Biotecnologia sem fronteiras: o monopólio da inovação está com seus dias contados
O baixo custo dos computadores, a lei de Moore ainda em vigor e o acesso à internet democratizaram os meios de produção, distribuição e educação. Hoje não somos apenas consumidores passivos, mas também produtores ativos. E na ciência, não é diferente. Vivemos a era “Pro-Am”, em que amadores dedicados, inovadores e conectados trabalham como profissionais, uma realidade na astronomia, na ciência da computação, e agora da biotecnologia. Basta um computador, conexão com a internet e um cartão de crédito para encomendar DNA e testar algumas das mais novas técnicas de clonagem e edição de genoma, até então só acessível a universidades e grandes empresas.
Em 1987, a luz de uma estrela, que explodiu há 168.000 anos chegou a Terra. Foi então que astronômos amadores junto com profissionais, confirmaram a teoria do que ocorre quando uma estrela explode, uma das maiores descobertas da astronomia do século XX. Hoje muito mais gente participa da ciência que até então dependia de equipamentos sofisticados e caros. Uma dessas tecnologias, foi disponibilizada por John Dobson, responsável por criar um poderoso telescópio usando materias de segunda-mão. Dobson se recusou a lucrar com sua invenção, a qual nunca patenteou. Essa democratização chegou à biologia com o movimento Do-it-yourself Biology (DIYbio) em 2008, em que profissionais e amadores desenvolvem projetos em laboratórios comunitários, constroem equipamentos por uma fração do preço e aproximam a comunidade da discussão sobre organismos geneticamente modificados.
Em um desses laboratórios comunitários, o BioCurious, na Califórnia, são desenvolvidos projetos que envolvem a recente ferramenta de edição de genoma CRISPR, uma bioimpressora capaz de “imprimir” células de E. coli, e um projeto do iGEM para a produção de queijo “vegan”, com proteínas do leite produzidas por leveduras, e não vacas.
Atualmente é possível comprar ou montar os próprios equipamentos, como o OpenPCR, um termociclador usado para amplificar DNA, a centrífuga OpenFuge e o robô OpenTrons, que permite automatizar seu trabalho de bancada. Em breve, o MiniION™ será realidade, um sequenciador portátil e descartável que pode analisar sua amostra, seja ela de um microrganismo ou sangue, em qualquer lugar do mundo, sem precisar de milhares de doláres em equipamentos ou treinamento. Além de aparelhos mais acessíveis, o preço de síntese por base de DNA (A, T, C, G) já custa apenas alguns centavos e tem caido ano após ano. No futuro, nada impede que etapas custosas de um projeto sejam terceirizadas, ocupando a capacidade ociosa de laboratórios ou serem realizadas por empresas prestadoras de serviços, como já acontece com a síntese e o sequenciamento de DNA na China.
Projetos como esses vão reduzir o custo de se buscar o novo, trazendo soluções acessíveis para a saúde, alimentação e preservação do meio ambiente, quebrando o atual monopólio da inovação presente apenas nas grandes instituições como empresas e universidades. Como em toda abertura democrática, espera-se que muito mais gente se beneficie deste passo da ciência: a biotecnologia sem fronteiras.
Confira a iniciativa acontecendo em Sâo Paulo – http://synbiobrasil.org/st/diy/
Referências:
The Pro-Am Revolution – How enthusiasts are changing our economy and society – Charles Leadbeater and Paul Miller
Time for new DNA synthesis and sequencing cost curves – Rob Carlson