em todos os argumentos supracitados (Alô, professores de redação!), podemos inferir que a hipótese levantada pode levar a especulações e trabalhos futuros que respondam às nossas dúvidas (isso claro, se esse post, neste humilde blog, chegar nas pessoas certas, e para isso seu compartilhamento é fundamental). Gostaríamos de agradecer a Julian Kiely do excelente blog “Paleoflora” pelo artigo que inspirou este, e que isso inspire a todos os nossos leitores a imaginar e especular dentro da ciência, lançar ideias, compartilhá-las, pois só assim a ciência cresce e prospera, com união e partilha. 

Referências:

Martins-Neto, R. G. 1997. Neurópteros (Insecta, Planipennia) da Formação Santana (Cretáceo IInferior) Bacia do Araripe, Nordeste do Brasil. X – descrição de novos taxa (Chrysopidae, Babinskaiidae, Myrmeleontidae, Ascalaphidae e Psychopsidae). Revista Universidade Guarulhos , São Paulo, v. 2, n.4,. p. 68-83.

Frazer, J. 2016. Butterflies in the Time of Dinosaurs, with Nary a Flower in Sight. Scientific American.

Labandeira, C. et al. 2016. The evolutionary convergence of mid-Mesozoic lacewings and Cenozoic butterflies. Proceedings of the Royal Society B: Biological Sciences. 283. 

Vinther, J., Stein, M., Longrich, N. et al. 2014. A suspension-feeding anomalocarid from the Early Cambrian. Nature 507, 496–499.

Moura-Júnior, D.A. et al. 2018. The Brazilian Fossil Insects: current scenario. Anuário do Instituto de Geociência – Ufrj, v. 41, n. 1, p. 142-166. Instituto de Geociências – UFRJ.

Mendes, M. et al. 2020. Ecosystem Structure and Trophic Network in the Late Early Cretaceous Crato Biome. Brazilian Paleofloras. Springer, Cham. 

Machado, R.J.P. et al.2021. A new giant species of the remarkable extinct family Kalligrammatidae (Insecta: Neuroptera) from the Lower Cretaceous Crato Formation of Brazil. Cretaceous Research. Volume 120.

Kiely, J. 2022. Restoring the Kalligrammatids: The not-butterflies of the mesozoic. Paleoflora.

Um dinossauro pescoçudo nanico é o mais novo dinossauro brasileiro

Os maiores animais a caminharem em terra firme foram os dinossauros saurópodes, apelidados de pescoçudos. Algumas espécies de pescoçudos,  como o Argentinosaurus ou o Patagotitan, encontrados na Argentina, podiam ultrapassar 30 metros de comprimento. Verdadeiros colossos capazes de fazer a terra tremer! Mas nem todos os saurópodes eram assim… Existiram centenas de espécies desses dinossauros em quase todos os continentes e, apesar da maioria ser conhecida pelo seu grande tamanho, algumas formas adotaram uma tendência contrária. Existem alguns casos de pescoçudos anões, formas com a altura de um cavalo ou de um camelo, como Magyarosaurus ou Europasaurus, encontrados em ambientes de ilhas antigas. Via de regra, essas formas anãs são encontradas em ambientes de ilhas, pois devido a restrição de área e recursos, a miniaturização do corpo pode ser uma vantagem. Porém, para nossa surpresa, fósseis de uma nova espécie de dinossauro pescoçudo anão foram encontradas aqui no interior do Brasil, em um lugar que esteve bem longe do mar durante toda a Era dos Dinossauros. Essa espécie de dinossauro foi descoberta na cidade de Ibirá, no interior de São Paulo, e se tornou uma das menores espécies de dinossauros pescoçudos conhecidas do mundo!

Reconstituição da nova espécie de dinossauro anão de Ibirá. Arte por Matheus Gadelha.

Por mais de 15 anos o Prof. Marcelo Fernandes (UFSCar) e seu grupo de pesquisa, eu inclusa, têm coletado fósseis no Noroeste Paulista, em uma localidade onde são encontrados abundantes fósseis de dinossauros. As rochas e fósseis dessa localidade datam do Período Cretáceo e têm aproximadamente 80 milhões de anos. Dentre os fósseis recuperados estão restos de dinossauros carnívoros, crocodilos, tartarugas e vários outros animais da “Era dos Dinossauros”. Muitos restos de dinossauros herbívoros foram encontrados na localidade, mas até o momento nenhuma espécie de pescoçudo havia sido nomeada para a região.

Eu procurando por fósseis no sítio onde foram encontrados fósseis do pequeno pescoçudo em Ibirá, SP. Foto por Tito Aureliano.

Fui eu quem trabalhou pela primeira vez, durante a minha graduação, com os fósseis do pequeno dinossauro pescoçudo de Ibirá. Àquela época, o dinossauro não ganhou nome, mas foi reconhecido como diferente das outras espécies descritas para o Brasil até então. Muito tempo se passou, mais fósseis desse pequeno dinossauro foram encontrados e, finalmente, alguns anos atrás, a missão de liderar a descrição da espécie desse misterioso dinossauro nanico foi dada ao paleontólogo Bruno Navarro, atualmente estudante de doutorado no Museu de Zoologia da USP, e especialista em dinossauros saurópodes. Bruno, Marcelo e eu contamos com a ajuda de uma excelente equipe de colaboradores nesse processo e, no último dia 15 de setembro, apresentamos formalmente essa nova espécie de dinossauro ao mundo científico.

O colega Bruno Navarro em Ibirá, SP, procurando por fósseis. Foto do arquivo pessoal de Bruno.

Comparando os fósseis do pequeno dinossauro de Ibirá com materiais de outros animais do mesmo grupo encontrados no Brasil e no mundo, foi possível concluir que ele pertencia à família dos saltassauros, um grupo de titanossauros que inclui algumas espécies de já de tamanho bastante reduzido. Além disso, o pequeno dinossauro de Ibirá apresentava várias características únicas, não compartilhadas com seus parentes mais próximos, logo, uma nova espécie poderia ser batizada. O nome escolhido foi Ibirania parva. Ibirania é a junção das palavras Ibirá – cidade onde a espécie foi encontrada – e ania que em grego significa “caminhante, peregrino”. Já parva é o latim para ‘pequeno’. Como a palavra Ibirá vem do Tupi para “Árvore” – é possível traduzir o nome desse dinossauro como “o pequeno peregrino das árvores”.

Reconstituição artística de Ibirania parva por Hugo Cafasso.

Desde o princípio era possível notar que os fósseis desse pescoçudo de Ibirá eram muito pequenos quando comparado a outros titanossauros, mas ao estimar o tamanho aproximado de um dos espécimes analisados, nos surpreendemos. Ele teria entre 5 e 6 metros de comprimento e seria da altura de uma vaca, o que o colocaria entre as menores espécies de saurópodes já descritas do mundo! Para checar se o tamanho reduzido seria porque o  espécime era apenas um jovem quando morreu, resolvemos analisar o tecido ósseo fossilizado do dinossauro ao microscópio. Essas amostras foram analisadas pelo paleontólogo Tito Aureliano, atualmente estudante de doutorado da Unicamp. A partir da análise do tecido ósseo foi possível concluir que Ibirania realmente era uma espécie de titanossauro anão, já que os fósseis pertenciam a um animal adulto no momento de sua morte, ou seja, ele não cresceria mais ao longo de sua vida.

Tamanho estimado de Ibirania parva comparado a um humano de 1,80m. Em destaque as partes descobertas do esqueleto.

Vértebra dorsal de Ibirania parva. Imagem de Navarro et al. (2022). Escala = 10cm.

No interior de São Paulo, durante o final do Período Cretáceo, há 80 milhões de anos, caminharam muitos dinossauros pescoçudos de grande tamanho, e até gigantes, como o Austroposeidon. Mas havia algo de especial na região de Ibirá, que favoreceu a existência de pescoçudos nanicos. Diferente de outros anões que viviam em ilhas tropicais onde hoje é a Europa, como Magyarosaurus ou Europasaurus, Ibirania vivia no interior do Brasil, em um ambiente semi-árido com períodos chuvosos intercalados por secas intensas. Foi esse ambiente hostil, com recursos limitados periodicamente, que selecionou esses pequenos dinossaurinhos herbívoros, que ao invés de migrar, provavelmente permaneciam residentes na região.

Ibirania é a primeira espécie comprovadamente anã das Américas e viveu em um contexto muito diferente dos outros dinossauros pescoçudos anões já encontrados. Ela acrescenta novas informações sobre a evolução dos titanossauros e também sobre a ocorrência de nanismo em dinossauros saurópodes. Ibirania recebeu o apelido carinhoso de “Bilbo”, em referência ao hobbit de “O Senhor dos Anéis”, por ser um nanico entre gigantes. Se você quiser saber todas as descobertas que este ‘dinossauro-Hobbit’ já forneceu, assista à playlist: https://www.youtube.com/watch?v=_kH96sPGjfg&list=PLHPifkNwYyYYNFP-wvUXNti7NGkfNQ8hz.

O estudo foi publicado na revista Ameghiniana e pode ser acessado AQUI.

Assista também ao vídeo de divulgação:

Referência:

A. Navarro, B., M. Ghilardi, A. ., Aureliano, T., Díez Díaz, V., N. Bandeira, K. L., S. Cattaruzzi, A. G., V. Iori, F., M. Martine, A., B. Carvalho, A., Anelli, L. E., A. Fernandes, M., & Zaher, H. (2022). A NEW NANOID TITANOSAUR (DINOSAURIA: SAUROPODA) FROM THE UPPER CRETACEOUS OF BRAZIL. Ameghiniana, 59(5), 317-354. https://doi.org/10.5710/AMGH.25.08.2022.3477