Tá quente aí? Vai piorar

ALÔ MOÇADINHA cética do clima! Alô Joões, Reynaldos, Felipes. Alô galera que acha que ser “de direita” e ser “polêmico” é dizer que a mudança climática é uma conspiração comunista para devolver o mundo à Idade da Pedra. Alô Rogérios, Aldos, Dilmas, Danielas. Alô ao pessoal que acha que física é uma questão de ideologia. Espero que estejam curtindo bem o verão e faço votos para que seus aparelhos de ar condicionado nunca lhes faltem.

Vou dizer: aqui em Brasília está quente. Quente e seco. Quem conhece Brasília sabe que esses dois adjetivos geralmente não se aplicam ao período compreendido entre o Natal e o Carnaval, quando todo mundo vira sapo e o mofo se espalha pelas casas. Li hoje em algum jornal que as temperaturas no país neste verão estão 2 graus Celsius acima da média e que a precipitação no Sudeste é a menor desde 1934. À noite as temperaturas batem fácil os 30 graus. Desde setembro eu aboli o banho quente, e não foi por convicção ambiental. Ruim para humanos, excelente para pernilongos, que ganharam uma estação extra para se reproduzir e estão literalmente tirando o sono dos brasilienses. Pesquisa da Fiocruz divulgada hoje pelo Estadão mostra que cada grau de calor a mais no verão significa 45% mais casos de dengue entre março e maio. All things being equal, este semestre promete.

Pode ser coincidência? Pode. Pode ser variação natural do sistema? Também. Mas que tal uma hipótese alternativa? Por exemplo, a de que existe um excesso de energia sem dissipação adequada na atmosfera terrestre e que esse excesso de energia precisa, obrigatoriamente, buscar o que fazer aqui — e o que ele acha para fazer é levar a meteorologia a extremos? E que entre esses extremos estão aumentos de temperatura e mudança no regime de chuvas? E que, obviamente, como a quantidade de radiação sem dissipação adequada não está diminuindo na Terra, os eventos extremos tendem a aumentar e o que é exceção hoje tende a virar regra?

“Ah, lá vem você com essa balela de aquecimento global de novo”, dirão alguns dos 12 leitores deste blog. OK, não precisa acreditar só em mim: hoje o Fórum Econômico Mundial, aquele notório convescote de anticapitalistas furibundos que se reúnem todo ano em Davos para fumar maconha, ouvir Manu Chao e planejar a derrubada do Sistema, lançou seu relatório Riscos Globais 2013 (aqui, em inglês). O documento diz que, enquanto governos e iniciativa privada dão atenção total dada ao gerenciamento da crise econômica, uma outra crise, o estresse do sistema ambiental — o climático em particular — está se acumulando e pode ter passado do ponto de não retorno. O Fórum chama a mudança climática de um dos principais “fatores X” de disco global, ou seja, perigos que dão o troco em você se não forem evitados. Alerta semelhante faz o economista americano Joseph Stiglitz hoje no Guardian.

A presidenta Dilma, o ministro Edison Lobão e o restante da eletrocracia brasileira fariam bem em ler o relatório dos radicais de Davos e tirar dele algumas lições: afinal, estamos, se o tempo não virar, às portas de um racionamento de energia elétrica causado, vejam só, por problemas climáticos — a baixa dos reservatórios decorrente da seca. Hoje O Globo publica em sua manchete que os próprios representantes das indústrias eletrointensivas propuseram um racionamento voluntário agora, para poupar energia para depois.

Pergunta: quantos estudos refinados existem sobre a vulnerabilidade do sistema hidrelétrico brasileiro às mudanças climáticas? Se há algum, está sendo mantido bem guardado pela Empresa de Pesquisa Energética. Tão bem guardado a ponto de não influir na construção dos planos decenais de energia. Porque a solução aventada pela eletrocracia, segundo o que lemos na imprensa, é aumentar ainda mais a nossa vulnerabilidade, com a volta dos grandes reservatórios (num argumento perfeitamente circular, ainda vão botar a culpa nos ambientalistas, que pressionam pelas usinas a fio d’água). E aumentar também as nossas emissões, com um novo surto de construção de termelétricas. Será que o país não analisa suas vulnerabilidades climáticas por incompetência? Por falta de cientistas? Por descrença em que o clima esteja mudando? Ou porque teme que uma análise do gênero estrague os planos de Ernesto Geisel Dilma Rousseff de barrar até a última queda d’água da Amazônia antes de pensar em outras formas de energia?

Há vozes sensatas no setor. O ex-diretor de óleo e gás da Petrobras Ildo Sauer, por exemplo, tem um paper recente mostrando a viabilidade de garantir a segurança do sistema energético integrando hidrelétricas e usinas eólicas. Gente como Sauer, Afonso Henriques Moreira Santos e até um radical de boa cabeça, Célio Bermann, porém, foram alijadas do planejamento energético, cada vez mais centralizado na figura da competentíssima técnica Dilma Vana Rousseff.

Como eu moro em Brasília e sou cliente da CEB, estou bem habituado a não ter energia em casa. Mas outras pessoas Brasil afora podem ter uma menor tolerância a apagões, e o PT poderá pagar nas urnas o preço de ter confiado demais em São Pedro.

 

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