Descobertas da Semana, 17/01/2009
Resumo e análise de cinco assuntos importantes de ciências físicas que foram destaque na imprensa na semana de 12 a 16 de janeiro.
Ano da Astronomia começa com apagão de megaestrela
+ Poluicão luminosa
O Ano Internacional da Astronomia começou oficialmente em cerimônia em Paris, França, nesta quinta-feira. Aqui no Brasil, porém, houve motivo para comemorar mais cedo.
Na madrugada de segunda-feira, por um telescópio em La Serena, no Chile, o astrônomo brasileiro Augusto Damineli e seus colegas observaram a estrela Eta Carina–a mais massiva já descoberta, com 100 a 150 massas solares–diminuir seu brilho em certos comprimentos de onda (via Folha de S. Paulo). O “apagão” aconteceu na data prevista por Damineli com precisão de dias e reforça a sua teoria de que Eta Carina é na verdade um par de estrelas extremamente gordas. A cada 5 anos e meio, o par se aproxima tanto que suas camadas externas colidem, causando o apagão.
Um dos nossos astrônomos mais importantes, Damineli coordena as atividades no Brasil do Ano Internacional da Astronomia, uma celebração dos 400 anos do nascimento da astronomia e da ciência modernas, organizada pela União Astronômica Internacional, com apoio da Unesco. Uma série de programas em mais de 135 países vai mostrar a importância da astronomia na nossa cultura e sociedade, além de incentivar as pessoas a apreciar o céu noturno.
Um programa importante será o de combate à poluição luminosa. Um quinto da população mundial não enxerga a Via Láctea de noite, por causa da iluminação mal feita que emite mais luz para o céu do que ilumina o chão (via Wired). Além de encobrir o espetáculo do Universo, esse desperdício de energia elétrica confunde aves e outros animais migratórios, os levando à morte, além de prejudicar a saúde humana (leia este artigo na Nat Geo). O Ano da Astronomia tem de resultar em novas leis que regulem a iluminação pública e privada nas cidades. Fiquemos de olho nos astros e nos políticos…
(P.S. p/ físicos: Uma simulação computacional publicada na Science de hoje mostra o papel de instabilidades do tipo Rayleigh-Taylor na formação de grupos de estrelas maiores que 20 massas solares, como a Eta Carina.)
Energia dos ventos é a melhor + mudanças climáticas vão resolver crise financeira global? + geoengenharia vale a pena?
Evitar catástrofes climáticas exige que o despejo de dióxido de carbono na atmosfera atinga seu máximo antes de 2020 e começe a cair até que, em 2050, as atividades humanas absorvam mais carbono do que emitem, concluiu um relatório do Instituto Worldwatch.
A meta não será atigida, porém, se governantes patrocinarem as fontes de energia erradas, alerta Mark Jacobson, especialista em energia eólica da Universidade de Stanford (EUA). Ele calculou o que aconteceria se toda rede elétrica e frota de veículos dos EUA fosse movida por um único tipo de combustível alternativo ao petróleo e, a partir dai, criou um ranking das energias alternativas com menor impacto no meio mabiente e na saúde (via New Scientist).
As opções que atraem mais fundos e atenção do governo, como biocombustíveis, energia nuclear e “carvão limpo” (captura dos resíduos da queima de carvão, injetando o carbono de volta ao subterrâneo) são de 25 a 1.000 vezes mais poluentes do que as do ranking de Jacobson, cujo campeão é a energia dos ventos capturada por turbinas.
A afirmação soa suspeita na boca de um especialista em energia eólica, mas o estudo parece sério e, de acordo com o press release da Univ. de Stanford, “Jacobson não recebeu nenhum financiamento de qualquer grupo interessado, companhia ou agência governamental”.
Aqui no Brasil, Fernando Barros Martins e seus colegas também defendem mais investimento em energia eólica, neste artigo publicado no começo de 2008 na Revista Brasileira de Ensino de Física (via Agência Brasil. Humm… estaria a Ag. Brasil divulgando esse artigo só agora para desviar a atenção do plano vergonhoso do governo federal de construir 68 usinas termoelétricas movidas a combustíveis fósseis até 2017?).
Jacobson defende outra idéia que parece cada vez mais popular: investir em energias renováveis vai gerar os empregos necessários para sair da crise econômica mundial.
Também nos EUA, o ativista político Van Jones faz pressão em Washington para que pobres e desempregados sejam a força motriz da reforma que a infraestrutura americana precisa para se tornar sustentável (via The New Yorker). No Reino Unido, a organização Green New Deal tem um plano de salvar a economia com “empregos verdes” (via BBC).
Uma reforma radical na economia é mamão com açucar, perto de projetos que pretendem mitigar o aquecimento global na marra. Uma das idéias da chamada geoengenharia global é despejar toneladas de nutrientes nos oceanos para forçar uma explosão de crescimento de algas microscópicas (fitoplâncton) que absorveriam carbono durante a fotossíntese e por fim morreriam, seus microcorpos afundando no leito oceânico. Assim, bilhões de toneladas de CO2 seriam retirados da atmosfera a cada ano, dizem as empresas que pretendem ganhar dinheiro com a venda
de créditos de carbono de projetos de fertilização oceânica.
Em 2007, uma convenção das Nações Unidas proibiu experimentos de fertilização oceânica que não sejam em pequena escala e em regiões costeiras, até que se esclareça quais as suas consequências nos ecossistemas marinhos.
Esta semana, porém, foi por pouco que um navio não despejou 20 toneladas de sulfato de ferro em uma área de mar de 300 km2 entre a Argentina e a Península Antártica, próxima à bela Ilha Georgia do Sul (via Nature News). A expedição hindo-alemã LOHAFEX seria o sexto experimento de fertilização oceânica desde 1993. Foi aprovada pelo ministro do meio ambeinte da Alemanha, que voltou atrás após críticas e suspendeu o experimento até que nos próximos 10 dias uma comissão independente analise os riscos ao meio ambiente.
Menos megalomaníaca que a feritilização oceânica, uma nova proposta de geoengenharia se aproveita da mais velha das geoengenharias–a agricultura. Em um artigo no periódico Current Biology, Andy Ridgwell e colegas da Universidade de Bristol (Reino Unido) propoem selecionar variedades de plantações com folhas mais brilhantes, capazes de refletir mais luz solar do que absorvem para resfriar no verão as zonas temperadas da América do Norte e da Eurásia e assim impedir o surgimento de ondas de calor mortais. No blog do jornalista Oliver Morton há uma discussão interessante dessa proposta e outras semelhantes.
Para concluir o assunto da geoengenharia, fico com o pensamento de Gavin Schimdt, do blog Real Climate: “Então, a solução para a conhecida influência humana cada vez maior no clima é um sistema mais elaborado de controle do clima? Ou a pessoa balançando a canoa devia simplismente se sentar?” (link)
Lua primitiva era magnética como a Terra
A rocha na foto acima veio da Lua. Foi trazida pelo único geólogo a passear por lá, o astronauta Harrison Schmitt, da última missão tripulada ao satélite, a Apollo 17, em 1972. Batizada de troctólito 76535, a rocha é a única amostra trazida da superfície da Lua que não mostra nenhum sinal de ter sofrido o impacto de meteoritos. É um relíquia quase intacta do tempo em que a Lua se formou da fusão dos destroços da colisão da Terra com um meteoro do tamanho de Marte, bilhões de anos atrás.
Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (EUA) examinaram as propriedades magnéticas do troctólito com uma precisão 10 vezes melhor que estudos anteriores. Em seguida, compararam seus dados com o de uma análise da proporção de dois isótopos de argônio que reconstituiu o perfil de temperatura da rocha ao longo de bilhões de anos. Concluiram que há 4,2 bilhões de anos, havia na Lua um campo magnético constante, 50 vezes menor que o terrestre.
Segundo o estudo, esse campo era provavelmente gerado pelas correntezas de ferro líquido no núcleo ainda quente da jovem Lua, exatamente como a Terra até hoje produz o seu campo magnético.
(Será que havia auroras polares na Lua como as terrestres? Há bilhões de anos a Lua estava bem mais próxima da Terra. Só posso imaginar o espetáculo da Lua, enorme no céu, com auroras, vapores, vulcões, rios de lava …)
A pesquisa publicada na Science de hoje é mais uma evidência contra a crença de que corpos menores que Marte não poderiam ter campos magnéticos constantes, apenas campos passageiros produzidos durante impactos com meteoros. Agora, parece que não só a Lua, mas outros corpos pequenos como Mercúrio e luas de Júpiter e Saturno possuem traços de campos magnéticos ancestrais. (Fontes: MIT, ScienceNOW, Nat. Geo. News)
Ressonância magnética enxerga vírus em 3D
A série de imagens em preto-e-branco acima pode não ser bonita mas vai deixar bioquímicos felizes. Cada quadro é o perfil da estrutura interior de um vírus da espécie “mosaico do tabaco” com uma resolução menor que 10 nanômetros. Elas foram obtidas com uma nova técnica que produz “o raio X” do interior de um vírus, sem de fato usar raios X.
A técnica desenvolvida por pesquisadores do Centro de Pesquisa Almaden da IBM (EUA) e descrita em um artigo na PNAS é uma versão 100 milhões de vezes mais sensível da ressonância magnética usada em hospitais. Um campo magnético oscilante faz os núcleos dos átomos de hidrogênio das moléculas orgânicas produzir seu próprio campo magnético em resposta que é registrado em imagens.
Na versão nanométrica, a amostra de vírus é cuidadosamente posta sobre a superfície de um peça móvel de silício (em foto de microscopia por varredura de elétrons, na imagem mais acima). Os núcleos de hidrogênio do vírus vibram em resposta ao campo magnético da ponta de uma agulha magnetizada próxima da amostra. A vibração dos hidrogênios faz a peça de silício se mexer. O movimento da peça é registrado por um feixe laser. Um software processa os sinais do laser e da agulha para criar as imagens. Tudo precisa ser feito em temperaturas abaixo de zero, para que as vibrações térmicas não atrapalhem nas medidas.
A resolução das imagens é similar a de outras técnicas em uso. Entretanto, ao contrário da cristalografia por raios X, a nova técnica permite enxergar a estrutu
ra de proteínas que não podem ser cristalizadas. E, ao contrário da microscopia por força atômica e da microscopia de varredura por tunelamento, será possível com o aprimoramento da técnica enxergar a estrutura atômica interna de amostras biológicas (Fontes: NYT, RSC e Nature News).
Marte emite metano que pode ser sinal de vida, ou não…
+ Cristais inorgânicos imitam formas orgânicas
Astrônomos norte-americanos descobriram que a superfície de Marte emite gás metano em uma quantidade que sugere a possibilidade de microorganismos vivendo no subsolo.
Em 2003, ao longo do verão do hemisfério norte marciano, astrônomos observaram Marte por dois telescópios no Havaí (EUA) e detectaram um gás na atmosfera do planeta absorvendo três faixas estreitas de comprimentos de onda de luz infravermelha características do metano (CH4).
Em 2006, a quantidade de metano em Marte era metade da observada em 2003, o gás destruído por uma série de reações químicas (vejam estes slides da Nasa), entre elas a quebra das moléculas de metano pela radiação solar.
Analisando as observações, os pesquisadores criaram um mapa que revela três regiões do planeta de onde o metano parece ter sido emitido. As três regiões mostram sinais de gelo de água no solo.
Os pesquisadores têm duas hipóteses preferidas para explicar as emissões. A mais prosaica seria a de que algum processo geológico do passado, como vulcões, ou um processo ainda ocorrendo, como a oxidação de ferro das rochas, produziu depósitos subterrâneos de metano debaixo da camada de solo congelado (permafrost). Durante o verão, o metano vazaria por rachaduras no premafrost.
A hipótese mais ousada é a de que os depósitos de metano seriam produzidos pelo metabolismo de microorganismos semelhantes a bactérias terrestres capazes de viver no subterrâneo, usando hidrogênio da quebra de moléculas de água por radiatividade como fonte de energia.
Não há evidências suficientes para descartar uma ou outra hipótese. Os pesquisadores consideram ainda que a origem do metano possa ser a colisão de cometas ou asteróides. A pesquisa foi publicada online pela Science. (Fontes: Nasa e New Scientist).
Essa ambiguidade entre biológico e mineral também aparece em outro estudo publicado nesta edição da Science. Juan Manuel Garcia-Ruiz e colegas filmaram passo a passo como oscilações no pH de uma solução química produzem cristais de carbonato de bário e silica, com lindas formas microscópicas arredondadas.
Vejam as imagens, cortesia do Laboratório de Estudos Cristalográficos da Universidade de Granada:
São chamadas de biomorfos, por serem parecidas com formas cristalinas produzidas com a ajuda de moléculas sintetizadas por organismos vivos. Garcia-Ruiz demonstrou a exsistência de biomorfos pela primeira vez em 2003. Antes disso, acreditava-se que cristais inorgânicos só podiam ter formas retas e que cristais curvos encontrados em rochas terrestres ou no famoso meteorito ALH 84001 vindo de Marte eram sinais inequívocos de atividade biológica fóssil. (Fontes: Eurekalert! e Nat.Geo. News)
Discussão - 4 comentários
Só um detalhe quando a fertilização com ferro Igor. A NatureNews falou sobre o lado científico deste último experimento. Ele só foi suspenso por pressão política. Ele é o contrário de tudo o que foi feito sobre fertilização oceânica. Como poderemos saber os efeitos reais da fertilização sem um estudo deste porte? Nem tudo (principalmente em ecologia) pode ser feito em micro escala. Vide os experimentos de lago inteiro realizados no canadá há mais de 30 anos.
Falei mais sobre isso aqui: http://discutindoecologia.blogspot.com/2009/01/ferro-algas-mitigao-do-aquecimento.html
Abraços.
Marc Jacobson deveria pensar que todos os governantes estão adotando posturas erradas. E, que os próprios cidadãos consumidores foram catequizados sobre 'sustentabilidade' como algo parecido 'não uso sacolinhas de plástico'
😛
Muito bom o seu banner, não tinha visto ele ainda! Se inspirou no livro do Ed Young?
Talvez inconscientemente... Juro que reparei na semelhança só depois que fiz. Passei uma tarde de domingo apanhando do Photoshop pra fazer...