Porque as mulheres se rebelam hoje em dia, de Dacia Maraini (tradução de Cláudia Alves)

Dacia Maraini (Fiesole, 1936) sempre esteve atenta às questões feministas de seu tempo. Desde o primeiro romance, L’età del malessere, publicado em 1963, até o livro mais recente, Tre donne: una storia d’amore e disamore, de 2017, é possível observar a presença de protagonistas femininas enfrentando as dificuldades de fazer parte de um mundo pouco simpático à sua existência. Além dessa preocupação explícita na produção literária de Maraini, a qual compreende romances, contos, poemas, peças de teatro, roteiros e livros infantis, a escritora italiana também se dedica ao tema em sua produção ensaística. Assim, em “Porque as mulheres se rebelam hoje em dia” (1973), deparamo-nos com suas reflexões não ficcionalizadas sobre as mulheres na sociedade italiana dos anos de 1970. Esse texto, publicado em resposta ao escritor Goffredo Parise, ocupou um lugar privilegiado no grande jornal italiano Corriere della Sera. A coluna em que circulou, Tribuna Aperta, era reservada a importantes escritores-intelectuais da época e, nesse sentido, a publicação do texto de Maraini cumpre um papel significativo ao ocupar esse espaço com as discussões sobre o feminismo. Nós que hoje o lemos, à distância de mais de 40 anos, reconhecemos ali as marcas dos movimentos feministas dos anos 1960 e 1970, que tratavam questões de sexualidade, raça e classe social de maneira menos crítica e não interseccional, como faz o feminismo contemporâneo. Porém, ainda é possível vermos ressoadas em nosso próprio tempo e em nosso próprio país muitas dessas mesmas questões que Maraini apresenta, ainda que ressignificadas por reflexões diversas e novos debates.

Porque as mulheres se rebelam hoje em dia (1973) [1]

Se eu fizesse um discurso do tipo: “Oh, os operários, mas que tanto eles têm para protestar? Eu conheço um operário, um belo rapaz loiro de olhos azuis, cheio de orgulho e de coragem, que trabalha suas 8 horas diárias sem reclamar tanto. Tem um Fiat Seiscento, se veste com certa elegância, vai ao cinema quando quer, nas férias de verão vai à praia. É feliz. Conheço outro que trabalha como mecânico, é bonito, jovem, cheio de vida, trabalha muito sim, mas daí no domingo veste uma calça jeans, uma camisa florida e vai para o jogo carregando seu rádio de pilha e sua vitrola portátil. Tem até um Honda. É verdade que para consegui-lo teve que fazer alguma maracutaia, mas não grande coisa. E não perdeu sua virilidade, seu orgulho, seu bom humor. Esses são os operários que conheço, modernos, independentes, nada de ficar choramingando, fazendo pose ou romantizando. Acima de tudo, eles não têm o complexo do explorado. Vivem bem, são sérios, sabem rir, sabem se divertir, sabem também trabalhar, mas sem reclamar. E se eles se prostituem, isso os torna mais atraentes. Ao contrário dos outros, que resmungam, protestam, se juntam e se fazem eternamente de vítimas. Que chatice!”

Se eu fizesse um discurso desse tipo, todos diriam que eu sou uma apática política[2] da pior espécie, diriam que vejo os problemas sociais de forma pessoal. E certamente me acusariam de ter um raciocínio “feminino”, isto é, irracional e particularista.

Pois esse mesmo discurso sobre os operários que faço como hipótese, Goffredo Parise faz de verdade, falando das mulheres. De maneira particularista e irracional, com a mesma indiferença tranquila em relação ao conjunto do problema. Estou me referindo ao artigo intitulado “Femminismo”[3], publicado aqui neste jornal.

Esse discurso de Parise é, infelizmente, muito comum entre os homens de todas as classes sociais. Frequentemente os escuto julgar de maneira decisiva: “Qual a necessidade do feminismo? Vocês já são praticamente iguais a nós homens. Façam o que quiserem, se comportem como preferirem, que mais vocês estão pedindo? Veja, eu sou mais feminista do que vocês. Eu amo as mulheres, as reverencio, as estimo, até as venero. Mas, por favor, não façam tanto alarde, não comecem a ideologizar porque isso estraga vocês. Vocês ficam instantaneamente feias e chatas”.

Se Parise, que há algum tempo escolheu o papel de defensor do contra, soubesse quão comum é esse discurso, talvez ele ficasse um pouco mais constrangido.

O feminismo é algo muito mais complicado e mais profundo do que aquele “cuidado para não engordar” a que ele se refere. O feminismo não nasce de uma genérica lamentação pelas próprias desgraças. Todos têm suas próprias desgraças e é importante saber guardá-las pra si mesmo. Mas nesse caso se trata de algo muito mais grave. Trata-se de metade da humanidade ter estado em situação de submissão por milhares de anos nas sociedades patriarcais que existiram ao longo da história. E a sociedade atual não é menos patriarcal do que as outras, apesar da sua aparente “liberalidade”.

Manifestação na Itália, nos anos 1970: “Para uma maternidade livre, aborto livre”.

O fato de hoje existirem mulheres aparentemente independentes e livres que talvez mandem em seus maridos não significa que a submissão segundo os homens tenha acabado. A liberdade não é um fato individual. E uma mulher não pode ser livre enquanto outros milhares de mulheres estão em estado de submissão.

A exploração não se torna menor. A grande maioria das sociedades desse mundo não teriam ido em frente se não tivessem vivido à custa de milhões de donas de casa que se matam de trabalhar 12 horas por dia sem remuneração de nenhum tipo, sem assistência médica, sem nem ao menos o reconhecimento social pelo trabalho que fazem.

A essa altura poderiam dizer: se está tão ruim assim, por que todas essas mulheres não protestam, não se rebelam? Por que continuam ali bondosas e contentes, satisfeitas consigo mesmas e com o mundo? A resposta é que a opressão criou na mulher uma forma nociva de passividade e fatalismo. A mulher não nasce passiva, mas se torna, para se adequar a um modelo de comportamento social.

Os opressores, no entanto, encontraram um ótimo sistema para aprisionar a mulher à sua própria opressão ao transformar sua passividade em dado fisiológico, em natureza. Enquanto a mulher não entender que sua passividade é um resultado histórico e não um destino natural, ela não se libertará da sua “inferioridade” psicológica em relação ao homem.

Isso não quer dizer que a mulher deva se masculinizar. Uma mulher-macho é a imitação ruim de um homem. Ela deve simplesmente se tornar um ser humano completo, munida de relações com o mundo, as quais são necessárias para se estar dentro, e não fora, da história. Recusar a passividade não significa recusar o amor ou a doçura. Pelo contrário, recusar a passividade significa desejar que a doçura seja uma escolha, não uma imposição.

O amor, segundo os movimentos de libertação da mulher, é algo vivido em duas pessoas, com o mesmo empenho e a mesma participação, recusando a agressividade de uma das partes e a aquiescência da outra; recusando a oposição tradicional ativo-passivo, sádico-masoquista, fazer-ser feito etc. O amor, como se entende hoje, se parece muito com uma agressão, com uma apropriação, com uma ofensa do homem à mulher. É por isso que muitas mulheres sensíveis e orgulhosas recusam o orgasmo, e se tornam frígidas. É uma recusa implícita do amor como uma forma de “se render” à brutalidade.

Os movimentos de libertação da mulher querem fazer renascer na mulher o sentimento de integridade humana. Querem que a mulher deixe de se considerar um ser incompleto, passivo, frágil, disponível, mutilado. Um ser humano pela metade, em resumo, de acordo com o conceito freudiano.

Mas ao mesmo tempo recusam o modelo “masculino” tradicional. Não é imitando o homem que a mulher vai se libertar, mas sim tomando consciência da sua realidade histórica, social e psicológica.

Não se fica livre da opressão fingindo que ela não existe, como acontece com muitas mulheres que fizeram carreira no mundo dos homens e odeiam ouvir falar dos problemas da emancipação feminina. Elas “conseguiram”, então pensam que a tarefa acaba por aí. Mas a liberdade, como dito antes, não é algo privado. Nenhuma mulher é realmente livre enquanto há outras mulheres em estado de servidão. Somos mulheres. Somos diferentes porque tivemos uma história diferente. Mas a nossa diferença não é uma vergonha. É a nossa realidade, da qual devemos partir em cada reivindicação de direitos.

Não é só uma questão de creches, igualdade salarial, remuneração para as donas de casa. É uma questão de aprender a ver com os próprios olhos os próprios problemas. É uma questão de falar com a própria voz. De pensar com a própria cabeça. Para isso, é importante se isolar e se organizar por conta própria. Não por ódio aos homens ou por desconfiança em relação às organizações políticas em que os homens dominam. Mas para nos acostumarmos com o ato de pensar sobre nossa própria situação de opressão.

E sobre aquilo que Parise disse, que as mulheres não seriam uma classe, se ele tivesse refletido um pouco mais teria percebido que isso é muito mais complexo, confuso e menos claro do que geralmente se pensa. Porque é verdade que existem as mulheres pobres e as mulheres ricas, mas é raro que as mulheres ricas, até mesmo as muito ricas, sejam ricas por conta própria. Em geral, são ricas por causa dos maridos ou dos pais. Ou seja, as mulheres usufruem da riqueza sem de fato produzi-la. Em outras palavras, são sustentadas e, portanto, não são livres. O próprio Parise escreve a propósito de uma delas: “Seu único privilégio é ser genialmente uma puta”.

As mulheres burguesas vivem essa estranha contradição: tem dinheiro à sua disposição, mas não o possuem de verdade. Há algo de ridículo, de irreal, de absurdo na mulher burguesa rica. Tudo o que ela faz ou diz soa sempre falso. E por quê? O ridículo vem do fato de que ela usufrui do poder sem compartilhar desse poder; antes, permanece decisivamente excluída dele.

A mulher pobre, a mulher do povo, nunca é ridícula porque sua relação com o mundo, ainda que limitada, é real. Porque mesmo ela, assim como seu marido, produz. A mulher burguesa que não faz nada e vive sustentada pelo marido é um absurdo social, uma alienação viva. Vêm daí suas neuroses. Daí a falsidade do seu intelectualismo, quando ele existe, que incomoda justamente os verdadeiros intelectuais.

Quando se fala em classe, no que diz respeito às mulheres, se entende essa situação particular em que, sejam mulheres pobres, sejam mulheres ricas, ambas têm em comum a dependência em relação a um homem.

Que existam mulheres que pela força do caráter ou pela “genialidade de puta” saibam dominar seus maridos, apesar da dependência econômica, porque são “mais bonitas, mais sensíveis, mais inteligentes, mais elegantes, em uma palavra muito mais ‘simpáticas’, mesmo se o marido for um coitado”, como escreve Parise, isso não muda nada.

Até mesmo entre os escravos, houve quem cativasse o coração do patrão e acabasse conseguindo o que queria. Mas fazer isso não acabava com a escravidão, nem com a sua, nem com a dos outros escravos.

É provável que a essa altura Parise me diga que sou uma fanática, uma chata, que seria melhor eu ficar quieta porque estou parecendo ingênua e “pasionaria”[4].

E eu lhe responderia que é essa ingenuidade e essa passionalidade que quero reivindicar como algumas das melhores características femininas, que devem ser cultivadas e não reprimidas.


Encontro com Dacia Maraini: “Lectio su letteratura e giornalismo”, em dezembro de 2018.

[1] Publicado no jornal Corriere della Sera, em 10 de julho de 1973. Está recolhido também na coletânea Giornalismo Italiano 1968-2001, na coleção I Meridiani (organização de Franco Contorbia; Milão: Mondadori, 2009) [nota da tradutora].

[2] Em italiano, Maraini utiliza o termo qualunquista. Historicamente, o qualunquismo está relacionado ao movimento autodenominado apolítico posterior à Segunda Guerra Mundial, o qual pretendia se desvincular tanto do fascismo, quanto do comunismo, defendendo a possibilidade de uma posição indiferente e apática politicamente das pessoas comuns. No vocabulário cotidiano, passou a referenciar negativamente aqueles que, pela desconfiança nos meios políticos e institucionais, acabam se aproximando a posicionamentos conservadores [nota da tradutora].

[3] “Femminismo” foi publicado por Goffredo Parise no jornal Corriere della Sera, em 20 de maio de 1973 [nota da tradutora].

[4] La Pasionaria foi o pseudônimo utilizado pela ativista antifascista espanhola Dolores Ibárruri (1895-1989). O termo passou a ser utilizado na língua italiana para referenciar mulheres de luta, atuantes em atividades políticas e ideológicas [nota da tradutora].

[Publicado pelo blog Pontes Outras: https://pontesoutras.wordpress.com/2018/12/09/porque-as-mulheres-se-rebelam-hoje-em-dia-1973-de-dacia-maraini-traduzido-por-claudia-t-alves/ ]

Uma biblioteca no jardim de casa: entrevista com Ilana Eleá sobre a Bibliotek Barnstugan

Em outubro desse ano, no encontro do Mulherio das Letras realizado na Itália, tive o prazer de conhecer vários projetos realizados por mulheres brasileiras espalhadas pelo mundo. E a Bibliotek Barnstugan (em português, Biblioteca Casinha de Campo das Crianças) foi certamente um dos projetos que mais me encantou. Os resultados do encontro ainda reverberam, inclusive aqui no blog, e com muita alegria hoje publico uma entrevista com a idealizadora desse projeto incrível.

Ilana Eleá construiu, em 2017, no jardim de sua própria casa, na cidade de Estocolmo (Suécia), uma casinha de brinquedo que é também uma linda biblioteca comunitária, um espaço literário aberto ao público para acolher as crianças e suas famílias semanalmente. Ali, estão disponíveis um acervo de livros infantis e espaços ao ar livre e internos para que as crianças possam se encontrar, brincar e, sobretudo, estar em contato com livros e com o hábito de ler. Como forma de reconhecimento por sua iniciativa em promover a cultura em sua região, Ilana recebeu recentemente o prêmio Bättre Stadsdel 2018.

Pedagoga e doutora em Educação pela PUC-Rio, Ilana, além de se dedicar à biblioteca, é também escritora, poeta e fez parte da comissão organizadora do Outubro Literário – II Encontro do Mulherio das Letras na Europa. Agradeço o seu carinho em compartilhar com o blog Marca Páginas essa entrevista e a história do seu projeto. Desejo vida longa à Bibliotek Barnstugan e que Ilana e suas ideias maravilhosas continuem inspirando mais pessoas a promoverem, nos espaços que lhe são possíveis, a literatura.

Fotos por Ilana Eleá

Marca Páginas: A ideia de trazer, para o jardim da sua própria casa, uma biblioteca infantil é encantadora e corajosa ao mesmo tempo. Você poderia contar um pouco mais sobre a história de como surgiu esse projeto? Que tipo de expectativas você imaginava quando criou a biblioteca?

Ilana Eleá: Costumo dizer que a Suécia não precisava da minha biblioteca no jardim, mas eu precisava dessa invenção e por isso a fiz acontecer. Nossa família se mudou para um bairro residencial em Estocolmo, com casas de madeira coloridas, muitas crianças e amplos jardins. Há bosques nos arredores, há lago, um parque para esportes e uma estação de metrô, mas não há uma biblioteca pública. A mais próxima fica a duas estações de casa, o que não é longe e lá tem um ótimo acervo infanto-juvenil, mas algo me dizia que não eram apenas livros que me moveriam. Então, a criação de um espaço literário de convivência, um ponto suspenso que fizesse a interlocução entre o público e o privado,  um lugar em que o aroma do café e do bolo assado no forno de casa fosse protagonista de uma atmosfera acolhedora e poética para se ler, ouvir e sonhar histórias foi ganhando corpo e telhado, como mágica.

Marca Páginas: Atualmente, a biblioteca já conta com um acervo considerável de livros infantis. Como é feita a curadoria desses livros? Existe algum tipo de critério em que você se baseie para selecionar novas obras?

Foto por Ilana Eleá

Ilana Eleá: Quando as pessoas me perguntam se aceito doações para a biblioteca, respondo que aceitamos sim, muito obrigada, mas apenas dos livros mais extraordinários que já tocaram a sua vida, marcando a sua memória até hoje, livros que nos surpreendam, tanto crianças como adultos. A curadoria é a chave com a qual conseguimos entrar no que temos de mais lúdico, livre e impressionante. A preferência é por títulos que tragam questões existencialistas, ricos em metáforas, ilustrados, com carga poética, livros que nos convidem a ver os dias com a beleza da complexidade.

Marca Páginas: A biblioteca e o jardim da sua casa, além de serem espaços de empréstimo e de leitura de livros, são também lugares de encontros e trocas entre as crianças e suas famílias. Você poderia explicar como são esses encontros, com que periodicidade eles ocorrem e como eles são organizados?

Ilana Eleá: Para participar dos encontros semanais, abertos ao público, as famílias se inscrevem  pelo site da biblioteca. Com a informação de quantas pessoas estarão presentes e sabendo a idade dos participantes, preparo, no dia anterior, com cartolina preta e caneta branca, o cartão para empréstimo dos livros, onde consta o nome de cada criança. É artesanal e simples,  elas adoram. Há também uma caixa com adesivos variados para que elas escolham e colem nos seus cartões, o que completa o ritual da devolução dos livros na semana seguinte, quando são convidadas a deixar alguma impressão para os próximos leitores. Espalho livros por todo o jardim, ocupando lugares óbvios como mesas, cadeiras e bancos, mas também pendurando-os na árvore de magnólia, decorada com fitas coloridas de cetim, ou os apoio em cestas de frutas, no banco de trás de bicicletas e triciclos, ou ainda os livros para os bebês que vão em toalhas de picnic e almofadas. A trilha sonora toca na caixa de som, encostada na varanda. Os encontros são divididos em 3 grandes momentos: 1) visita livre à biblioteca, para manuseio de livros. A  mesa da bibliotecária fica aberta para registrar nos cartões a escolha de novos títulos para empréstimo e para a devolução dos livros anteriores. 2) lanche com café, bolo feito em casa e frutas; nesse momento, os irmãos mais velhos são encorajados a ler para os menores, e pais e mães de outras famílias leem para quem se aproximar. Esse é o momento que também abraça performances (musicais, poéticas) tanto dos pais quanto das crianças. 3) leitura em voz alta dos livros previamente anunciados no blog para dois grupos de faixas etárias diversas: 0-3 anos e 4-7 anos de idade. O encontro entre pessoas e livros acaba se tornando uma inusitada festa.

Foto por Ilana Eleá

Marca Páginas: Imagino que realizar esses encontros seja algo que perpasse também a sua própria experiência de ser mãe. Pensando na sua percepção com seus filhos, assim como com outras tantas crianças que frequentam a biblioteca, você acredita no impacto da leitura em suas vidas, principalmente fora do ambiente escolar? Como você vê a relação dessas crianças com os livros e a literatura?

Ilana Eleá: A Suécia tem um longo histórico de investimento público na educação, na literatura, nas bibliotecas, no fomento ao livro, na valorização dos autores, leitores e ilustradores. A liberdade dos temas é respeitada e há uma abertura a tópicos impensáveis no Brasil atual, principalmente em relação a questões de gênero e feminismo, uma das conquistas das quais o país mais se orgulha e que tanto me inspiram. Penso que o tempero especial da nossa biblioteca não seja apenas o seu acervo ou oferta de livros, mas sua tipologia ambígua, que  mistura casa e biblioteca, adultos e crianças, livros e cafés no mesmo jardim. É uma forma de samba no gelo, de dança na neve, um círculo em volta da fogueira para as histórias passarem melhor. A biblioteca no jardim é uma forma de abraço.