>Cego?! Pesquisa e pessoas com necessidades especiais

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“- Cego?! Mas, como assim, cego?”

“- É, cego. Fez a graduação, o diploma e agora quer fazer doutorado. Bacana, né?”

Este pedaço de conversa aconteceu lá em casa uns dias atrás, entre minha mulher e eu. Ela, também física, conversou com um estudante interessado em fazer doutorado com ela. Ele é cego. Aquilo mexeu comigo. E me fez pensar.

A gente sempre fala que a sociedade tem que abrir espaço, oportunidades, diminuir barreiras, enfim, integrar da melhor forma possível pessoas que têm alguma especial, seja de mobilidade, seja pela privação de algum dos sentidos. Todo esse discurso é bacana, a maioria de nós sabe, repete, apóia, luta para que ele seja mais que um discurso e se torne soluções reais. Mas eu confesso: nunca tinha pensado sobre o assunto quando a atividade se tratava de pesquisa científica. E agora tenho vergonha disso porque, afinal, é isso que faço da vida.

A pergunta natural a se fazer é: por quê não? Não há motivos, a priori, para que pessoas com qualquer tipo de deficiência não façam pesquisa, em qualquer nível. É claro, alguns tipos de problema restringem o quê se pode fazer mas, impedem? Acho que há poucos exemplos que realmente previnem alguém de fazer ciência completamente. Só pra organizar o post (e as ideias) eu dividi as diversas necessidades especiais que me vem à cabeça abaixo e as possíveis restrições que elas possam trazer, pelo menos do meu ponto de vista. Como não sou um especialista no assunto, nunca tinha pensado nisso e não conheço realmente exemplos práticos de pessoas com necessidades especiais fazendo ciência, se você sabe do assunto, conhece exemplos ou discorda (concorda) com o que eu escrever ali embaixo, deixe seu comentário para enriquecer a discussão e, por que não?, me instruir um pouco no assunto.

As deficiências motoras são as menos restritivas, especialmente quando se trata de fazer teoria, afinal seu maior instrumento de trabalho é a cabeça. É óbvio que quanto maior a restrição, maiores as dificuldades e mais recursos extras é preciso usar para se trabalhar, mas possível, sem dúvida que é, está aí o Stephen Hawking que não me deixa mentir.

Para fazer ciência experimental, a coisa muda um pouco de figura. Se o pesquisador é cadeirante ou não tem um dos braços funcionais, por exemplo, eu acho que ainda dá, apesar de eu nunca ter entrado num laboratório onde um cadeirante pudesse entrar e se locomover propriamente, quiçá trabalhar. Mas adaptações podem sem dúvidas ser feitas de forma a garantir o trabalho com qualidade e sem restrições excessivas. Já no caso de tetraplegia ou falta de ambos os braços, a coisa piora um pouco, afinal não é qualquer coisa que pode ser feita com a boca (pipetar ácido?!) ou com os pés. Nesses casos, eu diria que as restrições são grandes demais, mas adoraria alguém me contradizendo.

Deficiências sensoriais, no meu modo de ver, são um pouco mais restritivas. De novo, para fazer teoria, ser surdo ou cego (como acabei de aprender) não é um problema, desde que seja possível ter acesso aos meios para se ler, escrever e falar enfim, comunicar-se. Para fazer ciência experimental, eu diria que a cegueira é totalmente restritiva, uma vez que nem tudo é tocável, muito pelo contrário. A surdez também é extremamente restritiva, especialmente por questões de segurança. Dentro do laboratório, espera-se alguém completamente alerta a sons, cheiros, ou qualquer coisa estranha. É claro que numa equipe, um compensa o outro e num ritmo de trabalho normal, uma pessoa com surdez não deve deixar nada a desejar a uma pessoa com audição perfeita. Mas quando se trabalha sozinho ou, como citei, em lugares onde sons estranhos podem significar um problema, a coisa se torna complicada. E segurança, em qualquer nível, é o mais importante.

Finalmente, o que dizer de pessoas com deficiências cerebrais? Por ser um trabalho essencialmente intelectual, graves problemas cerebrais (paralisia, etc) certamente restringem completamente o trabalho com pesquisa. Mas nesse ponto, eu me pergunto: e a síndrome de down ou o autismo? Antigamente, pessoas com essas doenças eram consideradas mentalmente atrasadas, mas sei que hoje, com o estímulo certo podem viver vidas normais e desempenhar os mais diversos papéis dentro da sociedade. Mas, e pesquisa? Eu não conheço nenhum exemplo. Quais as restrições, se é que existem, que pessoas com essas doenças têm, por exemplo, com cálculos matemáticos, ideias abstratas ou coordenação motora? Eu juro que não fui me informar sobre o assunto, mas pretendo. E por isso não emito opnião agora. Seria irresponsável. Mas reforço o pedido ali de cima. Se você conhece alguém ou sabe sobre o assunto, deixe seu comentário. O blog agradece.

O blog segue em ritmo de festas de final de ano e deseja a todos um Feliz Natal, bem atrasado, e um ótimo Ano-Novo. Nos vemos no comecinho de 2012!

Discussão - 1 comentário

  1. flavim disse:

    Bom, quanto aos portadores de desordem do espectro autista, há varios asperger pesquisadores... A tal da Dra. Temple Grandin acho que é a mais famosa.
    quanto a sindrome de down, vi essa noticia ontem:
    http://noticias.terra.com.br/educacao/noticias/0,,OI5629546-EI8266,00-Aprovado+no+vestibular+aluno+com+Down+da+UFG+rompe+preconceito.html

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