A seleção natural contada por um jogo
Quando estamos fazendo um jogo a pergunta que mais nos fazemos é: será que tá divertido? Hoje, mesmo trabalhando com jogos para a divulgação científica, essa é a nossa pergunta top 1!
É com este pensamento que os nossos jogos nascem. Nós, da Clareira dos Jogos, amamos trabalhar com temas ligados à biologia, mas de que adianta agregar tanta informação se isso não engajar as pessoas? Queremos sempre criar vivências com significados, para que a pessoa mergulhe em meio a novas descobertas por vontade própria e, claro, por diversão.
Nosso grupo é formado por biólogos, artistas, designers de jogos e programadores que, em 2020, fundaram a clareira para desenvolver jogos de divulgação científica e educação ambiental. Escolhemos esta mídia (que somos apaixonados) por entendermos o potencial dos jogos em promover imersão e o protagonismo aos jogadores, características que ajudam muito o aprendizado.
Por gostar de falar de ciências, sempre que podemos também estamos juntos com quem a produz! Seja em eventos acadêmicos ou sala de aula, as trocas e opiniões destas comunidades enriquecem qualquer jogo.
Também foi em sala de aula que Molukas surgiu. Um jogo sobre ecologia e evolução desenvolvido em meio a testes com estudantes do ensino fundamental e médio e universitários.
Foram temas que escolhemos justamente pela falta de exemplos práticos que podem ser dados quando se ensina sobre eles. Por serem tópicos mais abstratos, a interatividade e imersão do jogo criaram novas vivências para serem usadas na simplificação do entendimento.
Ao levar para a sala de aula, os estudantes também se conectaram muito com o estilo visual. Nós escolhemos referências como Pokémon e Hora da Aventura para as ilustrações por serem produções que mexem com vários públicos (inclusive com a gente). Nós recebemos até ilustrações dos estudantes que participaram da nossa versão antecipada!
Essa mesma turma de onde veio a ilustração foi o nosso primeiro teste usando Molukas no ensino remoto. Os relatos da professora foram os mais positivos possíveis, os estudantes inadimplentes começaram até a fazer exercícios atrasados para poder jogar com a turma.
A escolha por abordar aspectos ecológicos e evolutivos nos guiou em todas as nossas decisões, inclusive na estética. Como o jogo é focado em processos abrangentes, optamos criar espécies fictícias, assim, nós evitamos qualquer associação exclusiva de um efeito biológico com espécies reais.
As regras (ou mecânicas) de Molukas foram feitas para o jogador conseguir se relacionar com a diversidade de conceitos presente na ecologia e evolução. No mapa, por exemplo, temos três terrenos diferentes e quanto mais espécies em um terreno, mais disputada a comida fica.
Durante este jogo o vencedor é aquele que consegue fazer suas espécies prosperarem. Para isso você tem que garantir a alimentação e reprodução delas! As cartas também são muito importantes para isso. Cada uma delas contém um conceito biológico diferente, assim uma carta como “Pioneiros” pode beneficiar uma espécie que esteja sozinha em um terreno, sendo uma simplificação do conceito ecológico de espécie pioneira.
Além de disputar por alimentos e fugir de predadores, existem outros riscos que você pode correr. A seleção natural também pode te pegar desprevenido por meio das cartas que extinguem espécies. Um exemplo é a carta “Falta de Recursos” que diminui drasticamente o número de alimentos que a espécie precisaria comer.
Durante o percurso de desenvolvimento também percebemos que as mecânicas de Molukas eram um pouco complicadas para o público infantil. Como ele é um jogo com muitas regras e textos, muitas das crianças que eram atraídas pelas ilustrações fofas não conseguiam jogar de fato. Isso varia muito para cada pessoa, algumas com menos de 10 anos conseguiram jogar sem dificuldade, mas não deixa de ser um aperto no coração quando outras não conseguem (principalmente quando se está cercado de crianças).
Quando a partida termina, você também pode desbloquear novos conteúdos! O jogador pode conhecer as histórias dos exploradores que visitaram as Ilhas Molukas. Fizemos isso para expandir a quantidade de curiosidades biológicas do jogo e homenagear as ilhas da Indonésia, onde Wallace formulou seus ensaios sobre seleção natural.
Como Molukas é um jogo digital também existem algumas limitações para levar para sala de aula. Em turmas que os estudantes não poderiam jogar no celular, professores já usaram Molukas no projetor e fizeram um jogo colaborativo com os alunos tomando as decisões. Mesmo sendo usado de uma maneira inesperada, os professores que fizeram isso nos relataram experiências excelentes em que o problema foi o controle dos alunos querendo participar ao mesmo tempo.
Os testes em sala de aula também resultaram em um manual didático com toda essa experiência! Nele compilamos os conteúdos do jogo e propostas pedagógicas sobre como utilizar Molukas. Para acessar esse conteúdo você pode entrar na página do jogo: https://clareiradosjogos.itch.io/molukas
Nos apaixonamos pelos resultados deste jogo e desejamos um bom jogo para vocês!
Mateus Melotti Martins é mestre em biologia animal pela Universidade Federal do Espírito Santo. Atualmente, faz parte da Clareira dos Jogos como designer de jogos e divulgador científico.