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Prehistoric Planet, o guia de episódios

Breves considerações sobre cada capítulo, do litoral da Zelândia às florestas congeladas do Polo Norte.

Ainda dá pra falar da série? Depois de discorrer sobre as expectativas da produção e minhas primeiras impressões, chegou a hora de revisitar os cinco episódios de Prehistoric Planet. A série da AppleTV+ possui uma abordagem padrão dos documentários de natureza atuais, com cada episódio focado num ecossistema, o que garante uma salada de diversidade para a tela, tanto de criaturas como de seus habitats e condições climáticas. Somadas, elas perfazem o mais assombroso esforço paleoartístico conjunto já realizado.

Resolvi rever toda a série e fazer comentários breves, apenas minhas impressões, a respeito de cada episódio. Para deixar a leitura mais dinâmica, decidi trazer uma referência aos documentários prévios da BBC para cada capítulo. Em alguns casos, esses momentos claramente serviram de inspiração à algumas sequências de Prehistoric Planet (ou a coincidência é muito braba, quem garante?). Cabe a você identificá-las enquanto assiste (e depois dizer se concorda comigo!)

Sem mais delongas, Prehistoric Planet, capítulo por capítulo:

Episódio 1 – Costas (Coasts)

Prehistoric Planet não é uma série sobre dinossauros, é uma série sobre a fauna de nosso planeta durante o Maastrichtiano, o finalzinho do período Cretáceo. “Costas” deixa isso claro desde o princípio: os Tyrannosaurus são os únicos dinossauros num episódio que está cheio de pterossauros, plesiossauros e tartarugas.
Um episódio que se destaca por ser simplesmente o primeiro, aquele que, se assistirmos a série na ordem, representa o início da nossa viagem ao tempo. Tudo é novo, você não sabe o que esperar. Quem veio pelos clichês do gênero se surpreende com peixinhos limpando a pele de um mosassauro, amonites bioluminescentes, Tuarangisaurus engolindo pedra, e por aí vai. Prehistoric Planet não apenas almeja mostrar a vida do Cretáceo como nunca antes vista, mas se orgulha em fazer isso.

Amonite bioluminescente do episódio 1, “Costas”.

Sequência favorita: no Norte da África, bebês Alcione (A Voz do Samba) precisam fazer um voo dos rochedos onde eclodiram às florestas seguras, passando por um verdadeiro corredor aéreo de predadores. Tudo aqui funciona: as paisagens são lindas, a diversidade de pterossauros impressiona, os comportamentos especulativos são sensacionais (os filhotes “caindo” durante o voo é o ponto alto) e, principalmente, o trabalho dos cinegrafistas é, no mínimo, realista. Filmar aves em voo não é tarefa fácil, ainda mais durante perseguições, e essa dificuldade é transposta em Prehistoric Planet: perceba como as imagens do Barbaridactylus em voo são tremidas, como eles saem e entram do enquadramento, às vezes fora de foco, tal qual um falcão seria filmado hoje em dia. Sublime.

O que não gostei: aqui temos os únicos momentos de toda a série em que o CGI claramente me pareceu CGI. Alguns movimentos dos répteis marinhos não me soaram naturais, especialmente a ausência de qualquer mudança de direção da cabeça dos mosassauros. Mas nada foi mais artificial do que quando as imagens de recifes de corais reais deram lugar, abruptamente, a recifes de CGI.

Parece que, enquanto assistia a Blue Planet, alguém mudou de canal e colocou em Procurando Nemo.

Momento “já vi isso na BBC”:

Episódio 2 – Desertos (Deserts)

O episódio sobre as regiões desérticas do planeta vem como um perfeito antídoto pra quem sentiu falta de dinossauros no episódio anterior: temos aqui o maior número de cabeças por minuto de projeção – só a sequência do oásis asiático tem mais figurantes que uns 3 episódios juntos. Lawrence da Arábia, versão cretácea.

Hadrossauros nômades (duas vezes!), pequenos especialistas do deserto, duelos de saurópodes e até mesmo lagartinhos garantem uma sequência mais impressionante que a outra, ainda que, como de costume, pouco seja explicado para além do que os dinossauros estão fazendo. Prehistoric Planet não almeja ser o tipo de documentário didático cheio de informações sobre o mundo, daqueles que a professora passava pra gente na escola. É uma obra muito mais contemplativa, artística. E, nesse quesito, a série acerta em cheio.

Mononykus retratato no episódio “Desertos”.

Sequência favorita: mais uma vez, temos a prova da qualidade audiovisual de Prehistoric Planet logo de cara. No meio do deserto, Dreadnoughtus se reúnem para disputar acesso às fêmeas de maneira extremamente violenta, praticamente uma versão terrestre de elefantes-marinhos. O grande macho líder está sujo de areia; no inevitável embate com um concorrente, a gente consegue enxergar o pó lançado ao ar a cada tranco que o bicho dá, um detalhe mínimo, mas que nos lembra do altíssimo nível da animação. Sem falar os efeitos sonoros bizarríssimos usados durante toda a sequência. Fino, coisa fina.

O que não gostei: embora seja um comportamento notável (e visto e revisto em outros documentários com o caso das sépias-gigantes do sul da Austrália), a cena das estratégias reprodutivas peculiares do Barbaridactylus perde ponto pelo antropomorfismo exagerado, em minha opinião (mais sobre isso, abaixo).

Momento “já vi isso na BBC”:

Episódio 3 – Água Doce (Freshwater)

Após rever a série inteira, confirmei minhas impressões iniciais: esse é meu episódio favorito. Acredito que aqui temos um ótimo equilíbrio entre criaturas “wtf?!” pulando (literalmente) na tela e bichos mais conhecidos vistos sob uma nova perspectiva. Se, por um lado, os famosos Velociraptor e Tyrannosaurus fazem uma reprise, somos brindados com um Deinocheirus flatulento e um grupinho fofo de Masiakasaurus (talvez um dos únicos bichos que não foi exibido na divulgação prévia do documentário).

Mas preciso dizer, o tema do episódio é ainda mais vago que os demais: apesar de se referir como “água doce”, a tal da água só tá ali pra servir de plano de fundo e conectar frouxamente minidramas do mundo natural. A ausência de crocodilos, um grupo extremamente diverso durante o Cretáceo, também não faz muito sentido.

Mãe Quetzalcoatlus e seu ninho, no episódio “Água Doce”.

Sequência favorita: os pterossauros em Prehistoric Planet roubam todas as cenas. Mesmo com uma bela sequência envolvendo uma mãe Quetzalcoatlus, porém, nada bate a arrepiante descida de três Velociraptor num desfiladeiro, atrás de… mais pterossauros, disparada minha cena favorita de toda a série. O negócio é tão bem feito que realmente parece algo filmado hoje em dia; o fato de o “ataque final” ter sido filmado numa tomada longa em plano aberto, com os bichinhos bem pequeninos e distantes, é só uma pequena parte disso. Quem já viu as inúmeras cenas de leopardos-das-neves em documentários sabe que não é fácil filmar caçadas completas em escarpas e penhascos, e a emulação dessa limitação técnica em Prehistoric Planet foi só mais uma nota do seu primor técnico.

E, convenhamos, ver os Velociraptor usando suas penas como vantagem para saltos mais longos é simplesmente impagável.

O que não gostei: a sequência dos Elasmosaurus, que fecha o episódio, é um tanto confusa geograficamente (ora parece que eles sobem o rio, ora que estão descendo), e não chega no mesmo nível de tudo o que foi mostrado antes. Não é necessariamente ruim, mas, para mim, serviu como um anticlímax.

Momento “já vi isso na BBC”:

Episódio 4 – Mundos Congelados (Ice Worlds)

Ainda hoje, mesmo dentro da academia (experiência própria), muitas pessoas vivem sob o antigo dogma de que dinossauros são lagartões de sangue frio, limitados a uma existência em áreas tropicais, úmidas e quentes. Um episódio inteiro dedicado à fauna cretácica das altas latitudes joga um banho de água fria (RÁ!) nessa visão, nos apresentando uma coleção extraordinária de dinossauros na neve. Como padrão quando o tema é regiões sazonais, o quarto episódio se desenrola no ritmo das estações, começando no início da primavera e terminando com as nevascas de inverno.

E sim, aqui temos o recorde de ornitísquios de Prehistoric Planet, com cinco formas diferentes dando as caras. O Olorotitan provavelmente reina soberano, e sua sequência é facilmente uma das mais bonitas de toda a série.

Troodontídeo usando fogo para caçar durante o episódio “Mundos congelados”.

Sequência favorita: embora o duelo final entre Pachyrhinosaurus e Nanuqsaurus seja o clímax perfeito, em termos técnicos e narrativos, para mim, toda e qualquer coisa que envolva a Antártida já é um destaque, então fico com o jovem Australopelta em busca de um refúgio no inverno. Além de possuir ecos diretos de Espíritos da Floresta de Gelo, meu episódio favorito de Caminhando com Dinossauros, acho que devemos lembrar que sempre é bom ver representações dos raríssimos anquilossauros gondwânicos.

O que não gostei: nada realmente problemático, mas achei a sequência original envolvendo Edmontosaurus e Dromaeosauridae um tanto genérica e previsível. Os Dromeosaurídae, por outro lado, são os Maniraptora mais bonitos da série (desculpa, Corythoraptor).

Momento “já vi isso na BBC”:

Episódio 5 – Florestas (Forests)

Das selvas do que é hoje a Argentina às florestas decíduas autunais do Extremo Oriente, o Planeta Pré-histórico era um Planeta Verde (Green Planet, ah lá o Attenborough fazendo jabá pra ele mesmo). Ao tratar de florestas, esse talvez seja o mais didático dos episódios, com brevíssimas menções à sucessão ecológica, papel ecológico do fogo e mudança de estações.

Mesmo assim, esse foi o com o qual menos me identifiquei (e veja abaixo o porquê). Pelo menos temos o Brasil, representado aqui pelo belíssimo Austroposeidon, da região de Presidente Prudente, SP.

Anquilossaurídeo que aparece no episódeo “Florestas”.

Sequência favorita: eu tenho uma queda por Abelisauridae, posso passar horas vendo as proporções bizarras de bichos como o Majungasaurus, Aucasaurus e, claro, o Carnotaurus. Mas também posso fazer isso com os Azhdarchidae, e como torci o nariz pra um pequeno detalhe envolvendo o Carnotaurus, minha sequência favorita ficou com o gigante Hatzegopteryx dando um rolê pelas florestas pré-históricas da Transilvânia. Os pequenos Zalmoxes são um detalhe à parte. O único contra é essa cena ter acabado tão rápido!

O que não gostei: criaturas antropomorfizadas têm sido comuns (infelizmente) em boa parte dos documentários atuais, e em Prehistoric Planet, não poderia ser diferente. Na minha interpretação, esse episódio traz mais momentos emotivos do que todos os outros. É o Carnotaurus visivelmente frustrado, o bebê Therizinosaurus admirado com o adulto e a mãe Triceratops apreensiva com sua filhote perdida na caverna. Passa a impressão de que o simples fato de os Triceratops adentrarem uma caverna não seja espetacular o bastante, precisa ser inserido um drama narrativo (e que nos distrai do que realmente é importante). Ainda que não chegue a um nível Disney de bobose, esses artifícios narrativos soam um bocado exagerados (e a trilha sonora contribui muito com isso), caminhando na contra mão do realismo proposto pela série.

Momento “já vi isso na BBC”:

Um breve adendo: a música da série

Eu sou um grande reclamão das trilhas sonoras dos documentários atuais. Para mim, elas são altas, onipresentes e sem inspiração, músicas compostas com o claro e único intuito de gerar emoções. Logo, já esperava que ia encontrar esse problema aqui, mas fui surpreendido positivamente: em algumas sequências, é possível apreciar o silêncio, o som do ambiente e dos animais.

Mas, quando presente, a trilha soa genérica demais. Em alguns casos, até lembra as de um filme de super-herói (a própria música título pode ter saído de um filme da Marvel). Essas características negativas ficaram ainda mais claras quando me lembrei da música de Caminhando com Dinossauros, que de genérica não tem nada, e percebi como ela foi importante para deixar a série de 1999 tão atmosférica, até meio sombria.

Felizmente alguém também notou isso, pois descobri uma sequência de Prehistoric Planet com a música de Caminhando com Dinossauros substituindo a original. Olha a diferença!

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Link para meu texto sobre expectativa da série: https://www.blogs.unicamp.br/colecionadores/2022/04/20/de-caminhando-com-dinossauros-ate-prehistoric-planet/

Link para meu texto sobre primeiras impressões da série, e sua inspiração: https://www.blogs.unicamp.br/colecionadores/2022/06/05/prehistoric-planet-um-baita-exercicio-de-especulacao/ 

Prehistoric Planet está na Apple TV+: https://tv.apple.com/us/show/prehistoric-planet/umc.cmc.4lh4bmztauvkooqz400akxav

Descrição do Austroposeidon magnificus: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0163373

Sépias espertas: https://www.youtube.com/watch?v=KT1-JQTiZGc&ab_channel=BBCEarth

Leopardo-das-neves: https://www.youtube.com/watch?v=GgDHvl1wD20&ab_channel=WildFilmsIndia

The Green Planet: https://www.youtube.com/watch?v=3G1arGl8RvA&ab_channel=BBC

Prehistoric Planet: um (baita) exercício de especulação

A semana é boa quando você acaba sendo agraciado com 40 minutos diários de Mesozóico. Agora que terminamos de ver Prehistoric Planet, a série mais do que hypada da Apple TV+, que tal refletirmos sobre a origem do estilo especulativo da série?

Quando saíram os primeiros sinais do que era Prehistoric Planet, escrevi um texto a respeito de como a nova série de documental viera para repaginar (e talvez até substituir) a clássica ‘Caminhando com Dinossauros’. Era uma aposta óbvia: em mais de 20 anos, nenhuma outra produção sobre dinossauros conseguiu atingir o mesmo nível e impacto, e Prehistoric Planet parecia estar aqui exatamente para isso. E, embora muita gente siga comparando as duas séries, percebi que a grande inspiração da produção da Apple TV+ não era o clássico de 1999, mas sim um… livro.

Capa do livro “All Yesterdays” – A melhor dica de livro que você vai receber hoje.

All Yesterdays é um livrinho simpático e aparentemente inofensivo. Creditado aos paleoartistas John Conway e C.M. Kosemen e ao paleontólogo Darren Naish. A proposta da obra é realizar uma releitura das representações paleoartísticas do Mesozoico, assumindo dinossauros como seres vivos e não gigantes sanguinários com tendência a berrar e mostrar os dentes 24 horas por dia. Sentiu uma semelhança com Prehistoric Planet? Calma que é só metade da história.

Um Allosaurus e um Camptosaurus apenas se encarando, sem segundas intenções. Porque o predador não precisa estar caçando e a presa não precisa estar fugindo 100% do tempo.

Desde o chamado “Renascimento dos Dinossauros”, nos anos 1970-80, uma tendência dos paleoartistas foi representar esses animais como organismos complexos e atléticos, mas magrelões secos, verdadeiros sacos de ossos. Isso não é de se surpreender, uma vez que tecidos moles raramente são preservados, restando aos paleoartistas reimaginar essas criaturas tendo apenas os ossos como base.

Greg Paul é um dos maiores nomes da paleoarte e do Renascimento dos Dinossauros, e suas representações hiper-atléticas e zero gordura destes animais seguem sendo uma das mais influentes e reproduzidas nos últimos 40 anos. Por esse motivo que dinossauros magros são tão comuns na paleoarte. Aqui, um Tyrannosaurus apelão apostando corrida.

Em All Yesterdays, os autores reforçam que os dados científicos publicados devem ser utilizados ao máximo na reconstrução de tecidos moles, incluindo aí músculos, tecidos conjuntivos, penas, chifres e escamas. Com isso, temos uma nova interpretação dessas criaturas, reforçando ainda mais a visão dos mesmos como animais, e não monstros. Um exemplo que ilustra bem o caso é o dos bracinhos dos abelissaurídeos.

Um Majungasaurus agita seus bracinhos num claro sinal de comunicação. Já viu um abelissaurídeo fazendo isso em algum lugar?

Se existem evidências de que os diminutos braços dos abelissaurídeos possuem uma articulação que permite a rotação do membro em vários ângulos e, ainda por cima, cicatrizes musculares que indicam uma alta possibilidade de movimentos, por que não imaginá-los como órgãos de comunicação? E, seguindo essa lógica, porque não reconstruí-los com cores chamativas? Esse é o espírito de All Yesterdays, que foi muito bem encarnado em Prehistoric Planet

O jeito Carnotaurus de dizer “Oi gata, tá afim de ver uma Netflix?”. Cena do episódio 5.

Aliás, qualquer semelhança entre essas obras está longe de ser coincidência: o já citado paleontólogo Darren Naish é o principal consultor científico da série, e John Conway e outros paleontólogos/paleoartistas fortemente ligados ao “movimento” também deram assistência em sua criação.

Confia.

E é exatamente por isso, por conta dessa pegada “especulativa mas baseada no maior número possível de trabalhos científicos”, que Prehistoric Planet está sendo considerada a produção mais fidedigna sobre a vida no Mesozoico (e essa constatação não é apenas minha, mas a de muitos paleontólogos de respeito). Nada de dinossauros se matando como kaijus saídos do quinto dos infernos, mas sim animais bem adaptados ao seu ambiente.

Inclua no balaio da especulação mosassauros utilizando “estações de limpeza” em recifes de corais, Dreadnoughtus disputando direitos reprodutivos com sacos infláveis a la fragata, Quetzalcoatlus fazendo voos intercontinentais, um “Troodon” ateando fogo na floresta para tirar suas presas de seus esconderijos, Triceratops buscando minerais dentro de cavernas, e por aí vai.

Outro momento All Yesterdays: elasmossaurídeos fazendo display com o pescoço fora d’água, presente tanto na série como no livro. Cena do episódio 1.

Nenhum comportamento exibido na série “veio do nada”: com uma equipe de consultores tão grande e experiente, tais suposições foram baseadas ou em evidências fósseis ou por “phylogenetic bracketing“, um maneira de inferir traços em organismos a partir de sua posição num cladograma. Um assunto muito interessante que renderia horas e horas de discussão e, no mínimo, um novo post sobre.

Um exemplo resumido de phylogenetic bracketing: é de se assumir que cuidado parental seja uma condição ancestral em dinossauros, uma vez que tanto as aves (dinossauros modernos) quanto os crocodilos (parentes vivos mais próximos) possuem esse traço. Cena do episódio 4.

Pra cimentar esse jeitão “tão real que parece até de verdade”, temos o estilo documental. Cinegrafistas gravaram as tomadas de paisagens nos quatro cantos do planeta, para então inserirem os dinosauros de CGI nelas (e que CGI, senhoras e senhores… os efeitos são, no mínimo, ABSURDOS). Esse trabalho de câmera (que, inclusive, foi utilizado 23 anos atrás em Caminhando com Dinossauros) resultou numa abordagem muito mais realista, sem os maneirismos permitidos e artificiais de produções 100% animadas (como o caso de Planet Dinosaur).

Dinossauros de CGI em meio a cavalinhas de CGI fugindo de pterossauros de CGI. Ao fundo, nuvens de CGI. Planet Dinosaur pode parecer ser tudo, menos realista.

E, por fim, temos o estilo narrativo. Cada episódio é focado num ecossistema, com vinhetas que mostram como bicho X lida com a vida no ambiente Y: no fim das contas, um episódio se resume a sequências dramáticas sem muita conexão umas com as outras. Essa pegada tornou-se meio que um padrão nas produções recentes, como Planeta Terra II e Nosso Planeta, para citar apenas dois exemplos.

E é exatamente aqui que encontro o calcanhar de Aquiles de Prehistoric Planet (e devo ressaltar que essa é apenas a minha opinião). Ao assistir a série, notei que não existem praticamente nenhuma explicação de como as especulações foram feitas: elas simplesmente estão lá, assumidas como verdade absoluta. Isso é uma falha grave num documentário cuja intenção é transmitir conhecimento. Para entender melhor qualquer comportamento exibido, você ou deve ter conhecimento prévio sobre o assunto ou precisa pesquisar um bocado na internet.

Existe evidência fóssil da língua-pegajosa-armadilha-de-cupim do Mononychus? Não, embora a gente pode supor sua existência por outros detalhes anatômicos. Sei disso por ter visto o documentário? Não. É porque dei um Google depois de assistir. Cena do episódio 2.

O jeitão polido que Prehistoric Planet emula das outras séries de peso da BBC impede um maior teor científico ou mesmo um jargão mais pesado em cada episódio. Isso podia ter sido evitado se houvessem maiores explicações ao longo da narração, ou no mínimo um episódio especial apenas sobre a “ciência da série”. Ou ainda, imitando outros documentários modernos, colocando um “making of” de 10 minutos após a exibição, para deixar claro como foi feita a reconstrução. Infelizmente, o mais próximo disso foram vídeos de 4-5 minutos, lançados como bônus no serviço de streaming e também no canal da Apple TV+, explicando um único caso por episódio. Complicado.

Mesmo com essa ressalva (que considero bem relevante), estou com a maioria: Prehistoric Planet é uma obra excepcional, digna de ser considerada uma das maiores, senão a maior, produção do tipo já feita. O simples fato de trazer essas especulações tão bem baseadas em evidências ao público amplo através de uma produção de altíssimo nível já é louvável e garante um destaque. Na verdade, eu gostei tanto que já estou me preparando para reassisti-la e trabalhar em análises de cada episódio, porque tem pano pra gente discutir aqui!

Porque não é todo dia que somos brindados com Tarbosaurus tirando uma sonequinha <3 Cena do episódio 2.

Link para meu texto anterior: https://www.blogs.unicamp.br/colecionadores/2022/04/20/de-caminhando-com-dinossauros-ate-prehistoric-planet/

Prehistoric Planet está na Apple TV+: https://tv.apple.com/us/show/prehistoric-planet/umc.cmc.4lh4bmztauvkooqz400akxav

O conteúdo bônus da série pode ser visto aqui: https://www.youtube.com/watch?v=FIeCzBCLJww&list=PLx-VtE7KiW8zKg7VkRGBV5gguBncOPe-a

Você pode adquirir o ebook de All Yesterdays na amazon.com.br por R$ 20,00: https://www.amazon.com.br/All-Yesterdays-Speculative-Dinosaurs-Prehistoric-ebook/dp/B00A2VS55O/ref=sr_1_1?keywords=all+yesterdays&qid=1653761942&sprefix=all+yester%2Caps%2C227&sr=8-1&ufe=app_do%3Aamzn1.fos.4bb5663b-6f7d-4772-84fa-7c7f565ec65b

Você conhece a Geomitologia?

Olá caros colecionadores! Hoje trago o texto do aluno Rodrigo Lima Veloso que cursa especialização em Geologia do Quaternário pelo Museu Nacional/UFRJ. Neste texto Rodrigo explica o que é Geomitologia e traz alguns exemplos de como essa ciência nos ajudou a compreender melhor os povos pretéritos.


Desde pequenos nós nos encantamos com histórias fantásticas de mitos e heróis, sejam da antiguidade ou de heróis de histórias atuais como nos livros de Harry Potter e Percy Jackson, que geralmente se baseiam em antigas lendas. Mas você já parou para pensar de onde vêm essas histórias?
Geomitologia foi o termo empregado pela primeira vez em 1968 pela geóloga Dorothy Vitaliano (Figura 1) como sendo o estudo que tentava evidenciar algum tipo de relação entre os eventos geológicos e a mitologia. Esse estudo nos últimos anos tem servido como base para se especular e procurar entender o tipo de relação que os humanos da antiguidade tinham com o ambiente ao seu redor e como o compreendiam.

Vitaliano
Figura 1: Foto de Dorothy Vitaliano. Fonte: Google Imagens.

Dentro das áreas de estudo da geomitologia os fósseis são uma das principais evidências de como esses mitos podem ser mais bem contextualizados à época e compreendidos de forma mais completa por nós atualmente. Muitos são os exemplos destes vestígios orgânicos sendo coletados e interpretados durante toda a história da humanidade. Em seu livro “The First Fossil Hunters” (Figura 2), Adrianne Mayor relata diversas histórias que poderiam mostrar a interação seres humanos com fósseis, sendo alguma delas datadas desde o Egito Antigo até o Império Romano. Acredita-se que a relação desses povos com os fósseis seja muito maior do que imaginávamos.
Mayor tem como foco de seu trabalho mostrar que as relações e a compreensão de alguns conceitos naturais que hoje compreendemos nem sempre foram tão deixados de lados pelos antigos povos que viveram a milhares de anos atrás como seria de se imaginar. Algumas ideias como a de extinção de espécies ou como a de Delos, que propôs a existência de um ciclo natural contínuo de quase imperceptíveis transgressões marinhas e formações de áreas terrestres, são surpreendentemente acuradas em relação ao que sabemos hoje e que sempre fomos levados a acreditar que eram entendimentos “modernos”.
De acordo com Horner e Dobb (1997 apud Mayor, 2000), as populações antigas tinham uma percepção maior do ambiente que as rodeava, e que a interação entre o fato e a imaginação é a chave para a verdadeira compreensão da mitologia que conhecemos hoje. Os antigos gregos e romanos, por exemplo, acreditavam que todas as espécies estavam encolhendo porque eles encontravam ossos gigantes que não condiziam com o tamanho de nenhum animal que lhes fosse conhecido.

Figura 2: Capa de “The First Fossil Hunters” de Adrienne Mayor, mostrando o que parece ser um crânio fóssil representado em uma pintura de um vaso.
Figura 2: Capa de “The First Fossil Hunters” de Adrienne Mayor, mostrando o que parece ser um crânio fóssil representado em uma pintura de um vaso.

A ideia de animais gigantes que haviam sido extintos de alguma maneira também eram comuns, histórias como a das “Neades” que falavam sobre monstros enormes que tinham habitado a região de Samos na Grécia e que haviam sido engolidos pela Terra sem deixar nenhum vestígio para trás. A ilha de Samos na Grécia é um local onde ocorreram muitos terremotos e até hoje são encontrados fósseis como o do Samotherium por exemplo. Com isso fica fácil compreender de onde vêm as ideias contrárias ao fixismo e mais do que isso, coincidentemente ou não, chegam perto dos processos tafomômicos pelos quais esses fósseis passaram. Quando relacionadas, às informações a que temos acesso hoje e as lendas nos mostram que o poder de observação que indivíduos tinham do mundo era muito grande
Porém, em alguns casos, os fósseis influenciaram na descrição de animais com os quais eles acreditavam coabitar a Terra. Atualmente, o caso mais famoso é o dos grifos (Figura 3), esses animais, diferente do que já citamos, não eram considerados animais míticos que haviam existido apenas em tempos pretéritos, eram considerados animais reais que coexistiam com os humanos. A história dos grifos começa no deserto de Gobi, na Mongólia e China, onde mercadores e mineiros citas passavam durante suas caravanas de comércio, e de onde prospectavam ouro. Esses nômades contavam histórias sobre um animal terrivelmente territorialista e protetor com seus ninhos, e que portanto atacava sem piedade quem quer que se aproximasse do ouro, que de acordo com os nômades era encontrado em ninhos de grifos. Acredita-se que esses mineiros haviam se deparado com fósseis que são extremamente comuns no Deserto de Gobi, os fósseis de Protoceratops (Figura 3) que são expostos naturalmente no deserto e muitas vezes associados ao ouro. Esses homens então começaram a espalhar as histórias sobre essa criatura com a intenção de proteger o ouro que era encontrado no lugar afugentando pessoas que conhecessem a história dos grifos, mas o curioso, é que diversos autores da antiguidade descreviam inúmeras características desses animais, não se questionava a sua existência ou não, eles realmente acreditavam que eles existissem.

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Figura 3: Na parte superior representado um esqueleto de um indivíduo do gênero Protoceratops, na parte inferior uma representação de um grifo segundo os padrões dos romanos (Lorena Pontes Lima).

Um caso em particular da mitologia egípcia também pode ser usado para ilustrar a importância de se buscar a compreensão do que pode estar por trás dos mitos. Grande parte do panteão das divindades egípcias é representado por seres antropozoomórficos, ou seja, eram parte humanos e parte animais. Não coincidentemente, os animais com os quais essas divindades dividiam as suas características eram todos animais comumente encontrados na região e que tinham alguma relação com o que o deus em questão representava. Como por exemplo, Sobek era a personificação do rio Nilo e era representado por um homem com cabeça de crocodilo. Porém, um dos deuses sempre deixou os pesquisadores intrigados, também conhecidos por sua antropozoomorfia característica, o deus Set nunca se assemelhou a nenhum animal vivente da região do Egito. Essa representação pode ser explicada com bases paleontológicas, visto que crânios de girafídeos são encontrados nas áreas fossilíferas egípcias, e o crânio desses animais assemelha-se às representações da cabeça de Set que os egípcios faziam (Figura 4). Set no panteão egípcio era considerado a personificação do deserto, das tempestades e da violência, e comumente fósseis são expostos nos desertos justamente após grandes tempestades, fazendo com que a associação entre ambos seja mais crível.

Figura 4: A esquerda a representação de Set de acordo com os antigos egípcios e à direita o desenho de um crânio de um espécime de girafídeo (Lorena Pontes Lima).
Figura 4: A esquerda a representação de Set de acordo com os antigos egípcios e à direita o desenho de um crânio de um espécime de girafídeo (Lorena Pontes Lima).

Todos esses são pequenos exemplos de como a nossa história é influenciada por pequenos detalhes que quando mal interpretados nos levam a crer que o estudo e interpretação da paleontologia são relativamente recentes, quando na verdade, eles vêm sendo interpretados das mais diversas formas. De acordo com Oakley (1971 apud Fernandes, 2005), os primeiros registros de coleta de fósseis por humanos datam de cerca de 100.000 anos atrás. Não temos como afirmar se a produção dessa peça foi ou não proposital, mas já é um começo para que possamos entender a evolução da percepção humana quanto ao ambiente ao seu redor.
Mas nem sempre, o fóssil dá origem ao mito, alguns mitos foram responsáveis por servir de inspiração para a nomeação alguns fósseis, podemos citar aqui, por exemplo, o caso dos amonitas, que recebem esse nome pela similaridade aos cornos do deus Júpiter Ammon (Taylor, 2016) como está explicitado na Figura 5.

Figura 5: Á esquerda uma representação de Júpiter Ammon e à direita um amonita.
Figura 5: Á esquerda uma representação de Júpiter Ammon e à direita um amonita.

A geomitologia ainda é uma ciência pouco explorada, nos últimos anos, inúmeras histórias vêm sendo estudadas por especialistas, mas ainda há uma necessidade muito grande de maior interdisciplinaridade entre as diversas áreas como arqueologia, zooarqueologia, paleontologia e história. Uma maior interação faria com que fosse cada vez mais fácil de ver por trás dos mitos como apenas histórias fantasiosas, trazendo os fatos marcantes para aquela sociedade e que serviram de base para as crenças de um povo. Conseguir compreender que as pessoas da antiguidade, mesmo com tantas limitações tecnológicas, conseguiam ter vislumbres, por vezes muito precisos de eventos que demoraram séculos para serem explicados. Podendo assim evidenciar o interesse por esses eventos que muitas vezes passaram despercebidos por estudiosos e pesquisadores ao longo dos anos.

Referências:

FERNANDES, A.S.F. 2005. Fósseis: Mitos e Folclore. Anuário do Instituto de Geociências – UFRJ, v. 28, p. 101-115.
MAYOR, A. 2000. The first fossil hunters. Paleontology in greek and roman times. Princeton, Princeton University Press. 361 p.
TAYLOR, P. D. 2016 Fossil Folklore: Ammonyte. Deposits Magazine, nº 46 20-23.
VITALIANO, D. 1968. Geomythology: the impact of geologic events on history and legend, with special reference to Atlantics. Journal of the Folklore Institute (Indiana University), 5: 5-30.


26905858_2007696039247755_2080243137_oRodrigo Lima Veloso
Graduado em Ciências Biológicas/Licenciatura em 2014 pelo Centro de Ciências da Saúde (CCS) do Centro Universitário Serra dos Órgãos (Unifeso). Na mesma universidade foi aluno bolsista do Programa Pet-Saúde no período entre 2012 e 2014. Atuou como professor de ciências da rede estadual no município de Carmo – RJ de 2015 até 2017, atualmente cursa uma especialização em Geologia do Quaternário pelo Museu Nacional/UFRJ. Tem interesse em continuar seus estudos nas áreas de evolução, paleontologia e curadoria.

Concurso de Paleoarte: A Paleontologia do Nordeste

Concurso de Paleoarte

Os Colecionadores de Ossos têm a honra de anunciar o equivalente ao II CAP (Concurso de Arte Paleontológica) do Brasil!
Nossa equipe, junto com os organizadores da Paleo NE (Reunião anual de Paleontologia do Nordeste) e o apoio de outros paleontólogos e paleoartistas nacionais, abrimos hoje as inscrições para o “Concurso de Paleoarte: A Paleontologia do Nordeste”. 
O concurso procura exaltar as grandes contribuições da região Nordeste do Brasil para a paleontologia nacional e também incentivar novos talentos e promover paleoartistas em início de
carreira.

As regras e a ficha de inscrição para o concurso já estão disponíveis no site do evento!
São duas categorias de inscrição: Iniciante e Profissional. O tema do concurso é a Paleontologia do Nordeste.

-SOMENTE PODERÃO PARTICIPAR DO CONCURSO CANDIDATOS RESIDENTES NO BRASIL-

Leia atentamente as regras, preparem suas obras e inscrevam-se!

Regulamento e ficha de inscrição disponíveis no site: http://paleonordeste.com.br/concurso-paleoarte/ 

Projeto PaleoJr: Paleontologia para a Educação Básica

Olá seguidores do Colecionadores de Ossos! Seguindo no eixo de postagens relacionadas a divulgação científica, trago a vocês mais uma contribuição! Só que dessa vez o projeto de divulgação não está relacionado à um projeto de campo ou ao resultado de trabalhos científicos. Desta vez veremos o relato de um projeto de divulgação feito pelo Laboratório de Mastozoologia da UNIRIO, cujo foco era a educação infantil! A divulgação paleontológica é uma forte ferramenta para encantar e motivar o nascimento de novos pesquisadores, mas, além disso,  criar uma consciência nas crianças de hoje sobre a importância da ciência para o dia-a-dia e sua vida! Com vocês o relato da Dra. Dimila Mothe!


Ensinar conceitos relacionados à Biologia e Geologia para o público infantil é essencial para despertar a atenção, curiosidade e compreensão inicial sobre os processos naturais que nos cercam. Para tal, é importante realizar divulgação clara e objetiva, com o uso de linguagem acessível e didática, para que a dinâmica e o aspecto recreativo da atividade não se perca. O Projeto PaleoJr (PPJr) foi criado quando Eduardo, um menino de 5 anos muito apaixonado por Jurassic Park e paleontologia, juntamente com sua mãe, contactaram o Núcleo RJ/ES com um pedido inegável: uma conversa entre um paleontólogo do Rio de Janeiro e Eduardo, que tinha muitas perguntas sobre a paleontologia e os dinossauros! Assim, a equipe do Laboratório de Mastozoologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, coordenado pelo Dr. Leonardo Avilla e Dra. Dimila Mothé, se reuniu, contando com a colaboração de alunos de graduação e pós-graduação, e idealizou o “Projeto Paleo Jr”, com os objetivos de apresentar o estudo de fósseis e biodiversidade pretérita a crianças na faixa etária de 4 e 7 anos, em uma abordagem lúdica e didática, propiciando experiências comuns à vida de um paleontólogo.
Apesar do curto tempo entre o primeiro contato e o grande dia de pôr em prática o Projeto, organizou-se uma série de atividades sobre Paleontologia e como ser paleontólogo. Contou-se com a colaboração dos alunos do Laboratório de Mastozoologia na organização e produção das atividades (que envolveu planejamento e execução de pesquisa, trabalho artesanal, montagem da programação, confecção de uniformes e de “kits paleontólogo”) e do paleoartista equatoriano Pablo Lara, criador do logotipo desse projeto (uma ilustração de um filhote do proboscídeoNotiomastodon platensis com uma lupa e chapéu de paleontólogo, que em breve terá o seu nome escolhido em um concurso cultural – Figura 1). Contou-se também, para a realização deste projeto, com o suporte da FAPERJ, através da bolsa “Cientista do Nosso Estado” concedida ao Prof. Dr. Leonardo Avilla.

Figura 1 - Logo do Projeto Paleo Jr, um filhote simpático e curioso do mastodonte sul-americano Notiomastodon platensis.
Figura 1 – Logo do Projeto Paleo Jr, um filhote simpático e curioso do mastodonte sul-americano Notiomastodon platensis.

Foram conduzidas diversas atividades, sendo a primeira delas uma “linha do tempo” feita de tecido (Figura 2), com cerca de 40m de comprimento, na qual faixas de tecidos de diferentes cores e tamanhos foram unidas de acordo com a coluna estratigráfica  (aproximadamente Cenozóico em amarelo, Mesozóico em azul, Paleozóico em verde e Pré-Cambriano – Proterozóico, Arqueano e Hadeano – em vermelho). Nesta grande linha do tempo, as crianças participantes do Projeto Paleo Jr, Eduardo e Caio, aprenderam e exercitaram os conceitos de tempo, antiguidade, origem da vida e extinção, uma vez que a atividade consistia em “posicionar” no tempo uma série de elementos (fotografias), como uma cidade moderna, homem das cavernas, mamutes, pirâmides do Egito, múmias, pterossauros, dinossauros, trilobitas, vulcões gigantes e microorganismos.

Grande linha do tempo trabalhada com as crianças participantes do Projeto Paleo Jr.
Figura 2 – Grande linha do tempo trabalhada com as crianças participantes do Projeto Paleo Jr.

Ainda, um grande quebra-cabeças ilustrado exemplificou o processo de formação dos fósseis (Figura 3), trazendo imagens de processos naturais do ciclo da matéria orgânica e ainda dos processos bioestratinômicos e fossildiagenéticos. Neste momento, cada criança participante ganhou um “kit paleontólogo” que contou com uma bolsa de campo, pá, peneira, pincel e bandeja, preparando-os para a atividade que mais trouxe empolgação e experiência paleontológica: a “escavação”, realizada em uma piscina inflável repleta de areia lavada e seca, com partes desmontadas de dinossauros de madeira de baixa densidade (mdf) cobertos por porcelana fria (pasta de biscuit em duas cores diferentes, para distinguir os dois “indivíduos” soterrados – Figura 4). Conforme encontradas pelas crianças as peças foram “preparadas”, sendo limpas (removendo-se a areia/sedimento com a ajuda de um pincel), identificadas (coluna vertebral, crânio, membros anteriores, posteriores, bacia e cauda – Figura 5) e montadas, formando o dinossauro completo, que cada participante pôde levar consigo para casa como recordação deste dia único. Não é preciso dizer que encontrar o seu primeiro dinossauro (mesmo que réplica) foi o ápice do dia para as crianças participantes do Projeto PaleoJr que ficaram extasiados com a experiência! Além disso, foi um momento extremamente gratificante e comovente para a equipe do Laboratório de Mastozoologia: colaborar com o aprendizado de crianças tão interessadas na paleontologia (Figura 6)!

Figura 3 - Caio (5 anos, esquerda) e Eduardo (5 anos, direita) montando o quebra-cabeças do processo de formação dos fósseis.
Figura 3 – Caio (5 anos, esquerda) e Eduardo (5 anos, direita) montando o quebra-cabeças do processo de formação dos fósseis.
Figura 4 - Eduardo com um dos dinossauros de mdf e porcelana fria, ainda desmontado e com “sedimento”, recém-coletado
Figura 4 – Eduardo com um dos dinossauros de mdf e porcelana fria, ainda desmontado e com “sedimento”, recém-coletado.
Figura 5 - Caio concentrado na limpeza e identificação dos “espécimes” encontrados.
Figura 5 – Caio concentrado na limpeza e identificação dos “espécimes” encontrados.
Figura 6 - Idealizadores e participantes do Projeto Paleo Jr do Laboratório de Mastozoologia da UNIRIO (sentido horário: Dr. Leonardo Avilla, Karol de Oliveira, Dra. Dimila Mothé, Eduardo, Caio, Alline Rotti e Sabrina Belatto)!
Figura 6 – Idealizadores e participantes do Projeto Paleo Jr do Laboratório de Mastozoologia da UNIRIO (sentido horário: Dr. Leonardo Avilla, Karol de Oliveira, Dra. Dimila Mothé, Eduardo, Caio, Alline Rotti e Sabrina Belatto)!

Os conceitos científicos ensinados neste dia, bem como as habilidades trabalhadas durante as atividades do Projeto Paleo Jr, como organização, pensamento crítico, atenção, capacidade de dedução, coordenação motora, entre outras, estão presentes na vida diária dos cidadãos e são extremamente importantes para o desenvolvimento pessoal, educacional e social de qualquer indivíduo. Sendo a Paleontologia uma área da ciência que está em constante expansão e renovação de seu conteúdo (com novas interpretações e achados inéditos sobre a vida pretérita surgindo frequentemente), é essencial que haja diálogo simples (Figura 7), direto e proveitoso com o público, para que a sociedade conheça o que tem sido feito no âmbito científico em seu país e reconheça sua aplicabilidade e importância na geração de conhecimento. Desta forma, aumenta-se o interesse geral e identificação pela ciência, e incentiva-se a criação ou ampliação de uma cultura científica como um todo. O conhecimento científico, em seus diversos aspectos, permeia a vida de todos, e poucas pessoas se dão conta que os mesmos processos naturais que ocorrem atualmente no planeta já ocorriam há milhões de anos, influenciando e impactando a vida de organismos tão complexos quanto nós, seres humanos, quanto de dinossauros, trilobitas e tantos outros que já “reinaram” na Terra. Visto o sucesso desta experiência do Projeto Paleo Jr, a proposta agora em diante é dar prosseguimento ao Projeto, aprimorando as atividades e as expandindo para outras faixas etárias, como forma de incentivar o conhecimento e a paixão dos futuros paleontólogos brasileiros!

Figura 7 - Conversa entre o presente e o futuro: Eduardo esclarece dúvidas e faz perguntas (sobre dinossauros, claro!) para o Prof. Leonardo Avilla.
Figura 7 – Conversa entre o presente e o futuro: Eduardo esclarece dúvidas e faz perguntas (sobre dinossauros, claro!) para o Prof. Leonardo Avilla.

Foto DimilaDra. Dimila Mothé
Formação: Bióloga, Mestre e Doutora em Zoologia (subárea Paleozoologia) pelo Museu Nacional/UFRJ.
Áreas de Estudo: Sistemática, Evolução e Paleoecologia de mamíferos fósseis, principalmente mastodontes, mamutes e elefantes (proboscídeos). 
Atualmente bolsista de Pós-Doutorado Jr (CNPq) e coordenadora do Laboratório de Mastozoologia da UNIRIO.