O mistério do sumiço das manchas solares

Recentemente, a frequência das tempestades solares começou a aumentar e elas acabaram virando manchete no final do mês passado, como a erupção solar deste vídeo registrado dia 24 de fevereiro pela sonda SDO, da Nasa. As tempestades solares que alcançam a Terra podem danificar a rede elétrica de países em altas latitudes e satélites.
 
Esse aumento acontece depois de um período de calmaria anormalmente longo do Sol, cujo um modelo computacional publicado na revista Nature em 3 de março é o primeiro a explicar.  Veja abaixo uma ilustração feita a partir do modelo:

 

As erupções solares acontecem ao redor de regiões da superfície do Sol onde há uma intensidade momentânea maior de energia magnética, que às vezes é liberada de forma explosiva. O Sol é uma enorme bola feita de um gás quente e eletricamente carregado, o chamado plasma, que circula de maneira turbulenta, gerando campos magnéticos intensos e complicados por toda a estrela, que mudam constantemente. Essas regiões de maior intensidade magnética são as manchas solares, que aparecem como manchas escuras na superfície solar, por serem relativamente mais frias que o material ao seu redor. 

O número de manchas solares aumenta e depois diminui em um ciclo que dura mais ou menos 11 anos. A duração do ciclo está relacionada com o tempo que demora para o plasma solar viajar da superfície em seu equador em direção aos polos, onde afunda 300.000 km para emergir novamente no equador 11 anos depois. É por meio desse movimento chamado de circulação meridional (veja as linhas pretas na figura acima) que os campos magnéticos das manchas solares (linhas douradas na figura) renovam suas forças entrando em contato com o campo magnético principal do Sol, gerado em seu interior.

O último pico de manchas solares (e portanto, também das explosões solares) foi em 2001. Um novo ciclo devia ter começado em 2008, mas, em vez de aumentarem em número, as manchas solares continuaram raras. Entre 2008 e 2010, foram 780 dias sem manchas solares, enquanto que o normal durante o período de atividade mínima de um ciclo solar são uns 300 dias. Foi o mínimo solar mais longo registrado desde 1913.

Para entender o que causou esse mínimo prolongado, um grupo de pesquisadores simulou a circulação de plasma no interior do Sol. Ao simular 210 ciclos solares com seu novo modelo computacional, os pesquisadores concluíram que um mínimo solar prolongado é provocado por variações na velocidade da circulação meridional de plasma. Se essa circulação começa bem veloz no início do ciclo solar, não sobra muito tempo para a renovar os campos magnéticos que formariam as manchas solares. E se a velocidade da circulação diminui no fim do ciclo, ela atrasa o começo do próximo ciclo. 
 
A explicação só tem um pequeno problema. Conforme apurou Lisa Grossman do site Wired Science, um estudo de 13 anos de observações da superfície solar feitas pela sonda SOHO da Nasa, publicado em março de 2010 na Science, inferiu que a circulação meridional foi mais lenta no início do último ciclo e não mais rápida como o novo modelo propõe. Os pesquisadores do novo estudo e do estudo anterior defenderam suas conclusões.   

Se o modelo está certo ou não pode ficar claro nos próximos anos, com observações da sonda SDO da Nasa de oscilações na superfície solar. Da mesma maneira que as ondas dos terremotos são usadas para investigar o interior da Terra, essas oscilações vistas na superfície solar permitem reconstruir o movimento do plasma em seu interior. Os instrumentos da SDO vão explorar camadas de plasma mais profundas que as que a sonda SOHO consegue.

Fontes:
Solar Mystery Solved (Cfa Press Room)
Researchers Crack the Mystery of the Spotless Sun (Nasa)
Study Blames Plasma Flow for Spotless Sun (Wired Science)     

Deslizamentos de Terra: reais e simulados

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou ontem o impressionante vídeo acima, mostrando uma animação em 3D baseada em imagens de satélite dos trágicos deslizamentos de terra que aconteceram no estado do Rio de Janeiro, no começo do ano (soube via O Eco).

Acho que não tenho muito a acrescentar ao que já se comentou sobre aquela que talvez tenha sido a maior catástrofe climática que o Brasil já sofreu.

As causas são óbvias e foram apontadas repetidamente pelos meios de comunicação (veja o Planeta Sustentável, por exemplo): pessoas vivendo em encostas íngremes ou em áreas próximas delas, o deflorestamento que deixa essas encostas vulneráveis à erosão, a ausência do poder público para impedir tudo isso, combinado com o excesso de chuvas torrenciais, cada vez mais frequentes em um mundo passando por um aquecimento global.

Ao que parece, o governo percebeu a importância das informações científicas para a prevenção de desastres naturais e vai investir na criação de um plano nacional de monitoramento coordenado por Carlos Nobre, climatólogo do Inpe.

Vou então me ater a apresentar um resultado científico recente e muito interessante sobre deslizamentos.
 
Liquefação
Dá para notar no vídeo do Inpe, o que o especialista em deslizamentos Dave Petley, da Universidade Durham, no Reino Unido, apontou ao comentar fotos do desastre em seu blog:

“A maioria desses deslizamentos são compridos e estreitos, se estendendo pela maior parte do declive. Em deslizamentos induzidos pelas chuvas, isso é característico de colapsos que envolvem liquefação estática, a qual induz rápido colapso e altas taxas de movimento.” LINK

Petley refere-se ao mecanismo básico dos deslizamentos de terra provocado por chuvas. A chuva encharca uma porção de solo em uma encosta. O solo se liquefaz, perdendo a coesão, e a gravidade o faz despencar morro abaixo. Durante a queda, o solo arrasta mais solo, resultando em uma avalanche de terra que pode chegar a uma velocidade superior a 10 metros por segundo.

Para testar essa ideia qualitativa de como acontece um deslizamento, o grupo de pesquisa do hidrólogo Richard Iverson, do Serviço Geológico dos EUA, provocou seus próprios deslizamentos de terra controlados, usando o tobogã de concreto da foto abaixo, que tem  2 metros de largura, 107 metros de extensão e uma inclinação de 31 graus. (Veja o vídeo dos deslizamentos no Science NOW).



Os pesquisadores cobriam o tobogã de terra e lançavam lá do alto uma descarga de 6 metros cúbicos de terra para ver o que acontecia. Eles controlavam a umidade dessa terra toda por um sistema de irrigação e iam testando diferentes graus de liquefação da lama. Monitoravam os deslizamentos por meio de câmeras de vídeo e sensores ao longo do tobogã.

Assim, Iverson e seus colegas conseguiram pela primeira vez quantificar o deslocamento de terra e entender melhor como a avalanche ganha velocidade, medindo o chamado “fluxo de momento” do deslizamento. Eles descobriram que a descarga de terra inicial que cai pelo tobogã pressiona a camada de terra molhada logo abaixo e a frente dela. Essa pressão faz a terra ficar mais liquefeita e fluir, se agregando à descarga inicial, aumentando o poder da avalanche. 
       

As conclusões do estudo foram publicadas em um artigo na revista Nature Geoscience, dezembro passado.

Referência:

Iverson, R., Reid, M., Logan, M., LaHusen, R., Godt, J., & Griswold, J. (2010). Positive feedback and momentum growth during debris-flow entrainment of wet bed sediment Nature Geoscience, 4 (2), 116-121 DOI: 10.1038/ngeo1040

O vibrador que levou físicos ao delírio


OsciladorQuantico.jpg

Quase visível a olho nu, o pedacinho de metal na foto acima obtida por um microscópio eletrônico, foi projetado para se mexer e ficar parado ao mesmo tempo. Qualquer semelhança com o Gato de Schrödinger–o felino infeliz que está vivo e morto simultaneamente no experimento imaginário proposto por Erwin Schrödinger, um dos pioneiros da mecânica quântica–não é mera coincidência.

O mecanismo capaz de vibrar e não vibrar ao mesmo tempo é obra de Aaron O’Connell e mais onze colegas do laboratório de Andrew Cleland, na Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara (EUA). No artigo publicado 17 de março no site da revista Nature, o grupo explicou como resfriou a peça de metal até quase zero absoluto, deixando o mecanismo em seu estado de movimento mínimo possível, seu “estado quântico fundamental”. Mais parado que isso o mecanismo não pode ficar.

Podiam cantar vitória só com esse feito, mas seguiram em frente. Depois de colocar o oscilador em seu estado fundamental, transmitiram à peça a menor quantidade de energia possível que ela é capaz de absorver, um “quantum de vibração”.

Durante esse experimento, os pesquisadores obtiveram evidências indiretas de que, por alguns instantes, o mecanismo fez algo que apenas feixes de luz, átomos e moléculas individuais fazem normalmente. Algo que por muito tempo se pensava que apenas esses entes tão minúsculos seriam capazes de fazer.

Mundo Quântico X Mundo Clássico

Desde o início do século XX, os físicos descobriram que as leis da física do dia-a-dia, a física clássica–cujas fórmulas aproximadas precisamos decorar para passar no vestibular e que é quase tudo o que os engenheiros precisam saber para construirem pontes e usinas hidrelétricas–funcionam mal e mal no mundo molecular, atômico e subatômico.

Elétrons orbitando o núcleo dos átomos, as partículas de luz que eles emitem e absorvem, tudo isso e muito mais é explicado apenas por outro conjunto de leis, as da mecânica quântica.

A teoria tem esse nome porque, ao contrário da física clássica, onde os objetos podem trocar energia de maneira contínua, a energia na mecânica quântica é trocada na forma de múltiplos de uma porção mínima, os chamados quantum de energia (o plural é quanta). A quantidade de energia de um quantum varia de caso para caso.

As diferenças entre a mecância quântica e a física clássica não param nos quanta. Elétrons, por exemplo, podem agir “como se estivessem em dois lugares ao mesmo tempo”. O que quero dizer com a frase anterior entre aspas fica bem claro com o famoso exemplo em que se faz um elétron passar por duas fendas em uma parede. Tentei achar um link para algum texto que descrevesse esse exemplo, mas não achei nada que preste. Prometo mais para frente escrever sobre isso com mais detalhe. Por ora, basta dizer que quando se faz esse experimento em certas circunstâncias, os resultados sugerem que o elétron percorreu dois caminhos diferentes simultâneamente.

Até dá para dormir sossegado aceitando que elétrons existem em estados além da nossa imaginação. Mas objetos maiores, feitos de muitos átomos? O físico Erwin Schrödinger imaginou em 1935 um gato preso dentro de uma caixa onde um dispositivo lança veneno no ar quando um núcleo atômico emite radiação. Acontence que, até o momento em que alguém abra a caixa, o núcleo pode estar em um desses estados insanos em que ele emite e não emite a radiação, o que faz com que o lançador de veneno tenha sido acionado e não acionado, e o gato esteje morto e vivo ao mesmo tempo.

Isso seria mesmo possível? Um objeto “clássico” poderia se comportar quanticamente? Onde fica a linha que separa o mundo quântico do clássico? Essa linha existe? Será que a mecânica quântica precisa ser corrigida? São essas questões que motivam experimentos com objetos em princípio”clássicos”, feitos de bilhões ou trilhões de átomos, mas pequenos o suficiente para que seja possível vislumbrar efeitos quânticos neles.

Esses experimentos já obtiveram resultados muito interesssantes. Em 2000, físicos observaram a corrente elétrica em um anel supercondutor girar em dois sentidos ao mesmo tempo. Ano passado, outro grupo de pesquisadores emaranhou o estado de dois qubits superconduntores visíveis a olho nu.

Até agora, porém,ninguém havia posto um objeto macroscópico para se mexer quânticamente. Desde os anos 1990, grupos de pesquisadores investigam como fazer isso, construindo aparelhos mecânicos minúsculos e tentando fazê-los vibrar como um “oscilador harmônico quântico“. Foi exatamente o que o pessoal do laboratório de Cleland conseguiu fazer.

Como fizeram

Em um comentário que acompanhou a publicação do artigo na Nature, o físico Markus Aspelmeyer notou que a construção do vibrador quântico macroscópico venceu dois desafios. O primeiro desafio foi resfriá-lo até uma temperatura bem próxima de zero Kelvin (-273 oC), o chamado “zero absoluto”.

Um oscilador harmônico clássico vibra com qualquer energia. Já a sua versão quântica, oscila apenas quando absorve dos átomos do ambiente a sua volta pacotes discretos de energia chamados de “quanta de vibração” ou de fônons. O oscilador só absorve fônons de um determinado valor de energia. Quanto maior a temperatura, mais fônons com a energia certa há no ambiente para o oscilador absorver. Se a temperatura do ambiente for baixa o suficiente, o oscilador não terá fônons para absorver e estará em seu estado de energia mínima, o “estado fundamental”.

O valor do fônon que excita o vibrador depende da frequência de oscilação dele. Quanto maior a frequência, maior a energia de cada fônon e, portanto, maior o valor da temperatura em que o oscilador fica em seu estado fundamental.

Quanto menor o tamanho do oscilador, maior sua frequência. Assim, para colocá-los no estado fundamental, a estratégia dos experimentalistas tem sido resfriar e miniaturizar cada vez mais seus osciladores.

Nos experimentos mais recentes, foram construidos osciladores de frequências na faixa dos megahertz (milhões de oscilações por segundo), exigindo temperaturas da ordem de bilionésimos de Kelvins. Temperaturas tão extremamente próximas do zero absoluto foram obtidas só recentemente e há muito custo, com técnicas de refrigeração de última geração. Os pesquisadores chegaram tantalizadoramente perto do estado quântico fundamental desses osciladores, registrando números médios de até 4 fônons, mas não conseguiram ir além disso

Em vez de seguir com a boiada, resfriando e miniaturizando cada vez mais, o pessoal do laboratório de Cleland teve um ideia genial. Eles aumentaram em mil vezes a frequência do microvibrador deles simplesmente mudando o seu design.

Os osciladores usados geralmente pelos grupos de pesquisa são baseados no deslocamento do centro de massa do objeto, como a vibração de uma prancha de megulho.

Já o oscilador do grupo de Cleland dilata e contrai sua espessura, chegando a uma frequência na faixa dos 6 gigahertz. Com essa frequência eles conseguiram chegar no estado fundamental a meros 25 milikelvins, o que pode ser obtido por meio de um sistema de refrigeração mais “convencional”.

Aliás, curiosamente, o design do novo oscilador foi inspirado em um modelo desenvolvido pela empresa Agilent para ser usado como filtro primário para telefones celulares.

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Esquema do oscilador feito de matreial piezoelétrico, que transforma movimento mecânico em um sinal elétrico e vice versa. O mecanismo oscila dilatando e constraindo sua espessura.

O segundo desafio da equipe de Cleland foi medir os fenômenos quânticos acontecendo em seu oscilador com um instrumento delicado o suficiente. Esse instrumento foi “um qubit supercondutor”, que serviu como uma espécie de termômetro quântico. O sistema é complicado de explicar, daria um post só sobre ele. Mas resumindo, o tal qubit supercondutor pode ter apenas dois níveis de energia, o nível excitado e o nível fundamental.

Na figura abaixo, dá para ver o qubit supercondutor acoplado com o oscilador:

OsciladorQuantico3.jpg

Primeiro, os pesquisadores preparavam o qubit em seu nível fundamental. Em seguida, acionavam a ligação do qubit com o vibrador por um microsegundo e voltavam a desligá-la. Logo em seguida mediam o qubit para verificar se a energia de algum fônon vindo do oscilador havia sido transferida para o qubit. Fizeram essa medida várias vezes, variando a diferença de energia entre os níveis do qubit, e o resultado foi nulo. Mostraram assim que o vibrador estava em seu estado de energia mínima com um probalibidade maior que 93%.

Uma vez que tinham certeza de que o oscilador estava em seu estado fundamental, os pesquisadores resolveram demonstrar a transferência de um quantum de energia do qubit para o oscilador. Fizeram isso primeiro preparando o qubit em seu estado excitado. Em seguida acionaram a interação entre o qubit e o oscilador. Repetiram o procedimento várias vezes, variando o tempo em que a interação entre qubit e oscilador permanecia ligada. Um dos resultados foi o gráfico abaixo:

OsciladorQuantico4.jpg

Gráfico da probabilidade do qubit estar no estado excitado ao longo do tempo (em nanosegundos)

Essa oscilação é sinal de que um único quantum de energia ia e vinha entre o qubit e o vibrador. No máximos da curva o quantum está no qubit e nos mínimos, no vibrador. Nos demais pontos, o qubit e o vibrador estão em um estado que só existe na mecânica quântica, um “estado emaranhado”. É como se o conjunto estivesse em uma combinação de estado “qubit no estado fundamental e vibrador excitado” e “qubit excitado e vibrador no estado fundamental”. Em outras palavras, é como se o oscilador estivesse em dois estados de movimento ao mesmo tempo.

Ano passado um grupo de pesquisadores do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) fez exatamente o contrário, medindo o estado do qubit com um vibrador clássico acoplado. O resultado foi celebrado na época, pois a esperança do grupo era de reverter o processo e usar o qubit para observar o oscilador antes clássico se comportar quanticamente. Mas, seus concorrentes conterrâneos de Santa Bárbara chegaram na frente…

As figuras todas foram extraídas do artigo científico original:

O’Connell, A., Hofheinz, M., Ansmann, M., Bialczak, R., Lenander, M., Lucero, E., Neeley, M., Sank, D., Wang, H., Weides, M., Wenner, J., Martinis, J., & Cleland, A. (2010). Quantum ground state and single-phonon control of a mechanical resonator Nature, 464 (7289), 697-703 DOI: 10.1038/nature08967

Vuvuzelas, aprenda a amá-las sem ficar surdo

Shaya Vuvuzela! Após um longo silêncio, volto a blogar ao som das vuvuzelas do apocalipse, discutindo a acústica da corneta maldita. Shosholoza bafana!

A cacofonia da torcida berrando com as vuvuzelas irrita especialmente quem não curte atividades, digamos assim, carnavalescas, como este que vos escreve. Semana passada, os vuvuzeleiros de plantão do centro de São Paulo puseram minha paciência à prova, enquanto trabalhava na já ruidosa assessoria de imprensa da Reitoria da Unesp.

Não à toa, portanto, me chamou a atenção a entrevista a New Scientist do engenheiro de som Trevor Cox, da Universidade de Salford, Reino Unido, explicando as propriedades do som da torcida de vuvuzelas.

A vuvuzela é uma corneta de uma nota só. Um instrumentista profissional, capaz de soprar uniformemente e manter constante o movimento dos lábios, pode até tirar um som agradável da vuvuzela (veja o vídeo abaixo). Um torcedor médio, porém, tira um tom desafinado.

O som de toda nota musical cantada ou tocada por um instrumento é feito de uma soma de ondas sonoras com frequências de oscilação fixa. A frequência principal é chamada de primeiro harmônico. Os valores das demais frequências são múltiplos do valor do primeiro harmônico e chamadas de segundo harmônico, terceiro harmônico etc.

O Prof. Dulcídio, do blog Física na Veia, estimou a frequência do primeiro harmônico de uma vuvuzela aproximando a forma da vuvuzela por um tubo sonoro cilíndrico. Pela conta que todo vestibulando deveria saber repetir (atenção às questões sobre vuvuzelas, meninada), o som da vuvuzela é feito principalmente de ondas de compressão do ar oscilando mais ou menos 250 vezes por segundo, isto é, a uma frequência de 250 Hertz. O valor exato, segundo Cox, é 235 Hz. Imagino que a diferença entre a estimativa e o valor medido pelos engenheiros deva ser por conta da forma real da vuvuzela, que está mais para cônica do que cilíndrica.

Além disso, instrumentos de forma cônica, Cox explica na entrevista, produzem harmônicos superiores com frequências mais altas do que os produzidos por instrumentos cilíndricos. É por isso, por exemplo, que o som do saxofone é mais alto que o do clarinete. Os harmônicos da vuvuzela, de acordo com Cox, são 235, 470, 700, 940, 1171, 1400 e 1630 Hz.

Resumindo, o que faz da vuvuzela irritante são os harmônicos altos e o som tonal mas desafinado de milhares de torcedores tocando aleatoriamente.

E também a intensidade do barulho, claro, arrebenta o ouvido. Segundo artigo de pesquisadores sul africanos e norte americanos, a vuvuzela soprada com vontade chega a emitir um som cuja intensidade pode alcançar 131 decibéis na boca do instrumento e 113 decibéis a 2 metros dela. É mais intenso que o som de um britadeira, que fica entre 90 e 100 decibéis. Em outro artigo, os mesmos pesquisadores reportam casos de surdez temporária e de danos permanentes à audição de torcedores durante um jogo amistoso em estádio sul africano em 2009.

A FIFA deveria escutar esses dados. Proibir as vuvuzelas seria ofensivo e antipático. Mas bolar algum tipo de regulação para o número e o volume delas nos estádios é questão de saúde pública.

Mercado Anti Vuvuzela

Nas transmissões dos jogos pela TV, o zumbido de vuvuzelas não chega a estourar os timpanos, mas irrita, principalmente os espectadores do Reino Unido e da Alemanha, ao que parece. Haja vista a notícia do jornal britânico Telegraph (via Discoblog)  de que um engenheiro de som alemão, Clemence Schlieweis, anda vendendo na internet um arquivo de áudio MP3 de 45 minutos de duração que ele afirma ser capaz de fazer desaparecer o som das vuvuzelas das transmissões.

O arquivo MP3 vendido por quase 3 euros no site Anti Vuvuzela Filter é nada mais que o áudio de uma transmissão de jogo qualquer da copa do mundo com as ondas sonoras invertidas pelo engenheiro. No lugar das cristas das ondas de som, vales, no lugar dos vales, cristas.

Segundo Schlieweis, quando seu som é tocado na sala junto do som da TV, a parte idêntica de áudio de qualquer jogo da copa, isto é, o zumbido das vuvuzelas, é cancelado. Melhor que isso, só um CalaBocaGalvao Filter.

Mas o que o alemão espertalhão não conta é que seu som só funcionaria se o zumbido de vuvuzelas fosse idêntico em cada jogo, o que obviamente nunca acontece, como bem observou Trevor Cox ao Telegraph.

Alternativas mais efetivas não faltam. Na entrevista a New Scientist, Cox cita o site do Centro para Música Digital da Universidade Queen Mary de Londres (LINK), onde você pode baixar um “devuvuzelator”.

A figura abaixo é uma análise das frequências sonoras de uma transmissão de jogo da copa feita pelo grupo da Queen Mary. Os harmônicos da voz do narrador do jogo são o som mais intenso (em dourado). Interferindo nos harmônicos do narrador estão os harmônicos das vuvuzelas (em roxo).

Vuvuzela.png

A partir dessa análise, os engenheiros identificaram o que seriam as frequências do primeiro e segundo harmônicos das vuvuzelas e as eliminaram com o tal devuvuzelator. Escutei o resultado e, para ser sincero, notei pouca diferença entre a gravação original e a gravação tratada com o software.

Com a mesma estratégia, o autor do blog Die Surfpoeten produziu um filtro que extrai do áudio da TV o som das frequências que ele afirma serem os harmônicos mais fortes das vuvuzelas: 233, 466, 932 e 1864 Hz. A solução do alemão não é exclusiva e o pessoal do blog Ars Technica dá a dica para um geek fazer o mesmo com Linux (soube via @astrorho). Esses filtros parecem funcionar melhor que o do grupo da Queen Mary, mas também não são perfeitos. O som do zumbido das vuvuzelas é simplesmente complexo demais para ser eliminado.

Zen com as Vuvuzelas

Melhor que o devuvuzelator, é o conselho do pessoal da Queen Mary: desista de lutar e aceite a vuvuzela!

Difícil? Não achei depois de descobrir que a vuvuzela é derivada de um instrumento tradicional sul africano, a mhalamhala e que existe até uma orquestra de vuvuzelas (site por enquanto fora do ar), coordenado pelo músico Pedro Espi-Sanchis.

Neste vídeo do The Guardian, um dos músicos da orquestra, Samora Ntsebeza, explica como tocar a vuvuzela direito.

Dá para conferir as performances da orquestra no canal de Espi-Sanchis no Vimeo, em vídeos como este abaixo. Shosholoza!

Supernovas da semana passada

Três notícias sobre supernovas na semana que passou. Na primeira, uma nova observação de raios gama corrobora uma velha teoria. Nas outras duas, novas teorias explicam observações antigas, uma em raios X, a outra em luz visível.

Supernovas aceleram raios cósmicos, sugerem raios gama

As equipes do telescópio espacial Fermi e do telescópio Veritas analisaram raios gama vindos de três galáxias onde a taxa de formação de estrelas é altíssima. Entre as estrelas nascendo, estão algumas gigantes que vivem apenas alguns milhões de anos antes de explodirem como supernovas. As ondas de choque das supernovas aceleram raios cósmicos, que ao colidirem com partículas do meio interestelar emitem os raios gama que os telescópios observaram.

A aceleração por explosões de supernova é uma teoria com quase 20 anos de idade e que explica a energia de vários raios cósmicos que chegam à Terra. Os raios gama observados agora são a primeria evidência de que raios cósmicos de certa energia são acelerados por supernovas.

Para averiguar melhor se a teoria vale mesmo, o próximo passo é medir com cuidado o pico de energia desses raios gama. O  pico deve coincidir com a energia em que acontece o processo que cria os raios gama durante as colisões dos raios cósmicos com o meio interestelar. (Leia mais em Wired e Chi vó, non pó).

Estrela de neutrons jovem tem atmosfera de carbono

Saiu na Nature um artigo com uma nova explicação para o mistério dos restos de uma supernova do tipo II que aconteceu há 330 anos. No centro da chamada remanescente de supernova Cassiopeia A há uma estrela de neutrons cujo brilho é diferente de outras estrelas desse tipo conhecidas.

Agora, astrofísicos afirmam que a causa do brilho incomum é uma atmosfera de 10 cm de carbono, gerada por fusão nuclear nas altas temperaturas da superfície da jovem estrela de neutrons. Pode ser que todas as estrelas de neutrons tenham essa pele de carbono na juventude e depois ela decante com o passar dos séculos. Aliás, só o tempo vai decidir se a explicação está correta, com a bservação de outras estrelas de neutrons da mesma idade. (Fontes: Nature News, PhysicsWorld.)

Nova supernova é menos super que tipos mais comuns

Já a revista Science destacou artigo seu sobre um novo tipo de supernova descoberto quando astrofísicos resolveram reanalisar o brilho de uma supernova observada pela primeira vez em 2002 e na época classificada como supernova tipo II (a explosão de uma estrela gigante). Eles notaram que o objeto se parecia mais com uma supernova do tipo Ia (a explosão de uma estrela anã que sugou gás de uma estrela gigante vizinha).

O novo tipo de supernova, chamado de tipo .1A, deve ser a explosão de uma anã depois de sugar gás de outra anã vizinha, um pouco maior. Ao contrário da tipo Ia, que destroi a anã e ilumina uma galáxia inteira por meses, a tipo .1A não destroi a anã, sendo seu briho e sua duração apenas um décimo da Ia. (Fontes: Nat Geo News, Universe Today.)

Legendas e créditos das figuras:

Figura 1: Uma das galáxias estudadas pelo telescópio Fermi é a M82, que tem uma taxa de formação de estrelas em sua região central 10 vezes maior que a da nossa galáxia inteira. Crédito: NASA/ESA/Hubble Heritage Team (STScI/AURA)
Figura 2: Uma imagem do remanescente de supernova Cassiopeia A, registrada pelo telescópio de raios X Chandra, com uma pintura de como pode se parecer a estrela de neutrosn no centro da nuvems. Crédito da imagem: NASA/CXC/Southampton/W.Ho; crédito da ilustração: NASA/CXC/M.Weiss
Figura 3: Pintura de Tony Pico mostra como seria de perto uma supernova do tipo .1A antes de explodir. Hélio flue de uma anã branca maior para a menor.

Grãos de espaço-tempo, Ninguém entende estatística, Ninguém entende aerossol, como pássaros migratórios enxergam magnetismo e porque as hemácias são tortas

Destaques de ciências físicas na Internet, semana passada:

Telescópio Fermi impõe limites aos “grãos” do espaço-tempo

O espaço e o tempo são lisinhos e contínuos, segundo a teoria da gravidade de Einstein. A maioria dos físicos argumenta, porém, que perto de tamanhos da ordem de centésimos de bilionésimos de bilionésimos do raio de um próton– isto é, ⁻³⁵ metros–a gravidade precisa também obedecer às leis da mecânica quântica. Nessa escala absurdamente pequena, o espaço-tempo deve ser rugoso, feito de “grãozinhos” cujo tamanho e comportamento seriam descritos por uma ainda desconhecida teoria da gravidade quântica.

Sendo impossível observar diretamente esses grãozinhos, físicos perceberam uma chance de medir o efeito acumulado deles em um raio de luz ultraenergético que viajasse bilhões de anos-luz até chegar na Terra. Alguns modelos prevêm que a granulação provocaria um atraso no tempo de chegada dos raios mais energéticos. Esse atraso violaria a lei fundamental da teoria da gravidade de Einstein de que a luz sempre viaja a uma mesma velocidade no espaço vazio.

(in)Felizmente, esse atraso não foi observado pela equipe do telescópio espacial Fermi, que fez a análise mais precisa até hoje do problema, estudando uma explosão de raios gama vinda de uma galáxia há 7 bilhões de anos-luz de distância, registrada pelo Fermi dia 10 de maio. Dentro de uma precisão de uma parte em 100 milhões de bilhões (!), raios gama de energias diferentes chegaram praticamente ao mesmo tempo na Terra.

Os resultados, publicados agora na Nature, impoem um limite às propriedades que esses hipotéticos grãos de espaço-tempo podem ter.

Muito bom o vídeo que a equipe de comunicação do Fermi preparou para explicar a pesquisa:

Leia mais sobre em Symmetry Breaking (ótima explicação da diferença entre teoria e fenomenologia), Backreaction (comenta a diferença pra melhor entre as afirmações no preprint e no artigo publicado) PhysicsWorld (cita outras observações astrofísicas que testam e confirmam a simetria de Lorentz), Science News , New Scientist e Stanford Report.

Provavelmente você não analisa a estatística como devia
Nem eu e a imensa maioria dos jornalistas. E isso é ruim, certeza, porque deixa a gente vulnerável a interpretar errôneamente evidências sobre questões essenciais como, por exemplo, o futuro do clima da Terra ou a validade de uma vacina contra a AIDS, ou ainda as evidências em julgamentos de tribunais de justiça. É o que mostraram duas reportagens e uma entrevista semana passada.
Anda circulando pela Internet uma afirmação de que o aquecimento global é um mito, pois desde 1998 a temperatura média do planeta vem esfriando. Para verificar a tal hipótese do “esfriamento global”, a Associated Press mostrou os dados de temperatura em que se baseiam os defensores do esfriamento a quatro estatísticos independentes. O repórter da AP pediu a eles que analisassem os dados em busca de tendências. Detalhe: para os estatísticos era apenas uma tabela de números; eles não sabiam do que se tratava. A conclusão dos quatro foi unânime: a queda de temperatura de 1998 para cá é uma pequena flutuação; a tendência da temperatura global é de aumentar. Tanto assim, que um dos climatológos ouvidos pela AP espera um recorde de temperatura para o El Niño de 2010. Preparem-se… (via Laboratório)
Já o site de notícias da revista Science publicou uma entrevista com o estatísitico Victor De Gruttola, da Escola de Saúde Pública Harvard, em que o especialista se mostra irritado com a confusão que a maioria dos jornalistas e seus colegas cientistas fazem com o conceito de valor p, que convenhamos é mesmo difícil de entender. A conversa gira em torno da empolgação excessiva da mídia com um teste de vacina da AIDS feito na Tailândia. Das 8197 pessoas que tomaram a vacina, 51 foram infectadas pelo HIV. E das 8198 pessoas que tomaram o placebo, 74 foram infectadas. O “sucesso” do teste foi comemorado porque seus resultados atingiram um “valor p” de 0,04. Isso porque, reza a lenda, um valor p abaixo de 0,05 indica que o resultado é estatisticamente significante. Mas De Gruttola explica que a regrinha de ouro do 0,05 é totalmente arbitrária e que um valor p próximo de 0,05 não quer dizer muita coisa, principalmente em se tratando de um assunto urgente como saúde pública. O ideal seria chegar a um valor p no mínimo menor que 0,01.
Nos tribunais de justiça, reporta Angela Saini para a revista New Scientist, os julgamentos dependem cada vez mais de evidências quantitivas, como os exames de DNA, por exemplo. Os juízes precisam fazer as contas das probabilidades condicionais direito. Uma das confusões mais frequentes é igualar a probabilidade do acusado ser inocente dada um evidência acusatória encontrada na cena do crime, com a probabilidade da evidência ser encontrada na cena do crime seja lá quem for o culpado. A diferença é sutil mas pode levar um inocente à cadeia. (Uma boa referência sobre estatísitica e probabilidades é este pacote especial da revista Plus, em inglês.)

Gases estufa interagem com aerossóis modificando seu efeito
Aerossóis são partículas suspensas na atmosfera tais como poeira, sal marinho, sulfatos e fuligem. Além dos vulcões e da água do mar, uma grande fonte de aerossóis são os poluentes exalados por nossas chaminés.
Alguns aerossóis como os sulfatos resfriam o clima, refletindo calor de volta para o espaço, enquanto outros como a fuligem de carbono absorvem calor esquentando o ar. Estudos sugerem que o efeito antiestufa dos sulfatos supera o aquecimento provocado pela fuligem atualmente.
Um modelo mais sofisticado da atmosfera publicado na revista Science mostra que a interação com os aerossóis modifica a intensidade do efeito de importantes gases estufa. O gás metano (CH₄), que sozinho tem efeito estufa 25 vezes maior que o do gás carbônico (CO₂), reagindo com os aerossóis passa a ser  28 vezes mais potente que o CO₂. O monóxido de carbono (CO), cujo efeito estufa sozinho é 18 vezes maior que o do CO₂, torna-se 33 vezes maior que o do CO₂. O efeito estufa de ambos gases aumenta ainda mais se levada em vonta a infuência deles nas formação de nuvens.
O metano, por exemplo, reage de maneiras diferentes com os demais gases do ar em alturas diferentes da atmosfera, produzindo ozônio (um gás estufa) na parte mais baixa, e CO₂ ou vapor d’água (outro gás estufa) nas partes mais altas. O CH₄ também participa de reações que reduzem a formação de aerossóis de sulfato.
Já vários gases de efeito estufa tipo óxidos nitrosos podem aumentam a concentração de aerossóis de sulfato, triplicando seu efeito de resfriamento.
O modelo pode ainda ser usado para estimar o quanto os aerossóis estão mascarando do aquecimento provocado pelos gases de efeito estufa.
Os autores alertam que as políticas de redução de emissão de gases de efeito estufa estão centradas demais no CO₂. Os governantes deviam voltar mais atenção a outros gases de efeito estufa que se degradam rapidamente na atmosfera, como o metano e os aerossóis, pois a resposta do clima pode ser bem mais rápida à redução da emissão desses gases, do que será para o dióxido de carbônico.Não dá para considerar políticas de clima separado de políticas sobre a poluição do ar. Leia mais em Nature News e principalmente em Science News.

Pássaros percebem magnetismo pelos olhos, não pelo bico
Os pássaros usam o campo magnético da Terra do mesmo jeito que um navegador consulta sua bússola para viajar longas distâncias. Mas como funciona essa bússola interna?
Existem duas explicações concorrentes. Alguns pesquisadores acreditam que são cristais de ferro encontrados nos bicos das aves que percebem o campo magnético terreste e transmitem a informação ao cérebro por um nervo conhecido como trigeminal.
A outra explicação envolve os olhos da ave. Partículas de luz chegam às células do olho, onde quebram proteínas chamadas de criptocromos em pares de moléculas ionizadas que se alinham ao campo magnético do ambiente. O alinhamento dos criptocromos ionizados de alguma forma é registrado e transmitido a um centro nervoso chamado de aglomerado N.
Para testar as duas teorias, pesquisadores criaram piscos-de-peito-ruivo e submeteram os passarinhos a neurocirurgias. Um grupo teve o nervo trigeminal cortado. Outro teve o aglomerado N lesionado. Depois, observaram o comportamento dos animais sob ação do campo magnético terrestre natural e de campos artificiais com direção diferentes.
Apenas os pássaros com o aglomerado N intacto conseguiram perceber os campos magnéticos. Desse modo os biofísicos concluíram que pelo menos essa espécie enxerga os campos magnéticos pelos olhos.
Embora os cristais de ferro no bico pareçam inúteis, os autores do estudo publicado na Nature especulam que eles tenham um papel secundário na navegação da ave, talvez indicando mudanças na intensidade do campo magnético.
Pesquisas como essa podem ajudar na conservação de aves migratórias. Leia mais em Wired e New Scientist.

Como a corrente sanguínea entorta as hemáceas

As células vermelhas sanguíneas, também conhecidas como glóbulos vermelhos ou hemáceas constituem 45% do sangue. São elas que transportam o oxigênio dos pulmões para todo o corpo.
Uma série de doenças, do infarto à malária, estão relacionadas com o formato das hemácias e sua mobilidade.

Em repouso, as hemácias são uma panqueca mais ou menos circular, com 8 milésimos de milímetro de diâmetro. Quando viajam pela corrente sanguínea, a forma das hemácias encurva, lembrando um pára-quedas aberto. Às vezes, o pára-quedas, que é simétrico, se deforma ficando parecido com um chinelo.
Como a forma de chinelo foi observada em laboratório pela primeria vez quando o vaso sanguíneo por onde as hemáceas passavam era menor que duas vezes e meio o diâmetro de uma só hemácia, acreditava-se que era a proximidade da parede do vaso que causava a deformação. (Ailás, a elasticidade das hemácias é impressionate: elas podem se espremer em vasos capilares quatro vezes menores que elas mesmas…)
Já experimentos recentes mostram que a forma de chinelo aparece, sim, em vasos maiores, onde as hemácias ficam longe da parede. O que faz as hemácias mudarem de forma afinal?
Um novo modelo simplificado das hemácias na corrente sanguínea sugere que a transição da forma de pára-quedas para a de chinelo acontece pela interação do fluido viscoso do sangue em movimento com a superfície da célula. O resultado das simulações aparecem em um artigo na Physical Review Letters publicado online dia 26 de outubro. No modelo bidimensional dos físicos, as hemáceas são representadas por bolsas com as propriedades elásticas de uma hemácea.
Os biofísicos ainda descobriram que a forma de chinelo diminui a diferença de velocidade entre a hemácea e o fluxo imposto pelo bombeamento do coração. A forma de chinelo,portanto, aumenta a eficiência da corrente sanguínea.
Em uma apresentação dia 22 de novembro em um encontro da American Physical Society, os pesquisadores vão explicar como a forma de chinelo depende da rigidez da membrana da hemácia.
Leia mais em PhysOrg e em Physics .

Outros destaques:

Zumbis! Entrevista com o cientista que confirma, sim, matem, MATEM os zumbis!!!

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Não tenha dó de morto-vivo. Se avistar um ou mais, atire nos miolos deles sem parar ou estamos perdidos. Essa é a conclusão do primeiro modelo epidemiológico do ataque de mortos-vivos comedores de carne humana que transmitem sua maldição por saliva.

Sim, estou falando do famigerado estudo que caiu no radar de sites populares como Boing Boing e Wired em agosto deste ano.

Meu colega scibling Gabriel Cunha, do RNAm, se fartou de explicar o estudo. Na época, eu estava atrapalhado demais para blogar, mas cheguei a enviar umas perguntas por email ao Robert Smith? (o nome dele é assim mesmo, com ponto de interrogação), da Universidade de Ottawa, no Canadá, que é o autor do estudo e que deve visitar o Brasil ano que vêm para participar de um congresso de biologia matemática.

A seguir, após o quadro abaixo resumindo a pesquisa, as respostas que Smith? me passou por email, explicando como por trás da piada dos zumbis há muita pesquisa séria envolvida.

Matemática Zumbi

Smith? e três de seus alunos matemáticos resolveram estudar seriamente como evoluiria um ataque de zumbis capaz de destruir a civilização. Pasmem, o estudo foi publicado no quarto capítulo de um livro sobre modelos de doenças infecciosas.

Eles assumiram condições biológicas baseadas em filmes de terror populares, filhos do clássico de 1968, Nigth of the Living Dead, de George Romero.

O que fizeram foi simplismente usar uma classe de modelos matemáticos conhecido como SIR usado no estudo de doenças infecciosas. Três equações diferenciais relativamente simples que determinam como três variáveis evoluem no tempo: o número de pessoas Sucetíveis a serem infectadas, o número de pessoas Infectadas, e o número de pessoas Recuperadas (daí a sigla do modelo) .

No caso dos zumbis, as variáveis são Sucetíveis (todo mundo que topar com zumbis), Zumbis (autoexplicativo) e Removidos (zumbis mortos por destruição do cérebro). O desafio de modelar a “doença” é que os doentes voltam à vida.

Simth? e colegas partiram desse modelo simples e foram adicionando complicações. As conclusões do estudo nas palavras dos pesquisadores:

“Um surto de zumbis infectando humanos será provavelmente um desastre, a menos que táticas extremamente agressivas sejam empregadas contra os mortos-vivos. Enquanto uma quarentena agressiva possa erradicar a infecção, é improvável que isso ocorra na prática. Uma cura apenas resultaria em alguns humanos sobrevivendo ao surto, embora eles teriam ainda que coexistir com os zumbis. Apenas ataques suficientemente frequentes, com força cada vez maior, resultariam em eradicação, assumindo que os recursos disponíveis possam ser agregados a tempo.”

Como surgiu a ideia de modelar um ataque de zumbis?

Robert Simth? : Eu estava dando uma aula sobre modelagem de doenças e propus um projeto a meus estudantes. Eu disse que eles poderiam fazer qualquer modelagem que quisessem, desde que envolvesse alguma doença. Em seguida, um grupo veio até minha sala dizendo “Temos uma ideia, mais é meio fora do convencional: zumbis!” Respondi prontamente que eles fossem em frente, o que pode tê-los surpreendido um pouco.Quando eles voltaram com um manuscrito preliminar, examinei o modelo e disse “já vi Shaun of the Dead e isso não funciona assim. Senhores, vocês precisam voltar pra casa e assistir alguns flimes este fim-de-semana…” Dessa maneira, nós desenvolvemos a “biologia” até termos um modelo satisfatório.

Como vocês conseguiram publicar o artigo como capítulo de um livro?

Robert Simth? : Eu já tinha um capítulo de livro sobre gênero e HIV em localidades urbanas e rurais em um publicação irmã, Advances in Disease Epidemiology. Quando li o relatório da grupo, pensei que seria interessante submetê-lo, então enviei um email perguntando ao editor. Ele disse sim, mas que precisava dele em 3 dias. Eu estava em Newfoundland para uma defesa de doutorado. Então transformei o relatório em um artigo acadêmico e o submeti. Quando recebemos a confirmação oficial, ela dizia algo como “o corpo editorial avaliou seu capítulo e o considerou apropriado para publicação. O modelo matemático é consistente, o problema bem colocado, as quantidades apropriadas… Oh, e aliás, acreditamos que seja o primeiro modelo matemático de uma doença fictícia.”

Como outros pesquisadores reagem quando ficam sabendo que vocês publicaram um modelo de ataque de zumbis?

Robert Simth? : A maioria fica intrigada, embora algumas poucas pessoas nunca tenham ouvido falar em zumbis e me perguntem “essa doença é real?”. Isso provavelmente porque apresentei a pesquisa na conferência da Sociedade de Biologia Matemática em Vancouver no último julho, fingindo que era tudo real. Também foi a primeira palestra que já fiz onde o tempo para questões durou mais que a palestra original. Todo mundo tinha ideias do que fazer a seguir!

No artigo vocês dizem que “claramente, esse é um cenário improvável se tomado literalmente, mas possíveis aplicações na vida real podem incluir filiações a partidos políticos ou doenças com infecção dormente”. Poderia me dar um exemplo de como a filiação a partidos políticos poderia se parecer com zumbis?
Robert Simth? : A principal maneira pela qual zumbis diferem de outras doenças infecciosas é que os mortos podem volta a vida. Assim, pensamos nessa mudança de estado–de vivo para morto e vivo de novo, ou de Democrata para Republicano e de novo Democrata–como algo que pudesse ser análogo.

Além da diversão, o que você aprenderam sobre doenças reais trabalhando na matemática dos ataques de zumbis?

Robert Simth? : É muito instrutivo, porque te dá as ferramentas para lidar com uma doença que não é familiar. De fato, a gripe suína não tinha ainda surgido quando escrevemos o artigo, mas desde então emergiu. É muito importante estar preparado para entender rapidamente como novas doenças podem se espalhar e como certas intervenções (vacinas, remédios, quarentena etc) podem afetar o resultado. A modelagem matemática é uma grande maneira de fazer isso rápido e barato. Assim, embora a aplicação a zumbis seja divertida, também é bastante útil.


Vocês estão plenejando publicar um International Journal of Zombie Studies?

Robert Simth? : Um número de pesquisadores tem mencionado que está fazendo trabalhos em cima do artigo original, o que acho fantástico. Então, nunca se sabe…  

Pobres dinossauros,holograma de DNA,tensão Pré-Copenhagen

Esses foram alguns dos destaques nos sites de notícias de ciência que chamaram minha atenção semana passada:

Dois asteróides (no mínimo) mataram os dinossauros

Os dinossauros se extinguiram quando o clima da Terra sofreu mudanças extremas, há 65 milhões de anos. A cratera Chicxulub, no México, com 180 km de diâmetro, foi onde caiu o asteróide que muitos cientistas acreditam ser o principal culpado por essas mudanças.

Mas semana passada, no Encontro Anual da Sociedade Geológica da América, foi anunciada a descoberta de uma cratera de 500 km de diâmetro, submersa próxima ao litoral de Mumbai, na Índia. A cratera nasceu de uma colisão com um asteróide 100 vezes mais energética que o impacto de Chicxulub e apenas 300 mil anos depois.

Parece, então, que a extinção dos dinossauros aconteceu por uma série de catástrofes. As colisões com os asteróides coincidiram com (foram a causa de ????) um dos períodos de atividade vulcânica mais intensa da história do planeta e que certamente afetou o clima. Saiba mais na The Economist (via Physics Today).

Imagem holográfica de um pedaço de DNA

Sem título

Uma nova técnica desenvolvida na Suíça usa elétrons de baixa energia para obter imagens holográficas de biomoléculas, como a imagem acima (extraída daqui), de um pedaço de DNA. Isso é impossível de se fazer pela técnica tradicional de cristalografia de raios X, pela qual se descobriu a estrutura de dupla hélice do DNA (Prêmio Nobel de Medicina/Fisiologia de 1962) e com a qual se explorou a estrutura do ribossomo, atómo por átomo (!) (Prêmio Nobel de Química de 2009). (via PhysicsWorld ; obs.: a imagem no PhysiscsWorld está errada.)

Tensão Pré-Copenhagen

Estamos às vésperas da conferência de mudanças climáticas da ONU, em Copenhagen, Dinamarca, que acontecerá entre os dias 7 e 18 de dezembro. Esperamos que todas nações assumam compromissos de verdade para mitigar as emissões de gases de efeito estufa, embora já se preveja a mesma palhaçada que produziu o pífio Protocolo de Kyoto.

Aproveitando o gancho, as revistas científicas Nature e Science publicaram semana passada artigos e reportagens especiais sobre emissões de dióxido de carbono.

Como monitorar todo o carbono da Amazônia

Na Nature, a reportagem de Jeff Toleffson destaca um novo método para monitorar a biomassa de grandes áreas de floresta na Amazônia, sem precisar medir cada tronco de árvore com uma fita métrica.

Testado com sucesso no Peru, o método chamado de CLASLite foi criado pelo ecólogo Greg Asner. Combina imagens de satélite, com medidas à laser (método LIDAR) tomadas de avião e poucas medidas de campo para produzir uma imagem em 3D da floresta. Livre de patente, o método pode ser adotado por um custo razoável por qualquer governo de boa vontade para monitorar áreas continentais de florestas.

O monitoramento de florestas é feito principalmente por imagens de satélite, cuja resolução é de 30 metros. Dê uma olhada na Amazônia no Google Earth, que você vai observar umas clareiras como se fosem espinhas de peixe saindo das estradas. São essas atividades madeireiras em larga escala que os satélites conseguem detectar.

Dados preliminares de Asner mostram que a soma do desmatamento em pequena escala–invisível nas imagens de satélite–chega a ser 20 vezes maior que o da atividade madeirera em larga escala.

Asner fez uma parceria com o Google para diponibilizar dados do CLASLite via Internet por um serviço que a empresa deve estrear até o fim do ano.

Contando direito o carbono dos biocombustíveis

Na Science, um comentário de pesquisadores norte-americanos alerta para um erro cometido pela legislação do Protocolo de Kyoto, que omite o carbono produzido durante a produção de biocombustíveis. O etanol pode ajudar a mitigar emissões, mas não é santo. O processo de sua fabricação tem de ser fiscalizado, senão pode aumentar mais as emissões do que diminuí-las.

Esses políticos cagões não fazem nada mesmo, então…

Que tal você salvar o mundo?

Quer salvar o mundo? Seja um cientista, recomenda um caderno especial da New Scientist.

Mais especificamente, que tal ser um cientista de novos materiais? Um artigo muito bom sobre sustentabilidade na revista Physics World de outubro mostra que tecnologias limpas como a energia solar precisam de um empurrãozinho da nanotecnologia para se tornarem imbatíveis também comercialmente.

Além de energia limpa, um cientista de materiais pode ajudar a controlar a poluição, como fizeram químicos da UFMG ao desenvolverem um filtro de CO2 para chaminés.

Mas se química e física da matéria condensada não é bem sua praia e você prefere algo com mais energia, que tal salvar o mundo sendo um engenheiro de acelerador de partículas?

Um feixe de elétrons bem acertado pode eleminar resíduos tóxicos e biológicos de uma vez de água, esgoto e chaminés de fábricas, informa a revista Symmetry. Para popularizar o método (países como a Polônia já usam!) falta os aceleradores de elétrons funcionarem mais confiavelmente por longos períodos e diminuirem de tamanho.

Quem sabe com uma nova geração de tecnologia de aceleração de partículas a base de ondas de plasma, os aceleradores se tornem mais portáteis?

Reciclagem de plástico em números

A revista Discover tem uma lista impressionante de números sobre plástico e sua (falta de) reciclagem. Um relatório da Royal Society estima que em 2010 serão produzidos 300 milhões de toneladas de plástico no mundo. Metade desse plástico é para embalagens. Em 2007, apenas 6,8% dos plásticos norte-americanos foram recuperados para reciclagem, de acordo como a agência de proteção ambiental dos EUA. E lembram daquela lenda que uma garrafa de plástico demora 1 milhão de anos para se degradar no mar? Pois bem, não demora tanto, só uns 450 anos…

Robôs humanóides devem se parecer com humanos?

O ideal seria que eles fossem indistinguíveis de nós, como em… err… Westworld? Blade Runner? Inteligência Artificial? Ok, não seria tão desejável assim. Na verdade, hoje é impossível construir um robô funcional igualzinho ao um ser humano. As nuances da textura da nossa pele, por exemplo, estão além das propriedade de qualquer material sintético conhecido. Essa foi a conclusão de um estudo recente que Philip Ball comenta em seu blog.

Mas uma semelhança ainda que remota com nós é importante, diz o roboticista Karl Iagnemma na revista Frieze (via 3quarksdaily). Engenheiros e designers diante de um projeto de robô humanóide precisam descobrir quais detalhes do design nos inspiram confiança e simpatia.

Ah, os mistérios do céu…

Uma descoberta do telescópio de raios X Chandra anunciada semana passada foi a quebra de recorde do aglomerado de galáxias mais distante já observado. O aglomerado está a 10,2 bilhões de anos-luz de distância, um bilhão de anos-luz mais distante que o recorde anterior. Astrônomos já observaram galáxias mais distantes, mas elas não estão agrupadas em aglomerados. A imagem do aglomerado recém-descoberto ajuda a entender como surgiram os aglomerados. (Parabéns ao trabalho de divulgação do telescópio Chandra, que mantêm um site cheio de recursos multimídia e informação fácil de achar e bem explicada.)

a revista New Scientist destacou sinais estranhos observados nas lentes gravitacionais provocadas por aglomerados de galáxias. Alguns físicos especulam que esses sinais possam ser desvios da relatividade geral em escala intergalática ou ainda um efeito desconhecido da energia escura. Quem pode esclarecer o mistério é o Dark Energy Survey, uma varredura de lentes gravitacionais em uma área do céu bem maior que as anteriores e que deve começar em 2011, com participação de pesquisadores brasileiros.

Outro sinal estranho foi captado pelo Telescópio Espacial de Raios Gama Fermi, que uma dupla de astrofísicos sugere que possa ser radiação causada pela colisão de partículas de matéria escura no centro da Via Láctea. O estudo é independente da equipe que opera o Fermi, que deve apresentar sua própria análise dos dados no começo de novembro. (via NatureNews)

E se você ainda não entende como os astrônomos sabem que tal galáxia está a tantos e tantos anos-luz de distância da Terra, recomendo este artigo introdutório muito bem escrito do Lee Bilings (em inglês).

Escudo galático do Sol tem “faixa” estranha

O Sol nos protege de vilões intergaláticos, muita gente não sabe. Pelos átomos ionizados que expele o tempo todo–o chamado vento solar–nossa estrela projeta um campo magnético que engloba todos os planetas e demais a maior parte dos corpos do sistema solar. Essa bolha magnética chamada de heliosfera desvia 90% dos raios cósmicos de alta energia que vem do espaço interestelar e integalático. Esses raios são uma radiação letal para tecidos vivos.

A fronteira da heliosfera–uma região que fica entre 100 e 125 vezes mais distante do Sol que a Terra–também é uma fronteira selvagem da astrofísica, o lugar em que a influência do Sol termina e a do gás mais frio e rarefeito do meio interestelar local começa. Estudando essa região, aprendemos como o Sol interage com o resto da galáxia.

A fronteira tem três “cascas”. A primeira é o choque de terminação, a superfície em que o vento solar atinge “a barreira do som” e começa a desacelerar. A segunda é a heliopausa, onde a pressão do vento solar se iguala com a do meio interestelerar. Finalmente, a região onde o meio interestelar começa a se chocar com o vento solar é o arco de choque. (Telescópios já registraram fotos maravilhosas de arcos de choques de outras estrelas; o arco de choque do Sol com nosso meio local é fraquinho e não tão fotogênico assim…)

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Ilustração em cores da fronteira da heliosfera; mais próximo do Sol está o choque de terminação, depois a heliopausa em forma de cauda de cometa e por último o arco de choque. Fonte: Nasa.

O pouco que se sabe da fronteira da heliosfera vem de medidas das duas sondas interplanetárias que mais distantes chegaram, as Voyager 1 e 2, que atravessaram o choque de terminação entre 2007 e 2008.

A outra única maneira de explorar essa região é observar daqui da Terra partículas vindas da fronteira da heliosfera. Essas partículas são chamadas de átomos neutros energéticos, pelo seguinte motivo. Inicialmente elas são partículas eletricamente carregadas, prótons do vento solar viajando para fora do sistema planetário.

Quando estão entre o choque de terminação e o arco de choque, porém, alguns desses prótons colidem com os átomos de hidrogênio mais frios do meio interestelar e roubam o elétron deles. Transformados em átomos de hidrogênio neutros, eles são capazes de atravessar o campo magnético da heliosfera incólumes e voltar para dentro do sistema solar, atingindo eventualmente um detector aqui na Terra.

Difícil de visualizar, não? Este vídeo, cortesia da Nasa, ajuda horrores a entender como se formam os átomos neutros energéticos:


Uma missão inédita da Nasa, o IBEX foi lançado em órbita da Terra em outubro de 2008 . Ele observa hidrogênio neutro energético vindo da fronteira da heliosfera, que demora de um a dois anos para chegar aqui. A cada seis meses, o IBEX produz um mapa completo das emissões de átomos neutros energéticos do céu inteiro.

A revista Science da semana passada publicou o primeiro mapa completo do IBEX, que foi uma surpresa para todo mundo. Foi observada uma faixa longa e estreita serpenteando por quase metade do céu, em que os átomos neutros se concentram duas a três vezes mais que no resto da fronteira da heliosfera.

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Faixa de concentração de átomos neutros energéticos no céu resgistrada pelo IBEX.

Fonte: Nasa.

A faixa não havia sido percebido ainda pelas Voyager por estar fora do alcance delas.

Como os átomos são concentrados nessa faixa? A faixa não é prevista por nenhum modelo ou teoria, que na verdade previam que a distribuição dos átomos tivesse uma variação pequena e gradual. A explicação deve estar na maneira, ainda desconhecida, de como o campo magnético interestelar local interge com o da heliosfera.

A faixa, entretanto, sugere que a heliopausa não tem a forma que se pensava que ela tinha: a da cauda de um cometa, com uma cabeça enfrentando o vento do meio interestelar e uma cauda na direção oposta (veja ilustração mais acima).

Outro artigo na mesma Science, mostra que um detector de átomos neutros energéticos a bordo da sonda Cassini, em órbita de Saturno, observou também uma faixa no céu. O instrumento detecta átomos neutros mais energéticos que os coletados pelo IBEX, mas as faixas coincidem.

Os pesquisadores da Cassini interpretam a faixa como um sinal de que a heliosfera não tem uma cauda de cometa. Ela parece mesmo é com uma bolha inflada. Já os pesquisadores do IBEX acreditam que o formato ainda seja de cometa, mas um pouco distorcido. Mas todos concordam que só vão determinar a verdadeira forma quando explicarem detalhadamente a faixa de átomos neutros.

Produzindo novos mapas a cada seis meses, o IBEX vai ter uma ideia de como a heliosfera se altera durante o ciclo solar de 11 anos, o que deve ajudar a exlicar a faixa, verificando, por exemplo, se ela é permanente ou temporária.

Veja também: BBC, Science News, National Geographic News e site oficial da missão IBEX.

Deixem Higgs em paz!,magnetricidade,buraco negro portátil

Esses foram alguns dos destaques nos sites de notícias de ciência que chamaram minha atenção semana passada:

Magnetricidade – a “eletricidade” do magnetismo

“Gelo de spins” é o nome de um material sólido feito de cristais ionizados, magnetizados e congelados a temperaturas próximas do zero absoluto, em que o arranjo conjunto do momento magnético faz surgir “monopólos magnéticos”. É como se polos magnéticos norte ou sul andassem separados e independentes pelo material. A descoberta desses monopólos no gelo de spins foi anunciada em setembro. Agora, outro grupo de pesquisadores mediu a corrente de carga magnética gerada pelo movimento desses monopólos pelo material, um efeito que eles chamam de magnetricidade. Saiba mais em New Scientist , Physics Today e BBC.

Corrente elétrica eterna

Físicos conseguiram gerar e medir uma corrente elétrica de um bilionésimo de Ampére circulando por um anel metálico de um milésimo de milímetro de diâmetro, congelado a 1 Kelvin. Um efeito quântico previsto em 1983 faz os elétrons no anel se comportarem como se estivessem orbitando um núcleo atômico, indefinidamente, sem resistência elétrica. Em princípio essa corrente pode durar para sempre. Em um arranjo experimental extremamente difícil de construir, os pesquisadores usaram um mesmo campo magnético para induzir a corrente e medir sua intensidade. Mais detalhes em Physics World.

Carga fracionária em grafeno

Mais um efeito observado em grafeno–um plano feito de átomos de carbono, com propriedades fantásticas e que promete substituir as placas de silício da microeletrônica. Trata-se do bom e velho Efeito Hall Quântico Fracionário, em que grupos de elétrons agem como se fossem partículas com uma carga elétrica menor que a própria carga de um elétron. A descoberta abre a possibilidade de usar o grafeno para construir computadores quânticos “topológicos”. Saiba mais em Science NOW.

Modelo de Hubbard para leigos

O Modelo de Hubbard é uma espécie de jogo de tabuleiro com elétrons que pulam de um ponto a outro de uma rede quadriculada. Surgiu como explicação simplificada para o fenômeno complexo do eletromagnetismo em materiais, mas se revelou tão difícil de calcular que hoje é estudado por si só. Leia essa curiosa história contada em linguagem comum por Brian Hayes, em sua coluna na American Scientist (via 3quarks daily).

Buraco negro artficial de bolso

Físicos chineses criaram o primeiro “buraco negro” de microondas. Buraco negro entre aspas, porque o pequeno cilindro de 22 centímetros de diâmetro feito de anéis concêntricos cada um com propriedades eletromagnéticas diferentes captura apenas radiação na faixa das microondas e nada mais. Os criadores da engenhoca prometem em breve outro “buraco negro”, mas que captura radiação eletromagnética visível, isto é, luz. A invenção pode servir para capturar energia do Sol mais eficientemente que os atuais painéis solares. Leia mais em New Scientist, the ArXiv blog e Wired Science.

Geólogos encaram falhas em modelos de terremotos

Grandes terremotos são estudados por modelos simples de acúmulo e liberação da tensão em falhas geológicas, que sugerem que eles acontecem ciclicamente. A velha teoria está ruindo frente a evidências de que levar em conta a interação caótica entre falhas, às vezes em escala global, é importante para evitar catástrofes. Leia mais em reportagem de Glennda Chui para a Nature .

Deixem o Higgs em paz!

Em sua coluna no New York Times, Mr. Dennis Overbye destacou um artigo científico honesto, sim, mas absurdamente especulativo e desnecessariamente alarmante, sugerindo que os acidentes que impediram o LHC de funcionar até agora são sinal de que o universo quer ocultar o bóson de Higgs de nós. Ensaios nos blogs Built on Facts, Backreaction e Cosmic Variance explicam inteligentemente a “ameaça”.

Mapa da exploração do Sistema Solar

Fantástico mapa do Sistema Solar com todas as missões interplanetárias já lançadas, produzido pela National Geographic Books. A versão oficial é complicada de visualizar (uma cópia mais amigável aqui). A Lua é o corpo celeste mais visitado, enquanto Plutão nunca foi (missão New Horizons a caminho!). Via Boing Boing.

Opera Cosmique até 25 de outubro em Paris

De 9 a 25 de outubro, das seis da tarde a meia noite, cada vez que um múon vindo do espaço acertar um detector instalado no edifício Torre de Montparnasse em Paris, o observatório astronômico da cidade luz vai disparar um feixe laser sobre o céu. (queria saber ler em francês para entender os detalhes …). Saiba mais em Radio France e no site do evento, Opera Cosmique.

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