Obesidade e Depressão podem ser causadas por bactérias que vivem no nosso intestino, dá pra acreditar?!

Você já deve ter se deparado com relatos de conhecidos, parentes e amigos, que seguiram as mais variadas receitas e dietas milagrosas para uma tentativa frustrante de emagrecimento sem sucesso.

Ou ainda, em encontros com a família, escutado a sua tia comentar à mesa durante o café da tarde, “que está no terceiro antidepressivo diferente”, na esperança de combater a depressão.

Ou a caminho do happy-hour após o trabalho, em que um colega cancela a presença em cima da hora, pois iniciou o tratamento com antidepressivos “e o remédio o está deixando muito sonolento nesta primeira semana”.

Situações como estas são tão frequentes no nosso dia-a-dia, que não nos damos conta de que as doenças crônicas têm ganhado cada vez mais espaço entre a população.

Mas será que quando pensamos em obesidade, apenas as cores e a composição do nosso prato é o que importa? E quanto aos efeitos colaterais ou a baixa eficácia das terapias medicamentosas no combate à depressão? Será que estas são as nossas únicas opções?

Cientistas também se debruçaram sobre estes questionamentos.

E embora obesidade e depressão sejam síndromes completamente distintas, pesquisadores descobriram que as duas podem ter suas raízes patológicas, no nosso gigantesco universo microscópico conhecido como microbiota intestinal, em especial a sua porção bacteriana.

É consenso entre cientistas da área, que todos nós possuímos uma microbiota intestinal bastante diversificada, marcada pela presença de diferentes espécies e grupos bacterianos, nas mais diversificadas proporções ao longo do nosso intestino.

Assim como no caso das populações humanas, no que tange a  microbiota intestinal, a diversidade é muito importante, e uma microbiota que apresenta alta diversidade bacteriana é considerada saudável, na maioria dos casos.

Nos últimos anos, constataram que as bactérias intestinais das pessoas acometidas pela depressão crônica ou pela obesidade são diferentes daquelas que habitam os indivíduos considerados saudáveis.

São tão diferentes que se referem à esta condição como uma microbiota em disbiose, ou em outras palavras, em um estado de “desequilíbrio microbiano”.

E isso não é tudo.

Através da prática conhecida como transplante de microbiota, em que é possível transferir as bactérias intestinais de um indivíduo para outro, é possível estudar a ação de determinados micro-organismos em relação aos seus hospedeiros.

Em meio a este contexto investigativo, as bactérias intestinais presentes nas fezes de pacientes diagnosticados com depressão crônica foram coletadas em um estudo científico, e transferidas para o intestino de camundongos de laboratório.

Após o transplante, cientistas constataram que estes mesmos camundongos, antes saudáveis, após a colonização pelas bactérias intestinais provenientes dos indivíduos com depressão, passaram também a apresentar sintomas depressivos.

Em outro ensaio experimental de transplante de microbiota, neste caso, de uma microbiota proveniente de indivíduos obesos para camundongos,  os cientistas tiveram uma surpresa ainda maior. Independe do tipo de alimento que dessem para estes camundongos que abrigavam uma “microbiota intestinal de indivíduos obesos”, os camundongos sempre desenvolviam sobrepeso.

Por demonstrarem a atuação direta da microbiota intestinal sobre o fenótipo e o comportamento dos camundongos transplantados com as microbiotas em disbiose provenientes de humanos, estes estudos inauguram uma nova vertente no entendimento da depressão e da obesidade na nossa sociedade.

De volta para os questionamentos do início deste post, um olhar a partir da perspectiva das nossas bactérias intestinais (da microbiota intestinal) e da sua relação conosco, talvez ajude a elucidar o porquê de inúmeras práticas e tratamentos milagrosos para a redução de peso ou controle dos sintomas depressivos não funcionarem com a praticidade e o rendimento que nós gostaríamos. Abrindo caminhos para o surgimento de novas propostas terapêuticas a partir da manipulação da composição da nossa microbiota intestinal.

Dionisio Pedro Amorim Neto. Biólogo Licenciado pela UNICAMP e Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação do Dpto. de Biologia Celular e Estrutural, com ênfase em Biologia Celular por esta mesma instituição. É vinculado ao LNBio/CNPEM, onde desenvolve projetos relacionados às temáticas de Biologia Celular, Neurobiologia e Microbioma, sendo estas as minhas áreas de atuação e interesse.

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Matheus de Castro Fonseca. Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em Biologia Celular (UFMG). Doutor em Ciências Biológicas: Fisiologia e Farmacologia (UFMG). Atualmente, é membro da Sociedade Brasileira de Biologia Celular e pesquisador do Laboratório Nacional de Biociências, CNPEM, Campinas, onde desenvolve pesquisa com foco em neurobiologia celular e molecular, imageamento de neuroestruturas por raio-X e mecanismos celulares do Parkinson Idiopático.