O que é a vida!?

Talvez essa seja a pergunta – ou pelo menos variantes dela – que todos os que têm coragem de se perguntar, se perguntam pelo menos uma vez na vida.

Bem, o mínimo que podemos concluir desse metaquestionamento é que, se nos perguntamos isso, é porque estamos vivos e ponto final.  O que seria uma das conclusões que você poderia tirar da frase que Descartes ficou convencidamente orgulhoso de ter elaborado: “Penso, logo existo!”. Mas esse é um site sobre biologia sintética, e como tal devemos tagarelar sobre como subjugar a Biologia ainda mais à nosso favor (com todo o respeito Biologia!), e não sobre essas coisas incertas de filósofos!

É aí que o pobre estudante, simpatizante, ou entusiasta do assunto se engana (i.e., leitor do blog). Toda a ciência, por mais complexa e rebuscada que se torne, chega a um ponto em que deve olhar para as suas entranhas e dizer: “Mas o que significa isso mesmo!?”.

Todas não, vai! A matemática já é bastante crescidinha para esse tipo de coisa. Já superou suas crises e faz tempo que vem descrevendo perfeitamente a realidade bem antes de a maioria das pessoas conseguir interpretar sua abstração como algo mais tangível.

A Física por exemplo, passou séculos podendo ser entendida sem maiores preocupações filosóficas, até chegar nos problemas quânticos. Nessa fase, uma pergunta puramente filosófica à olhos leigos – e também para um certo número considerável de não-leigos – poderia ser: “Como uma coisa pode e não pode estar no mesmo lugar ao mesmo tempo?” ou “Como um gato pode estar vivo e morto ao mesmo tempo dentro de uma caixa!?”. Mas aí a Matemática, com toda sua experiência, dá um tapinha nas costas da Física (a que muitos atribuem o parentesco de filha) e a ajuda em seus problemas existenciais, mesmo que muitos seres humanos não tenham a capacidade de compreender à primeira vista como ela ajudou. Mas isso é só um detalhe.

E a Biologia!? Ela vem sofrendo de um problema existencial há muito tempo, e agora as coisas vêm piorando; coitada. Ela já estava combalida por causa de uma velha história indecisa sobre considerar um vírus como vida ou como “pseudovida”, e agora ainda vêm uns astrobiólogos aí com o papinho de “temos que acabar com os nossos preconceitos sobre o que é vida para conseguir procurar e encontrar adequadamente vida fora da Terra”. E que ainda por cima, têm a audácia de comprovar que o querido ácido nucleico, a peça chave na propagação de toda a vida, pode ser de uma maneira bem diferente (ok, nem tanto diferente) da que conhecíamos como “normal”. Isso sem falar nesses pesquisadores aqui (do post anterior) que conseguiram fazer em laboratório uma bactéria com um nucleotídeo considerado tóxico, que na prática, é quase o mesmo que fazer o que o pessoal da Nasa fez, mas sem o estardalhaço incompreendido na mídia (ou seria a mídia incompreendendo o estardalhaço?).

“Mas o que eu tenho a ver com essas neuras das ciências!?”, poderia se perguntar a pessoa mais desavisada. Eu diria que tudo.

As sociedades mais predominantes no mundo, apesar de terem o pensamento científico seguindo uma lógica singular, têm uma cultura extremamente plural. Fato. Isso quer dizer então, à priori, que existem mais maneiras diferentes dessas culturas verem a ciência do que o contrário; e as maneiras de influenciar a ciência são bem maiores quando ela abre margem para discussão de seus conceitos incertos, como “o que é vida!?”.

Aos olhos de uns, as peripécias do grupo de Craig Venter (que criaram a “célula artificial” Mycoplasma laboratorium) podem ser “brincar de Deus”, aos olhos de outros pode ser apenas “a linhagem de bactéria geneticamente mais ‘enxuta’ que já se conseguiu criar”. É nesse modelamento extremo da vida que a opinião sobre “o que é a vida!?” faz muito a diferença. Em geral essa pluralidade de visões é benéfica, pois ajuda a regularizar muita coisa potencialmente perigosa e não-ética. Mas por causa da falta de informação, pode gerar muito preconceito e dificultar várias pesquisas que poderia ajudar muita gente. Vide por exemplo o uso das células tronco: qual é sua opinião? Agora você consegue ver a implicação na sua vida do título desse post!?

Parece que a Biologia vai ter que ficar filosofando ainda um bom tempo sobre suas entranhas para responder algumas perguntas, mas isso talvez seja só um lembrete da sábia mãe Filosofia: de que pragmatismo em excesso e falta de questionamento geralmente não caem bem para o estômago das ciências.